Marcos Coimbra: A real percepção do eleitor sobre o mensalão

Tempo de leitura: 4 min

Celso de Mello. Foto: Nelson Jr./SCO/STF

por Marcos Coimbra, em CartaCapital

O STF fez a coisa certa. Ao considerar cabíveis os embargos infringentes no julgamento da Ação Penal 470, seus integrantes tomaram uma decisão de consequências profundas.

Os dias que antecederam à decisão, e mesmo as declarações subsequentes de alguns ministros, foram marcados pela ideia de que a opinião pública queria a rejeição desses embargos. Que a maioria do país exigia barrar o direito de os acusados, mesmo aqueles considerados inocentes por quatro juízes, serem submetidos a novo julgamento.

Da quinta-feira anterior, quando a sessão do plenário para deliberar sobre o tema foi interrompida, ao dia da decisão, o tom do discurso oposicionista no Congresso, na sociedade e na mídia “anti-lulopetista” seguiu por esse caminho.

Os parlamentares da oposição, com alguma cautela, os colunistas da “grande imprensa” sem qualquer embaraço. Todos desejavam evitar o acolhimento dos embargos e lançavam ameaças veladas aos juízes caso o fizessem. Anunciavam a ira da população sobre os ombros dos magistrados se não mandassem todos os acusados imediatamente para a cadeia.

Último a se pronunciar e responsável pelo voto definitivo a favor dos recursos, o ministro Celso de Mello mencionou a pressão. O tribunal, frisou durante a leitura de seu voto, não pode “expor-se, submeter-se, subordinar-se à vontade de maiorias contingentes”.

Ou seja, falou como se houvesse redigido seu voto contra o desejo da nação, ou da sua parcela maior. Como se existisse qualquer evidência da existência dessas “maiorias” e como se, caso confirmadas, devessem ser consideradas “naturais”.

Cada um a seu modo, os veículos da mídia oposicionista fizeram de tudo para dar substância à tese (e reforçar a pressão sobre o tribunal). O Datafolha foi convocado a pesquisar as opiniões na capital paulista de forma a permitir a manchete “Em São Paulo, maioria rejeita a reabertura do mensalão”.

Um jornal mineiro esmerou-se” na quarta 18, estampou na primeira página uma “carta a Celso de Mello”, escrita e assinada em nome (!?) dos “cidadãos do estado de Minas Gerais”.

De maneira “técnica” ou tosca invocavam a “opinião pública”.

Como chegou o Datafolha ao resultado?

A pergunta sobre a aprovação ou rejeição à “reabertura do julgamento” seguia-se a duas outras. A primeira pedia ao entrevistado que dissesse se considerava o chamado “mensalão” um esquema de corrupção (…) com uso de dinheiro público” ou “de arrecadação de dinheiro” para campanhas eleitorais. A segunda afirmava: “Pessoas condenadas à prisão (…) querem que o STF reveja (o julgamento)” e perguntava se o entrevistado estava de acordo.

Em outras palavras, mencionavam-se expressões como “corrupção”, “uso de dinheiro público” e “pessoas condenadas à prisão”, antes de indagar a respeito dos recursos. Até quem nada sabe de pesquisa é capaz de imaginar as respostas.

A pesquisa revelava, porém, outras nuances: a proporção de paulistanos bem informados (o que está sempre associado ao interesse) sobre o mensalão era de 19% e apenas 39% dava notas maiores que 6 para o desempenho do STF durante o julgamento (considerado “ótimo” ou “bom” por não mais de 21% dos entrevistados).

Tais números não são muito diferentes daqueles obtidos pelo Vox Populi em pesquisa nacional realizada no ano passado, ainda no auge do julgamento. Naquela época, aqueles que se acreditavam bem informados sobre o assunto somavam 18%, mas apenas 12% sabiam dizer, de forma espontânea, o nome do tribunal onde o julgamento ocorria.

Apesar do desinteresse e da desinformação, 30% dos entrevistados consideravam que a “responsabilidade dos acusados estava provada”. Sob outro ângulo, significa que 70% não tinham essa convicção. Mais: 30% entendiam que apenas as culpas de alguns estavam comprovadas e 39% não se julgavam em condições de responder. Não surpreendentemente, apenas 29% defendiam punições a todos os acusados.

Só 29% concordavam com a tese central da acusação, da existência de um esquema de desvio de verbas públicas para comprar o apoio de deputados. Informados do fato de os parlamentares acusados serem na sua maioria do PT, 33% dos entrevistados consideravam “sem sentido” a imputação (e 38% não tinham opinião).

Em outras dimensões, via-se a força dos estereótipos. Apesar da baixa (ou nenhuma) informação, 65% supunham que os acusados “ficaram ricos”. Entre a minoria que se acreditava capaz de calcular o montante dos recursos movimentados, 25% cravaram “mais de 1 bilhão de reais”.

A frase bombástica de que o mensalão teria sido “o maior escândalo” de nossa história era subscrita por não mais de 21%. Para uma ampla maioria (57%), haveria “outros casos, maiores ou iguais” (entre indivíduos com educação superior, a proporção alcançava 69%). (PS.JCMA: aqui a casa caiu!!!).

Em suma, ao se levarem em conta os resultados das pesquisas disponíveis, pode-se dizer que não chega a um terço o contingente da população crente na narrativa a respeito do mensalão criada pela oposição, especialmente seu braço midiático. A meia dúzia de mal-educados a destilar ódio pela internet e chatear os juízes não expressa o conjunto da sociedade.

A opinião pública brasileira não concorda com a corrupção e anseia pela punição dos corruptos. De todos. Ela não aceita a sonegação de impostos de megacorporações de mídia, o estímulo de autoridades a cartéis de fornecedores em troca de “apoio”, a existência de entidades “sociais” que desviam recursos ou o caixa 2 em campanhas praticado rotineiramente pelos partidos.

Quando alguém invoca “o sentimento da opinião pública” e atribui ao conjunto da sociedade o pensamento de uma minoria, nada mais faz do que um jogo político de segunda classe.

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Comentários

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Homero Mattos Jr

“Minha filha,
…o sistema político do Brasil funda-se na opinião nacional, que, muitas vezes,
não é manifestada pela opinião que se apregoa como pública.”
Dom Pedro II Imperador do Brasil
em carta de 03 de maio de 1871 à Princesa Isabel
http://passalidadesatuais.blogspot.com.br/2012/08/notas-para-posteridade-de-um-pais.html

    Zanchetta

    A culpa era da Globo?…

Coimbra desmascara “opinião pública” e a Folha | Conversa Afiada

[…] Marcos Coimbra: A real percepção do eleitor sobre o mensalão […]

leprechaun

o povão não está nem aí pra nada, nem sabe do que se trata

Ivan Cordeiro

A grande imprensa aos poucos vai sendo desmascarada. Mas é preciso uma lei que faça com que elas sejam responsáveis

    Xispagato

    “A grande imprensa aos poucos vai sendo desmascarada”. Caramba!!! O que ainda faltava? Pensava que já estava desmascarada há tempos….

ALGOPI

Essa, me parece, ser a questão mais importante no momento. A mídia tenta confundir a opinião pública, dizendo que a “opinião pública” condena os réus. Aí, o indivíduo acaba se sentindo incluído e não quer demonstrar desinformação.
Marcos Coimbra foi brilhante em sua exposição. Alguns elementos saltam aos olhos: primeiro, pouca gente sabe realmente de que são acusados os réus e depois a condenação se dá não porque se formou opinião a partir de informações, mas porque o movimento é de linchamento onde a emoção supera a informação.
O fato dos petistas não estarem sendo acusados de enriquecimento ilícito também é significativo quanto colocado na discussão. Claro que também temos que levar em conta que a elite não considera enriquecimento ilícito um crime importante porque eles não suportariam criminalizar o enriquecimento que dificilmente é realizado por meios laborais.
Enfim, o enriquecimento ilício seria perdoado pela elite, mas a tentativa de comprar poio no congresso não.

    André Dantas

    Concordo com você e ainda acrescento a questão do caixa 2. Esta prática ilícita foi admitida pelos envolvidos já há muitos anos e não há uma indignação geral (leia-se grande mídia e demais representantes da pequena-burguesia) em relação a isso, posto que é um elemento intrínseco do sistema que nenhum deles (Governo e oposição de direita) quer transformar.

dijalma lacerda

Se Anás, Caifás e Pilatos não tivessem ouvido a voz do povo,
Jesus não teria sido pregado na cruz.

Dijalma Lacerda.

    Abel

    Bem lembrado! Mas ainda há quem se saia com aquela batida expressão “a voz do povo é a voz de Deus”.

Eduardo

O jornal Estado de Minas parece que é mantido pelo PSDB, mais especificamente por ação direta de Aécio Neves.Não é verdade. Quem o mantém vivo são o Estado de Minas Gerais, portanto, os impostos pagos pelo povo mineiro, além das grandes empresas brasileiras e multinacionais que pagam ao jornal reacionário pelo trabalho sujo que faz.Seu pagamento é o serviço sujo que faz em favor da elite viciada e desonesta que representa. Sua editoria e o jornal só não é pior porque seu concorrente principal é o Jornal “O Tempo” que se diz Jornal. Mas francamente é lamentável. Total ausência de autocrítica! Não consegue nem atingir seu propósito, que é o de influenciar os ignorantes,apesar de ser distribuido gratuitamente. Ambos “Jornal Estado de Minas” e “Tempo” não convencem ninguém. Porisso, Marcos Coimbra, utilizam-se desonestamente da credibilidade do povo mineiro. Esses incompetentes não estão autorizados a falar em nome do povo mineiro! Eles tem também o hábito desavergonhado de usar o nome e imagem de Tiradentes e da Inconfidência Mineira! Não sobreviveriam honestamente.

Isidoro Guedes

A grande mídia (ferozmente anti-petista, anti-esquerdista e serviçal dos interesses do poder econômico) forjou a ideia de que a “opinião pública” estaria prestes a promover uma “guerra civil” por conta da admissibilidade dos embargos infringentes pró-réus condenados na primeira fase do julgamento do “mensalão”, todavia, como bem o demonstra o sociólogo e pesquisador Marcos Coimbra: “..ao se levarem em conta os resultados das pesquisas disponíveis, pode-se dizer que não chega a um terço o contingente da população crente na narrativa a respeito do mensalão criada pela oposição, especialmente seu braço midiático. A meia dúzia de mal-educados a destilar ódio pela internet e chatear os juízes não expressa o conjunto da sociedade”. E conclui: “… quando alguém invoca “o sentimento da opinião pública” e atribui ao conjunto da sociedade o pensamento de uma minoria, nada mais faz do que um jogo político de segunda classe”.
E jogo político de segunda classe é tudo o que tem feito a patética oposição sem rumo e sua mídia reaça nesse julgamento bufa da AP-470.

Francisco

O paulistano anda diariamente no maior caso de corrupção dos últimos tempos:

Chama metrô…

    Zanchetta

    Vou parar de andar nele…

Alexandre Tambelli

Exemplar o texto do Marcos Coimbra! Valeu por postar! E nos dar a oportunidade de lê-lo.

Apavorado por Vírus e Bactérias

Será que barbosa boia ou afunda no Tietê tucano.

    Roberto Locatelli

    Acho que boia. Já está nas mãos do Lewandovski o processo 2474, que expõe as ligações entre o filho do Joaquim Batman e Daniel Dantas. Pode ser a explicação para o tal apartamento que Batman recebeu como “doação” – é a palavra que consta no documento – 4 dias depois de entregar o relatório da AP470.

    Zanchetta

    Será que o empréstimo do Barroso também entra nessa???

morus

O que se poderia esperar da grande mídia, além disso?
Em nome da defesa do oprimido o opressor aufere benefícios para si, aumentando a opressão.
Os números dizem o que quem os manipula quer.

ricardo silveira

Se qualquer cidadão quiser discutir, com seriedade, qualquer assunto, não pode se informar por meio da Folha, porque a Folha há muito tempo, se é que em algum momento foi diferente, não está interessada em dizer a verdade. A Folha é um jornal que serve, apenas, para se saber o que a direita pensa sobre os assuntos em discussão.

Ozzy Gasosa

Sempre faço essa pergunta:
Com 513 deputados, e ainda, tem o Senado Federal, diga-se de passagem está fora dessa picaretagem dantesca Barbosiana, então, como a compra de 13 parlamentares pode comprar um votação ?
A matemática não fecha.
Esse PIG, alguns ministros do STF e os dois ex-procuradores do MP devem ser condenados por formação de quadrilha e todos irem para a cadeia, imediatamente.

Mario

Se eu não soubesse o que eu sei sobre a FARSA do mensalão, e me informasse somente por essa mídia escrota, eu estaria, provavelmente, querendo a cabeça de Dirceu e Genoino. Mas quando você acompanha o julgamento pela blogosfera, a coisa começa a se esclarecer. E eu nunca aceito notícias (na blogosfera) de primeira mão. Fico sempre na moita à espera de uma confirmação ou desmentido.

Li também o livro “O outro lado do mensalão”, do jornalista Paulo Moreira Leite onde a farsa é completamente desmontada de maneira cabal e absoluta.

Agora, vejam só o que disse, em entrevista a Mônica Bergamo, o ultraconservador IVES GANDRA: “NÃO HÁ PROVAS CONTRA JOSÉ DIRCEU”.

Jurista Ives Gandra Martins, um dos mais respeitados do País, concede entrevista bombástica à jornalista Mônica Bergamo; nela, afirma que estudou todo o acórdão da Ação Penal 470 e não encontrou uma única evidência contra o ex-ministro da Casa Civil; mais: disse ainda que a teoria do domínio do fato, importada pelo STF para julgar o caso específico de Dirceu, não é usada nem na Alemanha; Gandra diz ainda que, depois do precedente, abre-se um território de grande “insegurança jurídica” no País para executivos e empresários, que poderão ser condenados da mesma forma; detalhe: Gandra é um dos mais notórios conservadores do País e antagonista histórico do petismo; na entrevista, ele elogiou o ministro Ricardo Lewandowski, que “ficou exatamente no direito”, e fez críticas pontuais a Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa.
Matéria completa: http://blogdadilma.com/politica/4141-ives-gandra-não-há-provas-contra-josé-dirceu.html

    Alexandre Nunis

    É… insegurança jurídica né… Quase um pouco tarde demais pro mensalão petista, mas um pouco bastante cedo pro mensalão tucano, Domínio do Fato “nu dus outros” é refresco não ? A direita até quando parece sincera é oportunista, vamos livrar nossos Líderes tucanos dessa maldição do Domínio do Fato, ora pois…

Fabio Passos

Não tenho a menor dúvida.
O grupo de linchadores que o PiG conseguiu reunir não ultrapassa parte da classe média, preconceituosa e racista, que assiste jn e lê revista veja. rsrs
E a verdade é que nem mesmo estes imbecis adestrados pelo PiG sabem citar uma prova sequer nesta farsa do mentirão.

Ronaldo Silva

Vergonha mesmo eu tenho desta classe média brasileira, boquirrota-facebook, sertanejo-universitária.

Seabra

Dá-lhe Coimbra, a sua opinião é 100% igual à opinião de quem não suporta mais ser desinformado massivamente por canalhas mercenários e cada vez mais milionários…

Nelson Quintanilha

Tem uma frase que corre na net a muito tempo, ABAIXO A REDE GROBO, O POVO NÃO É BOBO.
Ficou visível nesse julgamento que a globo troca apoio com a oposição pelas dividas adquiridas por tentarem burlar o fisco.
Essa é a corrente crescente no País, a de que precisamos de uma mídia descente e não são as que estão operando hoje, visto que nas manifestações foram depredados e/ou queimados viaturas de todas as empresas.
O Brasil de fato está acordando para o desespero dos que se achavam intocáveis.
E viva a internet, a verdadeira formadora de opinião!

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