Daniel Valença: Como na ditadura, movimentos pró-impeachment querem cadeia e tortura para quem é de esquerda

Tempo de leitura: 3 min

pixuleco em mosssoró-001

Sobre realidades, choques e comunistas

por Daniel Valença, especial para o Viomundo

Em outubro de 2015 o país acompanhou a barbárie em que se transformou um ato anti-Lula em Natal.

Ali, um militante da UJS bradava bravamente “Olê-Olê-Olê-Olá, Lula, Lula”, enquanto era espancado covardemente, sob cumplicidade policial.

Ao tentar fazer cessarem as agressões, fui cercado por mais de dez pessoas encolerizadas aos berros de “petista”, “comunista”, “bandido”. E eis que, perante câmeras, um senhor de 65 anos, militante do Movimento Brasil Livre, pelas costas, me aplicou um choque com um taser[1], que eu relatei em artigo publicado aqui mesmo no Viomundo.

Ali, as pessoas me desconheciam. Sabiam apenas da minha “natureza” de comunista. Algo que seria inato à minha pessoa e que, como um câncer, precisava ser extirpado.

Em outra realidade, há poucas décadas, também havia comunistas.

No Brasil, eles lutavam por reforma agrária, saúde, educação. Existiam também os que os viam como doença. Dentre suas vítimas, esteve o religioso Frei Titto, após muitas sessões de torturas e choques, enlouqueceu.

No Chile, país em que trinta mil pessoas foram assassinadas – muitas delas comunistas – para além de choques em testículos e vaginas, os anti-comunistas foram além: Victor Jara, um dos maiores cantores da história chilena, teve as mãos e a língua decepadas antes de morrer. Seus algozes diziam que o fizeram para que “nunca mais cantasse músicas comunistas”.

Apoie o VIOMUNDO

Neste domingo, em uma atual realidade nacional de riscos à quebra da ordem institucional e perseguição aberta ao ex-presidente Lula, os mesmos líderes anti-petistas armaram seu Pixuleco. Mesmo sem juntar 13 pessoas, confiantes, divulgaram o ato em seu perfil de facebook “Vermelho Nunca Mais”, com os dizeres: “Comunista só merece desprezo e cadeia”, “um choque de realidade”, “Para Daniel Valença, com carinho”.

Tais “movimentos”, ao atribuir uma “natureza” aos comunistas, terminam por revelar, todavia, a sua natureza. Apesar de referentes a realidades distintas e apartadas por quatro décadas, os movimentos que hoje reivindicam choques e cadeias revelam face semelhante aos que, no passado, torturaram mediante choques, estupros por cães treinados para isso e outros expedientes.

A natureza desses “movimentos” que lideram as ações anti-Lula é a negação da política. É o ódio. É a eliminação, a violência. É o ódio contra o pobre que saiu da senzala. À mulher que se emancipa. Aos homossexuais. É o ódio contra a diversidade. Eles não têm propostas, eles não têm projetos.

Setores de centro e até de direita, porém democráticos, ainda não se aperceberam dos riscos inerentes a esse processo. Não podem se esquecer que em 1964 Lacerda foi um dos líderes políticos de um golpe militar. E o futuro, como hoje sabemos, a ele não pertenceu.

De nossa parte, somos petistas, somos comunistas. Nos orgulhamos toda vez que nos atribuem essa “natureza”. Para nós, ela reflete a capacidade humana de fazer política e, mediante ela, aprender a se solidarizar com as demais pessoas.

Nós, petistas, comunistas, continuaremos de cabeça erguida ao lado de trabalhadoras e trabalhadores que construíram a riqueza extraordinária que é esse país e em defesa de uma sociedade realmente humana, sem choques, torturas e golpes. Por uma sociedade sem classes sociais.

Aos que aderiram à barbárie, continuaremos torcendo para que recuperem sua natureza humana, sua capacidade de viver em coletividade e na diversidade.

Daniel Araújo Valença é comunista. Petista filiado desde 2003. Também é professor do curso de Direito da UFERSA, membro fundador do Grupo de Estudos em Direito Crítico, Marxismo e América Latina – Gedic e doutorando em direitos humanos pela UFPB.

Apoie o VIOMUNDO


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Nenhum comentário ainda, seja o primeiro!

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *


Leia também

Política

Roberto Amaral: No fundo do poço, outro poço

Violência contra Glauber e a anistia disfarçada de ‘dosimetria’