Michael Hudson: General iraniano morreu por ameaçar guerra “democrática” dos EUA pelo petróleo alheio

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Estados Unidos intensificam sua guerra “democrática” pelo petróleo no Oriente Médio

por Michael Hudson, no The Saker

A grande mídia está evitando cuidadosamente revelar o método por trás da aparente loucura de Donald Trump em assassinar o general da Guarda Revolucionária Islâmica Qasem Soleimani para iniciar 2020.

A lógica por trás do assassinato é a aplicação da política global de longa data dos EUA, não apenas resultado da personalidade impulsiva de Trump.

O assassinato do líder militar iraniano foi realmente um ato de guerra unilateral que viola o direito internacional, mas foi um passo lógico em uma estratégia antiga dos EUA.

Foi explicitamente autorizado pelo Senado, na lei de financiamento do Pentágono aprovada no ano passado.

O assassinato pretende aumentar a presença dos Estados Unidos no Iraque para manter o controle das reservas de petróleo da região e apoiar as tropas Wahabistas da Arábia Saudita (Isis, Al Qaeda no Iraque, Al Nusra e outras divisões do que, na verdade, são a Legião Estrangeira dos Estados Unidos) para apoiar o controle norte-americano da região.

O petróleo do Oriente Médio como garantia do dólar dos EUA

A chave para entender essa política e por que ela está em escalada, não diminuindo, é o petróleo como mercadoria que sustenta o dólar.

Participei de discussões sobre essa política, tal como foi formulada há quase cinquenta anos, quando trabalhei no Instituto Hudson e fui a reuniões na Casa Branca, encontrei generais em vários think tanks das Forças Armadas e diplomatas nas Nações Unidas.

Meu papel foi como economista especializado em balança de pagamentos*, tendo trabalhado por uma década no Chase Manhattan, Arthur Andersen e empresas de petróleo.

[*Registra o total de dinheiro que entra e sai de um país, na forma de importações e exportações de produtos, serviços, capital financeiro, bem como transferências comerciais, importações e exportações de produtos, serviços, capital financeiro, bem como transferências comerciais. Wikipedia]

Estas são duas das três principais dinâmicas da política externa e da diplomacia americanas. A terceira preocupação é como travar uma guerra em uma democracia, uma vez que os eleitores passaram a rejeitar esta ideia após a Guerra do Vietnã.

A mídia e a discussão pública desviaram a atenção da estratégia que está por trás do assassinato de Soleimani.

Foram lançadas especulações de que o presidente Trump autorizou o assassinato para combater a (não) ameaça de impeachment, ou apoiar os movimentos israelenses de expansão territorial, ou simplesmente para entregar a Casa Branca ao ódio/síndrome dos neoconservadores em relação ao Irã.

O contexto real da ação neocon foi a balança de pagamentos e o papel do petróleo e da energia como alavanca de longo prazo da diplomacia norte-americana.

A dimensão da balança de pagamentos

O principal déficit na balança de pagamentos dos EUA há muito tempo é gasto militar no exterior.

Todo o déficit de pagamentos, começando com a Guerra da Coréia em 1950-51 e estendendo-se pela Guerra do Vietnã da década de 1960, foi responsável por retirar o dólar do padrão ouro, em 1971.

[Nota do Viomundo: Até então, a emissão de dólares pelo Tesouro deveria estar atrelada necessariamente à existência de reservas em ouro, como lastro. O presidente Richard Nixon acabou com isso.]

O problema enfrentado pelos estrategistas militares de Washington: como continuar mantendo 800 bases militares em todo o mundo, além de dar apoio a tropas aliadas, sem perder a alavancagem financeira dos Estados Unidos?

A solução acabou sendo substituir o ouro por títulos do Tesouro dos EUA (IOUs), como base das reservas estrangeiras do Banco Central.

[Nota do Viomundo: Saiu o ouro, entraram papéis, cheques supostamente com fundos]

Depois de 1971, os bancos centrais estrangeiros tiveram pouca opção para o que fazer com a entrada contínua de dólares, exceto reciclá-los na economia dos EUA comprando títulos do Tesouro.

O efeito dos gastos militares estrangeiros dos EUA, portanto, não prejudicou a taxa de câmbio do dólar e nem forçou o Tesouro e o Federal Reserve a aumentar as taxas de juros para atrair divisas, compensando assim as saídas de dólares para gastos militares.

De fato, os gastos militares estrangeiros dos EUA ajudaram a financiar o déficit orçamentário federal.

Assim, a Arábia Saudita e outros países do Oriente Médio e da OPEP (Organização dos Paises Exportadores de Petróleo) rapidamente se tornaram um pilar do dólar.

Depois que esses países quadruplicaram o preço do petróleo (em retaliação pelos Estados Unidos quadruplicarem o preço de suas exportações de grãos, um dos pilares da balança comercial dos EUA nos anos 70), os bancos americanos foram inundados com a entrada de depósitos estrangeiros.

Esse dinheiro foi direcionado pelos bancos ao Terceiro Mundo, em empréstimos ruins que explodiram em 1972, com a insolvência do México, e destruíram o crédito dos governos do Terceiro Mundo por uma década, forçando-os a depender dos Estados Unidos via Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial.

Para esclarecer um ponto-chave: é claro que a Arábia Saudita não economiza em ativos dolarizados.

Ela torra o dinheiro na compra de centenas de bilhões de dólares em armas dos EUA.

Isso mantém os sauditas dependentes do fornecimento de peças de reposição e reparos e permite que os Estados Unidos desliguem o hardware militar saudita a qualquer momento, caso os sauditas tentem agir independentemente da política externa dos EUA.

Portanto, manter o dólar como moeda de reserva mundial se tornou um dos pilares dos gastos militares dos EUA.

Os países estrangeiros não precisam pagar diretamente ao Pentágono por esses gastos.

Eles simplesmente financiam o Tesouro dos EUA e o sistema bancário dos EUA.

O medo de perder essa vantagem foi uma das principais razões pelas quais os Estados Unidos atacaram militarmente a Líbia, cujas reservas estrangeiras eram mantidas em ouro, não em dólares.

A Líbia instava outros países africanos a seguir seu exemplo, a fim de se libertarem da “Diplomacia do Dólar”.

Obama invadiu a Líbia, pegou seu suprimento de ouro (ainda não temos idéia de quem acabou com esses bilhões de dólares) e destruiu o governo local, seu sistema público de educação, sua infraestrutura pública e outras políticas não neoliberais.

A grande ameaça para os EUA é a desdolarização, pois a China, a Rússia e outros países procuram evitar a reciclagem de dólares.

Sem a função do dólar como veículo para a economia mundial — com efeito, sem o papel do Pentágono em criar a dívida do Tesouro, que é o veículo para acumular reservas mundiais no Banco Central — os EUA se veriam constrangidos militarmente e, portanto, diplomaticamente, como aconteceu quando vigia o padrão ouro.

Essa estratégia da Líbia é a mesma que os EUA seguiram na Síria e no Iraque.

Agora, o Irã está ameaçando a dolarização e a diplomacia petrolífera dos EUA.

A indústria do petróleo como base da balança de pagamentos e da diplomacia estrangeira dos EUA

A balança comercial dos Estados Unidos é sustentada por excedentes de petróleo.

O petróleo é a chave, porque é importado pelas empresas americanas quase sem pesar na balança de pagamentos, devido a manobras contábeis.

Já os lucros obtidos nas vendas das empresas petrolíferas norte-americanas a outros países são remetidos para os Estados Unidos (por meio de refúgios fiscais offshore, principalmente Libéria e Panamá, faz muitos anos).

Como observado acima, os países da OPEP foram instruídos a manter suas reservas oficiais em valores mobiliários dos EUA (ações e títulos, bem como IOUs do Tesouro, mas não a compra direta de empresas).

Financeiramente, os países da OPEP são clientes/dependentes da área do dólar.

A tentativa dos EUA de manter essa garantia ao dólar explica a oposição a quaisquer medidas de governos estrangeiros para reverter o aquecimento global e o clima extremo causados pela dependência mundial do petróleo patrocinada pelos EUA.

Quaisquer movimentos da Europa e de outros países reduziriam a dependência dos EUA e, portanto, a capacidade dos EUA de controlarem a torneira global de petróleo como meio de controle e coerção.

[Nota do Viomundo: Os EUA controlam a torneira através da submissão da Arábia Saudita]

Os movimentos de combate ao aquecimento global são vistos como atos hostis.

O petróleo também explica a oposição dos EUA às exportações de petróleo da Rússia via oleoduto Nord Stream.

[Nord Stream é um gasoduto para transporte de gás natural em alto mar de Vyborg na Rússia até Greifswald na Alemanha. O consórcio encarregado de construir e operar é o Nord Stream AG. O projeto inclui o gasoduto de alimentação terrestre na Rússia, e novas ligações na Europa Ocidental. Wikipedia]

Os estrategistas dos EUA querem tratar a energia como um monopólio nacional dos EUA.

Outros países podem se beneficiar da maneira que a Arábia Saudita fez — enviando seus superávits para a economia dos EUA — mas não para apoiar seu próprio crescimento econômico e diplomacia.

O controle do petróleo implica, portanto, apoio ao aquecimento global contínuo como parte inerente da estratégia dos EUA.

Como uma nação “democrática” pode travar guerra internacional

A Guerra do Vietnã mostrou que as democracias modernas não podem montar exércitos para nenhum grande conflito militar, porque isso exigiria apoio de seus cidadãos.

Isso levaria qualquer governo que tentasse tal projeto a ser votado fora do poder.

Sem tropas, não é possível invadir um país para assumí-lo.

O corolário dessa percepção é que as democracias têm apenas duas opções quando se trata de estratégia militar: elas só podem empregar poder aéreo, bombardeando oponentes; ou podem criar uma legião estrangeira, ou seja, contratar mercenários ou apoiar governos estrangeiros que prestem esse serviço militar.

Aqui, mais uma vez, a Arábia Saudita desempenha um papel crítico, através do controle dos Wahabi Sunnis transformados em jihadistas terroristas dispostos a sabotar, bombardear, assassinar, explodir e combater qualquer alvo designado como inimigo do “Islã”, o eufemismo para a Arábia Saudita, como estado do cliente dos EUA.

(A religião realmente não é a chave; não conheço nenhum alvo israelense de ataque do ISIS ou Wahabi).

[Nota do Viomundo: O wahabismo é a vertente do islã cultivada e exportada pela Arábia Saudita através do financiamento de madrassas e universidades em várias partes do mundo].

Os Estados Unidos precisam dos sauditas para fornecer ou financiar loucos wahabi.

Portanto, além de desempenhar um papel fundamental na balança de pagamentos dos EUA, reciclando seus ganhos com a exportação de petróleo para ações, títulos e outros investimentos, a Arábia Saudita fornece mão de obra ao apoiar os membros Wahabi da legião estrangeira americana, ISIS e Al-Nusra /Al Qaeda.

O terrorismo tornou-se o modo “democrático” da política militar dos EUA de hoje.

O que torna a guerra do petróleo dos EUA no Oriente Médio “democrática” é que esse é o único tipo de guerra que uma democracia pode travar — uma guerra aérea, seguida por um exército terrorista cruel, que compensa o fato de que nenhuma democracia pode colocar seu próprio exército em campo no mundo de hoje.

O corolário é que o terrorismo se tornou o modo “democrático” de guerra.

Do ponto de vista dos EUA, o que é uma “democracia”?

No vocabulário orwelliano de hoje, significa qualquer país que apóie a política externa dos EUA.

Bolívia e Honduras se tornaram “democracias” desde seus golpes, junto com o Brasil.

O Chile, sob Pinochet, era uma democracia de livre mercado ao estilo de Chicago.

O mesmo aconteceu com o Irã sob o xá e a Rússia com Boris Yeltsin — mas não desde que elegeu o presidente Vladimir Putin, assim como a China sob o presidente Xi.

O antônimo de “democracia” é “terrorista”.

Isso significa simplesmente uma nação disposta a lutar para se tornar independente da democracia neoliberal dos EUA.

O papel do Irã como inimigo norte-americano

O que ameaça a dolarização dos EUA, o petróleo e a estratégia militar?

Obviamente, a Rússia e a China são alvos de planos estratégicos de longo prazo por buscarem suas próprias políticas econômicas e diplomacia independentes.

Mas, ao lado deles, o Irã está na mira dos Estados Unidos há quase setenta anos.

O ódio americano ao Irã começa com sua tentativa de controlar sua própria produção, exportações e ganhos de petróleo.

Isso remonta a 1953, quando o primeiro ministro Mohammed Mossadegh foi derrubado por defender a soberania doméstica sobre o petróleo anglo-persa.

O golpe da CIA-MI6 o substituiu pelo flexível Xá Pahlevi, que impôs um estado policial para impedir a independência iraniana da política dos EUA.

Os únicos lugares físicos livres da polícia eram as mesquitas.

Isso fez da República Islâmica o caminho de menor resistência à derrubada do xá e à reafirmação da soberania iraniana.

Os Estados Unidos chegaram a um acordo com uma OPEP independente em 1974, mas o antagonismo em relação ao Irã se estende a considerações demográficas e religiosas.

O apoio iraniano à sua população xiita e ao Iraque e outros países — enfatizando o apoio aos pobres e às políticas quase-socialistas, em vez do neoliberalismo — tornou o Irã principal rival religioso do sectarismo sunita da Arábia Saudita e seu papel como legião estrangeira americana dos Wahabi.

Os EUA se opuseram ao general Soleimani, acima de tudo, porque ele estava lutando contra o ISIS e outros terroristas apoiados pelos EUA na tentativa de conquistar a Síria e substituir o regime de Assad por um conjunto de líderes locais em conformidade com os EUA — o velho estratagema britânico, “dividir e conquistar”.

Soleimani cooperou ocasionalmente com as tropas norte-americanas na luta contra grupos do ISIS que ficaram “fora de linha”, o que significa a linha partidária dos EUA.

Mas todas as indicações são de que Soleimani estava no Iraque para trabalhar com o governo, que busca recuperar o controle dos campos de petróleo que o presidente Trump se gabou de ter agarrado.

No início de 2018, Trump pediu ao Iraque que reembolsasse os EUA pelo custo de “salvar sua democracia”, quando detonaram o restante da economia construída sob Saddam Hussein.

O reembolso foi feito sob a forma de petróleo iraquiano. Mais recentemente, em 2019, o presidente Trump perguntou: por que não simplesmente pegar o petróleo iraquiano?

O gigantesco campo petrolífero do Iraque tornou-se o prêmio da guerra do petróleo movida pela dupla Bush Filho-Cheney após o 11 de setembro.

“’Foi uma reunião simples e discreta’”, disse uma fonte que estava na sala. ‘E então, no final, Trump disse com um sorriso no rosto: ‘Então, o que vamos fazer com o petróleo?’ ”

A ideia de Trump de que os EUA deveriam “obter algo” de volta por seus gastos militares na destruição das economias iraquiana e síria reflete a nu e cru a política dos EUA.

No final de outubro de 2019, o New York Times informou que: “Nos últimos dias, Trump estabeleceu as reservas de petróleo da Síria como uma nova lógica para reverter sua decisão de retirar soldados e enviar centenas de tropas adicionais ao país devastado pela guerra. Ele declarou que os Estados Unidos “asseguraram” campos de petróleo no nordeste caótico do país e sugeriu que a apreensão do principal recurso natural da Síria justifica que os Estados Unidos ampliem ainda mais sua presença militar. ‘Pegamos e garantimos’, disse Trump sobre o petróleo da Síria durante declarações na Casa Branca no domingo, depois de anunciar o assassinato do líder do Estado Islâmico, Abu Bakr al-Baghdadi”.

Um funcionário da CIA lembrou ao jornalista que tomar o petróleo do Iraque foi uma promessa de campanha de Trump.

Isso explica a invasão do Iraque em 2003, e novamente este ano — como o presidente Trump disse, “por que simplesmente não tomamos o petróleo deles?”

Também explica o ataque da dupla Obama-Hillary à Líbia — não apenas pelo petróleo, mas por Khadafi investir suas reservas estrangeiras em ouro, em vez de reciclar sua receita excedente de petróleo no Tesouro dos EUA — e, é claro, por promover um estado socialista secular.

Isso explica por que os neocons dos EUA temiam o plano de Soleimani de ajudar o Iraque a controlar o petróleo e a resistir aos ataques terroristas apoiados pelos EUA e pela Arábia Saudita no Iraque.

Foi isso que tornou o assassinato de Soleimani uma opção.

Os políticos norte-americanos desacreditaram a si mesmos ao começar sua condenação a Trump dizendo, como fez a senadora democrata Elizabeth Warren, quão “mau” era Soleimani como pessoa, como ele havia matado tropas americanas, planejado bombardeios a tropas no Iraque e outras políticas, tentando repelir a invasão dos EUA para pegar petróleo.

Warren simplesmente repetiu a descrição que a mídia americana fez de Soleimani como um monstro, desviando a atenção da questão política que explica a razão dele ter sido assassinado agora.

A contra-estratégia para o petróleo, a diplomacia do dólar e o aquecimento global

Essa estratégia dos Estados Unidos continuará até que países estrangeiros a rejeitem.

Se a Europa e outras regiões não o fizerem, sofrerão as consequências dessa estratégia na forma de uma guerra crescente patrocinada pelos EUA via terrorismo, o fluxo de refugiados, o aquecimento global acelerado e o clima extremo.

A Rússia, a China e seus aliados já lideram o caminho da desdolarização como um meio de conter a sustentação da política militar global dos EUA.

Mas todo mundo agora está especulando sobre qual deveria ser a resposta do Irã.

A mídia norte-americana trabalhou o fim de semana para descrever os Estados Unidos como sob ataque iminente.

O prefeito de Nova York, Bill de Blasio, colocou policiais em cruzamentos importantes para nos informar o quão iminente é o terrorismo iraniano — como se o Irã, não a Arábia Saudita, tivesse montado o 11 de setembro e como se o Irã tivesse realmente fomentado alguma ação contra os Estados Unidos.

A mídia e os especialistas da televisão saturaram as ondas com avisos sobre o terrorismo islâmico.

Os âncoras da televisão estão especulando sobre onde os ataques provavelmente ocorrerão.

A mensagem é que o assassinato do general Soleimani foi para nos proteger.

Como Donald Trump e vários porta-vozes militares disseram, ele havia matado norte-americanos — e agora os iranianos devem estar planejando um ataque enorme, que ferirá e matará muitos outros americanos inocentes.

Essa postura [de vitimização do agressor] tornou-se a postura dos Estados Unidos no mundo: fraca e ameaçada, exigindo uma forte defesa — na forma de um forte ataque.

Mas qual é o interesse real do Irã?

Se é realmente para minar a estratégia do dólar e do petróleo, a primeira política deve ser tirar as forças militares dos EUA do Oriente Médio, incluindo a ocupação dos campos de petróleo.

Acontece que o ato precipitado do presidente Trump foi um catalisador, provocando exatamente o oposto do que ele queria.

Em 5 de janeiro, o parlamento iraquiano se reuniu para insistir que os Estados Unidos saíssem do país.

O general Soleimani estava no Iraque como um diplomata convidado, não um invasor iraniano.

São as tropas dos EUA que estão no Iraque violando o direito internacional.

Se elas partirem, Trump e os neocons perdem o controle do petróleo — e também sua capacidade de interferir na defesa mútua iraniano-iraquiana-síria-libanesa.

Além do Iraque, aparece a Arábia Saudita.

Tornou-se o Grande Satanás, o defensor do extremismo wahabi, a legião terrorista dos exércitos mercenários dos EUA, que lutam para manter o controle das reservas de petróleo e câmbio do Oriente Médio, provocam o grande êxodo de refugiados para a Turquia, Europa e onde mais puder.

As pessoas fogem das armas e dinheiro fornecidos pelos apoiadores americanos do Isis, da Al Qaeda no Iraque e de suas legiões aliadas Wahabi sauditas.

O ideal lógico, em princípio, seria destruir o poder saudita. Esse poder está em seus campos de petróleo.

Eles já foram atacados por modestas bombas iemenitas. Se os neocons dos EUA ameaçarem seriamente o Irã, a resposta possivelmente será o bombardeio e a destruição por atacado dos campos de petróleo sauditas, juntamente com os do Kuwait e dos sheikhdoms do Oriente Médio.

Isso acabaria com o apoio saudita aos terroristas wahabi, bem como ao dólar dos EUA.

Tal ato, sem dúvida, será coordenado com um apelo para que os trabalhadores palestinos e outros estrangeiros na Arábia Saudita se revoltem e expulsem a monarquia e seus milhares de familiares do poder.

Além da Arábia Saudita, o Irã e outros defensores de uma ruptura diplomática multilateral com o neo-unilateralismo dos EUA devem pressionar a Europa a se retirar da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), na medida em que essa organização funciona principalmente como ferramenta militar da  diplomacia do dólar e do petróleo e, portanto, opondo-se às políticas de combate à mudança climática e de confronto militar que ameaçam tornar a Europa parte do turbilhão dos EUA.

Finalmente, o que os oponentes da guerra nos EUA podem fazer para resistir aos neocon, que tentam destruir qualquer parte do mundo que resista à autocracia neoliberal dos EUA?

Essa foi a grande decepção do fim de semana.

Não foi útil para a senadora Elizabeth Warren e outros acusarem Trump de agir precipitadamente, sem pensar nas consequências de suas ações.

Essa abordagem evita o reconhecimento de que a ação de Trump realmente tinha uma justificativa — faça uma linha na areia, para dizer que sim, os Estados Unidos entrarão em guerra, lutarão contra o Irã, farão qualquer coisa para defender seu controle do petróleo do Oriente Médio e ditar a política do banco central da OPEP, defender suas legiões do Isis — como se qualquer oposição a essa política fosse um ataque aos próprios Estados Unidos.

Eu posso entender a resposta emocional ou ainda novos pedidos de impeachment de Donald Trump. É óbvio, para não iniciantes, que foi uma jogada partidária do Partido Democrata.

Mais importante é a acusação falsa de que o presidente Trump ultrapassou seu limite constitucional ao cometer um ato de guerra contra o Irã.

O Congresso endossou o assassinato e é totalmente culpado por ter aprovado o orçamento do Pentágono com a remoção da emenda à Lei de Autorização de Defesa Nacional de 2019, através da qual Bernie Sanders, Tom Udall e Ro Khanna explicitamente não autorizavam o Pentágono a fazer guerra contra o Irã ou assassinar suas autoridades.

Os três inseriram a emenda na Câmara dos Deputados.

Quando esse orçamento foi enviado ao Senado, a Casa Branca e o Pentágono (também conhecido como complexo industrial militar e neoconservador) removeram essa restrição.

Era uma bandeira vermelha anunciando que o Pentágono e a Casa Branca realmente pretendiam fazer guerra contra o Irã e / ou assassinar suas autoridades.

O Congresso não teve coragem de discutir o assunto.

Por trás de tudo isso está o 11 de setembro, inspirado na Arábia Saudita, que retirou o poder do Congresso de fazer guerra — a Autorização para o Uso da Força Militar, de 2002, foi puxada para fora da gaveta ostensivamente contra a Al Qaeda, mas na verdade tratou-se do primeiro passo para a guerra permanente dos EUA.

A questão é: como fazer com que os políticos do mundo — EUA, Europa e Ásia — vejam que  a política do tudo ou nada dos Estados Unidos está ameaçando novas ondas de guerra, refugiados, interrupção do comércio de petróleo no Estreito de Ormuz e, finalmente, aquecimento global e dolarização neoliberal impostas a todos os países?

Um sinal de quão pouco poder existe nas Nações Unidas é que nenhum país esteja pedindo um novo julgamento de crimes de guerra ao estilo de Nuremberg, nenhuma ameaça de retirada da OTAN ou mesmo fale em evitar manter reservas sob a forma de dinheiro emprestado ao Tesouro, para financiar o orçamento militar dos Estados Unidos.


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Comentários

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Zé Maria

Os golpes do petróleo,
no Irã e no Brasil

Por Luiz Carlos Azenha, no Viomundo TV
https://youtu.be/1P9PEL0mOlc

claudio

Excelente, concordo totalmente Michael Hudson.

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