Maister da Silva: O Ministério do Silêncio ameaça a democracia

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Golbery do Couto e Silva. Reprodução

Do SNI à ABIN, o Ministério do Silêncio

por Maister F. da Silva*

A esquerda brasileira urra contra os formadores de opinião, estrategistas e formadores das bases ideológicas, políticas e militares da direita, mas se nega a estudá-los.

Estudar Golbery do Couto e Silva, um dos personagens mais emblemáticos da direita e da história brasileira, que adquiriu maior relevância nos anos do golpe de 1964 – tido por muitos como o mentor intelectual do golpe – é tarefa preponderante, especialmente hoje.

Golbery estruturou o famigerado Serviço Nacional de Informações (SNI), responsável por ser o olho vigilante da ditadura militar, o SNI estava em todos os espaços de vida coletiva, onde quer que estivesse o SNI estava lá, vigilante.

O SNI deixou de existir, virou ABIN, aumentou o nível de vigilância e manteve-se apegado aos seus princípios fundadores, conservador e antidemocrático.

Tão antidemocrático e sem controle que levou mesmo Golbery a arrepender-se de sua criação e declarar ainda durante o processo de abertura democrática que havia criado “um monstro.”

A história do “Serviço”, como é conhecido entre a comunidade de agentes secretos brasileiros, é narrado com riqueza de detalhes no livro “O ministério do silêncio”, de Lucas Figueiredo, jornalista investigativo.

Tudo começou em 1927, no governo de Washington Luís.

Naquele ano, foi criado um órgão civil federal, o Conselho de Defesa Nacional, que tinha como missão exclusiva produzir e analisar informações relativas à proteção do Estado.

Estava longe de ser um serviço secreto, mas foi a gênese.

O Serviço seria legalmente instituído em 1946, na gestão de Eurico Gaspar Dutra, permaneceria dez anos somente no papel e seria implementado de fato apenas em 1956, por Juscelino Kubitschek. Juscelino por imposição do Governo dos EUA e da CIA criou o Serviço Nacional de Informação e Contra-informação (Sfici), uma comitiva brasileira chegou a viajar aos EUA para aprender, com o FBI e a CIA, técnicas de caça aos comunistas.

Um dos integrantes da comitiva era o jovem capitão Rubens Bayma Denys, que mais tarde se tornaria General e Ministro de Estado nos governos José Sarney e Itamar Franco.Nesse texto breve não é necessário nos atermos ao que o Serviço fez nos anos de chumbo da ditadura civil-militar, todos sabemos.

Na década de 1990 os serviços secretos do mundo todo foram reposicionados, a queda do muro de Berlim afastou a ameaça comunista e as agências buscaram novos inimigos.

O SNI deixou de existir em 1999 e tornou-se ABIN, por aqui o inimigo continuou o mesmo, a ABIN atua prioritariamente em território nacional, bisbilhotando a vida do cidadão brasileiro, desde o SNI o foco sempre foi o “inimigo interno”.

Para a ABIN, os movimentos sociais e os partidos de esquerda continuaram sendo vistos como uma ameaça em potencial ao país, um alvo a ser vigiado e combatido, independentemente se atuam dentro ou fora da lei.

Prova disso é que durante o primeiro Governo de Luis Inácio Lula da Silva, a resolução final do primeiro Encontro Técnico dos Serviços de Inteligência dos Países da América do Sul, patrocinado pela Abin, em outubro de 2003, o serviço secreto brasileiro combinava, com seus parceiros, vigiar os movimentos que tratavam da “questão da pobreza” – leia-se, quem organiza pobres — por temer que eles pudessem “representar ameaças, preocupações ou desafios a interesses estratégicos dos países da América do Sul”.

Lula, o inimigo número um do Serviço, seu nome constava de informes confidenciais do órgão desde 1977, quando tinha então 31 anos de idade e era um sindicalista pouco conhecido da região do ABC paulista.

Até se tornar presidente da República, Lula encarnara exatamente aquilo que o Serviço fora programado para conter: conflitos sociais represados no país durante cinco séculos. General Augusto Heleno, que dirige o Gabinete de Segurança Institucional – um SNI reformado – é desse tempo, assim como Braga Neto e quase todos os generais em postos chave do governo Bolsonaro.

Não é exagero afirmar que Getúlio, Juscelino, Jango e Dilma foram vítimas do Serviço.

Juscelino era um democrata, eleito democraticamente.

Lula, um democrata, eleito democraticamente e o presidente que mais lutou contra a pobreza no país.

São exemplos de que o Serviço mesmo em governo eleitos democraticamente, tem vida própria, é antidemocrático, chantagista e super poderoso, acostumado a agir na impunidade.

O Serviço foi criado para ser o longo braço das Forças Armadas e para que governo e Forças Armadas possam agir nas sombras quando lhes é conveniente, mas deve obediência, sobretudo, as Forças Armadas.

Golbery dizia que o serviço secreto nasceu para ser o Ministério do Silêncio.

*Maister F. da Silva é Militante do Movimento dos Pequenos Agricultores e membro do FRONT – Instituto de Estudos Contemporâneos


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