Theófilo Rodrigues: Dinheirama do 5G, que a Cisco levou sem debate, ficará nas mãos do genro de Silvio Santos

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A raposa e o galinheiro das comunicações

Por Theófilo Rodrigues*, no Barão

O presidente Jair Bolsonaro anunciou na noite desta quarta-feira o desmembramento do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações em dois.

A Ciência, Tecnologia e Inovação, MCTI, permanecerá com o ministro Marcos Pontes.

Já o Ministério das Comunicações, MiniCom, ficará sob o comando do deputado federal Fábio Faria (PSD).

Até 2016, o governo federal contou em sua estrutura com dois ministérios: o das Comunicações; e o da Ciência, Tecnologia e Inovação. Contudo, uma das primeiras medidas de Michel Temer após o golpe contra Dilma Rousseff foi a fusão dos dois em um único ministério sob comando do presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab.

Naquela ocasião, a sociedade civil brasileira criticou bastante a fusão.

A avaliação era a de que se tratava do primeiro passo para o sucateamento/privatização do setor.

SBPC, ABC, Barão de Itararé e FNDC foram algumas das organizações contrárias ao processo de fusão.

De fato, a preocupação rapidamente se concretizou, como restou demonstrado na intervenção do governo Temer na presidência da Empresa Brasil de Comunicação e, mais recentemente, com a inclusão da mesma EBC no programa de privatizações do governo Bolsonaro.

Agora, paradoxalmente, o desmembramento não é visto com bons olhos pela mesma sociedade civil.

E a razão reside na motivação que levou Bolsonaro a tomar essa decisão.

Aqui cabe um registro: a indicação de Fábio Faria não é trivial.

O deputado é filiado ao PSD, partido presidido por Kassab, que foi o ministro da fusão de Temer.

Trata-se, portanto, de uma clara indicação do “Centrão”, sinal do recente processo de aproximação de Bolsonaro com parte do parlamento para impedir o avanço do seu processo de impeachment.

Bastaria então olharmos para o passado para saber o que virá pela frente.

Quando Kassab assumiu o MiniCom, em 2016, diversas nomeações do mercado configuraram conflitos de interesses.

Aliás, tive a oportunidade de entrar com duas representações no Ministério Público Federal denunciando aquelas nomeações, em particular na presidência da Telebrás e nas Secretarias de Radiodifusão e de Telecomunicações.

Há, no entanto, um elemento novo em jogo que amplia o interesse pela pasta.

Vale lembrar que o governo federal anunciou na semana passada a parceria com a Cisco, empresa americana, para a implementação do 5G no Brasil.

Ainda não há notícias, mas na divisão das pastas, é intuitivo imaginar que o 5G ficará no MiniCom e não no MCTI.

Essa implementação do 5G envolve muito dinheiro e é estratégica para a soberania nacional.

Mas o governo preferiu avançar nessa parceria sem qualquer debate público, seja com o Congresso Nacional, seja com a sociedade civil.

A desconfiança no setor é grande: qual a razão para a chinesa Huawei ter sido preterida? A parceria com a Cisco permitirá a transferência de tecnologia para a indústria nacional?

Além do debate do 5G, há outra questão que merece atenção.

O novo Secretário Executivo do MiniCom será Fabio Wajngarten, que até então dirigia a Secretaria de Comunicação Social.

Até o momento, a SECOM fazia parte da Secretaria de Governo da Presidência.

Agora, a SECOM passará a fazer parte do MiniCom.

Como se sabe, a SECOM é a responsável por todas as verbas públicas de publicidade do governo federal que alimentam empresas de comunicação no país.

Por coincidência, Fábio Faria é casado com a filha de Silvio Santos, dono do SBT.

Dito de outro modo, caso não tenha ficado claro: o genro do dono do SBT será o responsável por distribuir as verbas de publicidade do governo para o próprio SBT. Conflito de interesses?

Não sei como dizem por aí, mas na minha terra chamam isso de “a raposa cuidando do galinheiro”.

*Theófilo Rodrigues é pesquisador e coordenador do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé no Rio de Janeiro


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Zé Maria

Da Série: “Mito do Centrão Queima a Língua Outra Vez”
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Carlos Cardoso

No Nordeste essa turma é a direita ou a turma da “bufunfa”, que sobrevive de cargos públicos.

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