Lincoln Secco: O PT e a disputa pela nova classe trabalhadora

Tempo de leitura: 3 min

dilma1

02/11/2014 03h14

A hegemonia incompleta

por LINCOLN SECCO, na Folha, sugerido por Antônio David

Ao completar 12 anos no governo, o PT se torna a mais importante força política da história do Brasil. Nenhuma outra terá permanecido tanto tempo no poder pela via eleitoral.

E o seu quarto mandato presidencial consolidará ainda mais essa imagem. O partido forjou uma cultura política enraizada num amplo setor da população brasileira, mas sem obter uma verdadeira hegemonia.

Ao contrário, foram seus adversários que pautaram boa parte do debate político ao longo de três mandatos. A experiência dos governos Lula e Dilma forjou o seu contrário com a mesma força que consolidou o PT no poder.

É que, por mais que dois partidos (PT e PSDB) protagonizassem as eleições desde 1994, as disputas antes e depois disso foram a favor ou contra o petismo.

A força identitária do PT foi tal que o sentimento oposicionista no Brasil não foi organizado por nenhuma prática de militância num partido, e sim por um antipetismo com significativa capilaridade social.

Evidentemente, o partido não é mais o mesmo das greves do ABC paulista, da luta dos sem-terra e do discurso radical.

Como partido de governo, a partir de 2003, o petismo se consolidou junto a estratos sociais que pareciam inconquistáveis, mas também moderou o seu discurso e fez alianças antes inimagináveis.

Embora seus dirigentes tenham atribuído seus defeitos ao sistema político, o antipetismo ganhou, depois dos escândalos de 2005, um fundamento ideológico novo: ele conseguiu redefinir o PT como “o partido mais corrupto da história”.

A reeleição de Lula foi, então, mais radicalizada do que sua primeira vitória. Como agora, a polarização social obrigou o PT a fazer uma inflexão à esquerda no discurso eleitoral.

Depois disso, esperava-se que ele rompesse o pacto social rentista que o sustentava e, finalmente, desengavetasse suas propostas de controle social da mídia e de punição dos crimes da ditadura, por exemplo.

Não foi isso o que ele fez, embora alguns vissem no segundo mandato de Lula e no próprio governo Dilma uma inclinação “neodesenvolvimentista”.

Desde junho de 2013, todavia, o antipetismo se tornou uma força social militante, embora este não fosse o sentido original das manifestações.

A implementação das políticas sociais aproximou espacialmente a classe média tradicional dos mais pobres, e isso conferiu a base material que faltava a uma ideologia.

O desconforto saltou da leitura dos jornais para o indivíduo ao lado no banco apertado do avião.

Parece inevitável que o PT tente agora restabelecer pontes com setores que lhe são hostis.

Mas isso dependerá do quanto o seu atual modelo ainda pode garantir a continuidade da inclusão social e, ao mesmo tempo, o atendimento das demandas de junho.

É na melhoria contínua da educação, da saúde e do transporte que já está a base da disputa pela nova classe trabalhadora que, nestas eleições, se dividiu.

Se o PT não fizer isso, vai deixar esse estrato social convencido de que sua ascensão econômica depende muito mais do esforço individual do que de políticas públicas.

Mas, se o partido confrontar o capital financeiro para atender realmente a agenda de junho, pode solapar as bases de seu modelo de governo.

Até aqui o PT evitou isso e ficou no canto do ringue, já que lhe roubaram a bandeira da ética sem que lhe sobrasse a do socialismo.

Agora sai das urnas ungido por uma campanha militante, com pequena vantagem de votos e a promessa de “mais mudanças”.

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