Disque M para Murdoch: o deputado blogueiro que incomodou os conservadores

Tempo de leitura: 5 min

Rupert Murdoch e a News Corporation

Marionetes

O esperado relato de um deputado britânico sobre investigação do império de Murdoch

28 de abril de 2012, na Economist

Disque M para Murdoch: a News Corporation e a Corrupção da Grã Bretanha. Por Tom Watson e Martin Hickman. Allen Lane, 384 páginas; 20 libras. A ser publicado nos Estados Unidos em capa dura no dia 8 de maio; Blue Rider Press; U$ 26,95. Em e-book; U$ 10,99. Na Amazon.com e Amazon.com.uk.

Pedindo aos jurados que condenassem Al Capone por evasão fiscal, em 1931, um promotor federal descreveu o destino do chefe mafioso de Chicago como um momento de virada na História. O veredito estabeleceria se um homem “pode se conduzir de forma a ficar acima do governo e da lei”.

Em 10 de novembro de 2011, no cenário mais brando de um comitê parlamentar britânico, acusações de peso retórico similar foram feitas contra a News Internacional (NI), o braço britânico da News Corporation, o negócio global de Rupert Murdoch. Àquela altura a NI, a maior empresa de mídia do Reino Unido, bajulada por líderes políticos da direita e da esquerda, já tinha enfrentado um ano cruel.

Os problemas começaram em janeiro de 2011, quando Andy Coulson, um ex-editor da NI, renunciou ao cargo de chefe de imprensa do primeiro ministro, David Cameron. Ele foi preso mais tarde sob suspeita de corrupção e de conspirar para interceptar mensagens em secretárias eletrônicas. Outras prisões se seguiram, de executivos da NI, de editores e repórteres de tabloides, em meio a acusações de espionagem em escala industrial. Elas incluiram a invasão de secretárias eletrônicas de políticos, celebridades e gente comum envolvida em crimes de expressão.

Revelações de espionagem de uma vítima de assassinato de 13 anos, Milly Dowler, e da família dela aumentaram o ultraje público. O sr. Murdoch respondeu fechando o tabloide mais vendido da NI, o Sunday, além do News of the World e desistindo de sua tentativa multibilionária de assumir a BSkyB, uma lucrativa companhia de TV via satélite. Questões relativas à colaboração policial com os crimes levaram o chefe da Polícia Metropolitana, a mais importante do país, a renunciar.

Quatro meses depois, livre das leis de difamação pela imunidade parlamentar, um deputado trabalhista, Tom Watson, aumentou o tom. Expressando descrença de que os chefes da NI não sabiam sobre os crimes em suas redações, o sr. Watson disse ao filho do sr. Murdoch, James, um executivo sênior da NI, que ele “é o primeiro chefe mafioso da História que não sabia que estava dirigindo um empreendimento criminoso”. “Sr. Watson, por favor”, respondeu o Murdoch mais novo. “Acho que é impróprio”.

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O sr. Watson, em colaboração com Martin Hickman, um jornalista do Independent, acaba de publicar um indiciamento dos negócios de Murdoch tentando — de fato — provar que aquela acusação era própria. Em parte é uma descrição, apimentada por anedotas de bastidores, do escândalo que envolve a imprensa britânica desde 2005, quando o jovem príncipe William buscou saber como um tabloide de Murdoch soube de um leve ferimento que ele, William, sofreu num joelho, o que levou à primeira investigação sobre a violação de telefones.

Em seus melhores momentos, o livro tem o ritmo e o tom de desprezo moral de um promotor em sua arguição final. Ridicularizando o lento recuo dos chefes da NI de sua primeira defesa de que um “repórter trapaceiro” tinha violado a lei, os autores descrevem como a defesa passou a admitir a existência de “alguns repórteres trapaceiros”, depois de um “jornal trapaceiro”, sacrificado para salvar a empresa que o livro chama de “estado-sombra”. O sr. Watson alega que a equipe da NI estava aparentemente tão certa de suas conexões policiais e políticas que decidiu destruir provas, ameaçar críticos e esconder os crimes, com impunidade. Carl Bernstein (famoso por ter investigado o escândalo de Watergate) é citado por encontrar “notáveis” paralelos entre os problemas da imprensa de Murdoch e o escândalo que derrubou Richard Nixon.

Uma estrela ascendente sob Gordon Brown, o sr. Watson oferece uma janela para o mundo de espelhos habitado pelas classes dirigentes e pela imprensa. Os mesmos tabloides que perseguiam políticos e chefes de polícia ofereciam a eles lucrativos empregos como colunistas. Os dois principais partidos agora se distanciaram dos negócios do sr. Murdoch, mas as ligações foram muito próximas. Tony Blair é padrinho de uma das jovens filhas do sr. Murdoch, e David Cameron cavalgou com o marido de Rebekah Brooks, ex-chefe da NI e vizinha de Cameron.

Os leitores podem ter dificuldades para navegar nas acusações e contra-acusações do livro. Denúncias ousadas de conspiração mafiosa apontam para a fragilidade central do livro. O sr. Watson tem uma tendência para exagerar; quem quer que o sr. Murdoch seja, ele não assassina seus inimigos. Além disso, o indiciamento de uma empresa não é suficiente para resgatar o  falido sistema político-midiático do Reino Unido. Um mafioso como Al Capone pode ser preso. Derrubem um presidente e um bom governo pode assumir. O império de mídia do sr. Murdoch não é uma gangue criminosa que deve ser trancafiada, deixando as ruas seguras. Ele é o maior player da indústria de mídia britânica, no qual abusos foram registrados em vários títulos. O livro foca nos detalhes desagradáveis das vidas dos poderosos. Mas milhões de consumidores comuns deram ao sr. Murdoch seu poder — e não pareciam se importar quando os tabloides invadiam a privacidade dos ricos e famosos. Não fosse o caso de Milly Dowler, envolvendo uma estudante comum, a opinião pública poderia nem ter se voltado contra o News of the World.

E a NI não é um estado secreto e sombrio. É um negócio que se portou de forma miserável, mas que também fez algo crescentemente raro: na maior parte dos anos lucrou disseminando notícias. Em parte, o sr. Murdoch faz jornalismo ao mesmo tempo financiando títulos sérios, que perdem dinheiro, como o Times, e tabloides populares e lúgubres como o Sun. Expulsem o barão e teremos menos jornais no Reino Unido. Este seria um preço alto a pagar.  A imprensa desordeira e áspera do Reino Unido também cobra os governos, avalia promessas eleitorais, noticia desde campos de batalha e vive para vigiar os poderosos.

Não está claro quanto o sr. Watson, uma estrela da blogosfera de Westminster e da comunidade do Twitter, se preocupa com isso. O livro despreza o amor do sr. Murdoch pela tinta e pelas velhas formas de fazer mídia. Descreve o barão como alguém que descobre “o poder do protesto da idade eletrônica”; o Twitter e o Facebook consolidaram o ultraje dos britânicos e deram um empurrão “devastador” aos pedidos de boicote contra o News of the World. Mas a fúria foi parasitária, alimentada por anos de investigação profissional, acima de tudo pelo diário Guardian (que perde dinheiro), que descobriu a maior parte dos casos de invasão das secretárias eletrônicas.

Expor práticas horríveis da imprensa, algumas delas claramente contra a lei, é uma missão importante, ainda incompleta. Em anos recentes, ela foi estragada pela incompetência dos que deveriam vigiar, dos reguladores sem dentes à polícia. Nenhum jornalista ou dono de jornal deve se sentir acima do governo ou da lei.

Agora, no entanto, vem a parte dura: desenhar novas formas de vigiar e novas regras sobre a propriedade da mídia que funcionem, deixando o Reino Unido com uma imprensa livre, menos horrível, mas ainda assim lucrativa. Para este debate vital, este livro enérgico, que dá vazão à indignação moral, tem pouco a acrescentar.

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