O desconcerto de um estudante de Jornalismo

Tempo de leitura: 2 min

por Leonardo Quintana Bernardi*

Quanto mais me aproximo do final da faculdade menos enxergo romantismo na profissão do jornalista. Nossa profissão é essencialmente ligada ao diferencial social. Quando se escreve para toda uma sociedade o que se tem em vista é a melhoria desta. Não é o que  acontece atualmente. Guiados pelo desmerecimento contínuo com a falta de exigência do diploma, redações cada vez mais cheias, salários baixos e chefes ceifadores dos “crentes” no Jornalismo Cidadão, o jornalista recém-formado na verdade não sabe pra que lado se atirar.

A profissão de jornalista tem tantas abas a serem abertas que elas nos confundem os olhos com essa complexidade de rumos a escolher. Antes de você pisar no teu caminho já tem algo te puxando pra outro lado, é um GPS guiado por uma voz de manicômio, é um desconcerto agonizante. Somos obrigados a sair da faculdade melhores do que os já estão no mercado há tanto tempo. A profissão do jornalista, maximizada na era da informação movida pelo capitalismo, parece ser vítima desta busca constante pelo lucro. Querer ser digno na profissão muitas vezes esbarra em não ter um salário justo.

Se a internet nos propiciou tanto, ela também nos trouxe como concorrente o mundo todo. A inteligência coletiva de Pierre Lévy anda se concretizando a passos largos em alguns casos. Em outras situações o que se vê é o esteriótipo de “desinformação coletiva”. Todos com suas verdades absolutas gritam aos quatro ventos suas fontes, localizadas em seus próprios cérebros. Muitos dizem que a não-exigência do diploma é consequência da modernização do Brasil, eu diria que na verdade foi um tiro no pé, pedir pra que não se qualifique seria absurdo em qualquer profissão, no meio jornalístico não é, é “liberdade de expressão”.

Informar é uma responsabilidade séria, nos bancos da faculdades somos orientados sobre como agir de forma correta, somos apresentados ao Código de Ética dos Jornalistas, nos mostram todo o contexto em que seremos inseridos. Passando os quatro anos somos jogados ao mundo, órfãos de diploma, perdidos em local íntimo. O excesso de jornalistas no mercado nos faz procurar locais como Assessorias de Imprensa, trabalho em propagandas políticas; no final do mês, afinal, quem vai pagar as contas? Minha ética ou o meu dinheiro?

Se o jornalismo é a busca incessante pela informação correta, pelo bem comum da sociedade e pela ética, teremos então que colocar um novo nome para o que é  praticado em grande parte da grande rede e da grande mídia. Nossa profissão  é ingrata. Não temos uma preocupação com  nossos companheiros de lida; em meio a tantas ideologias políticas e chefes que se engalfinham, ficamos reféns, esperando uma solução que não chega. Os jornalistas “novos” são obrigados a se esconder nas empresas, bater cartão e tomar café em suas mesas, estáticos. Se a rua é o ambiente de trabalho do jornalista, o que estamos fazendo atrás desse computador?

*Estudante de Jornalismo, 22 anos


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Comentários

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Gisely

Faço coro com você.

Escolhi jornalismo, pois gosto de ler e escrever, como uma forma de exercer minha intelectualidade de modo ativo. Uma forma de colaborar a formar um mundo melhor e ainda me sustentar com isso. Mas o que vejo é exatamente o oposto. E os professores são os que mais desanimam a gente. Acho que ao menos na Faculdade eu deveria sonhar e me orgulhar da área, mas nem isso. Me sinto triste. Ainda estou no Segundo ano e não sei se vou até o final para não largar na metade e atuo como Assessora de Imprensa ou se desisto agora, encaro este fracasso e mudo de área. Só vejo cobrança, não acho que estou aprendendo nada e mesmo que aprenda, vai servir apenas para ajudar a destruir a vida de alguém e não para ajudar a propagar a verdade.

joenas

O jornalismo do Brasil tem a marca de Assis Chateaubriand.
Difamar para conseguir seus objetivos!

    Gersier

    Vc está enganado,quem usava essa pratica e que ainda continua através dos "hedeiros",foi o roberto marinho.Não satisfeito, roberto marinho foi o mentor dos militares capachos dos interesses norte americanos,que com ajuda desses acabou com a nossa democracia no golpe de 64,lacrou os transmisores da TV Tupi que era a lider de audiência para ajudar a famigerada globo.A emissora que prega e cobra uma ética que ela nunca teve.

Olécia

São jovens JORNALISTAS como voce Leonardo, que podem mudar o que aí está. Viramos moleques de recados em muitas situações. A ética que nos guia é aquela que nos aponta as contas a pagar e a família a sustentar. Lamentávelmente, esta é a dura realidade. Vai em frente garoto, voce é bom demais. Texto limpo, correto e, principalmente, ético com sua classe!

Gerson Carneiro

Não acabem com o sonho do menino. Por favor, não digam a ele que o PIG contrata jornalista profissionais com anotação de "estagiário" na CTPS.

Ruth Alexandre

Olá Leonardo,
Bem-vindo ao jornalismo.
Com este nível de preocupação você com certeza será um excelente profissional. Vejo na carreira as mesmas dificuldades e desafios da maioria das profissões.
É sair por aí registrando, com esta responsabilidade que você enfatiza, e publicando. Vale internet, jornal de bairro, etc. A experiência vai trazer contatos e visibilidade para o seu trabalho, o facilita a empregabilidade. Quanto às redações conheço muitos profissionais que estão na velha mídia e conseguem fazer Jornalismo com J maiúsculo e outros que abandonaram bons salários para continuar exercendo a profissão com ética. Quanto aos picaretas, como é sabido, estão em todas as profissões. Mesmo na era AI (antes da internet) quem era jornalista fazia jornalismo. Hoje está mais fácil. Amo minha profissão e tenho muito orgulho de exercê-la. Boa sorte. http://www.falapovo.com

Renata

Gente, qual é o problema de bater cartão? Porque jornalista tem de ser um ser estranho ao mundo? É um profissão como qualquer outra. Não tem nada de romântico. Poderia ter lá no começo, quando um jovenzinho começava a trabalhar em um jornal e e começava a escrever, descobrir causos e fazia carreira de repórter. Hoje isso não existe. A ética precisa pagar a conta, assim como o salário. Não vejo nada de romântico em trabalhar 12, 15 horas por dia sem receber um centavo a mais por isso. É legal trabalhar de tênis e camiseta, não bater cartão e se dizer alternativo? Uau… prefiro poder pagar minhas viagens para onde quero… não dizer que conheci o mundo por conta da profissão. Quero conhecer o mundo por conta da minha vontade e da minha conta bancária. Ser jornalista e ser um profissional como qualquer outro. Encaremos a realidade…

jotaCE

Caro Leonardo,

Teu artigo é realmente provocante, estimula o debate, ainda que depois de muitos comentários cheios de sabedoria que aqui se vêem, não encontro muito o que te dizer. Contudo, gostaria de referendar o que escreveu SILOÉ, que cita o verso de Geraldo Vandré ao te aconselhar a ir em frente. Mas diz também que a vocação é o diferencial. Ela, de fato, permite a escolha da profissão entre um elenco multivariado de opções não menos cheias de atrativos, além da necessária força para os momentos de desânimo. Contudo, no meu entender, o diferencial vai mais além: inclui ainda o preparo que advém da busca continuada do saber, e também o respeito permanente ao código de ética, aos aspectos deontólogicos da profissão. Só assim o profissional se imporá a colegas e chefes enlevados pela sabujice e se realizará no jornalismo de respeito, cidadão. Abraços,

JotaCe

SILOÉ

Como diz Geraldo Vandré: "Quem sabe faz a hora não espera acontecer".
A vocação é o diferencial, vá em frente em busca do seu espaço.

FrancoAtirador

.
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Entendo oportuno que se apresentasse um projeto, no Congresso Nacional,

para transformar em Lei Federal o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros.

Bastaria acrescentar as cominações civis e penais, por descumprimento da lei,

inclusive responsabilizando solidariamente a empresa de comunicação,

ao qual o jornalista infrator esteja, eventualmente, subordinado.

Seria um excelente filtro, até para dar oportunidade de trabalho

aos profissionais que efetivamente desejam exercer o "Jornalismo Cidadão",

ao qual o nobre estudante se refere no artigo acima.

.
.
Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros

(…)

Art. 6º É dever do jornalista:

(…)

II – divulgar os fatos e as informações de interesse público;

(…)

VIII – respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão;

(…)

XI – defender os direitos do cidadão, contribuindo para a promoção das garantias individuais e coletivas, em especial as das crianças, dos adolescentes, das mulheres, dos idosos, dos negros e das minorias;

Art. 7º O jornalista não pode:

(…)

IV – expor pessoas ameaçadas, exploradas ou sob risco de vida, sendo vedada a sua identificação, mesmo que parcial, pela voz, traços físicos, indicação de locais de trabalho ou residência, ou quaisquer outros sinais;

V – usar o jornalismo para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime;

(…)

IX – valer-se da condição de jornalista para obter vantagens pessoais.

(…)

Art. 11. O jornalista não pode divulgar informações:

I – visando o interesse pessoal ou buscando vantagem econômica;

II – de caráter mórbido, sensacionalista ou contrário aos valores humanos, especialmente em cobertura de crimes e acidentes;

(…)

Art. 13. A cláusula de consciência é um direito do jornalista, podendo o profissional se recusar a executar quaisquer tarefas em desacordo com os princípios deste Código de Ética ou que agridam as suas convicções.

Parágrafo único. Esta disposição não pode ser usada como argumento, motivo ou desculpa para que o jornalista deixe de ouvir pessoas com opiniões divergentes das suas.
.
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Danilo Silvestre

Vale lembrar que se qualificar não significa ter um diploma do curso de Jornalismo. Existem diversas formas de se comunicar. Vamos dar um exemplo de uma área próxima ao jornalismo? A publicidade, que não tem diploma obrigatório e é considerada uma das melhores do mundo, ou seja, bem qualificada.
Dentro da publicidade existe gente sem nem ter começado uma faculdade, mas com bons cursos técnicos. Existem pessoas formadas em Desenho Industrial, em Publicidade, em Relações Públicas, Jornalismo, Artes Plásticas e por aí vai. Essas pessoas também não são qualificadas?
E mais do que isso, uma pessoa que participe de uma rádio comunitária, por exemplo, e não tem faculdade não pode se dizer jornalista? Essa pessoa vai lá, conversa com as fontes envolvidas (e não só os falsos dois lados que o jornalismo costuma dizer que ouve, mas os diversos lados), apura para verificar e não passar falsa informação (coisa que muito diplomado hoje não faz) e mesmo fazendo o que o bom jornalismo manda, ele não pode ser jornalista porque não teve condições de estudar? É isso mesmo que o Leonardo defende? Então desculpa Leonardo, você está indo contra a liberdade de imprensa e de expressão.
E é por isso, por causa dos comunicadores comunitários, dos comunicadores livres, que eu sou contra o diploma do curso de Jornalismo ser obrigatório, porque isso significaria fechar rádios e jornais comunitários que não tem como pagar um jornalista formado simplesmente para aparecer como responsável pelo veículo e tenho a certeza que esses comunicadores comunitários precisam se comunicar e fazer a própria linha editorial e não ter diploma e ser obrigado a escrever coisas que estejam de acordo com o pensamento das famílias Marinho, Saad, Abravanel, Frias, ou das Igrejas.

    Leonardo Quintana

    Há casos e casos, entendo sim que existem vários casos de jornalistas não-diplomados que se envolveram com a comunidade e praticaram um jornalismo essencialmente cidadão. Só que via-de-regra não é o que acontece. Várias rádios que se dizem comunitárias agem em prol de politicagem e coisas do tipo, fazem uma espécie de propaganda eleitoral. Existem rádios comunitárias genuínas, compreendo absolutamente a função delas na sociedade, só que elas são exceção.
    O que não se pode fazer é nivelar as coisas por baixo, o Jornalismo é um campo extremamente perigoso, a informação é uma arma e manusear ela exige técnica. O que nós vemos nas redações são pessoas tendo funçao de repórter, sem diploma, sem um texto legível (não quero ser preconceituoso de forma alguma), que recebem um salário bem abaixo do piso do jornalista e estão lá justamente por isso. Afinal se não precisa de diploma não precisa de salário.
    De forma alguma ajo contra a liberdade de expressão, assim como essa liberdade propõe que todos possam comunicar suas opiniões ela também diz da responsabilidade em publicar a verdade e em apurar os fatos. Compreendo seus argumentos, concordo que existam sim jornalistas não-diplomados que são melhores que muitos diplomados, só que eles são exceção. Se você estuda pra ser algo durante quatro anos certamente a possibilidade de você exercer essa função de forma qualificada será maior do que quem não estudou. A faculdade da rua pode coexistir com a faculdade de Jornalismo.

    Essa discussão é interminável.

    Olécia

    tem redatores não diplomados que são bons sim Leonardo, assim como tem curandeiros que são melhores que alguns médicos.

    Mana

    Se os diplomas sao desnecessários, entao porque os práticos que se dizem dentistas, médicos, enfermeiros e saem por ai abrindo consultorios e enganando as pessoas, quando descobertos sao presos? Oras, eles tambem nao tinham tiveram condiçoes de estudar e aprenderam "no oficio da vida".
    Entao nao há necessidade de diplomas para determinados cursos…? ou cirurgia cerebral é mais fácil?

    Gersier

    Mama mia,confundir alhos com bugalhos é complicado.

Bruno

Parabéns pro jovem aí, que mostrou como se faz um bom texto crítico à indústria da notícia. E o melhor de tudo: sem falar uma vez sequer non-sensices como PIG, entreguismo, Globo-e-Folha-ajudaram-a-ditadura, etc.

Quem dera todo jornalista fosse ao mesmo tempo tão consciente e tão pouco paranoico.

damastaor dagobé

so duas coisas me fariam romper definitivamente com um de meus filhos: se um deles dissesse que vai ser advogado ou…jornalista. Mas, de certo modo, à Bolsonaro, eles foram bem educados e acho que nao corremos esse risco…

    FrancoAtirador

    .
    .
    Não é à toa que popularmente se diz que,

    se estiverem reunidos um militar, um advogado e um jornalista,

    pode ter certeza que está prestes a ocorrer um Golpe de Estado.
    .
    .

    Marcelo Fraga

    Hahahaha. Boa!
    Essa eu não tinha ouvido ainda.

Cássia

Bom, sou jornalista e sou romântica. Vez ou outra, ou com muita frequência, sou tocada pelo ceticismo mas acredito em fazer meu trabalho focada, sobretudo, na ética. Se a gente deixar acreditar, morre. Se deixarmos perdermos nossa capacidade de indignação, também.

Latini

"Não se trata da profissão, meu jovem… mas dos homens!" Continue cavando.

Caracol

Então… eu não perco a fé nas pessoas, sabe, pode ser que ainda existe gente, e eu sei que existe, pode ser que em menor número, e eu tenho certeza que sim, mas existe, porra! Daí eu acho que você tem mais é que meter a cara e se impor, mesmo porque se não fizer isso, você vai virar geléia por dentro e cogumelo por fora. Faça isso nem que seja só por você, já vale a pena. Não é conselho, é apenas sugestão. Uma coisa eu te garanto, pois aprendi por experiência própria: o que torna as pessoas velhas, amargas e insuportáveis prematuramente (além de cancerosas, hemorróididas e biliosas) sabe o que é? A traição aos ideais da juventude. Abraço e boa sorte, espero poder ler você muito na vida.

ZePovinho

Não se assuste,Leonardo.Na engenharia(que é minha área) e em outras profissões é assim também.Faz parte do sistema.
Ninguém dá conselhos pra ninguém,sabemos,mas segui em frente e até hoje tento inserir meus bugs nesse sistema capitalista que,bem depois,descobri que é capitalista para os fudidos e muito estatista para os ricos.
Estranhamente,acho hoje que os ultraliberais do Instituto Von Mises e os marxistas têm uma coisa(se não tiverem outras) em comum:a percepção de que o poder(seja no capitalismo ou comunismo) usa o Estado como opressor do povão.

    Caracol

    Leonardo, a coisa ta tão preta em matéria de gente que quando eu vejo alguém como você, com esse nível de exigência em matéria de dignidade pessoal e humana… eu tenho que sair do silêncio e dar força.
    Olha, ta brabo mesmo. E realmente… desculpe, mas a profissão que você escolheu está tão podre e tão fedida em matéria de gente que fica difícil eu te animar. No entanto… cara, eu estou com 70 anos, eu vi, conheci e li verdadeiros luminares do jornalismo em tempos de juventude. Pra você ter um idéia, a qualidade humana era de tal ordem que até os reacionários retrógrados impunham respeito e consideração, e nós os respeitávamos mesmo, podes crer. (continua)

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