Uma visão chinesa da mídia ocidental

Tempo de leitura: 4 min

O dilema institucional da mídia ocidental

25/7/2011, Wang Fang, People’s Daily Online, Pequim, China

Traduzido pelo Coletivo da Vila Vudu

O escândalo de telefones grampeados por jornalistas de News of the World, jornal britânico, desencadeou um efeito-dominó: outros jornais ligados à empresa-mãe News Corporation começam a ser acusados também de participação ativa em novos escândalos que não param de ser descobertos. Afinal, começam a ouvir-se vozes até nos EUA, na Austrália e em outros países, que exigem ampla investigação e reavaliação dos princípios éticos do jornalismo e imposição de medidas para supervisionar jornalistas e jornais. O escândalo já ultrapassou os limites da imprensa e causou reações em cadeia nos círculos policiais e políticos; o premiêr britânico David Cameron enfrenta a maior crise política desde que assumiu o governo.

O escândalo dos telefones grampeados não é aberração provocada por uma ou outra empresa jornalística ou um ou outro jornalista que esquece a própria responsabilidade social e abusa, individualmente, da liberdade de imprensa. O escândalo reflete o dilema institucional em que a imprensa ocidental e o sistema democrático representativo enfrentam desde sempre, em seu processo de desenvolvimento.

Na história do jornalismo ocidental, os meios massivos sempre falam muito da “liberdade” e batem tambor a favor do estabelecimento e desenvolvimento do sistema democrático capitalista. A imprensa ocidental sempre se apresenta como “o Quatro Estado”, que seria independente do executivo, do judiciário e do legislativo, e que seria “um príncipe não coroado”, que distribuiria fatos e verdades e protegeria a justiça e a sociedade.

Contudo, quando subiu a maré dos monopólios e da fusão de empresas, as empresas de comunicação de massa sempre foram parte interessada no processo. Nos anos 1980s, 50 grandes empresas controlavam praticamente todo o jornalismo de massa nos EUA. Em meados dos anos 1990s, esse número já estava reduzido e todo o poder já estava concentrado em apenas dez empresas.

Hoje, no século 21. a imprensa está praticamente monopolizada nos EUA, controlada por apenas cinco grupos financeiros, entre os quais Time Warner, Walt Disney e News Corporation. A empresa News Corporation, de Rupert Murdoch, alcança vários continentes e é proprietária de 40% dos jornais do mundo, entre os quais o Times e News of the World. Nos EUA, a mesma empresa controla vários veículos, todos de grande circulação ou audiência, entre os quais o Wall Street Journal, a rede Fox de televisão, Movie.com e dúzias de estações de televisão. Além disso, mais de 70% de todos os jornais com sede na Austrália pertencem à mesma empresa. É absolutamente impossível falar de liberdade de imprensa, senão em sentido absolutamente superficial e oco, ante o processo de fusão de megaempresas que leva, exclusivamente, ao monopólio do direito de expressão.

Artigo recentemente publicado, intitulado “o capital é mais forte que a liberdade: Murdoch venceu”, diz que os jornalistas dos EUA têm de enfrentar a triste realidade de que rezam pela mão do único deus que efetivamente reconhecem; e que não se chama “liberdade de imprensa”; chama-se “capital”.

W. Lance Bennett, professor norte-americano, disse que todos os políticos e grupos políticos, inclusive o presidente, os senadores, grupos de interesse e radicais, conhecem ou deveriam conhecer a importância da imprensa para suas carreiras políticas. Grupos multinacionais de comunicações já controlam completamente não só os veículos, como empresas, mas também já constituíram poderosíssimos grupos de interesses, nos quais se interconectam os negócios, a política, veículos e profissionais que, todos esses, constituem uma elite que existe exclusivamente para proteger os interesses dessa elite.

Agências governamentais e as corporações de comunicações cooperam, mais do que se interfiscalizam. Os políticos acabam por aprender a usar a imprensa e algumas vezes têm, mesmo, de render-se à imprensa – quando não a subornam diretamente – para aumentar o próprio poder ou ganhar status graças ao auxílio da imprensa.

Segundo matérias publicadas na imprensa britânica, Andy Coulson, ex-editor-chefe do jornal News of the World e ex-principal assessor de comunicações do primeiro-ministro britânico David Cameron, foi preso, há algumas semanas, acusado de participar no grampeamento ilegal de telefones. Ligado por laços fortes com todo o mundo dos jornalistas ingleses, Coulson teve papel decisivo na campanha eleitoral que levou Cameron ao poder, como candidato dos Conservadores, nas eleições do ano passado. Peter Oborne, principal editor de política do jornal Daily Telegraph, disse que, nos últimos 20 anos, o fator decisivo para qualquer candidato que desejasse alavancar sua carreira política foi aproximar-se de Murdoch e conquistar sua simpatia.

Para maximizar interesses comerciais, vários jornais e jornalistas sempre usaram meios ilegais – escutas e grampos clandestinos e ilegais, suborno e chantagem – para obter informações exclusivas e a proteção de políticos e policiais. Agências governamentais, às quais deveria caber fiscalizar e coibir esse comportamento de jornais e jornalistas, mantiveram-se cegas, para não se indispor com jornalistas e jornais – o que foi como autorizar e legitimar os crimes ‘da mídia’. O escândalo das escutas clandestinas, agora, afinal, expôs completamente as relações complexas e obscuras que há entre jornais, jornalistas, policiais e outros funcionários corruptos.

O que ainda se chama no ocidente “liberdade de imprensa” acabou por condenar grandes países ocidentais democráticos à degradação de um círculo vicioso no qual “a imprensa modela a opinião pública; a opinião pública pressiona os políticos; e os políticos, em colusão com jornais e jornalistas, trabalham a favor de seus próprios interesses” – sempre privados, jamais públicos.

Nos estágios iniciais das guerras no Iraque e na Líbia, todos os grandes jornais do Reino Unido e dos EUA deram massiva divulgação a vitórias da coalizão, e sempre ignoraram o trágico grande número de civis mortos e a brutalidade da guerra. Indústrias que fabricam armas, empresas de comunicação e agências do governo constituíram comunidades de interesses, usando todos os meios possíveis para manipular, modelar e controlar a opinião de seus cidadãos.

O monopólio é o predador natural da liberdade. Os grupos globais de televisão e jornais, beneficiários, hoje, dos sistemas de comunicação de massa e, agregados a esses, também os sistemas da democracia ocidental, não têm medido esforços para homogeneizar as necessidades de alguns grupos domésticos, oferecendo sempre informação limitada e enviesada; e também se dedicam a reforçar estereótipos negativos contra outros povos e outros países.

Há muito tempo, a voz dos países pobres e emergentes foi suprimida das discussões sociais no ocidente, pela influente indústria da mídia ocidental. A mídia ocidental é responsável pela abissal desigualdade de informação entre países ricos e países pobres – e essa desigualdade construída inevitavelmente fez aumentar as desigualdades políticas e econômicas.

A indústria da mídia modela a opinião pública, mas não escapa da influência do poder político e da economia. No seu último editorial, antes de o jornal ser fechado, News of the World admitiu: “Nós perdemos o rumo”. Mas há outra pergunta no ar, a espera de resposta: “O que mais toda a imprensa ocidental perdeu?”


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Comentários

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Marcelo C.

Pois é, a mídia manda nos governos e direcionam a economia mundial e por ai vai. Quem tem dinheiro paga mídia e fica mais rico e finalmente chegamos à crise mundial!
EUA quebrado, Europa fudida. E bomba nos Árabes e Africanos. Com certeza se houvesse uma mídia séria e independente as guerras já não existiriam, a Palestina estaria livre e o mundo um pouco melhor!

Alexei_Alves

Enquanto isso a OTAN bombardeia a TV estatal da Libia, matando três jornalistas…

"Faça o que eu digo, não faça o que eu faço"

Elizabeth

Mesmo desconfiando sobre monopolio da industria da midia americana …é assustador ler estes dados!!
""Nos anos 1980s, 50 grandes empresas controlavam praticamente todo o jornalismo de massa nos EUA. Em meados dos anos 1990s, esse número já estava reduzido e todo o poder já estava concentrado em apenas dez empresas.""
Que seja bem vindo as opiniões de outras imprensas no mundo!

Elizabeth

É a China dando o seu sorriso de lagarto…hehe Pode acusar China de muitas coisas, mas nunca venderam "falsas liberdades"…Enquanto o mundo ocidental cobra da China por ela manter controle dos meios de informação e ter meios nada democrático de censurar as opiniões… China agora joga na cara e diz: "O monopólio é o predador natural da liberdade
" A indústria da mídia modela a opinião pública,"… mas interesses será sempre privados, jamais públicos".
Quem vai dizer que a China não tem razão? !!!
Interessante, ler opinião da imprensa chinesa, melhor ainda perceber que, vão tratar o assunto da indústria da mídia como política internacional!
.
Liberdade de imprensa não existe!!O que existe é interesses do CAPITAL!

Leonardo

E a imprensa na China, como é?

    Carlos Cruz

    Aqui não é como a imprensa funciona na China mas desmascarar a demagogia do "ocidente civilizado e liberto". Se a China era ridicularizada e cobrada por manter controle dos meios de informação ( o que é errado) o que dizer do relacionamento Estado/ imprensa no "ocidente livre" agora escancarado? Corrupção, mentiras, direcionamento politico, tudo que não presta é usual no "ocidente cristão e livre". Como cobrar de seu rabo é maior do que o do vizinho?

alexandre de melo

a unica força que podemos dispor para balancear esta concentração brutal da midia,
nas mãos das mafias é a internet, mas ai aparece a mãe do mensalao AZEREDO e quer
submeter esta força às mafias nacionais da midia, que morra de cancer bem doloroso este safado.
lutemos pela internet livre; sempre.

    ana

    E ele o AZEDO está querendo submeter à votacao em regime de urgencia seu filho feio indecente e criminoso, o Ai5 , se nao nos mobilizarmos vamos acordar qq dia desses com o AI5 aprovado na calada da noite, o IDEC esta com uma peticao no site p assinarmos e enviar p todo o os amigos e contatos, vamos agir antes que este crime se torne realidade.

lauro oliveira

No Brasil é diferente?

SILOÉ -RJ

O que eu sei e afirmo é que: com relação á midia ele apesar de ter se desfeitos de várias, por endurecimento e controle do governo, ainda assim, continua sendo o único ocidental a ter emissora de TV, SATÉLITES, editoras de livros, produtora de vidios e até de filmes, na China.
Não foi só pela beleza da chinesa, que se casou e teve 2 filhos com ela.

Bonifa

Aliás, ainda sobre a Líbia, cresce na imprensa européia a visão murdochiana de que é preciso relativizar a censura à matança de civis: seria válida a matança, contanto que vizassem também matar o chefe do governo, Muamar Kadafi.

Bonifa

O chefe militar dos pró-ocidentais da Líbia, Abdel Fatah Younès, ex-general do exército líbio que começou a secessão em favor dos colonialistas, foi asssassinado por um comando governamental. Agora, os generais europeus terão eles mesmos que assumir a tarefa de tentar tomar a Líbia para o ocidente colonialista. http://www.lemonde.fr/afrique/article/2011/07/28/

Celio Portunuovo

O que me incomoda é que por exemplo, o Deputado Paulo Pimenta — aqui no blog — é capaz de indignar-se e denunciar a obscenidade do jornalismo que o Estadão impinge aos seus consumidores. Mas não é capaz (acho que não) de processar o Estadão e armar o mó barraco por o Estadão fazer aqui, no campo político, o que os tablóides de Murdoch sempre fizeram em todo o mundo. Aí acontece o quê? Alguém grampeia telefones de uma família cuja filha estava sequestrada — e depois, já assassinada –, e o mundo vem abaixo.

O que significa isso? Acho que significa que nossa consciência possível ainda não é capaz de se indignar contra o atentado à democracia, tanto quanto já sabemos nos indignar contra o atentado à privacidade.

A privacidade é conceito burguês. Nunca vi pobres defendendo a tal 'privacidade'. Antes, os pobres defendem o direito de partilhar, do que o direito de esconder.

Conclusão: enquanto não aprendermos a nos indignar mais com atentados ao direito democrático da maioria, do que com atentados a privacidades burguesas metidas a 'éticas', continuaremos a 'denunciar' o subjornalismo acanalhado do Estadão… e o Estadão continuará a nos acanalhar. (Pessoalmente, já BOICOTO ATIVAMENTE O GRUPO GAFE (globo/abril/folha/estadão: não PAGO pra ler e não leio.)

Rafael

Ou seja roubaram a democracia.

operantelivre

"O monopólio é o predador natural da liberdade. Os grupos globais de televisão e jornais, beneficiários, hoje, dos sistemas de comunicação de massa e, agregados a esses, também os sistemas da democracia

Carlos Nunes

Analise interessante e válida.
Mas analisar os outros é sempre mais fácil.
E na China como é a imprensa?
Tanto um grande estado forte como o Chines como oligopólios empresariais são centros de poder. E Objetivo primário de quem está no poder é se manter lá.

    Bonifa

    Quem vive na Caverna ocidental, não tem elementos para julgar quem vive lá fora, à luz do dia. É preciso estudar e viajar, porque já não podemos nos balisar pelos boletins da Caverna.

Marat

Essa coisa de repetir discursos de estadunidenses falando muito mal da China está ficando ultrapassada. Essa matéria mostra isso, e mostra como os chineses são lúcidos em desnudar essa podre impren$$$a ocidental, que a cada dia se distancia mais da ética e da realidade, por conta de seu apego ao dinheiro.

monge scéptico

A imprensa pode modelar aos já alienados por ela. Libertei-me, não dando atenção
ao PIG, a não ser de raro em raro, para tentar analisar alguma maracutaia, emitida
pelos bizarros("cheirosos") etc.
O povo ocidental não tem liberdade de pensamento. Até parece; mas trata-se de um
tapume, atrás do qual se esconde a censura velada. Somos atrasados e pronto.

Mariano

Realmente, em matéria de imprensa a China tem muito a ensinar ao mundo. Aposto que o pessoal aqui adoraria ter uma igual à de lá.

Uma visão chinesa da mídia ocidental | A Tensão Flutuante

[…] Do Viomundo […]

Valdeci Elias

Na decada de 80, uma multinacional japonesa, comprou uma companhia aeria, e grampeou a primeira classe dos seus aviões. Para poder escutar as conversas dos executivos de outras empresas.
Hoje em dia empresas como o Google, Microsoft ,etc, tentam nos convencer a colocar nossas imformações nas nuvens. Ao invez de guarda-las num computador, devemos coloca-las na internet. Ocasionando uma economia de equipamentos, más facilitando a espionagem industrial.

Jorge Nunes

Geralmente eu sempre digo que a imprensa brasileira é pior que a da China.

    Klaus

    Já eu, as vezes, de vez em quando, digo que a imprensa da China não é exemplo pra nada.

    Bonifa

    Você não conhece, portanto não pode dizer, Klaus.

    Jorge Nunes

    A imprensa brasileira é contrlada por meia dúzia de grupos familiares, é um controle de informação mais centralizado que da China. E nós somos um estado democrático.

    joao

    No RS em parceria com a Governadora do PSDB, a RBS fazia escuta de seu interesse usando Brigadianos das comunicações do Palácio, em próprio beneficio.

Moacir Moreira

Olá, Azenha e demais amigos leitores e comentaristas,

Excelente artigo, que dificilmente veríamos publicado em nossos jornais de grande circulação.

De fato, a imprensa oligárquica monopolista burguesa patrocinada pelo crime organizado internacional para que defenda seus interesses de classe é uma raposa informando os galináceos sobre os benefícios de uma alimentação saudável.

Aqui no Brasil, por exemplo, o crime organizado atua sem constrangimentos a partir dos palácios e possui a chave do cofre.

O dinheiro sujo das máfias transnacionais compra tudo, principalmente a dignidade de profissionais que deveriam valorizar mais sua credibilidade, porém acabam se vendendo por alguns tostões e algum prestígio na grande mídia moedora de talentos.

É com o dinheiro sujo do crime organizado, que se elege, no Brasil, presidentes, governadores, senadores, deputados, prefeitos e vereadores que irão atuar em defesa daqueles que os elegeram – aqui não se trata de povo evidentemente – estabelecendo regras claras que impeçam os bandidos ricos de serem condenados por seus crimes, o que os obrigaria a ter de trabalhar para viver,

Ora, se tivessem de trabalhar para viver, eles não teriam tempo para planejar e executar seus golpes.

É com o dinheiro manchado de sangue das máfias, que se compra jornais, revistas, canais de televisão, estações de rádio, produtoras de cinema, e tudo mais o que possa ser útil para chegar ao poder e manter-se lá, por meio da técnica goebelliana de repetir mentiras até que pareçam verdades indiscutíveis.

Tudo com o apoio da mídia empresarial que fatura em publicidade e verbas públicas.

O dinheiro sujo do crime produz mais crime e mais dinheiro sujo, neste círculo vicioso começado pelo próprio capeta e que parece impossível de ser rompido.

Somente o povo pode combater o crime organizado, organizando-se também.

Não demora e os criminosos estarão sem dinheiro para continuar remunerando seus colaboradores, pois suas operações são todas realizadas em dólar que a cada dia perde mais o valor.

Estará instalado o caos no mundo do crime e será o tempo do povo assumir o protagonismo que a História lhe reservou.

A briga vai ser boa.

De um lado os vigaristas, e do outro, os enganados, sendo que há muito vigarista iludido por outros vigaristas mais espertos…o bicho vai pegar.

Abraços

Fabio_Passos

A mídia-lixo-corporativa é a expressão de um ocidente larápio e racista.

É a máquina de propaganda dos interesses do grande capital.
Sustentáculo de um regime corrupto que não representa os cidadãos.

ted tarantula

quem gosta de salsicha e jornais não deve procurar saber como são feitos…

    Marcelo Fraga

    Eu garanto que a fabricação da salsicha é mais limpa que a dos jornais.

SILOÉ -RJ

Não sei porque a China não faz uma autocrítica se lá também Murdoch é o único que tem seus tentáculos e muito bem posicionados.

    Bonifa

    Você não sabe sobre isso e não pode afirmar isso, SILOÉ.

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