Maringoni: A lógica intempestiva de Uribe

Tempo de leitura: 4 min

31 de Julho de 2010 – 18h08

Por Gilberto Maringoni, em Carta Maior, via Vermelho

A ruidosa ofensiva desencadeada pelo presidente colombiano Álvaro Uribe contra a Venezuela, a poucos dias do final de seu mandato, pode ser debitada a pelo menos dois fatores que se completam.

O primeiro e mais evidente diz respeito ao papel crescente que a Colômbia vem desempenhando na geopolítica regional como o de fiel representante dos interesses dos Estados Unidos. Para isso, o país tem de se contrapor de maneira firme aos governos progressistas na região.

Como não seria produtivo estabelecer uma oposição em bloco a Argentina, Brasil, Bolívia, Equador, Paraguai e Uruguai, Uribe elegeu seu alvo: Venezuela. O vizinho seria responsável por apoiar e abrigar em seu território destacamentos das Farc. As provas para sustentar tal acusação, apresentadas em reunião da OEA, são no mínimo discutíveis. Fotos de pessoas uniformizadas no meio do mato não dizem muita coisa.

Acordo militar

As relações entre os dois países conheceram altos e baixos nos últimos anos, mas se deterioraram acentuadamente a partir de julho de 2009, quando o presidente colombiano anunciou publicamente o fechamento do acordo de cooperação militar com os Estados Unidos. O ponto principal do entendimento, como se sabe, prevê a instalação de sete bases militares no país, sob a justificativa de que elas possibilitarão “uma oportunidade única para operações de espectro completo em uma subrregião crítica de nosso hemisfério, onde segurança e estabilidade estão permanentemente ameaçadas pelo narcotráfico, patrocinando insurgências terroristas, governos anti-Estados Unidos, pobreza endêmica e desastres naturais recorrentes”. A frase foi tirada do Programa de construção militar , divulgado em outubro do ano passado.

O líder venezuelano Hugo Chávez percebeu que a ameaça se dirigia especialmente contra seu país e bateu duro no tratado. O presidente Lula, ainda em agosto, contatou Barak Obama, pedindo explicações sobre o acordo. Uribe se isolou entre os países da Unasul, apesar da reunião de chanceleres, realizada nesta quinta, 29 de julho, em Quito, não ter deliberado sobre a questão das disputas entre Colômbia e Venezuela.

Por isso, é vital para a Colômbia levar suas pendências internacionais para outro fórum, a OEA, onde o peso dos Estados Unidos é determinante.

Disputas domésticas

Mas houve também motivações internas para a investida de Uribe, justamente nos dias em que o presidente eleito Juan Manuel dos Santos, em um giro pela Europa, anunciava a vontade de distensionar as relações com o país vizinho.

Quais as razões de Uribe para torpedear qualquer tentativa de aproximação? Santos representaria, de fato, outra linha a ser seguida pela política externa da Colômbia?

Parece pouco provável. O novo mandatário não apenas segue a mesma linha de aproximação com os EUA e de militarização crescente das disputas políticas, como era um dos membros do núcleo duro do governo Uribe, no qual desempenhou a função de Ministro da Defesa.

Onde estariam as diferenças entre ambos, se é que existem?

Apesar de toda a proximidade entre ambos, Santos não era o candidato preferido de Álvaro Uribe na disputa presidencial. O candidato dos sonhos de Uribe era Uribe, que não pode entrar na disputa porque a Suprema Corte vetou seu projeto de tentar uma segunda reeleição. Sem um nome viável, Uribe teve de aceitar a postulação de seu Ministro da Defesa, que não teve dificuldades em obter uma vitória eleitoral relativamente tranquila, nas águas da popularidade do presidente da República. Uribe desfruta de altos índices de aceitação no fim de seu mandato, especialmente entre uma população cansada por décadas de violência institucionalizada.

A aliança militar com os EUA foi alicerçada numa forte propaganda, baseada em duas premissas. A primeira era de que as Farc não seriam um grupo guerrilheiro, mas uma organização terrorista, nos moldes da Al Qaeda. A segunda, decorrente da anterior, era a de que numa situação dessas não haveria negociação possível. A solução seria um enfrentamento militar. Com isso, não apenas as forças de segurança do Estado se viram com mãos livres para agir, como os grupos paramilitares de direita contaram com a vista grossa oficial para cometerem qualquer tipo de crime.

Santos foi um dos formuladores dessa política. Sua diferença com Uribe é de outra ordem.

Duas oligarquias

Figura secundária da cena política colombiana até oito anos atrás, o atual presidente era um líder regional, governador de Antioquia, um dos 32 Departamentos do país, e membro da oligarquia local. Foi um firme opositor da política de negociação com a guerrilha, levada a cabo pelo ex-presidente Andrés Pastrana (1996-2002). Com este mote construiu a campanha que o levaria a vitória em 2002.

Juan Manuel dos Santos, por sua vez, é originário de uma linhagem tradicional da burguesia. Seu tio-avô, Eduardo Santos, presidiu o país entre 1938 e 1942. A família é dona do mais importante jornal colombiano, El Tiempo, fundado em 1911 e recentemente vendido ao grupo espanhol Planeta. Por fim, seu primo, Francisco Santos é vicepresidente de Álvaro Uribe. Ou seja, o novo presidente não é uma sombra de seu antecessor, mas membro destacado das classes dominantes locais. Para estas, Uribe cumpriu um bom papel, mas seria apenas um novo rico emergente.

Sabendo do jogo e com receio de sair definitivamente de cena num momento em que a elite tradicional reassume o centro do palco, Uribe resolveu imprimir sua marca para continuar presente na disputa política local. Com todo o beneplácito do Império e da grande imprensa do continente.

Uma nota final

Todo o espalhafatoso jogo de cena relatado acima vem bem a calhar a outra figura da direita continental. Pode não haver articulação direta, mas José Serra e seu folclórico candidato a vice pegaram no ar a pauta lançada por Álvaro Uribe. Agora tentam envenenar a campanha presidencial brasileira com a risível acusação de que o Partido dos Trabalhadores estaria “envolvido com as Farc e com o narcotráfico”. Por sorte, o terrorismo eleitoral não pega mais por aqui, apesar de toda a insistência da imprensa brasileira.


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Comentários

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Marco Aurelio

Digite o texto aqui![youtube 2-_lCIQxIkI http://www.youtube.com/watch?v=2-_lCIQxIkI youtube]

Marco Aurelio

Digite o texto aqui![youtube JjCsDTG3Rwk http://www.youtube.com/watch?v=JjCsDTG3Rwk youtube]

Milton Hayek

Digite o texto aqui![youtube Fnm7trO2Liw http://www.youtube.com/watch?v=Fnm7trO2Liw youtube]

simas

Espera, aê. Não estou entendendo, nada. Afinal, qual é o papel dos paramilitares, q a imprensa, maldita, não bombardeia com suas "melâncias"? E as negociações do Pres Patrana com a guerrilha das Farc não tiveram qq êxito, por qual razão? Seria verdade q aconteceu um tremendo contratempo, nos finalmentes dessa negociação; inclusive, com o assassinato de alguma figura, importante? Sei, não: mas, acho q ali, vigora a lei do bang-bang… Já foram convidados jornalistas, brasileiros, pra acompanhar o desenrolar do novelo… Essa gente voltou e ficou… calada? Eu sinto, q essa análise, acima, está mto… romantizada. Algo de mais podre, existe por debaixo desse pano. E, tanto, q os EEUU resolveram investir, antes q tudo vá ou fosse por águas à baixo, de vez… Carta Maior bem q poderia desenrolar o novelo, todo, heim? Qual é o "pobrema", afinal?

Fabio SP

Eu não sabia que tinha BRASIGUAIOS armados sequestrando e matando brasileiros aqui do lado de cá!?!?

    Jairo_Beraldo

    Tem sim. Em Ponta Porã(BRA) e Juan Pedro Caballero(PAR) existe uma guerrilha pelo controle do narcotrafico, e de trafico de armamento de alta precisão.A Record mostrou reportagem recentemente em seu JR.

Angelo Frizzo

Eles continuam achando que TODO mundo é completamente imbecíl. Pensam que ninguém tem internet ou lê livros e publicações estangeiras. O narco-governo uribe provavelmente será piorado pelo que vem aí. Temos que estar atentos pois a nossa tal de "grande imprensa", se puder, provocará uma guerra contra a Venezuela. Já tentaram provocr outras contra a Bolívia. Paraguai, Argentina, etc. Nossa mídia trrorista é assim mesmo.

Ed.

A resposta de Lula sobre o "conflito" (que é no máximo uma "crise"), foi claramente diplomática , colocando "panos quentes" na questão feita pelo repórter, no estilo PIG/Galvão de primeiro afirmar algo e depois perguntar o que acha".
Uribe, com o evidente intuito de tumultuar qq.coisa a uma semana de passar o bastão, pensou:
"Tô aqui tentando tumultuar e vem aquele baixinho amenizar, pô!"… "vou aproveitar e atrapalhar as eleições lá também"".
E o PIG repercute… Parece até uma orquestra, um trabalho centralizado por alguma agência…

PS: O legal foi Lula ignorar o "narcopresidente" e tratar do assunto diretamente com seu sucessor, hehe

Marat

Está chegando o momento apropriado de Uribe retirar-se à sua insignificância, porém, sabendo como ele é, ainda vai nos "brindar" com suas idiotices por muito tempo… Mas ainda há uma esperança: ele poderia mudar-se para o paraíso dos gusanos, Miami, e convidar o Serra, para, juntos, traçarem planos diabólicos…

heraclitus fracus

Se a presença de estrangeiros do outro lado da fronteira fosse crime, os BRASIGUAIOS, estariam ferrados uma hora destas, já que qualquer jornalzinho idiota, ou algum outro manipulador da tragédia humana de não se conseguir uma vida digna em seu país, poderia facilmente criar uma situação saia-justa, igualzinha a esta do mercenário americano Uribe!

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