Luis Branco: O homem do lixo

Tempo de leitura: 3 min
A queda de Murdoch é uma boa notícia para a liberdade de imprensa e para a democracia, independentemente do terramoto político que venha ainda a provocar.

por Luís Branco, no Esquerda.Net

O caso das escutas ilegais em Inglaterra parece dar início à queda de Rupert Murdoch, o magnata da News International. Este grupo de comunicação dispôs de uma autêntica rede de espionagem sobre políticos, celebridades e não só: os investigadores deste escândalo confirmam 4000 pessoas na lista de alvos de vigilância do detective privado suspeito de violar os “voice mails” dos telemóveis.

O News of the World, tablóide campeão de vendas ao domingo, pagou durante anos a agentes e responsáveis policiais para obter informações confidenciais sobre gente poderosa, entre eles alguns adversários do grupo. A violação dos “voice mails” foi denunciada primeiro pelo príncipe William e a investigação que condenou um editor e um detective privado apontava para a existência de apenas mais oito pessoas escutadas da mesma forma. O responsável pela investigação foi Andy Hayman, o oficial de polícia que liderou o contraterrorismo em Inglaterra entre 2005 e 2007, altura em que foi obrigado a demitir-se sob suspeita de fazer despesas sumptuárias. Foi então contratado como colunista dos jornais do grupo News International

Os tablóides ingleses de Murdoch lucraram quase 100 milhões de euros em 2010, um dos anos mais complicados para os grupos de imprensa. A ambição do magnata era comprar a totalidade da cadeia televisiva BSkyB e aumentar ainda mais a influência que já tem sobre a política do país: Andy Coulson, o editor do News of the World que saiu na sequência das condenações das escutas em 2007, tornou-se em seguida director de comunicação dos Conservadores. Com a eleição de David Cameron no ano passado, Coulson foi para Downing Street dirigir a comunicação do primeiro-ministro e ganhar o salário mais alto de todos os assessores do governo… até se ter demitido de novo em Janeiro, pelo avolumar das suspeitas sobre o seu papel encorajador do uso das escutas para produzir manchetes.

Nos Estados Unidos, Murdoch detém a licença de 27 canais, entre eles a Fox News, defensora da guerra do Iraque e da administração Bush e por onde já passaram como comentadores os principais candidatos republicanos às próximas presidenciais. Mas se se provarem as suspeitas de que o grupo usou o mesmo método para escutar os “voice mails” de vítimas do atentado de 2001 nas Torres Gémeas, dificilmente encontrará quem o defenda, mesmo entre a direita que recebe generosos contributos financeiros do magnata.

Neste escândalo que vitimou o maior jornal de escândalos, as ligações perigosas entre os media, a política e a polícia compoem uma teia de favores e chantagens que provavelmente nunca será conhecida. Muita da informação privada recolhida não foi publicada, mas poucos crêem que não terá sido usada para servir os propósitos do todo-poderoso grupo mediático agora caído em desgraça. Até a primeira comissão de inquérito ao escândalo optou por não convocar Rebecca Brooks, a ex-editora e agora administradora do grupo que se transformou na vilã deste caso:  despediu 200 jornalistas que nada tinham a ver com todos estes crimes, anunciando ao mesmo tempo que não se demite do cargo que detém na empresa. Ao que parece, os membros da comissão de inquérito tiveram receio das represálias do grupo e optaram por não arriscar ver alguma parte menos favorável das suas vidas expostas no Sun ou News of the World.

A queda de Murdoch é uma boa notícia para a liberdade de imprensa e para a democracia, independentemente do terramoto político que venha ainda a provocar. E é animador saber que no fim da história acaba por ser o jornalismo que está de parabéns: foi na redacção do Guardian, indiferente aos recuos na Justiça, que avançou a investigação para saber a verdade por detrás das escutas, ao ponto da Justiça não poder agora ignorá-la. A petição que corre em Inglaterra para que os políticos assumam as suas responsabilidades – e promovam um inquérito público que vá até às últimas consequências em vez de tentarem abafar a extensão da teia montada – diz-nos que a sociedade está vigilante em defesa da informação contra a manipulação. É sempre boa altura para limpar o lixo…

PS do Viomundo: O português deste post é o de Portugal.


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Comentários

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Bonifa

“Considerem as evidências. Blair vira seu antecessor no cargo, John Major, e um líder trabalhista, Neil Kinnock, serem destruídos por uma imprensa hostil. Ele aprendeu a lição. Cortejou o mais que pôde esses barões da imprensa… David Cameron superou Blair na paparicação aos barões da imprensa em geral e de Murdoch em particular. Pior, ele contratou Andy Coulson, ex-editor do News of the World, como seu assessor de comunicações… O primeiro-ministro Cameron agora promete um inquérito público, presidido por um juiz conceituado… Alguns policiais eram pagos pela imprensa de Murdoch. Autoridades de peso agora dizem que seus próprios telefones foram grampeados.” Isto tudo está no artigo de Timothy Garton Ash, publicado no Estadão. Ash considerava que o maior aliado deste tipo de mídia era o medo, que dela nutriam todos os políticos. Medo dos “dossiês” que ela poderia fabricar. E sob os quais até quem tinha nenhum rabo de palha terminavam sucumbindo. Isso é uma enorme lição para as autoridades brasileiras que pensam em contemporizar com a mídia solerte. Será que no Brasil poderia haver um inquérito público presidido por um juiz conceituado? Já sei, todos vão dizer que só se for presidido pelo juiz Fausto De Sanctis.

Bonifa

Pode não dar em muita coisa, mas já é uma fratura na espessa blindagem do domínio conservador da grande mídia no Ocidente.

Leider_Lincoln

Não seria hora de seguirmos o exemplo britânico? Acaso aqui não temos uma revista que usa muito amiúde de ataques à reputação, que forja dossiês e publicas matérias mentirosas? O que estamos esperando para colocar os Civitas na chincha? E o Globo e os Marinho? E o Estadão? O que difere a prática destes meios daqueles usados por Murdoch? Não chegou a hora do basta, da Ley de Medios?

    José Ruiz

    Eu diria que o problema aqui é mais complexo… mídia, judiciário e legislativo estão encostados, uns nos outros… todo mundo de rabo preso… essa imoralidade crônica dificulta qualquer investigação mais séria..

spin

O pais está sendo desmurdochonizado…claro, estou falando da Inglaterra http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-primav

Renato Lira

A D. Judith deles foi em cana.

Renato Lira

Já pensou se essa onda pega no Brasil?

Ia ter jornalzinho, revistinha e televisinha sem ninguém pra apagar a luz.

Leider_Lincoln

A tal pilantra que o encobria no Reino Unido foi presa, um dos jornais fechados e há imensas pressões por maior controle do Estado sobre a atividade midiática. Se fosse no Brasil, da OAB ao instituto Millenium, do PSDB/DEM/PPS/PV à Igreja Católica, passando pela ANJ e pelos trols a soldo, a gritaria de "chavismo", "ameaça à liberdade de expressão" seria geral, alta e contundente.
Sorte nossa que uma mídia corrupta, bandida, golpista, manipuladora e mentirosa é problema apenas de lá, não é mesmo? Também sorte nossa que grupos políticos cúmplices de uma tal mídia tampouco são encontrados aqui, não é verdade?

Maxwell B. Medeiros

Murdoch ainda não caiu. Pode ter perdido terreno na Inglaterra, mas o restante dos seus domínios continuam intactos.

edv

E alguém tem dúvidas de que a Veja, a Folha e seus companheiros mirdiáticos não tenham redes similares de espionagem, funcionários públicos e privados infiltrados, políticos informando movimentos e tendências por baixo dos panos, repórteres manipuladores,colonistas arrancando informações em "papos inocentes" com seus contatos e entrevistados, etc?
Se ainda fosse de todos os "lados", ainda poder-se-ia dizer que é pelo interesse público.
Mas é sempre visando um lado só.
Aquele que é inimigo do seu próprio.

    gilberto

    Concordo com vc , nosso PIG tem as mesmas ferramentas em mão… Dilma , manda a ABIN investigar isso ai…..

    Ronaldo Cananéia

    Este governo investigar o PIG?

    Quá, quá, quá, há, há, há, rs, rs, rs . . .

    A gerentona não quer nenhum conflito com esse pessoal. Para ela já basta a Copa, a Olimpíada, o câmbio, a inflação, a desinsdustrialização, o DNIT, o PMDB, o Congresso, o trem-bala, o ministério, a pobreza extrema, o PAC 2, etc, etc.

    Para não dizer que ela se liga para o PIG vamos aguardar as próximas denúncias e demissões.

    Boa semana a todos,

    Bonifa

    O PIG do Brasil não é uma cobrinha qualquer… É uma serpente de primeira linha em tamanho e peçonha. Ninguém de bom senso tem o direito de fazer de conta que ela não existe.

spin

Ai vem o PIG nacional, pilantra como sempre e, diante dos grampos do Murdoch dizem não terem nada a ver, então tá, me engana que eu gosto.

Me preocupa ver Lula sozinho enfrentando este monstro de 7 cabeças chamado PIG.

Os partidos e entidades do movimento social tem que encampar esta luta e não o ex-presidente Lula. Ricardo Kotscho é outro que está preocupado com esta luta Lula x PIG, segue link http://noticias.r7.com/blogs/ricardo-kotscho/2011

rogerio

A rapidez do andar da carruagem na Inglaterra (terra de muita carruagem e pouca diligência…) desatualizaram em parte essa matéria, mas não lhe tira a importância, inclusive porque põe no centro da discussão a necessidade de regulação da mídia, do seu controle pela sociedade. A essa altura Rebekah Brooks ja foi convocada para depor no parlamento na próxima terça-feira, dia 20 de julho, o policial que se tornou editor do News of the World foi preso na quinta-feira, dia 15 e, agora se soube, era assessor contratado pela Scotland Yard, trabalhando apenas dois dias por mes, e recebendo um pagamento astronômico por seus até agora não tornadas públicas funções. Esse policial teve um papel importante na época das investigações sobre a estúpida morte, pela polícia inglesa, do eletricista brasileiro Jean Charles. Náo seria apenas casualidade o fato de que o "voice mail" do celular de um familiar de Jean Charles ter sido grampeado na ocasião, como somente agora, como um respingo do escândalo midiático, se soube. Seu número está na lista dos grampos do jornal, segundo comunicado oficial da polícia á sua família. Grampeados, portanto, membros da família real, o ex-primeiro ministro Brown, estrelas do show bizz, jogadores de futebol e parentes de pessoas assassinadas…quem mais, entre os 4 mil celulares até agora reconhecidos? Na esteira das denúncias, agora nas páginas dos jornais, há a declaração atribuída à mulher do ex-primeiro ministro Blair, de que a decisão de invadir o Iraque foi tomada pelo primeiro ministro depois de uma longa conversa telefônica com Rupert Murdoch…ou seja, os laços entre a imprensa suja, sensacionalista, que derruba reputações, através do uso de escutas ilegais, a banda podre da arapongagem policial, e grupos ainda mais poderosos e sinistros está ainda para aparecer em toda a profundidade. Alguém pergunta aqui por que ele ainda não foi preso. A pergunta parece ser: com relações dessa natureza ele será preso algum dia? A senhora Rebekah, por sua vez, renunciou (ou foi demitida) da editoria de" International News", que pretendia ter sido blindado, com o fechamento do "News of the World", um jornal de mais de cem anos de circulação, medida tomada pelo proprietário na tentativa de estancar, não digo um terremoto, cujas principais causas são naturais, mas estancar a revelação de tragédias de urdimento bem humano, com consequências desumanas… Mas, apesar dos fortes laços de Murdoch com o anterior governo trabalhista e com o atual, aliança do partido conservador com os liberais democratas, a coisa parece ter ido muito longe. Alguns paralelos são possíveis, uma boa referência para experiências semelhantes mais próximas de nós, pode ser encontrada na biografia "Chatô", escrita por Fernando Morais (que está nos devendo uma biografia que envolve comunicações, ainda na gaveta), nos documentários "A revolução não vai ser televisionada" e " Mais além do cidadão Kane", disponíveis no Youtube, além do filme clássico de Orson Welles…A esperança dos que pretendem uma sociedade em que o público possa controlar os estados e a mídia a serviço dos interesses obscuros, de toda natureza, é que essa investigação possa se aprofundar e levar a regulações da mídia, como a do senhor Murdoch e a nossa, por que não?

José Manoel

Mais um que vai pro lixo!!!!!!

Marcelo Rodrigues

Por que o Murdoch ainda não foi preso?

Heitor Rodrigues

Murdoch precisa de informação confiável para chantagear lideranças políticas e manobrá-las de acordo com seus próprios interesses. E a imprensa é obrigada a indenizar os prejudicados quando difama alguém. Aqui, não é preciso montar redes de espionagem ou coisa parecida. Assassina-se a vítima ao vivo e a cores – na telinha e nas bancas de jornais – e fica por isso mesmo.

João PR

A queda do Murdoch poderia ser a senha para que se deflagrasse a discussão sobre a Ley dos Medios aqui no Brasil.

Acorda Hibernardo!!! Este Ministro, infelizmente, é fraco e não tem estofo para ocupar o cargo que ocupa.

    SILOÉ -RJ

    Este também faz parte do tripé corrupto: mídia – políticos – policia.

    Bonifa

    E a justiça?

mundim

O Murdoch deveria ter mandado os seus editores e reporteres para fazerem estagio na Globo e na Folha de Sao Paulo. Em materia de jornalismo sujo, o Brasil pode se orgulhar de ter o melhor do mundo, nem a NewsCorp do Rupert Murdoch, nem a Fininvest do Berlusconi chegam perto das Organizacoes Globo, Abril ou Folha de Sao Paulo.

Aqui o Andy Coulson, viraria Ministro das Comunicacoes ou da Defesa, o Andy Hayman chefe da Policia Federal e a ruiva Rebekah Brooks (grafia do nome correta meu caro revisor) pelo seu perfil seria provavelmente uma forte candidata a Chefe da Casa Civil.

Estas e uma das razoes que o Guardian sempre e um dos primeiros sites que abro quando acesso a internet. Uma pena que o Brasil nao tenham jornais como o Guardian ou o The Independent ingleses. Talvez se tivessemos jornais com aqueles perfis editoriais , nao haveria este poder da Globo / Veja / Folha.

Mudando de assunto, ou melhor retornando a um assunto recente:

Sera que o BNDES faria um emprestimo para um candidato a barao da midia global? Certamente o preco das acoes da NewsCorp vao despencar ainda mais, e com uma ajudinha do Luciano Coutinho eu bem que poderia comprar o controle desta empresas e iria anunciar e vender mais mandioca, queijo de minas, vatapa e sarapatel do que o Carrefour ou Casino juntos. Para o BNDES eu colocaria os anuncios de graca e em primeira pagina.

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