Pedro dos Anjos: Fernando da Porsche e Rafael Braga do Pinho Sol

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Por Pedro dos Anjos

A velha rádio relógio, na era analógica, seguia um padrão.

Antes do badalo e da voz humana anunciarem a hora e o minuto seguinte, era sempre lida uma curta mensagem.

Tinha muita platitude e propaganda negacionista da ditadura civil-militar, mas de vez em quando aparecia algum sinal de inteligência.

Lembro de um, muito marcante, cujo significado pleno me escapou, pois eu tinha somente 11 ou 12 anos de idade: “A visão do mundo não depende dos olhos”.

Anos mais tarde, assisti o filme “O Conformista” de Bertolucci onde um dos personagens, um radialista fascista, era cego.

Já na película do Fernando Meirelles adaptada do livro do Saramago “Ensaio Sobre a Cegueira”, entre os cegos, despontavam psicopatas que não devem nada àqueles do mundo real em matéria de perversidade.

E precisamente neste soube, por fonte confiável, que para a tomada de decisões o doutor” Roberto Marinho se aconselhava com um grupo de cegos, além de outros.

Então, visões de mundo estão por aí, em cada ser social, podendo ser reconhecidas por dentro pelo que são, com ou sem auxílio dos olhos.

Ao se debruçarem sobre fatos, elas os julgarão de modo mais explícito ou encoberto, desvelando a sua índole.

Fato 1: Madrugada de 31/03/24. O empresário Fernando Sastre de Andrade Filho, 24 anos, com sua milionária Porsche colidiu a 156km/h na traseira do Sandero de Ornaldo da Silva Viana, 52 anos, motorista de aplicativo, que foi morto no incidente.

A máxima velocidade permitida na via era 50km, o motorista não foi submetido a bafômetro e até a publicação deste artigo responde a indiciamento criminal solto.

Fato 2: 20/06/2013. Rafael Braga, negro, catador de latas, então com 25 anos, foi preso, seviciado e condenado a longa pena por crimes que não foram minimamente comprovados.

O Pinho Sol, que carregava quando abordado numa batida policial, foi arbitrariamente apontado como produto a ser usado por ele na fabricação de bomba “molotov”. Em outra ocasião, a maconha e cocaína encontradas com Rafael, na verdade, foram “plantadas” por policiais.

Se a rádio relógio fosse recriada hoje à moda antiga, em relação ao playboy Fernando da Porsche e ao catador de latas Rafael Braga do Pinho Sol, uma mensagem baseada em uma visão terraplanista do mundo, provavelmente leria: “No Brasil, não existem classes em luta e tampouco racismo.”

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