Inscritos no 1º dia do programa de auxílio emergencial viram reféns da “análise eterna”

Tempo de leitura: 4 min
Aparecida, de Niquelândia (GO) e Jorge, de Viamão (RS), candidataram-se ao auxílio emergencial no primeiro dia de inscrições. Até agora, estão sem resposta e sem renda

“Eterna Análise”: O drama de quem ainda não recebeu o auxílio emergencial do governo

Em todo o país surgem relatos de quem se inscreveu há quase um mês no programa, mas segue sem resposta (e sem renda)

por Marcos Hermanson Pomar, especial para o Viomundo 

Mãe solteira de dois filhos, a trabalhadora autônoma Monica Ferreira (50), moradora da cidade do Rio de Janeiro, viu sua renda familiar reduzida a zero durante a crise da Covid-19.

Ela é vendedora de empadas e o filho mais velho, com quem mora, professor particular de jiu-jitsu.

Ambos tiveram que parar de trabalhar por conta do isolamento social e agora dependem de doações para sobreviver.

Ainda no dia 07 de abril, quando se iniciaram as inscrições para o programa Auxílio Emergencial, ela se candidatou, esperando contar com a ajuda do governo para pagar as contas e custear a alimentação em casa:

“Pra você ter uma ideia do meu desespero, por volta de uma, uma e meia da manhã do dia 06 pro dia 07 eu já estava me cadastrando. Acredito que eu tenha sido uma das primeiras”.

Dezesseis dias depois, Monica recebeu pelo aplicativo do auxílio o aviso de que os seus dados eram “inconclusivos” e foi obrigada a refazer o cadastro.

No dia 03 de maio, quando conversou com a reportagem, ela ainda não havia recebido os R$ 1.200 aos quais tem direito:

“Acabei de tirar foto do extrato do banco: 3 reais. É todo o dinheiro de uma mãe de família”.

Conforme os dias passam, ela aguarda um desfecho no seu pedido e sobrevive com doações de vizinhos:

“Há umas duas ou três semanas começaram a dar cestas: primeiro um dava um quilo de feijão, outro dava um saco de arroz, óleo, sal, açúcar, macarrão, leite, nescau, biscoito. Aí, depois uma outra vizinha me ligou, perguntou se eu aceitava uma cesta da igreja dela. Eu disse que sim, na hora”.

Também sem ter recebido o auxílio, o vendedor de cosméticos Jorge Luiz Martins (22), de Viamão (RS), precisou vender itens domésticos para seguir pagando as contas. As últimas “vítimas” foram a televisão e a máquina de costura.

Desde o início da crise Jorge mora com o companheiro, que também é vendedor e está desempregado.

Com dívidas e contas da casa para pagar, eles se inscreveram no auxílio emergencial ainda no dia 07 de abril, e seguem aguardando o pagamento:

“No dia 23 fui anunciado com dados inconclusivos, o que já me gerou tremenda frustração, pois presenciei pessoas de carteira assinada recebendo e eu naquela situação de vulnerabilidade”.

“Refiz o cadastro e, novamente, ‘dados inconclusivos’, com motivo alegado de que não havia na base de dados [se eu era] ‘masculino’ ou ‘feminino’, mas fiquei pensando: que base de dados não teria essa informação? Agora toda vez que tento [refazer o cadastro] não consigo porque dá limite de tentativas excedido”.

Moradora de Niquelândia (GO), Aparecida Rocha (38) trabalhava como auxiliar de cozinha em uma escola particular da cidade e, nos fins de semana, fazia bicos limpando casas de família.

Ela acabou dispensada do serviço quando as aulas foram suspensas e, por conta do isolamento social, também já não pode trabalhar como faxineira.

Antes da pandemia, sua renda mensal era de aproximadamente R$ 1.500, mas agora esse valor caiu para zero.

Aparecida está há dois meses sem pagar o aluguel, aguardando o auxílio, que segue “em análise” desde o começo do mês de abril.

Um dos filhos foi levado para a casa do avô, como forma de diminuir as despesas.

Os outros, de 16 e 7 anos, seguem com ela. Aparecida diz que não tem outra opção senão esperar a boa-vontade do governo:

“Não posso sair pra trabalhar, não posso arrumar faxina, não posso arrumar uma roupa pra passar. Eu tô perdidinha, sem saber o que fazer, não tenho ajuda nenhuma. Eu passo mal de noite, não durmo“.

No dia 13 de março o vendedor ambulante Reginaldo Conceição (39) trabalhou na rua pela última vez.

Era a partida entre São Paulo e LDU, no estádio do Morumbi, pela Taça Libertadores.

Até então, ele tirava uma média de 3 a 5 mil reais por mês vendendo espetinho e bebidas em eventos como festas universitárias e jogos de futebol.

A partir do início da política de isolamento social, Reginaldo viu seu rendimento cair abruptamente e passou a depender da namorada, que recebe cerca de 400 reais mensais pelos programas Bolsa Família e Auxílio Moradia, vinculado à CDHU:

“A sensação é de desespero, impotência. Você fica meio depressivo. Você tem uma renda que era suficiente para pagar suas contas todo mês. De repente é pensão atrasada, carro atrasado. Nunca passei por isso”

Depois de duas semanas parado, Reginaldo conseguiu um bico como ajudante de pedreiro, em que tira cerca de R$ 1.200 por mês, mas o dinheiro segue sendo insuficiente para as contas: são R$ 1500 em pensões para os três filhos e outros R$ 700 nas contas de água e luz, cujos valores, ele afirma, são abusivos:

“Eu solicitei o auxílio no primeiro dia, e até agora está em análise. Se recebesse o dinheiro, eu compraria comida pra casa e começaria a pagar as pensões dos meus filhos. Mas não daria pra parar de trabalhar”

Na sexta-feira (01) a Caixa Econômica Federal anunciou que dos 97 milhões de cadastros no programa de Auxílio Emergencial, 50 milhões haviam sido aceitos, 26 milhões haviam sido considerados inelegíveis e outros 5 milhões ainda careciam de análise.

Doze milhões de cadastrados terão que refazer seus registros, pois seus dados foram considerados “inconclusivos”.


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Comentários

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Zé Maria

O desgoverno Bolsonaro/Guedes/Onix/MilicoMijão
fez o Aplicativo da Caixa para não funcionar mesmo.

É uma Espécie de Depósito Compulsório Bloqueado.
O Dinheiro fica no Banco pra ser usado em outros fins,
mas principalmente para melhorar o balanço da Caixa.
Foi assim o Confisco da Poupança no Governo Collor.

E a Dilma é que ficou com má fama porque mandou
liberar o dinheiro do Bolsa-Família aos beneficiários.
E liberou os valores, de fato, não ficaram trancados.
Os pobres receberam o benefício a que tinham direito.

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