Médico do Incor: Lamentável que ministros do STF prefiram acreditar em “pesquisador” pago pela indústria do amianto; ouça

Tempo de leitura: 13 min

por Conceição Lemes

Nesta quinta-feira (24/08), o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 4066, que questiona a validade da lei federal 9.055/1995, que disciplina extração, industrialização e comercialização do amianto.

É a chamada “lei do uso controlado”, que cientificamente é uma falácia.

Será a quarta sessão de um julgamento, iniciado em 10 de agosto.

Naquele dia, publicamos: Está nas mãos do STF evitar que tragédias como as dos seis da “Silva Simões” continuem a ocorrer 

Quatro “Silva Simões” já faleceram devido à asbestose, uma fibrose pulmonar causada pelo amianto; dois ainda estão vivos, mas sofrem da doença.

Havia então grande expectativa de que finalmente o Brasil finalmente iria banir a fibra cancerígena, como já acontece em mais de em mais 70 países, entre quais todos da Europa, Japão, nossos vizinhos, Chile, Argentina e Uruguai, e, em 1º. de janeiro de 2018, será a vez do Canadá.

Naquela sessão, o voto impecável do ministro Dias Toffoli pela proibição do amianto reforçou a confiança.

“Dia do juízo final do amianto está muito próximo”, observou a a engenheira Fernanda Giannasi, fundadora da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea) e referência no mundo da luta contra a fibra assassina.

No segundo dia de julgamento, 17 de agosto, o voto da ministra Rosa Weber, relatora da ADI 4066 , só fez crescer essa esperança.

A ministra posicionou-se pela inconstitucionalidade da lei federal de 1995, portanto pela proibição da exploração, industrialização, comercialização e venda de produtos com amianto.

Ela ressaltou:

“Não é mais razoável admitir, à luz do conhecimento científico acumulado sobre a extensão dos efeitos nocivos do amianto para a saúde e o meio ambiente, e a evidência da ineficácia das medidas de controle da Lei 9055/1995, a compatibilidade de seu artigo 2º com a ordem constitucional de proteção à saúde e ao meio ambiente”.

Ela lembrou que, segundo a Constituição Federal de 1988, a saúde é um direito social de todos, que abrange também o direito à prevenção inclusive no local de trabalho:

“Os preceitos constitucionais que elevam a saúde à categoria de direito social incumbem ao Estado o dever de garanti-la mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doenças e assegure aos trabalhadores a redução de riscos no trabalho e adoção de agenda positiva para a proteção desses direitos”.

A ministra salientou que a Convenção 162 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata do banimento do amianto, admite a continuidade de sua produção em determinadas condições, sempre regulamentada por meio de lei, mas orienta a substituição progressiva à medida em que surjam tecnologias alternativas.

Observou que a convenção, que tem status de norma supralegal no Brasil, prevê a atualização periódica da legislação, mas que isso não ocorreu, pois a Lei 9055 já tem mais de 20 anos de sua promulgação.

“Embora pudesse ser constitucional em 1995, não detém o mesmo status atualmente. Não é possível expor os trabalhadores ao risco de uma doença laboral unicamente para potencializar a capacidade produtiva de uma empresa ou determinado setor econômico”.

“Cada vez que um processo produtivo se revele um perigo para a saúde do profissional, o empregador deverá reduzir, até o limite máximo oferecido pela tecnologia, os males causados ao trabalhador”.

“Quando, porém, os incômodos forem de tal monta a ponto de minar a saúde do trabalhador, havendo um conflito entre a exigência produtiva e o direito, este último deverá prevalecer”.

“O voto da ministra foi muito bem fundamentado. Ela se pautou no estado-da-arte da ciência. Deu-nos uma grande esperança de que finalmente o Supremo vai avançar num marco civilizatório em defesa e prevalência da vida”, elogiou Fernanda Giannasi, na semana passada, logo após a sessão de 17 de agosto.

Porém, na sessão dessa quarta-feira (23/08), o STF mais uma vez falhou em proteger a saúde.

Os ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Marco Aurélio discordaram de Rosa Weber e votaram pela constitucionalidade da lei federal de 1995, portanto a favor da indústria do amianto.

Edson Fachin e Ricardo Lewandowski seguiram Rosa Weber no sentido da inconstitucionalidade da lei.

O julgamento será retomado na sessão desta quinta-feira (24) com os votos dos ministros Celso de Mello e Cármen Lúcia (presidente). Os ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, que se declararam impedidos, não votam nesta ação.

O que mais me causou espanto nos votos a favor do amianto é o fato de os ministros Marco Aurélio e Fux terem respaldado os seus votos no atraso científico. Mais precisamente em David Bernstein, elevando-o à categoria dos mais brilhantes cientistas do mundo e especialista de amianto.

Só que não é nada disso.

Na reportagem Perito “suiço” em amianto foi pago pela indústria brasileira do amianto (na íntegra, ao final), publicada em 28 de setembro de 2008, o Viomundo o desmascarou.

Bernstein defende que o tempo que a fibra de amianto persiste no pulmão é que indica o seu grau de nocividade. É o que ele chama de biopersistência.

Em 1999, ao participar de uma audiência pública sobre o tema na Câmara dos Deputados, em Brasília, foi saudado como “cientista suíço, autoridade máxima e de reconhecimento internacional em estudos de fibras e partículas”. Na ocasião, apresentou-se como pesquisador independente.

Faltou com verdade aos deputados brasileiros. Físico de formação e estadunidense de nascimento, Bernstein acabou se dedicando à toxicologia e foi morar na Suíça.

Em 2008, sua máscara de neutralidade e independência lhe foi arrancada em plena Corte do Distrito de Ellis County, Texas, Estados Unidos.

As pesquisas de Bernstein e suas conclusões foram usadas pela indústria no mundo inteiro, inclusive no Brasil, com os objetivos de: inocentar a crisotila dos males do amianto, adiar leis e regulamentos de restrição ou banimento do mineral e não pagar indenizações às vítimas.

Na reportagem de 2008, na íntegra abaixo, esta repórter enviou em 3 de setembro seu primeiro e-mail a David Bernstein. Perguntou:

1) Sabemos que teve pesquisas financiadas pela indústria brasileira do amianto. O senhor confirma isso? Que companhia, especificamente, financiou seu trabalho?

2) Se a informação que temos é totalmente verdadeira, poderia nos dizer quanto recebeu? Para que pesquisas esses financiamentos foram utilizados? Uma delas é sobre a biopersistência da crisotila brasileira. Há outras?

Primeiro e-mail, nenhuma resposta. Segundo, idem. Terceiro, também. No quarto: “Todos os financiamentos estão referidos na primeira página de cada publicação e se você quiser mais informação, por favor, contate as respectivas companhias”.

Solicitamos então o envio de uma cópia dos trabalhos por e-mail. Ou, considerando que eram públicos, que dissesse o nome das empresas que o financiaram e quanto pagaram. Esquivou-se, de novo: “Estou viajando e não os tenho disponíveis. Você pode fazer o download deles no website da revista Inhalation Toxicology. Espero que você leia as publicações”.

Bernstein veio ao Brasil financiado pelo lobby do amianto: Instituto Brasileiro do Crisotila e Eternit, que se calaram quando os questionei sobre quanto  a indústria brasileira do amianto havia pago pelos serviços do “cientista”.

E ,agora, com surpresa, nove anos depois, assisto ao “renascimento” do “cientista” da indústria.

Talvez Fux e Marco Aurélio tenham buscado socorro em Bernstein por dois motivos: é gringo, e a nossa elite tem complexo de vira-lata; os médicos que trabalhavam para a indústria do amianto, particularmente para a Eternit, e estavam ligados a universidades brasileiras já foram exaustivamente desmascarados aqui.

Na reportagem de 2008, eu entrevistei o  médico Ubiratan de Paula Santos, da Divisão de Pneumologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Incor/HC/FMUSP). Ele desmontou a teoria de Bernstein.

Hoje, 24 de agosto de 2017, voltei a falar com doutor Ubiratan sobre Bernstein e  teoria fajuta dele.

Ubiratan é responsável pelo ambulatório de doenças respiratórias ocupacionais do Incor, onde cuida também  pessoas expostas ao amianto.

Perguntei-lhe o que achava de os ministros do STF se calcarem em Bernstein para defender o amianto.

“Acho que tentaram usar argumento de um “pesquisador” para justificar posição que já tinham de defender a indústria do amianto”, diz Ubiratan.

“Preferem considerar o Bernstein ao grupo de pesquisadores internacionais da IARC [Agência Internacional de Pesquisa do Câncer]”!, lamenta.

“Não há argumento, evidência que sustente considerar mais válidos, criveis, os estudos experimentais do Bernstein do que as avaliações da IARC feita por comitês de pesquisadores e levam em conta estudos experinentais e epidemiológicos em humanos”, prossegue.

“Bernstein é pago pela indústria do amianto; portanto, conflito escancarado de interesse”, arremata o doutor Ubiratan.

Ouça também o áudio que o doutor gravou especialmente para o Viomundo.

Abaixo, cartaz feito por um sindicato

Publicada originalmente em 28 de setembro de 2008

por Conceição Lemes, do site antigo do Viomundo

Guarde este nome: David Bernstein. E este termo: biopersistência. A partir de agora, “ouvirá” falar bastante de ambos. No centro da discussão, o amianto branco, ou crisotila, utilizado no Brasil. Com a palavra, primeiro, as instituições defensoras do mineral no País. Seus sites expressam suas posições.

O da Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTA) divulga: “A menor taxa de biopersistência: ‘Estudos recentes confirmam que o crisotila brasileiro é menos nocivo á saúde humana no mundo’. A declaração é do médico David M. Bernstein em abordagem sobre os efeitos do mineral para a saúde (sic)”.

“‘Hoje, diferente do que ocorreu no passado, não há nenhum risco para os trabalhadores, que aderiram ao uso controlado e responsável, assim como para a população que utiliza produtos que contém o crisotila e o mundo precisa saber disso (sic)’”, destaca Adilson Santana, vice-presidente da CNTA, ao comentar, no boletim da entidade, a Conferência Internacional do Amianto, realizada na cidade do México, em 2007. “A Conferência foi marcada por diversas palestras, que deram um panorama geral sobre o amianto crisotila e a defesa dos recursos naturais, como o do médico e pesquisador David Bernstein (sic) …”

O Instituto Brasileiro do Crisotila (IBC) propaga: “Em temperaturas acima de 800ºC o amianto crisotila sofre decomposição térmica, transformando-se em forsterita (…); a forsterita não é fibrosa, sendo inócua à saúde humana. Estudos de biopersistência evidenciam o fato do produto ter baixo potencial de toxicidade (…) Esses dados foram confirmados pelo renomado médico toxicologista suíço, Dr. David Bernstein (sic).”  O objetivo principal do IBC é fazer lobby a favor dos interesses da indústria.

O site do Grupo Eternit, o maior do setor de amianto no Brasil, expõe: “Biopersistência significa o tempo de permanência das fibras no pulmão antes de serem eliminadas. Enquanto as do amianto crisotila permanecem no máximo dois dias e meio no pulmão, as do anfibólio ficam mais de um ano. Os trabalhadores das indústrias que seguem as regras do uso controlado estão totalmente seguros”.

“O discurso sindical é xerox do discurso empresarial”, considera Eliezer João de Souza, presidente da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea). A engenheira de segurança do trabalho Fernanda Giannasi, auditora fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) em São Paulo e coordenadora da Rede Virtual-Cidadã pelo Banimento do Amianto para a América Latina, põe o dedo na ferida: “CNTA =IBC=Eternit = David Bernstein + biopersistência”.

Bernstein defende que o tempo que a fibra de amianto persiste no pulmão é que indica o seu grau de nocividade. É o que ele chama de biopersistência. Em 1999, ao participar de uma audiência pública sobre o tema na Câmara dos Deputados, em Brasília, foi saudado como “cientista suíço, autoridade máxima e de reconhecimento internacional em estudos de fibras e partículas”.

Na ocasião, apresentou-se como pesquisador independente e disse, entre outras coisas, que: 1) a crisotila da mina de Cana Brava, em Minaçu, norte do Estado de Goiás, fica pouco tempo no pulmão, o que eliminaria o risco de ser cancerígena; 2) o amianto brasileiro seria seguro e não faria mal à saúde; 3) suas pesquisas sobre biopersistência, feitas com ratos de laboratório, teriam orientado a Comissão Européia na classificação de fibras. Fora, inclusive, convidado a participar dela.

INDÚSTRIA BRASILEIRA DO AMIANTO FINANCIOU BERNSTEIN

Faltou com verdade aos deputados brasileiros. Físico de formação e estadunidense de nascimento, Bernstein acabou se dedicando à toxicologia e foi morar na Suíça.

Recentemente, sua máscara de neutralidade e independência lhe foi arrancada em plena Corte do Distrito de Ellis County, Texas, Estados Unidos. A audiência era para tratar do processo de indenização de vítima de mesotelioma contra a empresa Geórgia Pacific (G-P), que fabricava produtos à base de crisotila, também conhecido como calídria, proveniente da mina da Union Carbide na Califórnia. Bernstein compareceu na condição de expert para defender a G-P, como o fizera anteriormente para a Union Carbide .

O tiro saiu pela culatra. Ao ser interpelado pelo advogado dos familiares da vítima, Rick Nemeroff, revelou, entre outras coisas, que a indústria brasileira do amianto financiou suas pesquisas com a crisotila. A transcrição do depoimento tem 143 páginas. Abaixo alguns trechos importantes. Você vai descobrir que certas informações disseminadas por e sobre Bernstein, inclusive no Brasil, não correspondem à verdade factual. P refere-se às perguntas dos advogados. R, às respostas de Bernstein.

(…)

P. Doutor, quanto você recebe atualmente por hora de trabalho?

R. Em moeda local, na Suíça, meu preço é 506 francos-suíços por hora.

P. Convertidos em dólares americanos, é quanto?

R. Suponho que US$ 415 por hora.

(…)

P. Você tem falado a este júri sobre seus estudos com crisotila. Eles foram realizados a pedido da Union Carbide [dos Estados Unidos], do setor de mineração da crisotila no Brasil, do Instituto de Asbesto e do governo do Canadá. Isso é correto?

R. Correto.

P. Suponho que contou a este júri que, nas décadas de 1960 e 1970, quando você descobriu que a crisotila causava mesotelioma, os seus estudos não eram financiados por esses grupos, eram?

R. Eles foram financiados por outros grupos.

P. Outros grupos?

R. Hum-hum.

P. E, agora, que trabalha para grupos de mineração ou industrialização da crisotila, você próprio está se distanciando dos seus estudos iniciais, dizendo: no passado, nós cometemos erros, demos doses exageradas para os ratos e assim por diante. Isso é parte do seu testemunho, aqui, ao júri?

R. É parte dele.

(…)

P. Quanto os advogados, representando a Union Carbide, ajudaram a financiar seus estudos? Conte a este júri quanto você recebeu deles para fazer o trabalho que você está fazendo hoje neste tribunal?

R. Eles me pediram para fazer uma avaliação científica.

P. Quanto eles pagaram em dinheiro para você? Pode ser em francos ou dólares.

R. Eu não tenho isso em mãos no momento.

P. Refrescaria a sua lembrança se eu lhe mostrasse que os representantes da Union Carbide [um dos clientes de Bernstein e ré em muitos casos de amianto nos Estados Unidos] admitem ter pago a você US$ 400.623,30 por sua participação em audiências de litígio?

(…)

Corte. Ouça. Pode me ouvir? Pode me ver e ouvir? Leia meus lábios. Quanto a Union Carbide, por meio dos advogados dela, pagou a você?

R. Não tenho o total exato na minha frente. Me lembro que é cerca de 100 mil francos suíços.

(…)

P. Você nos falou a respeito dos seus estudos; repetidamente disse que a EPA [Agência de Proteção Ambiental, dos EUA] e a Comissão Européia vieram até você para fazer alguma coisa. Nem a EPA nem a Comissão Européia jamais procuraram você para fazer um estudo sobre amianto, procuraram?

R. Não, eles não me procuraram.

P. Então, se este júri ficou com a impressão de que EPA e a Comissão Européia procuraram você devido às suas opiniões sobre amianto, isso seria incorreto, certo?

R. Sim.

(…)

P. Eu entendo que epidemiologia (…) é o estudo das pessoas e de fatores que causam doenças. Você concorda comigo?

R. Concordo.

P. E você, senhor, não é epidemiologista?

R. Eu não sou.

P. Então, seria justo afirmar que você estuda amianto em ratos para ver o que acontece?

R. É verdade.

P. Em relação às suas qualificações, senhor, você não é higienista industrial, é?

R. Eu não sou.

P. E não é médico?

R. Eu não sou.

P. E não é patologista?

R. Eu não sou.

(…)

P. E o senhor discorda de todas as agências que dizem que o amianto crisotila pode causar mesotelioma [câncer agressivo e fatal de pleura, pulmão, peritônio, pericárdio e diafragma; a média de sobrevida após o diagnóstico é de 1 ano], não é correto?

R. Correto.

P. E você discorda de todos os países que baniram o amianto, inclusive daquele que você escolheu morar, não é correto?

R. Correto.

P. E as suas conclusões são baseadas nos estudos financiados por esta companhia, com licença, não por esta companhia, mas financiados por companhias que atuam na mineração e fabricação de produtos com amianto crisotila?

(…)

“SILÊNCIO CONSTRANGEDOR SOBRE A QUANTIA PAGA CHEIRA MAL”

As pesquisas de Bernstein e suas conclusões foram usadas pela indústria no mundo inteiro, inclusive no Brasil, com os objetivos de: inocentar a crisotila dos males do amianto, adiar leis e regulamentos de restrição ou banimento do mineral e não pagar indenizações às vítimas. Desde o início do século 20, já se sabia que o amianto causa asbestose, mais conhecida como “pulmão de pedra”. A doença provoca o “endurecimento” do pulmão, levando pouco a pouco à perda progressiva da capacidade respiratória; pode evoluir para a morte — a chamada morte lenta. Na década de 1940, comprovou-se que era cancerígeno.

Em 3 de setembro, esta repórter enviou seu primeiro e-mail a David Bernstein. Perguntou:

1) Sabemos que teve pesquisas financiadas pela indústria brasileira do amianto. O senhor confirma isso? Que companhia, especificamente, financiou seu trabalho?

2) Se a informação que temos é totalmente verdadeira, poderia nos dizer quanto recebeu? Para que pesquisas esses financiamentos foram utilizados? Uma delas é sobre a biopersistência da crisotila brasileira. Há outras?

Primeiro e-mail, nenhuma resposta. Segundo, idem. Terceiro, também. No quarto: “Todos os financiamentos estão referidos na primeira página de cada publicação e se você quiser mais informação, por favor, contate as respectivas companhias”.

Solicitamos então o envio de uma cópia dos trabalhos por e-mail. Ou, considerando que eram públicos, que dissesse o nome das empresas que o financiaram e quanto pagaram. Esquivou-se, de novo: “Estou viajando e não os tenho disponíveis. Você pode fazer o download deles no website da revista Inhalation Toxicology. Espero que você leia as publicações”.

Ao mesmo tempo, questionamos Marina Júlia de Aquino, presidente-executiva do IBC. Por meio de sua assessoria da imprensa, devolveu, por e-mail, a bola para Bernstein: “Quando o Instituto Brasileiro do Crisotila foi criado, o Dr. David Bernstein já havia realizado suas pesquisas. A pergunta, portanto, deve ser encaminhada diretamente a ele”.

Perguntamos também à Eternit. Apesar de vários e-mails e contatos telefônicos desta repórter com assessoria de imprensa do Grupo, silêncio total. A indústria brasileira que financiou as pesquisas de Bernstein sobre a crisotila foi justamente a mineradora do Grupo Eternit, a SAMA, em Minaçu, norte de Goiás. A SAMA é responsável pela única mina de amianto em exploração no Brasil — a de Cana Brava. Descobrimos duas publicações, onde a SAMA é citada como financiadora; ironicamente, uma delas, no próprio site do IBC, em português e inglês.

“Cheira mal o silêncio constrangedor de Bernstein e de seus clientes, quando solicitados a divulgar quanto a indústria brasileira do amianto pagou pelos serviços do cientista”, vaticina o consultor ambiental Barry Castleman, autor do livro Asbestos: Medical and Legal Aspects (Amianto: Aspectos Médicos e Legais).

Castleman é, desde 1999, consultor do Banco Mundial e da Comissão Européia para assuntos relativos ao amianto. É também testemunha-expert nas Cortes americanas sobre matérias de saúde pública e história corporativa do amianto. Por ano, atua em 20 a 30 processos, quase todos casos de mesotelioma. Ele denuncia: “Bernstein continuará sendo pago pelos negócios do amianto, inclusive do Brasil, enquanto houver ações financiadas pela indústria para defender seus produtos. Ele é o fim de uma longa tradição de cientistas contratados para publicar pesquisas e conclusões em saúde pública favoráveis à indústria do amianto”.

“Em 1999, quando o Bernstein depôs na Câmara dos Deputados, bem que estranhamos o fato de ele só andar com o pessoal da indústria. Agora sabemos o motivo”, observa Fernanda Giannasi. “Bernstein participa de uma orquestração internacional muito bem engendrada para sustentar em todo o mundo a ausência de nocividade da fibra assassina. Médicos das nossas mais prestigiosas faculdades de medicina fazem parte dela. Bernstein, como dizem os americanos, é o melhor que o dinheiro pode comprar.”

Laurie Kazan-Allen, coordenadora do International Ban Asbestos Secretariat (Secretariado Internacional pelo Banimento do Amianto, o IBAS), sediado na Inglaterra, fustiga: “Já que David Bernstein não é epidemiologista, não é higienista industrial, não é médico ou patologista e todas as entidades científicas rejeitam as conclusões dele de que a crisotila não é cancerígena, estou muito curiosa para saber que serviços ele presta para merecer tanto dinheiro dos réus do amianto, as mineradoras e indústrias do setor”.

“O argumento dele é ridículo”, afirma o médico David Egilman, professor adjunto de Clínica Médica da Brown University, em Massachusetts, EUA, e testemunha em disputas judiciais para uma companhia que foi proprietária de uma mina de amianto. “Ele só enxerga ‘biopersistência’ no pulmão e todo mundo concorda que a crisotila causa câncer no pulmão. A crisotila é o tipo de fibra  mais ‘biopersistente’ na pleura; assim, se ‘biopersistência’ é a questão-chave para a carcinogenicidade, então a crisotila é a principal causa de mesotelioma. Para tanto dinheiro assim, eles deveriam ter arranjado uma teoria melhor.”

“O fato de a crisotila ser menos biopersistente não significa que seja inócua à saúde; é como fumaça do cigarro”, compara o médico Ubiratan de Paula Santos, professor colaborador da disciplina de Pneumologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (Incor/HC/FMUSP). “A fumaça não tem biopersistência alguma. Entra e vai embora. Mas, ao fumar todo dia, você vai provocando e renovando a lesão. Resultado: assim como o cigarro no longo prazo pode causar câncer de pulmão, a crisotila pode ocasionar câncer de pulmão e mesotelioma.”

 


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Comentários

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elizabeth basilone

se não
faz bem para a saude , é não.

elizabeth basilone

só aceitamos se ascasas das pessoas que votaram a favor sejam revestidas tom telhas de amianto,e se for
realmente beneficas para a saude teremos comprovação e assim,poderão serem comerciaiizadas

FrancoAtirador

.
.
https://twitter.com/STF_oficial/status/900891659508097024

STF declara inconstitucionalidade
de dispositivo federal que disciplina
uso do amianto crisotila

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=353599
.
.

Jotage

Estes juízes não são a favor do câncer. Eles são um câncer em nosso país e este câncer tem que ser extirpado.

    JOSÉ GILVAR GONZAGA

    FAÇO AS MINHAS SUAS PALAVRAS

Antonio Carlos Magnanelli

Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Gilmar Mendes e Marco Aurélio: “OS QUATRO CAVALEIROS DO APOCALIPSE”.
Sugiro que os quatro passem 6 meses numa mina de amianto, com suas esposas e filhos.

jose

Os últimos anos nos reservaram o pior Congresso da História, o pior Senado da História e o pior STF da História…

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