Gilson Caroni: Serra, o retorno do “Magnífico”?

Tempo de leitura: 3 min

13 de Junho de 2010 – 14h18

por Gilson Caroni Filho, no Vermelho

Nascido da tradição da Filosofia da História, o tempo lento, linear e previsível não costuma dar espaço para que surjam agitações trazidas por “eventos” desconstrutores de representações sedimentadas No entanto, quando constelações específicas condensam a vida, restituindo sua dimensão dialética, estamos, sem dúvida, diante de atos ou fatos inaugurais quase sempre originados na esfera política.

José Serra, em discurso na convenção do PSDB que aprovou seu nome como candidato à sucessão de Lula, mostrou desconhecer quando a história se torna presente no espaço. Sua fala aparenta ser prisioneira de um passado que, por não poder ser explicitado para eleitores mais jovens, ameaça se voltar contra ele, de forma grotesca, quase patética.

Ao dizer que “não tenho esquemas, não tenho máquinas oficiais, não tenho patotas corporativas e não tenho padrinhos”, Serra tenta, em vão, esconder de onde vem e quais são suas companhias. Tanto o PSDB quanto o PFL, partidos da coligação vencedora da sucessão eleitoral em 1994 e 1998, foram criaturas concebidas e direcionadas a fim de se tornarem instrumentos viabilizadores das velhas elites no sistema político hegemonizado pelo neoliberalismo. O ex-governador paulista, velho militante da AP, ressurgiu como ator de relevo no bojo da velha conciliação negociada.

É isso que faz dele o ator antagônico das novas formas de articulação entre o Estado e a sociedade civil, forjadas nos últimos oito anos de governo Lula. O tucanato representa uma época em que qualquer demanda coletiva, mesmo quando meramente setorial, encontrava barreiras quase intransponíveis na desorganização e apodrecimento dos aparelhos institucionais do Estado cartorial, submetido aos ditames do mercado.

Quando compara, de forma jocosa, Lula a Luís XIV, Serra incorre em dois erros perigosos. O primeiro mostra a indigência política de sua maneira de ver o país. O segundo traz à cena o “padrinho” que precisa ser ocultado. O desmantelamento do consórcio tucano-pefelista combinou ampliação da participação com fortalecimento institucional. O presidente petista não expressou a ameaça de uma via personalista, carismática, na qual a institucionalidade se enfraqueceu e a participação popular aumentou de forma abrupta e inorgânica.

Pelo contrário, dialogando com movimentos sociais, a inclusão de novos atores se deu de forma consistente, sem prejuízo do Estado Democrático de Direito. Antes o reforçou, na medida em que conferiu maior densidade e vitalidade aos partidos políticos, entidades de classe e ao próprio processo eleitoral.

A alusão ao monarca absolutista, a quem se atribui a frase ” L’État c’est moi”, não só não guarda sintonia com o momento de avanços democráticos em que vivemos, como remete à genealogia política do candidato da Rede Globo, revelando o apadrinhamento rejeitado. Sim, Serra não é pouca coisa. Pontificou como gente grande no poder quando o Palácio do Planalto, no início do governo de FHC, parecia o de Lourenço, o Magnífico, fino poeta e protetor das artes em Florença. Ele permitiu a falência do banco dos Médicis.

No segundo mandato, o Planalto ficou parecido com o palácio de Lorenzaccio, príncipe intrigante e sem princípios, que assassinou o primo Alexandre e depois foi assassinado também.

Na trama palaciana do tucanato, um forte componente de sua personalidade era o orgulho e alta conta em que tinha a si mesmo. O que mais temia, no entanto, ocorreu: passou à história como um fracassado na economia e um pusilânime na política, tolerante com os desmandos de seus aliados e com a corrupção. Esse é o legado que Serra, com o apoio da grande mídia corporativa e do judiciário partidarizado, pretende resgatar. Será isso o que queremos?

Pretendemos voltar a um período em que ação econômica instrumentalizava a política, fazendo dela um meio de coerção para maximizar fins acumulativos? Ou desejamos manter as conquistas de oito anos de governo democrático- popular, que, enfrentando a questão social, inverteu os termos da equação?

*Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil


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Comentários

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ROSANGELA

o que o professor comenta no seu texto chega a ser tediante, de tão comentado que é o objeto de sua analise em tudo o quanto é bolg que eu acesso, no entanto a forma como o senhor escreve me deixa realmente encantada, uma delicia esse texto, sinto falta, em tempos de falencia do nosso vocabulario, de textos tão ricamente construido. vou dormi feliz hoje!!!!!
abraços

Jairo_Beraldo

Fontes cruéis e falastronas da oposição (nem tudo são flores no reino Tucano) disseram em tom de escárnio e zombaria que Serra deveria parar seu périplo incansável e inglório de buscar um vice para sua natimorta campanha presidencial.O motivo é coerente e razoável ao extremo.Como Serra e FHC são aparentemente os dois únicos representantes da linha "um tacape na mão e uma idéia na cabeça", e essa linha é a que tem comandado o PSDB ao longo de pelo menos, nos últimos 8 anos, por qual razão não convocar o Iluminado para o cargo de substituto da Primeira Cadeira?

jõao

serra careca generico de fhc

Henrique

Este é o Sr Enganador/Mais Cheiroso/Ex-Gov/SP, aquele que acha normal o convívio com nordestinos.

Carlos.

…"não tenho esquemas, não tenho máquinas oficiais, não tenho patotas corporativas e não tenho padrinhos”… É pra rir ou é pra chorar de uma declaração destas vinda de quem veio? Enganou quem?

    ana cruz

    Não tem patotinha corporativa?
    E o friazinho, mesquitinha, minnus de calças curtas marinhos, os civitinhas, heim?

    @marisps

    Não tem patota; tem gangue, tem quadrilha!

Sérgio Mendes

Quando justificava a construção das novas pistas na Marginal, O Ex- governador de São Paulo, argumentou contra o uso de transportes não convencionais e emendou ao perguntando aos repórteres como as pessoas deveriam movimentarem-se na cidade, (…)"vão usar o que? burricos? "…errou apenas o animal.
A velocidade média do transito, em vias como a Av. Ibirapuera no horário de pico, é menor que a de uma galinha.

pizolati

prof. Gilson como seria maravilhos te-lo como docente em varias cursos no Brasil afora
Voce é brilhante!

jacó

NNão é prudente comparar esseser ao animal, pois o jegue é um muinto trabalhador, contrarioao decendoserra que é um preguiçoso que se gaba da sua hora de acordar às 12:00 horas do dia, só para comer e deitar de novo, eita governardor incompetente abandonou são paulo aos ratos e baratas.

dukrai

O Vampiro Brazileiro tomou todas as dores do tucanato paulistano e do Boca Mole, patota e padrinho dos seus esquemas que fazem funcionar a máquina oficial urutucana.

    Jairo_Beraldo

    Mas caro dukrai, parece que em SP já corre a corrente Dilmin…Dilma e Alckimin…e agora Zé?

Vinícius Vitoi

Não é só o Serra quem perde…É todo o conjunto de políticos ligados a ele…Fico imaginando a confusão lá no ninho PSDB-DEM!!!!
A turma apostou que o governo Lula não passaria de um mísero mandato de quatro magros anos e varrer para sempre esse tal PT do mapa político…
Deu tudo errado…Para eles… Meu Deus!!! Esse ano a indústria farmaceutica vai vvender diazepam como nunca vendeu…

octávio freire

Nao tem patota etc e tal e nao terá nunca o meu voto

    Polengo

    E nem minha consideração.

mariazinha

*Gilson Caroni Filho!
Professor estupendo, escritor genial; um SÁBIO.

Orlando Bernardes

Este Serra fala para si mesmo e para os seus. É patético. Não enxerga ou não quer enxergar a realidade à sua frente. Deve sofrer de autismo político.

Gerson Carneiro

O Serra está no escuro, sem laser, atirando a esmo.

Marcelo Teixeira

$erra, com um discurso transgênico, passará ao ostracismo junto com FHC.

    Jairo_Beraldo

    Já está de malas prontas para ir passar uma temporada na caverna com o Iluminado.

Davi

A candidatura Demotucana já nasceu fadada ao fracaço, com discurso patético do ex-governador de São Paulo, a sociedade brasileira visivelmente está se convencendo de que o projeto de poder pesdebista alicerçado historicamente no velhos privilegios das elites e da midia colonizada dá seu último suspiro.

Seu fracasso definitivo é uma questão de tempo. Sem precisar de interpretes da imprensa imparcial, calejados pela experiencia histórica, os brasileiros aprenderam a falar por si mesmos. A duvida é, até quando essa midia tucana vai continuar dando murro em ponta de faca?

O mundo mudou, o Brasil mudou e a mÍdia demotunizada ainda está na idade da pedra, com discurso incompatível com a realidade histórica.

    Rogerio

    Meu caro, a midia tucana tem mais é que continuar dando murro em ponta de faca até dilacerar-se por completo, pois a sua deteriorização faz parte desse processo renovador. Não temos que ficar preocupados com essa velha mídia. Deixemos que ela se canibalize enquanto assistimos a consumação das transformações sociais (que já começou) e politicas que virão a reboque.

    Eu quero mais é que ela se debata até que se desmanche em si mesma! Do pó ao pó! E ai seremos redimidos.

sergio

o serra é a treva!

    Jairo_Beraldo

    O porteiro das trevas..a treva é o Iluminado.

Marat

Ainda acho que Serra não tem glamour suficiente para ser comparado a déspotas franceses antigos. Com sua jequice habitual, amparado pela nossa cafona imprensa e com esmolas estadunidenses, ele está mais para um coronelzão de republiquetas ditas bananeiras. Ele está mais para Uribe…

    Polengo

    Ao dizer que “não tenho esquemas, não tenho máquinas oficiais, não tenho patotas corporativas e não tenho padrinhos”…

    Ele disse isso mesmo?
    Pena que eu náo tava lá pra ver. E gargalhar.

    Por que será que ele disse isso?

    Rogerio

    um exercicio de autonegação?

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