Flávio Aguiar: Insistindo na ”paz”, Brasil busca restaurar credibilidade e prestígio

Tempo de leitura: 3 min
A convite do primeiro-ministro do Japão, o presidente Lula participa oficialmente da reunião do G7 em Hiroshima, de 19 a 21 de maio. Segundo o jornalista Flávio Águiar, depois da longa hibernação, todos querem conversar com o atual governo brasileiro, que já dialoga com Xi Jinping (China), Joe Biden (EUA), Olaf Scholz (Alemanha), Rishi Sunak (Inglaterra) e Emmanuel Macron (França) e outros mais. Fotos: Ricardo Stuckert/PR

Insistindo na “paz”

O Brasil busca restaurar a credibilidade e o prestígio de que sua diplomacia quase sempre desfrutou desde a segunda metade do século XIX

Por Flávio Aguiar*, em A Terra é Redonda

Imaginemos uma equação matemática assim disposta: Ucrânia + EUA, OTAN e aliados contra Rússia/ China e Brasil. O resultado seria ainda uma incógnita.

O fato é que ninguém sabe como esta guerra vai terminar, nem quando.

O secretário-geral da ONU António Guterres sentenciou: a paz está longe, porque ambos os lados do conflito ainda “estão convencidos de que vão vencer”.

Diante desta expectativa, a insistência com que o governo brasileiro insiste em falar em paz pode parecer uma retórica vazia, embora acompanhado pela China. Mas não é bem assim. Em matéria de geopolítica e diplomacia as coisas são mais complexas.

A posição brasileira de não enviar armas para Kiev pode suscitar críticas por parte dos Estados Unidos e seus aliados europeus. Mas estas críticas, curiosamente, são mais veementes entre os governados do que entre os governantes.

O fato é que por onde passem o presidente Lula e seu assessor especial Celso Amorim são recebidos de braços abertos, com ou sem críticas, de Washington a Moscou, de Buenos Aires a Pequim.

Exemplos recentes, além da visita de Celso Amorim a Moscou e Kiev: o presidente Lula foi oficialmente convidado pelo primeiro-ministro japonês para a próxima reunião do G7 em Hiroshima, de 19 a 21 de maio; o primeiro-ministro holandês disse que quer explicar ao presidente Lula a posição dos países europeus que apoiam Kiev, mas, ao mesmo tempo, declarou que quer conversar com ele sobre “muitos outros assuntos”.

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Pragmatismo político

Depois da longa hibernação provocada pela política externa confusa e obtusa do governo anterior, agora todos querem conversar com o atual governo brasileiro.

Para colocar a questão em termos muito pragmáticos, muito ao gosto das finanças internacionais: um mercado de quase 220 milhões de habitantes não pode ficar na berlinda.

Alguns comentaristas na mídia costumam cair na armadilha de considerar a posição brasileira sobre a guerra isoladamente, sem levar em conta o conjunto da sua política externa.

O termo que a melhor define apareceu em artigo recente da revista norte-americana Foreign Affairs: “restauração” (edição de 23/03/2023, assinatura de Husseis Kalut, da Universidade de Harvard, e de Feliciano Guimarães, da Universidade de São Paulo).

O governo brasileiro busca restaurar a posição de liderança que já teve em relação aos países do chamado “Sul” do mundo, e por isso mantém uma política de equidistância em relação às atuais potências geopolíticas e seus aliados mais próximos.

Busca restaurar a credibilidade e o prestígio de que sua diplomacia quase sempre desfrutou desde a segunda metade do século XIX, onde os alinhamentos automáticos foram a exceção, nunca a regra. O Brasil não é um país mundialmente relevante do ponto de vista militar.

A política externa brasileira sempre se pautou pelo chamado “soft power” e pelo multilateralismo, e no século XXI pela liderança na questão ambiental, que foi rompida pelo governo anterior. O governo brasileiro quer demonstrar que pode dialogar com todo mundo o tempo todo.

Na Europa, o governo brasileiro dialoga com Emmanuel Macron em Paris e com Charles III e Rishi Sunak em Londres; com Olaf Scholz em Berlim, com Pedro Sánchez em Madri, António Costa em Lisboa, e com Joe Biden, Vladimir Putin, Volodymyr Zelensky, Xi Jinping e outros mais.

Quanto à insistência na palavra “paz”, bem, pode-se esperar de tudo no atual estado da arte da geopolítica, menos resultados imediatos.

Decididamente o mundo – inclusive a Europa – passa por um momento de rearmamento geral, intensificado pela guerra na Ucrânia.

Em tal circunstância, é melhor acreditar no ditado tão brasileiro: “água mole em pedra dura tanto bate até que fura”.

*Flávio Aguiar, jornalista e escritor, é professor aposentado de literatura brasileira na USP. Autor, entre outros livros, de Crônicas do mundo ao revés (Boitempo).

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Comentários

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Sandra Rezende

Armaram pro Lula, mas Lula não é bobo.

“Zelensky se atrasou. Ele ouviu o meu discurso e eu ouvi o dele. Minha posição não mudou. É a paz.”
Presidente Luís Inácio Lula da Silva

https://www.brasil247.com/poder/zelensky-se-atrasou-ele-ouviu-meu-discurso-e-eu-ouvi-o-dele-minha-posicao-nao-mudou-e-a-paz-diz-ele?amp

Maria Carvalho

A guerra Ucrânia/Rússia vai até a eleição de Biden. Auferir resultados… como todas as guerras.

Zé Maria

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