Marco Aurélio Mello, de Montreal: As conexões e a sincronicidade no FSM

Belíssimas companhias: Jöel, Marco Aurélio Mello e o Paço das Artes. Fotos: Marco Aurélio Mello

por Marco Aurélio Mello, de Montreal, Canadá, especial para o Viomundo

A hospedagem é simples. O responsável pela casa, Jöel, é filho de congoleses. É esse acima comigo.

O pai veio para um mestrado em anestesia aqui no Canadá vinte e seis anos atrás, trouxe a família e nunca mais voltou. Pergunto se ele se considera um canadense. Definitivamente, ele responde. Jöel tem 27 anos, é formado em Recursos Humanos e é um ativista da causa dos negros em nível internacional.

Ao lado de casa me deparo com uma enorme sede da igreja Universal.

É impressionante o poder que eles acumularam mundo afora. Pesquiso na internet e descubro que só aqui no Canadá são cinco unidades.

Poucos quarteirões adiante, uma instituição que aqui no Canadá é gigante: os escoteiros.

Um movimento que no Brasil é pequeno. Criado no início do século passado por um inglês, Robert Baden-Powell, os escoteiros e seus ideais, assim como a igreja, também se espalharam pelo planeta. Mas, ao contrário da Universal, seus ideais são educacionais, voluntários, apartidários e sem fins lucrativos.

No entanto, por incrível que pareça, um sistema de valores baseado na promessa (compromisso) e em regras (ordens) aproxima a igreja dos escoteiros. Ainda que lealdade, fraternidade e disciplina não tenham para os dois o mesmo significado.

Nesta altura você deve estar se perguntando: o que Jöel, Universal e escoteiros tem em comum? É que, na tarde de ontem, fiquei admirado ao saber que Jöel é músico nas horas vagas. E que sabe muito de música brasileira. Listou mais de uma dúzia de artistas do meu país e seus sons característicos.

Para nós brasileiros, afeitos a uma auto-imagem de vira-latas, qual não é o tamanho do nosso patrimônio artístico? Para se ter uma ideia da nossa importância, Tom Jobim é uma das figuras estampada no Paço das Artes, espaço onde anualmente se realiza um dos mais importantes festivais de Jazz do planeta.

A certa altura Jöel e eu estávamos discutindo os afro-sambas e o encontro de Vinícius de Moraes e Baden Powell. Ops, Baden Powell? Mas não é o mesmo nome do pai dos escoteiros? Sim. Bom, mas onde entra a igreja nesta coincidência, se é que podemos chamar coincidência? Foi a perseguição da TV Globo ao bispo Edir Macedo que desencadeou a disputa que atraiu um grupo de jornalistas a trocar de emissora há quase dez anos. Entre eles, Luiz Carlos Azenha e eu, que fomos para a TV Record, mantida pela bispo e sua igreja.

Foi na Record que estreitamos nossos fortes laços e, hoje, somos parceiros neste projeto de cobrir o Fórum Social Mundial. Mas volto ao ponto da coincidência. Não acredito em coincidências como uma série de eventos aleatórios que se combinam. Prefiro o conceito de sincronicidade. Explico. Todos estes acontecimentos que acabei de contar não são meras relações causais, elas se integram por seus significados.

Simplificando, quando dois ou mais eventos coincidem de forma significativa, obedecendo a um padrão temos um “insight”, um estalo. Parece papo de maluco, não é mesmo? Mas quem inventou toda essa história não fui eu, foi um dos mais renomados psicanalistas da história, Carl Gustav Jung. O pai dos conceitos de arquétipo e inconsciente coletivo demorou 21 anos para desenvolver a tese de sincronicidade.

Portanto, quando penso sobre como vim parar no Canadá, nestas condições e neste contexto, não consigo deixar de considerar a força de uma energia superior, um padrão, um “estar no mundo” que nos conecta. O Fórum Social Mundial é uma oportunidade de explorar estas coincidências e de descobrir como há pessoas interessadas em se associar para lutar por um mundo melhor.