Venício Lima: Empresas ganham com horário eleitoral “gratuito”

Tempo de leitura: 4 min

Horário eleitoral e direito de antena

No horário eleitoral o que é gratuito é o acesso de candidatos, partidos e coligações aos meios de comunicação. A veiculação do horário eleitoral, porém, não é gratuita. Em 2010, as empresas de comunicação devem ganhar mais de 851 milhões em compensação fiscal.

Venício Lima
, na Carta Maior

Começa no dia 17 de agosto e se estende até 30 de setembro o horário eleitoral no rádio e na televisão. Durante 45 dias, candidatos aos cargos de presidente, governador, senador, deputado federal e estadual estarão em todos os canais de televisão aberta, além dos canais a cabo utilizados pelo Senado Federal, a Câmara dos Deputados, as Assembléias Legislativas e as Câmaras Municipais e também nas emissoras de rádio. No total serão cerca de 63 horas em cada veículo.

O horário eleitoral, garantido pelo § 3º do artigo 17 da Constituição – “os partidos políticos têm direito a recursos do fundo partidário e acesso gratuito ao rádio e a televisão, na forma da lei” – é o que mais se aproxima, entre nós, de um direito fundamental nas democracias: o “direito de antena”.

O “direito de antena” é praticado em países como Alemanha, França, Espanha, Portugal e Holanda e foi positivado pela primeira vez na Constituição portuguesa de 1976 que reza:

Artigo 40.º

Direitos de antena, de resposta e de réplica política

1. Os partidos políticos e as organizações sindicais, profissionais e representativas das atividades econômicas, bem como outras organizações sociais de âmbito nacional, têm direito, de acordo com a sua relevância e representatividade e segundo critérios objetivos a definir por lei, a tempos de antena no serviço público de rádio e de televisão.

2. Os partidos políticos representados na Assembléia da República, e que não façam parte do Governo, têm direito, nos termos da lei, a tempos de antena no serviço público de rádio e televisão, a ratear de acordo com a sua representatividade, bem como o direito de resposta ou de réplica política às declarações políticas do Governo, de duração e relevo iguais aos dos tempos de antena e das declarações do Governo, de iguais direitos gozando, no âmbito da respectiva região, os partidos representados nas Assembléias Legislativas das regiões autônomas.

3. Nos períodos eleitorais os concorrentes têm direito a tempos de antena, regulares e equitativos, nas estações emissoras de rádio e de televisão de âmbito nacional e regional, nos termos da lei.

http://www.parlamento.pt/Legislacao/Paginas/ConstituicaoRepublicaPortuguesa.aspx

Na verdade, trata-se de uma forma de democratizar o acesso aos meios de comunicação de massa. Nas sociedades contemporâneas, a liberdade de expressão é apenas um direito subjetivo se não se garante a pessoas e grupos representativos da sociedade civil acesso ao debate público que (ainda) é, em grande parte, agendado e controlado pelos grandes grupos de mídia.

O acesso é gratuito, a veiculação é paga

O que muitas vezes não fica claro para a maioria da população, todavia, é que no horário eleitoral o que é gratuito é o acesso de candidatos, partidos e coligações aos meios de comunicação. A veiculação do horário eleitoral, não é gratuita. A legislação eleitoral prevê a compensação fiscal para as emissoras de rádio e televisão, regulamentada pelo Decreto nº. 5331/2005.

É uma forma de compensar as empresas de mídia, oferecendo-lhes o benefício da renúncia fiscal, pelas eventuais perdas na veiculação de publicidade de anunciantes. A Receita Federal, na verdade, “compra” o horário das emissoras, permitindo que deduzam do imposto de renda 80% do que receberiam caso o período destinado ao horário político fosse comercializado.

A Receita Federal, de acordo com números divulgados em outubro de 2009, estimou que, em 2010, os custos para os cofres públicos dessa compensação fiscal chegarão a 851,1 milhões de reais. A estimativa, todavia, já está ultrapassada porque o cálculo inicial não incluiu o ressarcimento para as empresas que trabalham dentro do Super Simples e passaram a ter direito ao benefício fiscal após a minirreforma eleitoral de 2009.

De qualquer maneira, para se ter uma idéia de grandeza, os recursos envolvidos na compensação fiscal às empresas de mídia, em 2010, são maiores do que a isenção prevista para o “Programa Universidade Para Todos (ProUni)”, que é de R$ 625,3 milhões; são suficientes para pagar um mês de salário mínimo a 1,5 milhão de pessoas; ou custear, no mesmo período, 12,5 milhões de benefícios do Bolsa Família, no valor mínimo de R$ 68; ou, ainda, repassando o custo ao cidadão, cada brasileiro paga R$ 4,44 para receber informações sobre os candidatos e os partidos políticos.

http://contasabertas.uol.com.br/WebSite/Noticias/DetalheNoticias.aspx?Id=2868

Direito fundamental

No Prefácio do nosso livro “Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa” (Publisher, 2010), o jurista Fábio Konder Comparato, entre outras, fez a seguinte proposta:

“Além dos partidos políticos, devem poder exercer o chamado direito de antena, já instituído nas Constituições da Espanha e de Portugal, as entidades privadas ou oficiais, reconhecidas de utilidade pública. Ou seja, elas devem poder fazer passar suas mensagens, de modo livre e gratuito, no rádio e na televisão, reservando-se, para tanto, um tempo mínimo nos respectivos veículos.”

O início do horário eleitoral no rádio e na televisão possibilita ao conjunto da população brasileira receber informação política sobre todos os candidatos que disputam mandatos nas eleições de 2010, o que é fundamental no processo democrático. Deveria ser também uma oportunidade para que a cidadania se dê conta do quanto ainda estamos comparativamente atrasados em relação à democratização da comunicação ou da universalização da liberdade de expressão no nosso país.

Venício A. de Lima é professor titular de Ciência Política e Comunicação da UnB (aposentado) e autor, dentre outros, de Liberdade de Expressão vs. Liberdade de Imprensa – Direito à Comunicação e Democracia, Publisher, 2010.


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Comentários

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ferrera13

E eu que cheguei a pensar que eles estavam certos!…

Obrigado dr. Lima.

Disse Jesus (em algum canto da Bíblia): "conhecereis a verdade e ela vos libertará.. Pois estou livre desta mentira.

Ed.

Saiu o Globope: Serra "na frente", com 32…Dilma "atrás" com 43… 11 pontinhos!
Tadinha da Eliane Cheirosa…
Amanhã começa o horário eleitoral:
Preparemo-nos para 2 meses de notícias, farsas, mentiras, abafamentos, exaltações, dossiês e demais variações do distinto PIG e seus PIGuinhos amestrados.

HÉLIO TATTU

Sem contar, caro ZéPovinho – falando do criança esperança- a globo divulga que, cada um que doar não receberá o benefício do dedução do imposto de renda. Acontece que, a emissora dos Marinhos, passam a grana para a Unesco e recebe da mesma um recibo, o qual ela apresenta ao Fisco, deduzindo assim, imposto de renda. Ou seja, os otários que ligam para o criança esperança, na verdade estão ajudando a globo a pagar seu imposto de renda. Quanto malcaratismo. Não liguem para o criança esperança, ajude uma criança da sua comunidade, uma entidade assistencial da sua cidade ou do seu bairro, ajude a Apae, ao o Teletoon…sei la, mas nao o criança esperança

PEDRO AUGUSTO

Azenha v o que esta acontecendo ,pq desde o dia 11.08 quarta feira, nao estamos conseguindo acessar o blog do PHA aqui no ES,tem algo estranho. o SERRA mandou alguem dele bloquear, sera???????????

Venício Lima: Empresas ganham com horário eleitoral “gratuito” Horário eleitoral e direito de antena « CartaCapital

[…] *Matéria originalmente publicada no site Vi o mundo […]

ZePovinho

Como se pode ver,as empresas de mídia nunca perdem.Vejam o caso do Criança Esperança da Rede Globo.O sujeito,para poder doar,tem que pagar a tarifa das operadoras privadas de telefonia(que não abrem mão dos lucros) e ainda tem que pagar os impostos.A GLOBO,óbvio,fica com uma parte daquilo que arrecadam as empresas de telefonia por meio da publicidade que é veiculada.
Por que a GLOBO não faz o Criança Esperança em parceria com o UNICEF-o órgão da ONU que cuida das crianças no mundo?Por que a UNESCO????
Se fosse feito via UNICEF não haveria incidência de impostos.Esses só incidem nas doações ao Criança Esperança porque a GLOBO transformou uma boa coisa(ajudar nossas crianças) em atividade LUCRATIVA.
E nem precisa de isenção fiscal,como eles dizem.O lucro é maior quando você paga para fazer as doações ao ligar para eles,sendo que uma parte desse lucro fica na GLOBO.
Como dizia aquele "jornalista" que não gosta de garis:"Isso é uma vergonha!"

Supertramp68

Seria tragico se não fosse no Brasil. Dizer que as empresas ganharão quando deixarão de receber 20% dos valores referentes ao tempo de propaganda é no minimo desonesto. E ainda receberão, a prazo, na dedução do IR.
Na verdade, nós (o povo) é que estamos financiando a campanha na TV e temos que aturar isso por 45 dias. Ninguem merece.

    Carlos

    Quanto as empresas pagam à União pelo uso das frequências?
    Quanto elas recebem pela veiculação de propagandas do poder público nos três níveis?

Mauri Alexandrino

Azenha, cá com meus pobres recursos, tenho insistido há muito, muito tempo, que a Justiça Eleitoral precisa botar fim à frase "horário eleitoral gratuito", com que os apresentadores de telejornais, invariavelmente com cara de quem comeu e não gostou, como determinaram os patrões, anunciam a parada. Isso acontece também quando do horário que os partidos têm direito ao longo do ano. Não é gratuito coisa nenhuma. Daí, é coisa da Justiça Eleitoral impedir que ocorra. Ou será que estou errado?

Carlos.

Quem mais vai se beneficiar com o fim do horário gratuito? Os candidatos que tem a mídia a seu lado… O blog da cidadania, do Eduardo Guimarães está "fora do ar". Alguém sabe o que se passa?

    Vera Pereira

    Ele disse no twitter que é problema técnico.

    Carlos.

    Obrigado.

Pedrão

Isso é um sinal para certa "editora": continue me apoiando, continue fazendo o jogo de enlamear a candidata da situação que, após eleito, vocês terão, garantido, um mercado de 100 milhões de livros ao ano…sem concorrência, nem nada…

    Carlos

    Serve à Abril, mas também à Globo e… e também aos parques gráficos.

    Vera Pereira

    Repararam na cara de felicidade do Paulo Renato de Souza, atrás dele, no vídeo em que Serra faz essa promessa às editoras?

    Carlos

    Todos os grupos de mídia passariam a editar livros didáticos….

Ed.

Donde se conclui que o insistente interesse da mídia conservadora em acabar com o horário eleitoral gratuito não tem nada a ver com perdas de receita.
É puramente interesse político em manter o monopólio da propaganda aos "seus candidatos".

Julio Cesar

Super esclarecedor! Que não era gratuito eu já sabia! O texto deixa bem mais claro pra mim o que vem a ser direito de antena e o quanto muitos grupos ainda estão excluídos de tal direito!!!

    Jairo_Beraldo

    O que eu discordo plenamente. Se é concessão pública, teria que ser 100% gratuito, já que as redes, se "abastecem" com a venda do espaço para divulgar produtos em publicidade.

ZePovinho

Até para sermos cidadãos temos de pagar.É dureza,né Azenha??E o pior é que eu nem gosto de DREHER:

[youtube NOIKKgb8Ajc http://www.youtube.com/watch?v=NOIKKgb8Ajc youtube]

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