Juliana Cardoso: “Em plena crise climática, Prefeitura de SP quer derrubar 63 mil árvores”
Tempo de leitura: 4 minPor Juliana Cardoso
“Em plena crise climática, Prefeitura de SP quer derrubar 63 mil árvores”
Por Juliana Cardoso*
Em meio às emergências climáticas, o prefeito da cidade de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), aprovou no ano passado na Câmara Municipal o PL 799/24 que pretende ampliar o Aterro Sanitário de São Mateus e implantar incinerador no novo espaço.
Durante as audiências públicas a informação da Prefeitura é de que seriam suprimidas 10 mil árvores, mas quando o projeto foi aprovado descobriu-se o tamanho da tragédia. São seis vezes mais, ou seja, 63 mil árvores. A área que se pretende devastar abriga nascentes de córregos, inclusive da bacia do Rio Aricanduva.
Infelizmente, tanto em Brasília como em São Paulo há tentativas de flexibilizar a legislação ambiental para favorecer interesses empresariais. O Aterro de São Mateus é uma área que o próprio Plano Diretor Estratégico (PDE) da cidade classifica como de preservação de ecossistemas naturais. Autorizar uma obra desse porte é uma contradição frontal com as diretrizes ambientais da cidade.
Por isso, no fim do ano passado apresentamos representação junto ao Ministério Público (MP) onde apontamos que o processo fere o princípio da precaução e ignora a função ecológica dessa região, que é fundamental para preservar as nascentes e o equilíbrio climático da zona leste.
Além disso, o projeto desrespeita a Constituição Federal, que impõe à União, aos Estados e aos Municípios o dever de proteger e preservar o meio ambiente. Essa iniciativa do prefeito Nunes vai na contramão dos debates que ocorrerão na COP30 e ignora um direito fundamental de todos: o de viver em um meio ambiente limpo, saudável e sustentável.
A Ecourbis, que administra o atual aterro, tem tentado “vender” o projeto como uma simples ampliação técnica, quando, na verdade, é uma nova intervenção em área verde sensível.
As críticas que apresentamos na representação não são ideológicas, mas são baseadas em estudos, mapas e legislações urbanísticas. O que pedimos é transparência, participação popular e a realização de estudos completos e independentes de impacto ambiental e de saúde pública.
Mesmo porque o poder público municipal deveria priorizar o que preconiza a Política Nacional de Resíduos Sólidos que situa o aterro como a última alternativa e não a primeira.
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A cidade de São Paulo tem condições de ampliar a reciclagem, investir em compostagem descentralizada e estimular cooperativas de catadores. Mas, insisti em modelos ultrapassados e poluentes, como a queima de lixo e a expansão de aterros.
Ameaça real – Necessário abrir parênteses. O estudo apresentado pela Ecourbis é extremamente insuficiente. Não considera a totalidade da área afetada, subestima o impacto sobre nascentes e ignora o acúmulo de poluição atmosférica e de solo ao custo da devastação de 63 mil árvores.
Mesmo prevendo compensação, nada substitui uma mata nativa madura, que leva décadas para se regenerar. Não é possível aceitar o desmatamento de uma floresta urbana em plena crise climática global.
Nossa representação solicita do Ministério Público Estudo de Impacto Ambiental completo, com audiências públicas no território e pareceres independentes sobre o risco hídrico e de saúde.
Quanto ao incinerador, é uma ameaça real: a queima de resíduos libera dioxinas e metais pesados, altamente tóxicos, que afetam diretamente a saúde da população da zona leste, já sobrecarregada pela poluição industrial e pelo trânsito pesado.
A vegetação dessa região ajuda a reduzir as ilhas de calor, filtra o ar e abriga uma rica biodiversidade. A supressão dessa mata significa aumento de temperatura local, perda de fauna, redução da umidade e mais enchentes. É uma tragédia ambiental anunciada, com reflexos diretos na qualidade de vida da população.
Essa área, que é uma das últimas grandes reservas verdes da zona leste, atua como um “pulmão” que ajuda a regular a temperatura e a infiltrar água no solo. A sua destruição compromete o equilíbrio ambiental não só de São Mateus, mas da cidade. É uma questão de justiça climática.
A gestão Nunes deveria considerar que há alternativas tecnológicas ou logísticas mais sustentáveis do que a expansão física desse aterro. A gestão moderna de resíduos urbanos passa por logística reversa, economia circular e investimento em tecnologias limpas. São Paulo precisa olhar para o futuro. O que defendemos é uma transição ecológica justa, com geração de trabalho e renda a partir da reciclagem e da compostagem.
Se a Prefeitura e a Cetesb permitirem a alteração de zoneamento nessa região, estarão abrindo as portas para que outras áreas de preservação sejam desmatadas sob o mesmo argumento. É um precedente gravíssimo, que ameaça décadas de luta pela proteção ambiental em São Paulo.
Hoje, o prefeito derruba árvores para enterrar o lixo; amanhã, poderá desapropriar casas para fazer o mesmo, caso não priorize alternativas sustentáveis e responsáveis para o tratamento dos resíduos.
O nosso mandato, em conjunto com a Frente Contra a Ampliação do Aterro, o Desmatamento e o Incinerador de Lixo, realizou em 4 de outubro Audiência Pública Popular em São Mateus. O ato contou com apoio de movimentos sociais e populares, além de parlamentares. Estamos também nas ruas contra essa tragédia ambiental.
*Juliana Cardoso é deputada federal eleita por São Paulo para o mandato 2023/2026 e vice-líder da bancada do PT. Faz parte da Comissão de Saúde e da Comissão de Mulheres, além de ser a primeira vice-presidente da Comissão dos Povos Originários e Amazônia.
Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
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Deputada Federal (PT) eleita para o mandato 2023/2026.




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