Momento inimaginável: Internacional cantada no antigo DOI-Codi

Tempo de leitura: 4 min

 por Artur Scavone, encaminhados via e-mail

Internacional é entoada no antigo DOI-Codi paulista em ato contra torturadores

Ativistas de direitos humanos e ex-presos políticos lotaram o pátio do local onde ainda hoje funciona uma delegacia de polícia

Por Lúcia Rodrigues, especial para o Viomundo

50 anos após o golpe militar que perseguiu, prendeu, torturou, matou e desapareceu com os corpos de centenas de ativistas de esquerda durante a ditadura, a internacional, hino comunista, ecoou na manhã desta segunda-feira, 31, no pátio onde funcionou o antigo DOI-Codi de São Paulo, o principal centro de torturas do país, no ato que exigiu a punição dos torturadores e financiadores da repressão.

Dezenas de ex-presos políticos que tiveram o grito sufocado nas sessões de tortura, puderam cantar a plenos pulmões a canção que silenciaram durante os Anos de Chumbo, junto com aproximadamente duas mil pessoas que compareceram à manifestação.

Do lado oposto do pátio que dava acesso às celas e salas de tortura, a ex-guerrilheira do Araguaia, Criméia Almeida, torturada pessoalmente pelo então comandante do DOI, Carlos Alberto Brilhante Ustra, quando estava grávida de sete meses, contemplava o local onde ficou presa. “Foi ali, naquela janela da esquerda, que eu fiquei”, afirma recordando o inferno que viveu.

Vitória da resistência

Apesar do sofrimento, Criméia considera que o ato desta segunda, em repúdio ao golpe, foi uma vitória daqueles que lutaram contra a ditadura. “Apesar de ser um lugar de muitas memórias tristes (ela viu o companheiro de partido, Carlos Nicolau Danielli, ser assassinado sob tortura), a sensação, hoje, é muito boa. Com muito sacrifício ocupamos este espaço. É sem dúvida uma vitória”, enfatiza.

O presidente da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo, deputado Adriano Diogo (PT-SP), organizador da manifestação, também foi pessoalmente torturado pelo coronel do Exército, Brilhante Ustra. Ele ficou preso três meses no centro de tortura. No dia em que chegou ao DOI-Codi haviam acabado de matar seu colega de classe na Geologia da USP, Alexandre Vannuchi Leme.

“Este lugar é macabro. É uma desfaçatez que ainda hoje funcione uma delegacia neste local. Foi importante os sobreviventes virem até aqui. É uma demonstração de muita coragem”, afirma ao se referir às torturas que todos que passaram por ali sofreram.

Na leitura do manifesto Ditadura Nunca Mais, Adriano defendeu a revisão da Lei de Anistia. De acordo com ele, a manutenção do entulho autoritário permite que a polícia continue agindo de forma truculenta até hoje. “A Lei de Anistia é a pedra de toque da impunidade. A Comissão Nacional da Verdade devia fazer um relatório dizendo: Reveja-se a Lei de Anistia”, explica.

No ato desta segunda não houve discursos, as manifestações foram substituídas por intervenções artísticas. A atriz Fernanda Azevedo, que ganhou recentemente o Prêmio Shell de Melhor Atriz, compareceu ao evento e apresentou parte de sua peça Morro Como Um País, que está em cartaz em São Paulo. No trecho encenado, Fernanda apresenta o diálogo do general Geisel com um colega de farda reconhecendo a tortura e a morte de ativistas como uma necessidade do regime.

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Assassinos

Todos os ex-presos políticos mortos no DOI-Codi paulista foram lembrados no ato. A cada nome citado, a plateia repetia: Presente. Os torturadores também não foram esquecidos por quem sofreu nas mãos deles. A cada nome de um agente da repressão, gritos de assassino ecoavam e invadiam a delegacia de polícia.

Bem perto dali, no Comando Militar do Sudeste, o palanque onde sempre se comemoraram todos os aniversários do golpe militar estava vazio. Do lado de fora, na calçada do quartel do Ibirapuera, uma dezena de integrantes da Marcha da Família pediam a volta dos militares em cartazes de cartolina e ao som do hino nacional tocado do alto de um potente carro de som.

Fotos Lúcia Rodrigues

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Comentários

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Ivanisa Teitelroit Martins

uma grande emoção

luizine

Aos democratas de ocasião: Ditadura do proletariado ou Golpe civico-militar, qual mataria menos?

    abolicionista

    Reforma agrária virou ditadura do proletariado, é a novilíngua vejista.

FrancoAtirador

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DESCOMEMORAÇÃO NO RIO DE JANEIRO


http://www.vermelho.org.br/rj/noticia.php?id_noticia=239273&id_secao=101

Ceiça Araújo

O local… A imagem… A canção… O verbo… A História revisitada. Um aperto no coração… Uma saudade sem fim… Uma lágrima seca nos olhos… “Quem é essa mulher
Que canta sempre esse estribilho?
Só queria embalar meu filho
Que mora na escuridão do mar
Quem é essa mulher
Que canta sempre esse lamento?
Só queria lembrar o tormento
Que fez meu filho suspirar
Quem é essa mulher
Que canta sempre o mesmo arranjo?
Só queria agasalhar meu anjo
E deixar seu corpo descansar
Quem é essa mulher
Que canta como dobra um sino?
Queria cantar por meu menino
Que ele já não pode mais cantar”

Urbano

A polícia é altamente necessária, mas bandidos infiltrados, não…

    Urbano

    Do lado de cá, a primeira novidade é sobre a delação premiada para quem entregar detratores do psb (deve ser uma homenagem às bodas de boston da ditadura mercenária (malas e malas de dinheiro para general ou generais mala) e fascista. A segunda é sobre o financiamento das eleições de 1996 em Pernambuco, que foi feita com dinheiro de precatórios, segundo um vereador da época, pelo psb.

    Urbano

    Agora, se chega um desses e em vez de detratar, questionar o faz de contas, hein?

Carlos N Mendes

Grandioso. Inesquecível. Épico. Necessário. Esse ato tem grande godto de vitória, e e entristece muito lembrar que, nos últimos 3 meses, tenho travado discussões ríspidas com conhecidos e amigos no Facebook. Gente que defende a totura, a volta da ditadura e odeia a esquerda com um ódio que parece vir de 3 ou 4 pessoas juntas. Algo muito estranho e que, por mais que eu procure entender as opiniões, elas nunca conseguem se explicar por si. É algo comparavel ao que sente alguém que viu seu cachorro de estimação ser morto pelo vizinho. Teve amigo de 20 anos que me tirou do próprio Face durante uma discussão dessas, e nunca mais falou comigo. Acredito que todo esse ódio esteja sendo cultivado há décadas, mas recebeu no último ano navis cargueiros inteiros cheios de fel e ignomía. A coisa tende a ficar pior até outubro, rezo para quem tem hoje a responsabilidade de governar tenha a serenidade para fazer a coisa certa nomomento e certo e evitar de fazer o errado antes de conseguir contar até 10. Amém.

Adriano Medeiros Costa

Incrível!

Paulo Ribeiro

Não pude conter as lágrimas.
Inimaginável.
A música que me lembrava dai era o tema do filme
Aeroporto, no último volume para abafar os gritos de um
companheiro, Paulinho, que estava sendo torturado.
Obrigado camaradas que ai deixaram seu sangue ou sua vida.
Muito obrigado.
Paulo Ribeiro – Marcos – Ala vermelha

diego

sem palavras para descrever as emoções de constatar que por mais brutal que seja uma repressão ela jamais conseguirá derrotar um ideal.

FrancoAtirador

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Ainda é necessário relembrar a ditadura que não acabou

Mesmo com a volta da democracia,
as estruturas da ditadura perduram.

Por Roberto Brilhante, na Carta Maior

Quanto há do passado no presente?

Diversos movimentos sociais tentaram, na manhã desta segunda-feira (31/03),
responder a esta pergunta durante o ato “Ditadura Nunca Mais”,
convocado pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”,
no 36° distrito policial da rua Tutóia, em São Paulo.

Antiga sede do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI),
o local foi durante a ditadura civil-militar um dos palcos do terror de estado contra os presos políticos, que ainda não terminou.

As chagas dos torturados que sobreviveram não cicatrizaram, nem cicatrizarão jamais. Durante o ato, ocorreram diversas apresentações cênicas e musicais que tentaram transmitir os horrores sofridos nos porões da ditadura e o espírito de resistência que tomou conta dos lutadores que combateram de diversas maneiras as violências de Estado.

O teatro foi hoje um meio onde nos emocionamos e conhecemos mais de perto desde a violência sexual ocorrida durante as torturas ao abuso de poder dos oficiais do estado.

A espera por justiça continua a torturar muitas famílias.

A transição democrática não previu a punição daqueles que participaram do estado de exceção e muitos familiares ainda não puderam conhecer o destino de seus entes queridos, mortos pela ditadura e ainda soterrados pela ineficiência do poder público em oferecer um enterro digno àqueles que lutaram por justiça social.

E durantes estas “descomemorações” dos 50 anos do golpe militar, muitos tentam colocar como “erros” do passado o que foi na verdade condição de suas próprias existências.

Talvez o caso mais notável seja o da Rede Globo que, em agosto do ano passado, escreveu em seu jornal um pedido de desculpas pelo apoio “editorial” à ditadura militar.

Mas o que seria da Globo sem a ditadura?
Teria ela o tamanho que tem hoje se não tivesse sido o órgão de comunicação oficial dos militares?

Hoje estacionam seu furgão do outro lado da rua Tutóia por medo de represálias dos manifestantes,
mas no passado tinham vaga preferencial dentro das dependências do DOI-CODI.

E, enfim, quanto há do passado no presente?
No Brasil, muito.

Mesmo com a volta da democracia, as estruturas da ditadura perduram. A reforma agrária não foi feita.

A polícia continua militar e mata mais do que nunca.

Os meios de comunicação estão longe de serem democratizados.

Ainda não demos nome a todos os bois.

E nossos mortos continuam a nos olhar e a nos questionar o que faremos de suas lutas.

(http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Ainda-e-necessario-relembrar-a-ditadura-que-nao-acabou/4/30620)
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“Só é cantador quem traz no peito

o cheiro e a cor de sua terra,

a marca de sangue de seus mortos

e a certeza de luta de seus vivos…”

(François Silvestre; ‘Dormentes, A Serra da Festa Encantada’)

quinta-feira, 08/08/2013
Substantivo Plural

Ficha do DOPS

Por François Silvestre

Puseram a minha ficha do DOPS na internet. Resultado dos arquivos de Mércia Albuquerque, advogada do Recife, na época da Ditadura, e garimpagem de Roberto Monte.

A publicação deu-se por iniciativa de Neide Alencar, segundo me informou Aurilo Suassuna, com registro de 1972 e foto de 1974.

Sei não, mas tô parecendo gente naquela foto, mesmo naquele canto de memória dispensável.

Diz a ficha que sou “indiciado em práticas subversivas”.

Tirando o “subversivas” o MP/Ditadura usava o mesmo linguajar do MP/democracia.

Noutra parte do arquivo informa-se que a “Auditoria Militar da Marinha” acatou a denúncia do MP por crime contra a Segurança Nacional.

Eu tive outros processos, mas nesse aí, especificamente, eu pus em risco a Segurança Nacional ao fazer um discurso no Salão Nobre da Casa do Estudante (foto), que aparece em fotos recentes na imprensa desmoronando de abandono.

Dessa denúncia resultou minha condenação a dois anos de reclusão sem direito de recorrer em liberdade.

Contra mim o MP sempre teve muita convicção dos delitos, parece até um carma.

(http://www.substantivoplural.com.br/ficha-do-dops)
(http://www.substantivoplural.com.br/author/fsalencar)
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Roberto Locatelli

Poderoso.

Alexandre maruca

Maravilhoso

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