Marcelo Zero: Brasil está sendo forçado a cruzar um rubicão geopolítico

Tempo de leitura: 3 min

O Brasil está sendo forçado a cruzar um Rubicão Geopolítico

Por Marcelo Zero*

Desde o início deste século, principalmente desde o primeiro governo Lula, que o Brasil vem diminuindo paulatinamente sua outrora forte dependência, em relação aos EUA.

Não se trata de “antiamericanismo”, ou algo que o valha.

Nosso país simplesmente acompanhou, de forma inteligente, as profundas mudanças geoeconômicas e geopolíticas que ocorreram, e continuam a ocorrer, neste século.

A ascensão célere e inexorável da China e dos chamados países emergentes criou um cenário econômico, comercial e geopolítico que permitiu ao Brasil projetar melhor seus interesses no exterior.

Ocorreu, nesse período um processo que Tullo VigevaniI e Gabriel Cepaluni denominaram, com precisão, de “autonomia pela diversificação”.

Nosso país, sem abandonar suas parcerias tradicionais com o EUA, a Europa e o Japão, diversificou muito suas parcerias estratégicas com os novos e ascendentes atores mundiais e investiu bastante na integração regional soberana e em uma aproximação ao Oriente Médio, à África e a outras regiões do planeta, nas quais tínhamos presença modesta.

Uma das consequências naturais dessa estratégia de busca de maior autonomia foi a diminuição paulatina do peso dos EUA em nosso comércio e em nossa economia.

Em 2001, cerca de 25% das nossas exportações iam para os EUA. Hoje, apesar de alguns retrocessos recentes, nossas exportações para aquele país representam apenas 12% do total. Ou seja, essas exportações caíram a menos da metade do que eram.

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Claro que os EUA continuam a ser um parceiro muito importante para o Brasil, principalmente quando se leva em consideração a exportação de manufaturas. Nesse campo, os EUA continuam a ser o principal destino das exportações de nossas indústrias. Cerca de 9.500 empresas do Brasil exportam para lá.

Mas o fato é que o Brasil hoje tem parcerias diversificadas, que ajudam a amortecer o impacto da fúria protecionista de Trump.

No primeiro semestre deste ano, nossas exportações para a Ásia somaram cerca de US$ 70 bilhões (mais de US$ 48 bilhões apenas para China), para Europa ao redor de US$ 30 bilhões, para a América do Norte US$ 26, 6 bilhões (US$ 20 bilhões para os EUA), para a América do Sul US$ 20 bilhões, para a América Central e Caribe US$ 2,6 bilhões, Oriente Médio US$ 7,1 bilhões, África US$ 6,7 bilhões e Oceania US$ 616 milhões.

Nosso grande polo de exportação e parceria se deslocou para a Ásia e exportamos o mesmo volume para América do Sul e os EUA.

Entretanto, ante as inaceitáveis agressões de Trump contra o Brasil, essa estratégia de “autonomia pela diversificação” terá de ser consideravelmente intensificada.

Esperamos que a “autonomia pela integração” não tenha de ser substituída pela “autonomia pela ruptura”, mas parece inevitável, no quadro do Império hobbesiano que Trump está criando, que as relações bilaterais Brasil/EUA, que foram estabelecidas há mais de 200 anos, venham a passar por uma revisão e que o nosso país seja obrigado a se afastar mais dos EUA e se aproximar mais do BRICS e do chamado Sul Global.

De novo, não se trata de “antiamericanismo”. Nem o Brasil nem o BRICS são “antiamericanos”. Isso não faz sentido para os interesses do nosso país e desse bloco.

Julián Marias, filósofo conservador espanhol, discípulo de Ortega y Gasset, certa vez foi indagado se ele era “anticomunista”. Julián Marias respondeu que não se considerava “anticomunista”, pois ser “anti” alguma coisa significa ser dependente dessa coisa.

O Brasil é simplesmente pró-Brasil e dedica-se, junto com o BRICS, a construir uma ordem mundial mais simétrica, mais multipolar, próspera e democrática, assentada em um renovado multilateralismo.

O problema está em que Trump é “anti-BRICS”, “anti-China”, “anti-Brasil” etc.

Trump vê o mundo como um jogo de soma zero, no qual, para os EUA ganharem alguma coisa, o resto do mundo precisa, em contrapartida, perder algo. Essa é “lógica” de um “empresário” que veio do submundo mafioso da construção civil de Nova Iorque. Não é lógica que deveria inspirar um presidente ou um estadista.

Trump simplesmente não entende o mundo. Não entende as forças tectônicas que estão mudando irreversivelmente o cenário global, tornando-o crescentemente multipolar e diversificado.

Acha que as suas tarifas vão parar a rotação da Terra. Não vão.

Ao contrário, seus movimentos torpes, agressivos e isolacionistas vão acelerar as mudanças geoeconômicas e geopolíticas que vêm se consolidando há tempos.

Se os EUA continuarem nesse diapasão, dissonante e celerado, o Brasil talvez venha a ser forçado, para defender sua soberania, algo inegociável, a cruzar um Rubicão geopolítico.

A se tornar um opositor, não propriamente dos EUA, mas da criação de um Império hobbesiano, baseado na força e incompatível com os interesses do Brasil e de toda a humanidade.

O Brasil, é claro, vai continuar a apostar no diálogo e nas negociações. Mas paciência tem limites e lidar com gente que se comporta como uma dissidência do Homo sapiens as vezes torna-se impossível.

Trump, como a pandemia, deverá passar.

Restará ver, no entanto, como ficarão as inevitáveis cicatrizes de sua passagem, à la “Gengis Khan”, nas relações bilaterais Brasil/EUA e no cenário global.

Nada será como antes.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais

*Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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Zé Maria

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“A Verdade Veio à Tona:
o Clã Bolsonaro Odeia o Brasil
e Ameaça a Nossa Soberania”

Por Jandira Feghali (*), na Revista Carta Capital

Um grave ataque à soberania brasileira foi disparado por Donald Trump na semana passada. A carta publicada na rede do próprio presidente dos EUA (um bestiário de fake news ironicamente chamado de “Truth Social”) era imperativa e imperialista. Exigia que o governo Lula e o Supremo Tribunal Federal desistam dos processos contra o golpista e réu Jair Bolsonaro (PL) para evitar a taxação de 50% sobre “todo e qualquer produto brasileiro” a partir de 1º de agosto.

Longe de qualquer diplomacia, o nome disso é chantagem.
Chantagem explícita e truculenta, construída com mentiras, inédita na História das relações entre Brasil e EUA.
Mas, infelizmente, a cara do governo Trump.
O “agente laranja”, na definição do cineasta Spike Lee, age mesmo como um gângster.

Mas a agressão ao Brasil não foi motivada apenas por solidariedade entre golpistas.
Foi também um ataque direto aos Brics, que acabaram de realizar uma cúpula no Rio de Janeiro muito produtiva, com importantes resoluções em temas como o multilateralismo, o fortalecimento econômico e solidário entre os países e até mesmo a criação de uma moeda comum como alternativa à onipresença do dólar.

Este cenário de maior independência dos países do Sul Global frente ao domínio americano [dos EUA], e a defesa dos seus iguais em ideologia, criaram o caldo para o ataque ao Brasil, uma tentativa de se afirmar como “xerife” do mundo, a ponto de meter o dedo no sistema Judiciário de um país livre e soberano.

Mas, para o filho “zero-três” de Jair Bolsonaro, foi a realização de um “sonho”.
Em fevereiro, Eduardo Bolsonaro se licenciou do mandato de deputado federal e se mudou para os EUA, financiado pelo pai, para influenciar parlamentares e assessores de Trump a impor sanções ao Brasil caso o País não conceda “anistia” aos responsáveis pelo 8 de Janeiro.
Mirava especialmente o ministro do STF Alexandre de Moraes.
Seus apelos vieram a calhar para o presidente dos EUA justamente agora, como modo de exigir submissão total do Brasil aos seus interesses.
Mas o tom ameaçador e as exigências absurdas da carta parecem ter surpreendido até a própria extrema-direita brasileira, que agora está exposta, em toda a sua hipocrisia patriótica e subserviência ao truculento Trump.

O governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas (entusiasta do trumpismo e favorito da Faria Lima ao posto de “Bolsonaro moderado”), até apagou de suas redes a foto com o boné do movimento neofascista MAGA (acrônimo de “Make America Great Again”) e não está conseguindo explicar aos empresários do estado, que governa, como uma tarifa de 50% sobre seus produtos pode ser positiva.

Já o clã Bolsonaro, que vivia se dizendo “patriota”, tem dado seguidas declarações em tom de ameaça ao Brasil, vinculando a manutenção de milhares de empregos à anistia a Jair exigida por Trump.
Pouco importa que o procurador-geral da República, Paulo Gonet, tenha pedido a condenação do ex-presidente em suas alegações finais por cinco crimes: golpe de Estado, líder de organização criminosa, dano qualificado, grave ameaça e tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito.

Os Bolsonaro sequestraram e prejudicaram a economia produtiva brasileira em nome da liberdade de um homem que tentou golpear a nossa democracia de inúmeras formas.

As gestões sabotadoras de Eduardo (e do neto-de-ditador Paulo Figueiredo) surtiram efeito agora porque a possível condenação dos golpistas se aproxima e os EUA temem o Brics.
Pior: acham que podem cantar de galo em nosso quintal.

Na última terça-feira 15, Trump abriu investigação
comercial contra o Brasil.
Com o apoio do clã Bolsonaro, quer destruir o Pix e meter a mão nos dados privados dos brasileiros, entre outros absurdos que mais uma vez ferem nossa soberania.
Tudo como retaliação contra a cúpula dos Brics.

Bolsonaro é apenas a desculpa esfarrapada que Trump usa para nos atacar.
Mas o clã golpista aplaude, indiferente aos impactos econômicos que pode causar ao País.
Prejudicar a população brasileira não é um problema para os falsos patriotas bolsonaristas, desde que seu “mito” escape da prisão.

Mas não adianta tentar frear a História!
O Sul Global avança e Jair Bolsonaro já foi condenado pela PGR.
Sua prisão é questão de tempo e Justiça.

Dos destroços do neoliberalismo tentamos superar desigualdades e fazer emergir uma relação mais justa e responsável entre as nações.

Figuras como Trump e Bolsonaro representam o atraso, a violência, o desrespeito à vida humana e à autodeterminação dos povos.
A tentativa de interferir na economia e na política não será tolerada.
Pedidos de cassação [do mandato parlamentar] do traidor da pátria Eduardo Bolsonaro já estão em curso.

A chantagem forjada por Trump com apoio da extrema-direita brasileira tampouco impedirá que o Brasil faça suas próprias escolhas geopolíticas.
E muito menos interromperá o curso da Justiça brasileira, que caminha para condenar Jair Bolsonaro e todos os artífices do golpe.

Todo o apoio à independência do STF.

Por direitos e empregos.

Pela soberania nacional.

Sem anistia.

(*) JANDIRA FEGHALI é Deputada Federal (PCdoB-RJ).
Vice-Presidente Nacional do PCdoB.
Vice-Líder do Governo Lula na Câmara dos Deputados.

https://www.cartacapital.com.br/opiniao/frente-ampla/a-verdade-veio-a-tona-o-cla-bolsonaro-odeia-o-brasil-e-ameaca-a-nossa-soberania/

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Zé Maria

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Há tempos os Estados Unidos da América
não é mais a ‘Economia Mais Confiável do
Mundo’.
Hoje, isto é apenas uma Mistificação, um Mito.
Aliás, o Déficit Fiscal dos EUA é insustentável,
e, em breve, a Inflação deles vai estourar.

Falando nisso, quando o Brasil vai sacar as
Reservas Cambiais que estão desvalorizando
(‘Aplicadas’ a Juro Negativo) lá nos EUA?
Estão correndo o Risco de serem Roubadas.
Poderia Convertê-las de Dólar em Ouro ou
qualquer Ativo mais Rentável que os Títulos
do Tesouro Norte-Americano fora dos EUA.

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Zé Maria

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“Eduardo Bolsonaro pode estar por trás de
manipulação bilionária do dólar horas antes
do anúncio de Tarifaço de Donald Trump”

AGU vê possível conexão entre a operação suspeita
no câmbio com informação privilegiada e a articulação
internacional liderada pelo deputado para coagir o STF
e desestabilizar o Brasil

[ Reportagem: Ivan Longo | Revista Fórum ]

A ofensiva internacional liderada por Eduardo Bolsonaro (PL-SP)
contra o Supremo Tribunal Federal (STF) pode estar
por trás de um possível megacrime financeiro.

Segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), há indícios
de que a articulação golpista promovida pelo deputado
licenciado nos Estados Unidos junto ao [des] Governo
de Donald Trump possa estar relacionada a uma
operação bilionária no mercado cambial brasileiro
às vésperas do anúncio de tarifas contra o Brasil.

Em petição apresentada no sábado (19) ao Supremo,
a AGU pede que seja investigada uma possível
utilização de informação privilegiada (insider trading) para lucrar com a alta do dólar registrada pouco antes
do anúncio tarifaço de Trump.

O pedido foi anexado ao inquérito [STF INQ 4995]*
que já apura a atuação de Eduardo Bolsonaro em
articulações para pressionar e coagir autoridades
brasileiras, especialmente ministros do STF.

A suspeita veio à tona a partir de denúncia feita por Spencer Hakimian, da gestora norte-americana Tulu Capital, que identificou transações entre US$ 3 bilhões e US$ 4 bilhões em dólares realizadas cerca de duas horas antes do anúncio das tarifas. Os dados, obtidos por meio do Terminal Bloomberg, indicam que os dólares foram adquiridos por volta das 13h32 (horário da Costa Leste dos EUA) e revendidos com lucro após a coletiva de Trump às 16h19, quando o real despencou.

Com alavancagem – recurso comum nesse tipo de
operação [de Derivativos]–, os ganhos estimados
podem ter alcançado entre 25% e 50% em apenas três horas.

A AGU considera que a sequência de eventos, somada
aos dados já presentes no inquérito, pode indicar uma
ação coordenada não apenas para sabotar a estabilidade
institucional do Brasil, mas também para obter vantagem
financeira direta.

Para a AGU, os elementos revelados [vindos a público]
pela imprensa “se inserem em contexto no qual os fatos
já em apuração estão além dos ilícitos penais já indicados,
relacionados à obstrução da Justiça, mas também com
possíveis ganhos financeiros ilícitos”.

Segundo a petição, há uma ligação entre a tentativa de
desestabilizar a economia brasileira para pressionar o
STF e a realização de movimentações financeiras que
geram lucro com este tipo de crise.

“A AGU enfatiza que o inquérito, instaurado a pedido
da Procuradoria-Geral da República para apurar a
conduta delitiva do Deputado Federal licenciado,
Eduardo Nantes Bolsonaro, decorre do uso de
instrumentos comerciais internacionais como
mecanismo
de coação premeditada contra a Justiça brasileira”,
diz o órgão.

O documento lembra que o próprio STF já havia registrado,
no inquérito, que as tarifas impostas por Trump poderiam ter como objetivo “a criação de uma grave crise econômica no Brasil, para gerar uma pressão política e social no Poder Judiciário e impactar as relações diplomáticas entre o Brasil e os Estados Unidos da América”.

Além de acionar o Supremo, a AGU também mobilizou
a Procuradoria-Geral Federal – que representa a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – para investigar
os responsáveis pelas operações.

O objetivo é apurar se houve violação das regras de
mercado com uso indevido de informação sigilosa,
o que pode gerar responsabilizações criminais, civis
e administrativas.

O caso ainda foi encaminhado à PGR, responsável
por conduzir o inquérito contra Eduardo Bolsonaro.

*[O Ministro Alexandre de Moraes despachou o pedido da AGU determinando que a petição STF nº 98.400/2025
fosse autuada como Pet autônoma e sigilosa [PET 98400],
distribuída por prevenção ao Inq. 4.995/DF, no qual
é Investigado o Deputado Federal Licenciado
Eduardo Nantes Bolsonaro.
Íntegra da Decisão:
(https://portal.stf.jus.br/processos/downloadPeca.asp?id=15378566910&ext=.pdf)]

https://revistaforum.com.br/economia/2025/7/20/como-eduardo-bolsonaro-pode-estar-por-tras-de-manipulao-bilionaria-do-dolar-horas-antes-do-tarifao-de-trump-183701.html

.

Zé Maria

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Não é só o Trump o Problema.
Historicamente, os EUA, o País,
se criaram como um Império
Opressor da América Latina.

Ora o Brasil tem a Chance de se
livrar dos Verdugos Históricos.
E a Libertação se dará com Ação,
não com Chantagem ou Ameaça.

.

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