Pedro Galindo: Instituto sueco mostra que Brasil está entre os 10 países onde a democracia mais se deteriorou

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Policiais militares do DF rezam pelo presidente Jair Bolsonaro. Foto: Anderson Riedel/PR

Brasil entre os 10 líderes de um mundo em “autocratização viral”

Por Pedro Galindo, em seu blog, via whatsapp 

Não que essa seja exatamente uma novidade ou algo surpreendente.

Mas na edição 2021 de seu estudo anual Democracy Report, publicada esta semana, o Instituto V-Dem mostrou de maneira indiscutível o que os brasileiros vêm sentindo na pele nos últimos anos: o país vive um acentuado processo de autocratização (veja PS do Viomundo), e está entre os 10 países onde a democracia mais se deteriorou em 2020.

De acordo com o estudo, desenvolvido desde 2017 por uma equipe multidisciplinar do Departamento de Ciências Políticas da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, a autocratização se espalhou pelo planeta, e atualmente mais de um terço (34%) da população mundial vive sob regimes em que esse processo avança.

A quantificação desses retrocessos é feita a partir de seis indicadores, que analisam desde a qualidade do processo eleitoral até o índice de participação da sociedade civil nas decisões.

E em cada um deles, o Brasil apresentou um declínio que traduz, em números, os danos à democracia desde o golpe contra Dilma Rousseff em 2016, acentuados a partir de 2019, quando o atual presidente, Jair Bolsonaro, tomou posse.

A publicação cita os ataques do capitão reformado à imprensa.

“Censura oficial e hostilidade à mídia não partidária está crescendo com firmeza no Brasil, particularmente depois que o populista de direita Bolsonaro se tornou presidente em janeiro de 2019, incluindo disseminação de informação falsa por parte do governo.”

No estudo, há a constatação de que em todos os países onde a autocratização avança, existe uma “cartilha”, um padrão de ação por parte dos seus líderes, que não costumam atacar imediatamente o coração da democracia – só o fazem depois de golpear e enfraquecer instituições de controle e a própria sociedade, um processo que no Brasil de 2021 parece consolidado.

“Primeiro, eles tentam controlar a mídia, bem como a academia e a sociedade civil. Além disso, desrespeitam os oponentes políticos, e alimentam a polarização usando a máquina do governo para espalhar desinformação. Só depois de avançar em todas essas frentes, é hora de um ataque ao núcleo da democracia: eleições e outras instituições formais”.

                                              Fonte: Democracy Report 2021 (V-Dem)

Entre os seis indicadores usados na mensuração, chama atenção a posição do Brasil no ranking mundial dos componentes igualitário (ECI) e deliberativo (DCI).

O primeiro deles, como o nome sugere, está ligado às desigualdades sistêmicas do país, enquanto o segundo diz respeito ao peso da razão e do bem comum nas decisões políticas, em contraponto a apelos emocionais, interesses paroquiais ou coerções.

Pois bem, em relação ao componente de igualdade (ECI), o Brasil é apresentado pela publicação como o 140º entre os 179 países investigados no estudo.

Aparece logo abaixo de Fiji (139º) e logo acima da Etiópia (141º).

Em 2017, ano da publicação do primeiro Democracy Report, o país era o 114º no quesito.

Já no que tange ao grau de deliberação precedente às decisões políticas, o Brasil é o 136º, abaixo da República Centro-Africana (135º), porém acima da Somalilândia (137º).

Em relação a 2017, quando o país ocupava o 108º lugar neste ranking, foi ultrapassado por 28 países.

Década de retrocesso

Apesar de estar apenas na sua 4ª edição, o Democracy Report compara os dados obtidos em 2020 aos indicadores apresentados pelos países 10 anos antes.

E é aí que a situação brasileira se mostra mais dramática: em 2010, o Brasil marcava 0,79 pontos no índice de democracia liberal (LDI), o quesito mais pesado do estudo.

Só para fazer um paralelo, foi a pontuação que a Coréia do Sul obteve este ano, e que a elevou ao grupo das 20 democracias mais fortes do planeta.

De 2010 até 2020, o Brasil apresentou uma variação de -0,28 pontos – foi o 4º país que mais regrediu no indicador em todo o mundo –, e hoje marca apenas 0,51, não sendo mais considerado sequer uma democracias entre as 50 mais robustas.

Fundamentos

Apesar de tantos reveses ao ambiente democrático no Brasil, o estudo ainda considera o país uma “democracia eleitoral” – um conceito que se baseia no cumprimento dos princípios liberais clássicos, por meio de seis garantias institucionais:

— Representantes eleitos

— Eleições livres e justas

— Liberdade de expressão

— Fontes alternativas de informação

— Liberdade de associação

— Cidadania inclusiva

Mesmo assim, só uma virada considerável no rumo dos acontecimentos pode evitar que o Brasil continue despencando no ranking anual do V-Dem.

Enquanto isso, seu povo tenta sobreviver à pandemia e ao genocídio enquanto assiste, perplexo e inerte, ao sufocamento das instituições democráticas do país.

Até aqui, Jair Bolsonaro nunca hesitou em enfraquecer, quando teve chance, a jovem democracia brasileira: antagonizou a mídia, armou milícias, desmoralizou as instituições e calou opositores. Seguiu, com louvor, cada ponto da “cartilha” do autocrata.

Ninguém poderá se dizer surpreso quando ele se aproveitar das Eleições de 2022 para tentar seu derradeiro ataque.

PS do Viomundo:  Autocratização é o oposto de democratização. Refere-se à concentração de poder nas mãos de um líder forte, que afirma conhecer a “vontade do povo” e governar em seu nome. Direitos fundamentais, como a liberdade de expressão, e os princípios democráticos básicos, como a separação de poderes, ficam suspensos ou sob ameaça. Líderes autocráticos esforçam-se para estender seu mandato para além de quaisquer restrições. Alguns reivindicam sua permanência no poder de forma vitalícia. As informações são da SWI swissinfo.ch

Abaixo, a íntegra do relatório


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