Jornalista alemão denuncia controle da CIA sobre a mídia

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jornalista

Udo Ulfkotte, que trabalhou no Frankfurter Allgemeine Zeitung, fala à Russia Today

sugerido pela Conceição Oliveira

Tradução parcial da entrevista reproduzida em vídeo abaixo

Sou jornalista há 25 anos, e fui criado para mentir, trair, e não dizer a verdade ao público. Mas vendo agora, e nos últimos meses, o quanto … como alemão a mídia dos EUA tentar trazer a guerra para os europeus, para trazer a guerra à Rússia. Este é um ponto de não retorno, e eu vou me levantar e dizer … que o que eu fiz no passado, não é correto, manipular as pessoas, para fazer propaganda contra a Rússia e o que os meus colegas fizeram no passado, porque eles são subornados para trair o povo, não só na Alemanha, mas de toda a Europa.

livro

A razão para este livro é que estou muito preocupado com uma nova guerra na Europa, e eu não quero de novo a situação, porque a guerra nunca vem de si mesmo, há sempre pessoas atrás que levam à guerra, e não é só políticos, jornalistas também.

Eu só escrevi no livro sobre como traimos no passado nossos leitores apenas para empurrar para a guerra, e porque eu não quero isso, eu estou cansado dessa propaganda. Nós vivemos em uma república de bananas, não é um país democrático, onde teríamos a liberdade de imprensa, direitos humanos.

[…]

Se você olhar para a mídia alemã, especialmente os meus colegas que, dia após dia, escrevem contra os russos, que estão em organizações transatlânticas, que são apoiados pelos Estados Unidos para fazer isso, pessoas como eu. Eu me tornei um cidadão honorário do Estado de Oklahoma. Por que exatamente? Só porque eu escrevia pró-Estados Unidos. Eu escrevia pro-Estados Unidos e fui apoiado pela Agência Central de Inteligência, a CIA. Por quê? Porque eu tinha que ser pró-americano.

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Estou cansado disso. Eu não quero! E assim que eu acabei de escrever o livro — não para ganhar dinheiro, não, ele vai me custar um monte de problemas — só para dar às pessoas, neste país, a Alemanha, na Europa e em todo o mundo, apenas para dar-lhes um vislumbre do que se passa por trás das portas fechadas.

[…]

Sim, existem muitos exemplos disso: se você voltar na história, em 1988, se você for ao seu arquivo, você encontrará em março de 1988 que os curdos do Iraque foram atacados com gás tóxico, o que se tornou conhecido em todo o mundo. Mas em julho de 1988, eles [o jornal alemão] me mandaram para uma cidade chamada Zubadat, que fica na fronteira entre Iraque e Irã.

Foi na guerra entre iranianos e iraquianos, e eu fui enviado para lá para fotografar como os iranianos tinham sido atacados com gases venenosos, gás venenoso alemão. Sarin, gás mostarda, fabricado pela Alemanha. Eles foram mortos e eu estava lá para tirar fotos de como essas pessoas foram atacadas com gás venenoso da Alemanha. Quando voltei para a Alemanha, só saiu uma pequena foto no jornal, o Frankfurter Allgemeine, e saiu apenas uma pequena seção sem descrever como era impressionante, brutal, desumano e terrível, matar … matar, décadas após a Segunda Guerra Mundial, o povo com gás venenoso alemão.

Foi uma situação em que eu me senti abusado por estar lá apenas para fazer um documentário sobre o que tinha acontecido, mas não estar autorizado a revelar ao mundo o que tínhamos feito atrás das portas fechadas. Até hoje, não é bem conhecido do público alemão que havia gás alemão, houve centenas de milhares de pessoas atingidas nesta cidade de Zubadat.

Agora, você me perguntou o que eu fiz para as agências de inteligência. Então, por favor, entenda que a maioria dos jornalistas que você vê em outros países afirmam ser jornalistas, e eles poderiam ser jornalistas, jornalistas europeus ou americanos … mas muitos deles, como eu no passado, são supostamente chamado de “informantes não-oficiais”.

É assim que os americanos chamam. Eu era um “informante não-oficial”. A cobertura extra-oficial, o que isso significa?

Isso significa que você trabalha para uma agência de inteligência, você os ajuda se eles querem que você para ajude, mas nunca, nunca […] quando você for pego, se descobrem que você não é só um jornalista, mas também um espião, eles nunca dirão “era um dos nossos.”

Isso é o que significa uma cobertura extra-oficial. Então, eu ajudei-os várias vezes, e agora eu me sinto envergonhado por isso também. Da mesma forma que eu sinto vergonha de ter trabalhado para jornais como o Frankfurter Allgemeine, porque eu fui subornado por bilionários, subornado pelos norte-americanos para não refletir com precisão a verdade .

[…]

Eu só imaginava, quando eu estava no meu carro para vir a esta entrevista, tentei perguntar o que teria acontecido se eu tivesse escrito um artigo pró-russo no Frankfurter Allgemeine. Bem, eu não sei o que teria acontecido. Mas todos nós fomos ensinados a escrever artigos pró-europeus, pró-americanos, mas por favor não pró-russos. Portanto, estou muito triste por isso …. Mas não é assim que eu entendo a democracia, a liberdade de imprensa, e eu realmente sinto muito por isso.

[…]

Sim, eu entendi a pergunta. A Alemanha ainda é uma espécie de colônia dos EUA, você verá em muitos aspectos; como [o fato de que] a maioria dos alemães não querem ter armas nucleares em nosso país, mas ainda temos armas nucleares americanas.

Então, sim, nós ainda somos uma espécie de colônia americana e, por ser uma colônia, é muito fácil de se aproximar de jovens jornalistas através de (e isso é muito importante) organizações transatlânticas.

Todos os jornalistas de jornais alemães altamente respeitados e recomendados, revistas, estações de rádio, canais de TV, são todos membros ou convidados destas grandes organizações transatlânticas. E nestas organizações transatlânticas, você é abordado por ser pró-americano. Não há ninguém que vem a você e diz: “Nós somos a CIA. Gostaria de trabalhar para nós? “. Não! Esta não é a maneira que acontece.

O que essas organizações transatlânticas fazem é convidá-lo para ver os Estados Unidos, pagam por isso, pagam todas as suas despesas, tudo. Assim, você é subornado, você se torna mais e mais corrupto, porque eles fazem de você um bom contato. Então, você não vai saber que esses bons contatos, digamos, não-oficiais, são de pessoas que trabalham para a CIA ou outras agências dos EUA.

Então, você faz amigos, você acha que você é amigo e você vai cooperar com eles. E se perguntam: “Você poderia me fazer um favor?”. Em seguida, seu cérebro passa por uma lavagem cerebral. A pergunta: é apenas o caso com jornalistas alemães? Não! Eu acho que este é particularmente o caso com jornalistas britânicos, porque eles têm uma relação muito mais próxima. Também é particularmente o caso com jornalistas israelenses. É claro que com jornalistas franceses, mas não tanto como com os jornalistas alemães ou britânicos.

Este é o caso para os australianos, os jornalistas da Nova Zelândia, de Taiwan e de muitos países. Os países do mundo árabe, como a Jordânia, por exemplo, como Omã. Há muitos países onde você encontra pessoas que se dizem jornalistas respeitáveis, mas se você olhar para trás, você vai descobrir que eles são fantoches manipulados pela CIA.

[…]

Desculpe-me por interrompê-lo, dou-lhe um exemplo. Às vezes, as agências de inteligência vêm para o seu escritório e sugerem que você escreva um artigo. Dou-lhe um exemplo, não de um jornalista estranho, mas de mim mesmo. Eu só esqueci o ano. Só me lembro que o serviço de inteligência alemão no exterior, o Serviço Federal de Inteligência da Alemanha (isto é apenas uma organização irmã da Agência Central de Inteligência) veio ao meu escritório Frankfurter Allgemeine em Frankfurt. Eles queriam que eu escrevesse um artigo sobre a Líbia e o coronel Kadafi. Eu não tinha absolutamente nenhuma informação secreta sobre Kadafi e Líbia. Mas eles me deram toda a informação em segredo, só queriam que eu assinasse o meu nome.

Eu fiz isso. Mas foi um artigo que foi publicado no Frankfurter Allgemeine, que originalmente veio do Serviço Federal de Inteligência da Alemanha, a agência de inteligência no exterior. Então, você realmente acha que isso é jornalismo? As agências de inteligência escreverem artigos?

[…]

Oh sim. Este artigo é parcialmente reproduzida no meu livro, este artigo foi “Como a Líbia e o coronel Kadafi secretamente tentam construir uma usina de gás tóxico em Rabta”. Acho que foi Rabta, sim. E eu tenho toda essa informação… foi uma história que foi impressa em todo o mundo, alguns dias depois. Mas eu não tinha nenhuma informação sobre o assunto e  foi a agência de inteligência que me sugeriu escrever o artigo. Então isso não é como o jornalismo deve funcionar, as agências de inteligência decidirem o que é publicado ou não.

[…]

Eu tive uma, duas, três … seis vezes a minha casa foi revistada, porque eu tenho sido acusado pelo procurador-geral alemão pela divulgação de segredos de Estado. Seis vezes invadiram a minha casa! Bem, eles esperavam que eu nunca iria me recuperar. Mas eu acho que é pior, porque a verdade virá à tona um dia. A verdade não vai morrer. E eu não me importo com o que acontecer. Eu tive três ataques cardíacos, não tenho filhos. Então, se eles querem me processar ou me jogar na cadeia… é pior para a verdade.

PS do Viomundo: Quem serão as fontes não oficiais da CIA no Brasil?

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Comentários

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Paulo

Respondendo à pergunta do final da excelente matéria, “Quem serão as fontes não oficiais da CIA no Brasil?”…

Bom uma dessas fontes com certeza é o CR, que escreve para um panfleto tucano paulista com status de “jornal”. O tal CR, que é considerado pelo panfleto como um “reporter especial” e faz sempre questão de colocar no começo de seus artigos que ele ganhou um conhecido prêmio de jornalismo (adivinhem onde?) nos EUA para dar mais “credibilidade” aos seus textos sempre opinativos e desprovidos de qualquer fato proveniente da realidade, ou sem apresentá-los de forma isenta, objetiva e integral (quem não tem fundamentos em fatos para embasar suas argumentações, precisa sempre fazer referência a prêmios obtidos para conseguir alguma credibilidade no que escreve… bom ao menos até descobrirmos quais são os critérios de concessão dos prêmios e quem está por trás deles e com quais motivações e interesses). É perfeitamente compreensível que o tal “reporter especial” do panfleto paulista tucano tenha recebido o tal prêmio se olharmos a lista de pessoas que costumam ser premiadas no jornalismo por essa mesma “organização transatlântica” (para usar o termo do jornalista alemão, mas aqui para nós, organização do norte do nosso continente). Entre os contemplados pelo mesmo prêmio do CR ao longo dos anos também estão Roberto Civita (editor da Veja), Roberto Marinho (da Globo, recebeu o prêmio duas vezes), Carlos Lacerda (do Tribuna da Imprensa) e o próprio dono do panfleto paulista tucano onde o CR escreve. Entre outros latino-americanos contemplados pelo mesmo prêmio estão outras figuras conservadoras e pró-yankees como a blogueira cubana Yoani Sanchez, o também cubano Raúl Rivero (fundador da oposicionista agência Cuba Press), Roberto Noble (fundador do jornal conservador argentino Clarín), Agustin Eastman (fundador do jornal conservador chileno El Mercúrio), José Santos Calderón (dono do jornal conservador colombiano El Tiempo), Mario Vargas Llosa (o nobel peruano conhecido por suas opiniões conservadoras) e além das personalidades, também foram distinguidas com o prêmio empresas jornalísticas com o mesmo tipo de ideologia reacionária estampada de forma explicita em suas produções, como o canal CNN, e os jornais “El Universo” (do Equador) e “La Nación” (de Costa Rica). Só pela lista de prêmiados já dá para ver o tipo de “jornalistas” ou empresas de “comunicação” que essa organização que concede os prêmios busca promover. Mas se formos além da lista dos premiados e verificarmos quem é o fundador da organização, encontraremos que trata-se de um magnata bilionário norte-americano que fundou uma corporação ligada à industria química e exploração do minérios (principalmente o carvão, mas também o nióbio, minério extremamente valioso, do qual o Brasil detêm 90% das reservas mundiais – inclusive o filho desse magnata foi embaixador dos EUA no Brasil, não por acaso). E segundo o Wikipedia, em inglês, o fundador da organização que costuma conceder aos “jornalistas” conservadores e pró-yankis o disputadíssimo prêmio do jornalismo, também fundou uma outra organização que se dedicava a fazer “pressões econômicas, sociais e legais e até técnicas de assédio para bloquear a venda e distribuição de livros que ele desaprova por razões morais.” Entre os escritores que foram perseguidos (e não premiados) pela outra organização fundada pelo magnata da indústria química estão Conrad Aiken, Sherwood Anderson, John Dos Passos, Theodore Dreiser, William Faulkner, Ernest Hemingway, Aldous Huxley, James Joyce, Sinclair Lewis, Bertrand Russell, Upton Sinclair, e H. G. Wells. Com ele é assim: com uma organização ele premiava e promovia (uso o verbo no passado porque ele já morreu, mas seus descendentes e comparsas dão continuidade à missão) os “jornalistas” a fins à sua visão ideológica, e com a outra organização ele perseguia escritores para fazer a vida deles impossível e dificultar que estes publicassem. É esse o tipo de gente que está por trás dessa organização que concede os cobiçados prêmios do jornalismo, logo não é por acaso que seja esse o tipo de gente que recebe tais prêmios, como o CR e os demais citados. Tal organização ( que também possui escritórios no Brasil) é uma dessas organizações que fazem a ponte de contato entre a CIA e os jornalistas dispostos a verder seus serviços à Central de Inteligencia Americana, como relatado pelo jornalista alemão nesta matéria publicada pelo Viomundo. A corporação que concede os prêmios de jornalismo a CR e outros da mesma espécie sempre esteve envolvida com o governo norte-americano, tanto para assuntos políticos como econômicos. Em meados do século passado, o fundador dos tais prêmios do jornalismo e do império industrial químico mantinha conversas com o então presidente norte-americano Eisenhower sobre comunismo, União Soviética, foguetes V-2 e a influência da opinião pública nas políticas governamentais. Mais recentemente (depois que o fundador da corporação morreu), quem foi CEO da corporação entre os anos 80 e 2000 foi também Ministro da Energia no governo de George W. Bush (2004). Além disso a corporação do fundador da organização que concede tais prêmios ao jornalismo também tem sido acusada de estar envolvida no comércio ilegal de coltan no Congo e na compra Certificados de Redução de Emissão de Carbono para ter autorização de atuar na Europa e em outros países onde a legislação ambiental é mais restrita (nos EUA, a corporação foi uma das maiores poluidoras do país entre 1987 e 2000, de acordo com o jornalista Jason Leopold – que certamente, depois dessa revelação, não poderia mais sonhar em algum dia receber o cobiçado “prêmio de jornalismo” que o CR, o Roberto Marinho, o Carlos Lacerda e companhia receberam… ao contrário, Jason Leopold deve ter entrado na lista dos perseguidos pela outra organização do magnata da indústria química, aquela dedicada a perseguir escritores).

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