Fátima Oliveira: Uma república democrática e laica sob o “Sistema jagunço”

Tempo de leitura: 3 min

cunha

Uma república democrática e laica sob o “Sistema jagunço”

Fátima Oliveira, em O TEMPO

[email protected] @oliveirafatima_

Difícil escolher um tema, pois 2015 tem sido pura pauleira política. Estou que nem quando escrevi “Quero o aconchego de uma República laica, e nada mais” (O TEMPO, 31.5.2011).

Isto aqui, o Brasil, é uma República democrática e laica. Entretanto, pelas manchetes, a impressão que se tem, desde o último dia 2 de janeiro, é que estamos nas soleiras de uma teocracia: “Aborto só vai à votação se passar pelo meu cadáver”, diz Cunha, que retoma um projeto para instituir o Dia do Orgulho Hétero e outro que proíbe a adoção de criança por casais gays; Cunha pode entregar a TV Câmara a partido ligado à Igreja Universal; Cunha diz que é “preciso parar de discriminar a atuação de deputados evangélicos porque têm seus projetos e são atendidos igual aos outros no regimento”.

Sob o laicismo, nenhuma religião pode dar o tom das leis nem emitir normas de comportamento para todo o povo, porém estamos vivenciando algo que não há paralelo na vida real, apenas na literatura: o sistema “jagunço”, “instituição situada ao mesmo tempo dentro da esfera da lei e do crime”. Eduardo Cunha (PMDB-RJ) instaurou o sistema “jagunço” de governar sem ser presidente!

Repito: “Perdi a paciência: quero a República terrena de volta!” no artigo que iniciei indagando: “Afinal, o que é República (do latim, ‘res publica’: coisa pública)?” (O TEMPO, 12.10.2010). República é um regime de governo que tem como eixo a defesa dos valores e dos princípios republicanos.

Sob a democracia (regime político), o espírito republicano tem como um valor a independência entre os Poderes, que aqui são três: Executivo; Judiciário e Legislativo – em âmbito federal, é um sistema bicameral: Senado e Câmara dos Deputados –, cada um deles com suas missões definidas na Constituição Federal de 1988 (Título IV – Da organização dos Poderes, artigos 44 a 135).

A nossa República (regime de governo) democrática (regime político) e laica está sob ameaça, pois as consignas republicanas da governabilidade estão sendo destruídas com a chegada à presidência da Câmara dos Deputados de Eduardo Cunha – lobista, segundo sua folha corrida, e evangélico fundamentalista, da igreja Sara Nossa Terra, seguidor do bispo Robson Rodovalho.

Segundo o Diap, o Congresso que emergiu das eleições de 2014 se configura como o mais conservador desde o fim da ditadura de 1964, logo, mais do que suficiente para dar o ar de trevas que nada tem a dever à jagunçagem! Acertou o diretor de Documentação do Diap, Antônio Augusto, quando declarou: “São sérios os riscos de retrocessos em relação aos direitos civis e à legislação trabalhista”.

Se a eleição de Severino Cavalcanti, em 2005, à presidência da Câmara foi uma surpresa repleta de atabalhoamentos, a de alguém como Eduardo Cunha, também do baixo clero, da turma do troca-troca, era o que se chama de “favas contadas”.

Como em 2005, em 2015 foi a política que saiu perdendo, com o agravante de que, se Severino era um misógino “católico roxo”, Eduardo Cunha é fundamentalista roxo, orgânico e militante, o que faz toda a diferença, vide o sistema “jagunço” de fazer política, um sistema de poder que ele implementa com ares e desenvoltura de presidente do Brasil!

Se Severino Cavalcanti tinha aquele olhar de paspalhão, o de Cunha é puro Hermógenes, um chefe jagunço de “Grande Sertão: Veredas”, de Guimarães Rosa, que nem sequer respeitava as normas/leis da jagunçagem, como disse Riobaldo Tatarana: “O senhor sabe: sertão é onde manda quem é forte, com as astúcias. Deus mesmo, quando vier, que venha armado”.

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Comentários

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Eunice

Eu senti falta de Protógenes e fui ver seu site. Até me arrepiei. Ele não é moleque não.

    Eunice

    Segundo o Diap, o Congresso que emergiu das eleições de 2014 se configura como o mais conservador desde o fim da ditadura de 1964, logo, mais do que suficiente para dar o ar de trevas que nada tem a dever à jagunçagem!

    Bom texto e más noticias.

Laura Antunes

O Cláudio escreveu: “Por favor, me esclareçam! Essa situação apresentada acima não é, também, aparelhamento da máquina pública?”

Vc tem razão, é sim aparelhamento da máquina pública!

carlos

Estamos diante de um PARLAMENTARISMO jagunço, aonde os achacadores acham que podem tudo ou melhor, podem tudo porque os tolos os colcocaram lá no congresso, e mais deram -lhe uma procuração para achacarem o povo brasileiro, reforma politica já, total irrestrita e feita por projetos de iniciativa populares.

FrancoAtirador

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O Projeto de República Democrática BraSileira sucumbiu.
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Quem manda é a Inter American Press Association (IAPA).
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(http://www.sipiapa.org/en/category/noticias-en/press-releases)
(http://blogln.ning.com/forum/topics/entenda-o-que-a-sociedade-interamericana-de-imprensa)
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    Rodrigo

    Dilminha pertence ao Foro de São Paulo amigo. O Foro quer integrar a américa latina e chamá-la de Unasul. Estou fora de bloco ideológico.

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