Salomão pede apuração de chacina de indígenas bolivianos na fronteira com o Brasil: ”Fortes indícios de uso de armas de fogo e tortura”; vídeo

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Presidência da CDHM pede apuração sobre o assassinato de 4 indígenas bolivianos na fronteira com o Brasil

Por Pedro Calvi, CDHM

A presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM) recebeu denúncia sobre o assassinato de quatro indígenas do povo Chiquitano, na cidade de Cáceres (MT), na fronteira de Mato Grosso com a Bolívia.

Eles teriam sido mortos, no dia 11 de agosto, pelo Grupo Especial de Fronteira (Gefron) durante um suposto confronto com traficantes.

Os policiais alegaram que o grupo estaria armado, mas nenhum integrante do Gefron foi atingido e nenhuma droga foi apreendida.

A denúncia foi feita pelo Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de Mato Grosso (CEDPH-MT) e pelo Fórum de Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso (FDHT-MT).

De acordo com familiares, os indígenas Paulo Pedraza Chore, Ezequiel Pedraza Tosube, Yonas Pedraza Tosube e Arcindo Sumbre García estavam caçando e não tinham relação com o tráfico de drogas.

O Gefron afirma que os policiais patrulhavam a zona rural e encontraram homens armados em uma região de mata.

Pediram, então, que o grupo parasse, mas os suspeitos teriam reagido e atirado.

Durante uma diligência feita ao local pelos denunciantes, as famílias relataram sinais de tortura nos corpos das vítimas e marcas de muitos tiros em árvores.

“Há fortes indícios de uso desproporcional da força, emprego absurdo de armas de fogo contra os indígenas e tortura. As informações coletadas pela diligência também apontam que a chacina trouxe terror e desestabilização comunitária, além da fragilização das famílias que perderam seus arrimos”, destaca o presidente da CDHM, Helder Salomão (PT/ES).

No último dia 11, sexta-feira, Salomão pediu a Eliana Torelly de Carvalho, da 6ª Câmara de Coordenação e Revisão da Procuradoria-Geral da República, Francisco dos Santos Sobrinho, coordenador da 7ª Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional do Ministério Público Federal, e Rolando de Souza, diretor-geral da Polícia Federal, providências para investigar e elucidar os “gravíssimos fatos relatados, bem como apurar a responsabilidade pelas mortes”.

Reportagem da Folha de S.Paulo informa que a imprensa boliviana aborda o caso como homicídio e o Ministério Público boliviano apresentou queixa ao governo brasileiro contra o Gefron.

Os indígenas do povo Chiquitano vivem em território dos dois países, nos municípios de Cáceres, em Mato Grosso, e San Matías, no lado boliviano.

Corpos de indígenas assassinados tinham sinais de tortura. Foto: CEDPH-MT e FDHT-MT

Chacina de indígenas chiquitanos segue impune e mobiliza organizações sociais do Brasil e Bolívia

Caso completa um mês esta semana; Polícia brasileira que atua na fronteira do Mato Grosso é acusada de atuação criminosa

Por Nanda Barreto, da Assessoria de Comunicação do Cimi 

Quatro chiquitanos foram assassinados no dia 11 de agosto, em território brasileiro, próximo à comunidade de San José de la Frontera, na Bolívia.

Os indígenas estavam caçando quando foram surpreendidos por agentes do Grupo Especial de Fronteira (Gefron) – núcleo da polícia do Mato Grosso que faz a segurança da região.

Após denúncias sobre o caso, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e outras organizações de defesa dos direitos humanos enviaram, na semana passada, um grupo de trabalho para investigar os fatos in loco.

Os relatos indicam atuação criminosa do Gefron.

Para a polícia, Paulo Pedraza Chore, Ezequiel Pedraza Tosube, Yonas Pedraza Tosube e Arcindo Sumbre García seriam suspeitos de tráfico.

No entanto, a abordagem revelou que eles portavam apenas carne de animais silvestres e instrumentos de caça – ou seja, nenhuma droga ou a algo que remeta à comercialização de ilícitos.

Meire Choré é viúva de uma das vítimas e exige justiça.

“Eram meu marido, meu irmão e dois sobrinhos. Eles saíram cedo pro mato e quando deu cinco horas da tarde só os cachorros voltaram da caça. Nossos familiares, não”.

A análise dos corpos das vítimas mostrou sinais de tortura.

“No dia seguinte, nós soubemos que os corpos estavam no hospital. Meu marido foi quebrado no queixo, levou tiro, parte do corpo dele estava em carne viva. Nestes tempos de pandemia, estamos com pouco trabalho. Eles aproveitaram um dia de folga para sair, pois dependemos da caça para colocar comida na mesa”, salienta Meire.

Com base nas informações colhidas, as organizações sociais encaminharam um ofício às autoridades brasileiras – de todas as instâncias – exigindo a apuração dos fatos.

O documento pode ser lido aqui.

Mobilização internacional

De acordo com Gilberto Vieira dos Santos, coordenador do Cimi Regional Mato Grosso, o próximo passo é denunciar o caso em cortes internacionais de direitos humanos.

“Nossa batalha é para que haja uma investigação independente e imparcial, que levante todos os elementos desta chacina. A caça é um fator de sobrevivência para os chiquitanos. Trabalharemos para que este crime não fique impune”, salienta Gilberto, indicando que as organizações sociais não vão retroceder enquanto o caso não for devidamente solucionado.

Maria Surubi Paticu é cacique geral do povo e reivindica respeito dos governos do Brasil e Bolívia (veja vídeo no topo).

“As caçadas e pescas fazem parte dos costumes dos povos originários e nós não dividimos esta prática por fronteiras. Pedimos às autoridades que nos resguardem e não nos amedrontem. Sabemos que há policiais bons e policiais maus. Necessitamos que nos tratem com respeito: somos indígenas, mas somos seres humanos”, sustenta.

Direitos sem fronteiras

A fronteira seca entre os dois países não é marcada por nenhuma delimitação na região.

Além disso, o líder indígena Soilo Urupe Chue ressalta que os chiquitanos devem ter seus direitos garantidos nos dois países.

“Esteja na Bolívia ou no Brasil, o povo chiquitano é um só, independente da nacionalidade. Nós não criamos as fronteiras – esta coisa de país pra cá e país pra lá. Pra nós, isso não existe. O que existe é a territorialidade onde a gente vive com nossos costumes, nossas crenças e nossa língua”.

Para a indígena Antonia Arteaga Tosube, moradora da comunidade, o caso ficará marcado para sempre com dor e tristeza na história dos chiquitanos.

“Nós deveríamos viver como irmãos de fronteira. Mas não foi assim. Eu sinto muito, pois em todo este tempo que eu vivo aqui, nunca havia passado por estas coisas. Eles saíram de casa com destino de caçar e encontraram a morte. Voltaram para nós dentro de um caixão”, lamenta.

Soilo destaca a importância de que a situação sirva como mais um alerta para que as autoridades dos dois países garantam o direito de ir e vir dos chiquitanos.

“Queremos que apurem este caso com a maior celeridade possível e não criem mais conflitos pra nós”.

* Com fotos e informações do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de Mato Grosso – CEDPH-MT e do Fórum de Direitos Humanos e da Terra de Mato Grosso – FDHT-MT


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Comentários

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a.ali

entre governo brasileiro e boliviano difícil indicar o mais OMISSO…

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