Janio de Freitas: É ilógico que o Congresso fique sujeito a um juiz de 1ª instância, e não ao STF

Tempo de leitura: 3 min

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É ilógico que o Congresso fique sujeito a um juiz de 1ª instância, e não ao STF

por Janio de Freitas, na Folha de S. Paulo, em 27/10/2016

O esbravejar de associações de juízes e de procuradores contra um protesto do presidente do Senado não é, apenas, mais uma das tantas manifestações de corporativismo com que tais categorias se privilegiam.

A reação desproporcional teve também a finalidade de depressa encobrir, com o barulho exaltado, uma ordem judicial vista como abusiva. É dar as costas à democracia.

Nem por ser quem é, Renan Calheiros está impedido de ter, vez ou outra, atitudes corretas. Se a forma como o faça for descabida, e no caso foi, não é o sentido da atitude que deve pagar.

Mesmo porque, se falarmos em democracia, defender a soberania relativa do Congresso é tão democrático quanto invadi-lo policialmente não é.

Ainda não consta, embora não falte muito, que os cidadãos – quaisquer cidadãos – tenham perdido o direito de verificar se seus telefonemas, sua correspondência, sua casa e trabalho, enfim, sua intimidade, estão sendo violados.

Mesmo a ordem judicial para a violação não cassa tal direito, pois se é desconhecida do vigiado. E não só por ordem judicial há violações à intimidade.

É só constatá-lo nos anúncios de detetives particulares e seu instrumental de violações remuneradas.

É inesquecível o caso criado por Gilmar Mendes quando, gravado em telefonema no seu gabinete, acusou Lula de instaurar o estado policial. Um escarcéu.

Nelson Jobim foi à Câmara, com prospectos de uma aparelhagem que o Exército comprara e, a seu ver, era a usada para gravar Mendes.

Logo se viu que Jobim só mostrara o que era, de fato, uma propaganda na internet.

E a gravação foi feita pelo próprio amigo telefônico a quem o ministro do Supremo pedira, para sua enteada, um emprego boca-rica no Senado.

Gravadores clandestinos do SNI foram encontrados por “varreduras” em muitos gabinetes da ditadura.

Fernando Henrique foi gravado manipulando a “privatização” da Vale.

Depois que Eduardo Cunha deixou a presidência da Telerj, evidências de gravações clandestinas tornaram-se epidêmicas no Rio.

Até que foi descoberta, perto de uma instalação da FAB no centro, uma central onde foram presos um ex-técnico da Telerj e um sargento.

Na Barra da Tijuca, foi localizada uma central chefiada por um coronel.

Em São Paulo, usar apelidos e metáforas era frequente em muitos círculos. Nunca deixou de sê-lo por completo, mas mudou: agora é o permanente.

A insegurança no país, pela bandidagem ou pelos novos poderes, torna as “varreduras” aconselháveis: hoje, até a palavra amigo é associada a crime.

Fazer “varredura” é ilegal? Não. Ou sim, desde que direitos, vários, ficaram à mercê do que pretenda um procurador ou um juiz das novas forças – poucos, ainda bem.

A conclusão deles, de que “as ‘varreduras’ nas casas de três senadores e de um ex-presidente eram obstrução à Lava Jato”, carece de sentido.

Ninguém está obrigado a se sujeitar à hipótese de que esteja com suas conversas sob gravação.

Impedir de ter a intimidade violada clandestinamente não é obstrução ilegal.

Além disso, nem houve obstrução prática, por falta do que fosse obstruível.

Grampo ilegal foi posto na cela de Alberto Youssef por policiais federais, em Curitiba.

Alguns dos que faziam campanha nas redes contra Dilma e o PT e pró-Aécio, o que hoje se pode ver como uma das primeiras evidências da missão político-ideológica que tinham. Têm.

Mas a gravação clandestina e a propaganda ficaram nisso mesmo: certas ilegalidades são mais legais do que a lei, a depender do policial, procurador ou juiz que as cometa.

Como disse a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, “cada vez que um juiz é agredido, eu e cada um de nós juízes é agredido”. Sem ressalvas. Logo, não importa o que o juiz faça.

Calheiros fez pequena agressão verbal ao juiz de primeira instância que mandou a PF apreender equipamentos do Senado e prender quatro da Polícia Legislativa.

Se um congressista só pode ser processado e julgado pelo Supremo, no mínimo é ilógico que o próprio Congresso fique sujeito a um juiz de primeira instância, e não a decisões do Supremo.

Ainda mais se a ordem é de que a Polícia Federal, dependência do Executivo, arrebate bens patrimoniais do Poder Legislativo.

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Comentários

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Luiz Carlos P. Oliveira

Grampo só incomoda quem tem MUIIIIITO o que esconder. Por isso a gritaria dos nossos “representantes”.

    Luiz Carlos Azenha

    Por exemplo, o Obama não tá nem aí pra ser grampeado, tanto que pediu ao Serviço Secreto dos EUA que deixe de fazer varreduras na Casa Branca.

    Eugenio Arima

    Que sábia conclusão! O problema é que nem tudo que se esconde, é ilícito. Talvez o neonliberal desconheça o termo “segredo industrial”. Certamente, aqueles que detém patentes de medicamentos, algoritmos para mecanismos de busca, equipamentos eletronicos e outras coisas mais, tem muito a esconder. Ah, dirá o distinto cavalheiro, mas isto não se aplica a política ou judiciário. Será? Digamos que o senhor seja estuprado. Crime horrível. E ao invés de segredo de justiça, o ilustre meretíssimo divulgasse seu nome? Bullying seria pouco por parte dos amigos, nâo é? Digamos que o país queira costurar um acordo comercial com outro país e os ilustres congressistas divulgassem isto em nome da transparencia. Qual seria a chance do acordo se efetivar? Escuta é ferramenta de exceção, para situações que envolvem perigo real e imediato. Aos demais crimes, investigação. Descubra-se aonde está o dinheiro. Quem se beneficiou. Muito, muito mais justo e adequado que bisbilhotar a todos e sabe-se lá com que interesse. Extorsão, se o senhor não sabe, costuma empregar estes meios. Pobre inocente.

Luiz Carlos P. Oliveira

Haja combustível para essa fogueira de vaidades existente hoje no Brasil. Todos pensam que mandam e ninguém manda porra nenhuma. Talvez alguém possa lembrar à todos estes narcisistas aquela música infame “Cada um no seu quadrado”. É muita prepotência dessa gente.

Roberto

Então já sei: se eu encontrar um grampo, eu chego perto do dispositivo e digo: “alô, alô, você que está aí me ouvindo. Minha empregada, sem querer, achou esse grampo aqui no escritório. Eu não sei se você, que está aí escutando, é meu concorrente tentando me passar a perna, ou é um policial federal cumprindo seu nobre dever de espionar a serviço de algum juiz. Se você é policial, então esse grampo é legalizado. Se eu inutilizá-lo, posso ser preso por obstruir a justiça. Nesse caso, peço desculpas pelo inconveniente. Por favor, passe aqui no escritório quando não houver ninguém e esconda o aparelho em outro lugar. Eu vou deixar a porta da minha sala destrancada, pra facilitar. Obrigado”.

Schell

Mas, um dos procuradores força-tarefa vazando-jato, pelo que li, disse (mesmo que em outras palavras) que alguém que suspeite estar sendo investigado não pode fazer “varreduras” em seus telefones… Pois é, mais fascista, impossível. Gostaria de saber se a douta presidentA do stf “irá pra cima” do preclaro teori(a) depois do despacho dele contra os meganhas-invasores…
Pior, até agora não consegui “alcançar”: afinal, quem determinou a interceptação das conversas telefônicas dos senadores em suas residências funcionais e gabinetes senatoriais? A meganhagem sabem, pois, foram eles que se deram conta que os senadores não falavam mais coisa com coisa ao telefone. Que ministro do stf havia autorizado tais quebras de sigilos? Ou não havia (há) qualquer ministro autorizativo? Se não foi algum ministro, quem foi? Mais, autorizaram a quebra do sigilo telefônico (a partir das operadoras) ou instalaram grampos físicos nos referidos locais? A autorização, se havia, era para o quê, mesmo? E o juizeco entrou nessa por qual razão? Por acreditar piamente na puliça, ou por moto (im)próprio, ou porque o tal ministro assim lhe solicitou?
Afinal, a douta presidentA do stf foi rapidíssima nas palavras e na decisão de prender e arrebentar com o Delcídio e, agora, cala-se sem explicar a totalidade da confusão causada pelo poder que ela – argh – representa?

FrancoAtirador

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https://twitter.com/cartamaior/status/791708133383168000
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Roberto

Segundo os juristas, ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Se qualquer cidadão quiser fazer uma varredura em sua casa à procura de grampos e escutas, tem todo o direito de fazê-lo. Não tem que pedir permissão a nenhum juiz.

Durval

Estamos vivendo tempos dos absurdos. É mais dentre tantos.

FrancoAtirador

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https://pbs.twimg.com/media/Cvx9x_MWEAEO7ld.jpg

Decisão de Teori Zavascki Suspende Ação na 1ª Instância

e Determina a Imediata Remessa dos Autos ao Supremo.

http://www12.senado.leg.br/noticias/arquivos/2016/10/27/veja-a-integra-da-decisao-do-ministro-teori-zavascki
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