Dilma e o novo omelete
Entre a rua e o Plebiscito, um marqueteiro
publicada terça-feira, 02/07/2013 às 14:08 e atualizada terça-feira, 02/07/2013 às 16:30
por Rodrigo Vianna, no Escrevinhador
As informações que chegam de Brasília dão conta de que “lideranças” do PT teriam consultado o marqueteiro João Santana para compreender o que explica a queda de Dilma nas pesquisas, e o que pode acontecer até 2014. Os profissionais – assustados há duas semanas, parecem já se refestelar nas poltronas dos gabinetes refrigerados. Na campanha eleitoral, ocorreu o mesmo: certa “cúpula” petista estava divorciada das ruas e das redes, preferia ouvir o marqueteiro. E só.
Nessa toada, Dilma quase perdeu. Quando o segundo turno começou, Serra chegou a encostar, ficou a apenas 4 pontos de Dilma. O que mudou? A candidata esqueceu os conselhos do marqueteiro e dos assessores mais próximos, e decidiu fazer Politica.Partiu pra cima do Serra no debate da Band, reanimando militância e oferecendo um discurso que demarcava posições. Lançou Paulo Preto em pauta, cravou em Serra a responsabilidade pela boataria do “aborto”. Pouca gente viu o debate, mas a repercusão foi imensa. Ali, Dilma “virou” a pauta e consolidou a vitória.
Passada a eleição de 2010, o marqueteiro (e boa parte do PT) seguia a acreditar que a eleição foi ganha graças à campanha “profissional”. E, agora, o “profissionalismo” parece ter ganho de novo a parada.
Pressionada pelas ruas (e por uma campanha midiática que transformou o protesto legítimo em “campanha cívica” contra “tudo que está aí”), Dilma propôs a Constiuinte. A elite, a Globo com seus mervais e uma parte do STF com seus gilmares decidiram bater o pé. Ali, era hora de confrontar. Há muitos juristas que defendiam, sim, a possibilidade de fazer a Consituinte. Dilma voltou atrás. Ouviu os “profissionais”. E tomou a decisão “técnica”.
A foto acima mostra os “profissionais” em ação. Eles é que interpretam a “voz das ruas”? Que medo… O Plebiscisto precisa ser convocado pelo Congresso. Ok. Mas Plebiscito sem mudar a rota de governo, sem mudar ministério, sem compreender que o país passou por uma espécie de rebelião no mês de junho (e, ainda que essa rebelião tenha sido dominada e pautada pela classe média, parece evidente que ela teve efeitos concretos sobre a visão que a maioria dos brasileiros passou a ter em relação ao governo federal – as pesquisas de opinião atestam bem isso!), esse caminho escolhido por Dilma é o caminho para novo avanço conservador.
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Acabo de ler, no Tijolaço, análise muito parecida. Fernando Brito escreve: Sem Dilma e sem povo, Reforma Política é para nada ou para nunca.
Já escrevi aqui que – na atual conjuntura e com a pauta dominada pelos conservadorismo do “contra tudo que está aí” (sim, essa pauta é conservadora) – o Plebiscito vai acabar com:
— ”rejeição do financiamento público de campanha”, e aprovação do voto distrital puro.
A pauta que domina as redes e ruas (e que Dilma se recusa a enfrentar) é a de que “não precisamos de partido” e de que “toda corrupção é culpa dos políticos”. Alguém acredita que será possível, por esse caminho, aprovar financiamento público?
O discurso da velha mídia em breve estará em campo, a influenciar redes e ruas:
— ”financiamento público é dar dinheiro dos impostos para os políticos” (sem levar em conta que o financiamento privado gera uma estrutura corrupta, em que empresas e empresários – de lixo, transportes, da área financeira ou da construção civil – são os verdadeiros donos de mandatos no Executivo, Legislativo e até no Judiciário);
— voto em lista é favorecer os “politicos” (o melhor é o voto distrital, com o “político” bem pertinho de você).
Despolitizado, rendido à lógica da marquetagem e de que “batalha da Comunicação é bobagem – basta o controle remoto”, o governo (e parte do PT) pode se transformar num omelete tão insosso como aquele que Dilma preparou com Ana Maria Braga quando ganhou a eleição.
Dilma fez a leitura correta dos fatos gerados pela Rebelião de Junho. Mas parou aí. Diagnóstico correto, ação tortuosa e confusa. Dilma propôs a Constituinte, depois aceitou só o Plebiscito, e daqui a pouco nem isso terá (afinal Henriquinho, Renan e o PMDB já avisaram que “talvez seja melhor o Congresso aprovar a Reforma”, sem Plebiscito nenhum). Parece ter-se perdido (de novo?) na lógica do “gerenciamento técnico” e dos “profissionais”.
No caminho sinuoso entre a rebelião das ruas e o Plebicisto, deveria haver Política com “P” maiúsculo. Dilma e certo PT preguiçoso preferiram ouvir o marqueteiro e os “profissionais”. Parece esperteza, e pode ser que na ” bacia das almas” essas manobras pra lá e pra cá ainda garantam vitória em 2014 (até pela falta de uma oposição de verdade). Ao abdicar da Política e do confronto (numa hora em que o confronto é inevitável), Dilma e o PT que a acompanha podem até ganhar no varejo. Mas a derrota política já estará dada. Derrota semelhante à que engoliu (e faz definhar) o PSOE na Espanha e o Partido Social Democrata Alemão.
O que pode mudar isso? A força que vem dos movimentos sociais e sindicais. E Lula. Só isso poderia mudar a pauta das ruas e das redes. Do contrário, é esperar pelo omelete. Os ovos já foram quebrados e a mesa do conservadorismo está posta.
PS do Viomundo: O Rodrigo Vianna ainda trabalha com a ilusão de que o governo Dilma representa mudança, contida apenas pela correlação de forças desfavorável. Eu, Azenha, estou deixando de acreditar nisso. Todo governo pensa, acima de tudo, em sua própria sobrevivência — e a do governo Dilma depende da sobrevivência de uma coalizão essencialmente conservadora, que vai do Sarney aos ruralistas. Creio que existe um fosso entre um Congresso profundamente conservador e uma rua — jovem e metropolitana — faminta por mudanças. Se abraçar a rua, Dilma corre o risco de perder a base que, imagina, pode ser a garantia de sua reeleição. Por isso, em recente debate, eu disse que suspeitava que o PT dilmista — existe isso? — está em busca de uma “fuga para a frente”: fazer de conta que pretende mudar, para deixar tudo como está e garantir a reeleição de Dilma com o “velho” Congresso. Espero estar equivocado. A resistência de Dilma em fazer uma reforma ministerial, abraçar a rua e usar o púlpito presidencial para marcar claramente suas posições significa que o PT corre o sério risco de afundar abraçado com os tucanos e sua modernização conservadora, diante de um candidato “novo”.
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