Entendendo o conceito da Liga de Democracias

Tempo de leitura: 15 min

Caros leitores, eu me dei ao trabalho de fazer uma tradução parcial do artigo que John McCain escreveu para a revista Foreign Affairs propondo a tal Liga de Democracias. Por trás do palavreado bonito está a constatação de que os Estados Unidos já não podem fazer guerras à vontade e, portanto, precisam dividir o peso econômico de sua política externa com parceiros como a Índia, o Brasil, a Indonésia, a Malásia e outros.

Os objetivos são, claramente, os de contenção da Rússia e da China, com a expansão mundial do “livre mercado” — o que conhecemos como globalização. As parcerias estratégicas reconhecem o espaço de atuação regional das sub-potências, em troca de apoio aos Estados Unidos em um mundo multilateral. A primeira demonstração claríssima desta estratégia está acontecendo, por acaso, exatamente neste momento: os Estados Unidos deram à França e ao Reino Unido liberdade para assumir o controle do Mediterrâneo, via derrubada do ditador da Líbia, Muamar Kadafi.

Com pequenas variações, as propostas de John McCain foram adotadas pelo governo Obama. Não se trata, caros leitores, de uma aberração. A política externa americana obedece a um consenso bipartidário. McCain apenas foi mais explícito ao apresentá-la:

October 16, 2007

Uma paz duradoura construída sobre a liberdade

John McCain, na Foreign Affairs

Desde a aurora de nossa república, os americanos tem acreditado que nossa Nação foi criada com um propósito. Nós somos, como disse Alexander Hamilton, “um povo de grandes destinos”. Da Revolução Americana à Guerra Fria, os americanos entenderam seu dever de servir a uma causa maior que seu interesse pessoal e a manter os princípios universais da Declaração da Independência. Ao superar ameaças à sobrevivência de nossa Nação e ao nosso modo de vida, e ao se aproveitar das grandes oportunidades oferecida pela História, os americanos mudaram o mundo.

Agora é a vez desta geração de restaurar e reabastecer a crença do mundo em nossa Nação e nossos princípios. O presidente Harry Truman disse uma vez, “Deus nos criou e nos trouxe à nossa presente posição de poder e força por algum objetivo maior”. No tempo dele, o grande objetivo era erigir as estruturas da paz e da prosperidade que nos garantiram passagem segura pela Guerra Fria. Em face de novos perigos e oportunidades, nosso próximo presidente terá o mandato para construir uma paz global duradoura nas fundações da liberdade, segurança, oportunidade, prosperidade e esperança.

Os Estados Unidos precisam de um presidente que possa revitalizar nossos objetivos e nosso papel no mundo, derrotar adversários terroristas que ameaçam nossa liberdade em casa e no estrangeiro e construir paz duradoura. Há uma enormidade por fazer. Nossas guerras no Iraque e Afeganistão foram custosas em sangue e tesouro e tiveram outros custos menos tangíveis. Nosso próximo presidente vai precisar reunir nações de todo o mundo em torno de causas comuns como só os Estados Unidos podem fazer. Não haverá tempo para treinamento em serviço. Dados os presentes perigos, nosso país não pode arcar com o tipo de desconforto, desvios e fraquezas que se seguiram à Guerra do Vietnã. O próximo presidente precisa estar preparado para liderar os Estados Unidos e o mundo à vitória — e para aproveitar as oportunidades dadas pela liberdade e prosperidade sem precedentes do mundo de hoje, para construir a paz que durará um século.

WINNING THE WAR ON TERROR

Derrotar o extremismo radical islâmico é o desafio da segurança nacional de nosso tempo. O Iraque é a frente central da guerra, de acordo com nosso comandante lá, general David Petraeus, e de acordo com nossos inimigos, inclusive a liderança da al Qaeda.

Os anos recentes de mau gerenciamento e fracasso no Iraque demonstraram que os Estados Unidos só deveriam ir à guerra com número suficiente de tropas e com um plano realista e completo para o sucesso. Não fizemos isso no Iraque e nosso país e o povo do Iraque pagaram um preço caro. Só depois de quatro anos de conflito os Estados Unidos adotaram uma estratégia de contrainsurgência, apoiada por crescente número de tropas, o que nos dá uma chance realística de sucesso. Não podemos recuperar os anos perdidos e agora a única ação responsável para um candidato presidencial é olhar para a frente e adotar uma postura estratégica no Iraque que seja a melhor para os interesses nacionais dos Estados Unidos.

Enquanto pudermos ter sucesso no Iraque — e acredito que podemos — temos de tentar. As consequências do fracasso seriam horríveis: uma perda histórica na mão de extremistas islâmicos que, depois de terem derrotado a União Soviética no Afeganistão e os Estados Unidos no Iraque, acreditariam que o mundo está no caminho adotado por eles e que tudo seria possível; um estado falido no coração do Oriente Médio dando santuário para terroristas; uma guerra civil que rapidamente se tornaria um conflito regional e mesmo genocídio; um fim decisivo para a perspectiva de uma democracia moderna no Iraque, na qual grandes maiorias de iraquianos tem repetidamente votado; e um convite para o Irã dominar o Iraque e a região ainda mais.

Se o sucesso se aproximar ou se tornar mais distante nos próximos meses, é claro que o Iraque será uma questão central para o próximo presidente dos Estados Unidos. Candidatos democratas tem prometido retirar tropas americanos e o “fim da guerra”, independentemente das consequências. Tomar tais decisões baseadas nos ventos políticos domésticos, em vez da realidade do teatro de operações, é cortejar o desastre. A guerra do Iraque não pode ser wished away e é um erro de cálculo de magnitude histórica acreditar que as consequências do fracasso seriam limitadas apenas a um governo ou partido. Esta é uma guerra americana e o resultado dela vai tocar em cada um de nossos cidadãos durante os próximos anos.

É por isso que apoio as tentativas continuadas de vencer no Iraque. É por isso que eu me oponho à estratégia de retirada preventiva, que não inclui um plano B para o futuro, teria fracasso inevitável e causaria problemas ainda maiores.

O que acontecer no Iraque também vai afetar o Afeganistão. Houve progresso no Afeganistão: mais de dois milhões de refugiados regressaram, o bem-estar dos cidadãos afegãos melhorou de forma marcante e eleições históricas aconteceram em 2004. O ressurgimento recente do talibã, no entanto, ameaça fazer o Afeganistão reverter a seu papel pré-11 de setembro, de santuário para terroristas com alcance internacional. Nosso novo compromisso com o Afeganistão precisa incluir forças da OTAN, suspender as restrições debilitantes de quando e como tais forças podem lutar, expandir o treinamento e equipamento do Exército Nacional Afegão através de uma parceria de longo prazo com a OTAN, tornar o exército mais profissional e multiétnico e aumentar o número de instrutores de polícia estrangeiros. Precisa também tratar das deficiências atuais em reforma judiciária, reconstrução, governança e esforços anticorrupção.

Sucesso no Afeganistão é crítico para frear a al Qaeda, mas sucesso no vizinho Paquistão também é vital. Precisamos continuar a trabalhar com o presidente Pervez Musharraf para desmantelar as células e campos de treinamento do tabilã e da al Qaeda mantidas no país. Estes grupos ainda tem santuários lá, e a “talibanização” da sociedade paquistanesa está avançando. Os Estados Unidos precisam ajudar o Paquistão a resistir às forças do extremismo, ao assumir um compromisso de longo prazo com o país. Isso significa melhorar a capacidade do Paquistão de agir contra os santuários dos insurgentes, trazendo as crianças para dentro das escolas e para fora das madrassas extremistas, apoiando os paquistaneses moderados.

Nossas tentativas de contraterrorismo não podem ser limitadas a grupos que operam em santuários. O Irã, o estado-chefe do mundo em patrocínio do terrorismo, continua sua busca mortal por armas nucleares e os meios para dispará-las. Protegido por um arsenal nuclear, o Irã estaria ainda mais disposto e capaz de patrocinar ataques terroristas contra qualquer inimigo, inclusive os Estados Unidos e Israel, ou mesmo a entregar materiais nucleares para uma de suas redes de terroristas aliados.

O próximo presidente precisa confrontar esta ameaça diretamente, e esse esforço precisa começar com sanções políticas e econômicas mais duras. Se as Nações Unidas não agirem, os Estados Unidos precisam liderar um grupo de países para impor eficazes sanções multilaterais, como restrições na exportação de gasolina refinada, por fora das Nações Unidas. Os Estados Unidos e seus parceiros deveriam privatizar as sanções, dando apoio a uma campanha de desinvestimento para isolar e deslegitimar o regime de Teerã, cujas políticas já recebem oposição de muitos cidadãos iranianos. E a ação militar, embora não seja a opção preferida, precisa continuar na mesa: Teerã precisa entender que não pode vencer um confronto com o mundo.

Enquanto isso, em vista das crescentes ameaças a Israel — do Irã, Hezbollah, Hamas e outros — o próximo presidente dos Estados Unidos precisa continuar a antiga política de apoio a Israel, inclusive com o fornecimento de tecnologia e equipamento militar para que Israel mantenha sua vantagem militar qualitativa. A antiga busca por paz entre Israel e os palestinos precisa continuar prioritária. Mas o objetivo precisa ser paz genuína, e o Hamas precisa ser isolado ainda que os Estados Unidos intensifiquem seu compromisso de encontrar um acordo duradouro.

Derrotar os terroristas que ameaçam os Estados Unidos é vital, mas tão importante quanto é evitar que uma nova geração deles se junte à luta. Como presidente, vou empregar toda ferramenta econômica, diplomática, política, legal e ideológica à nossa disposição para ajudar os muçulmanos moderados — os defensores dos direitos da mulher, sindicalistas, advogados, jornalistas, professores, imãs tolerantes e muitos outros  — que estão resistindo à bem financiada campanha extremista que está destruindo as sociedades muçulmanas. Meu governo e seus parceiros vão ajudar estados muçulmanos amigáveis a construir os tijolos de sociedades abertas e tolerantes. E vamos fazer crescer uma cultura de esperança e oportunidade econômica ao estabelecer uma área de livre comércio do Marrocos ao Afeganistão, aberta a todos os que não apoiarem o terrorismo.

DEFENDING THE HOMELAND

Em 1947, o governo Truman lançou uma reforma maciça das agências de política externa, defesa e inteligência para enfrentar os desafios da Guerra Fria. Hoje, precisamos fazer o mesmo para enfrentar os desafios do século vinte e um. Nossas forças armadas estão seriamente sobrecarregadas e sub-financiadas. Como presidente, vou aumentar o tamanho do Exército dos Estados Unidos e dos Fuzileiros Navais do nível atualmente planejado, de 700 mil soldados para 900 mil soldados. Melhorar o recrutamento vai demandar recursos e tempo, mas precisa ser feito tão rapidamente quanto possível.

Além de mais pessoal, nossos militares precisam de equipamento adicional para compensar as perdas recentes e se modernizar. Podemos enfrentar parcialmente essa necessidade de investimento adicional cortando gastos desnecessários. Mas também podemos gastar mais em defesa, que atualmente consome menos de 4 centavos para cada dólar que nossa economia gera — muito menos do que gastávamos durante a Guerra Fria. Também precisamos acelerar a transformação de nossas Forças Armadas, que ainda estão configuradas para lutar contra inimigos que já não existem.

Os Estados Unidos precisam não apenas de mais soldados, mas de soldados com aptidões necessárias para ajudar governos amigáveis e suas forças de segurança a resistir diante de inimigos comuns. Eu vou criar o Corpo de Assessoria do Exército com 20 mil homens para fazer parcerias com exércitos estrangeiros, e vou aumentar o número de tropas nas forças especiais para se engajar em operações, atividades civis, policiamento militar e inteligência militar. Também precisamos de uma força policial não militar para treinar forças estrangeiras no exterior e para ajudar a manter a ordem em lugares ameaçados pelo colapso estatal.

Hoje, o entendimento de culturas estrangeiras não é um luxo, mas uma necessidade estratégica. Como presidente, vou lançar um curso rápido em escolas civis e militares para preparar mais especialistas em idiomas críticos como árabe, chinês, farsi e pashtun. Estudantes em nossas academias militares deveriam ser obrigados a estudar fora. Vou aumentar o programa dos Foreign Area Officer e criar uma nova especialidade em interrogatórios estratégicos para produzir mais interrogadores que possam obter conhecimento crítico de detidos usando técnicas psicológicas avançadas, em vez das táticas abusivas proibidas pela Convenção de Genebra.

Vou estabelecer uma nova agência inspirada no Office of Strategic Services. Uma OSS moderna poderia juntar especialistas em guerra não convencional, questões civis, guerra psicológica; operação de ações clandestinas; e especialistas em antropologia, propaganda e outras disciplinas relevantes dentro e fora do governo. Como a OSS original, esta seria uma organização pequena e ágil. Lutaria contra a subversão terrorista em todo o mundo e no ciberespaço. Poderia assumir riscos que nossos burocratas de hoje raramente consideram correr — como colocar agentes infiltrados sem cobertura diplomática em organizações e países terroristas –,  jogando um papel-chave nas tentativas de reconstruir estados falidos.

No momento em que aumentamos nossa capacidade militar, precisamos melhorar também nossa capacidade civil. Como presidente, vou energizar e expandir nossas capacidades de reconstrução pós-conflito para que qualquer campanha militar seja complementada por uma ação civil para construir as fundações políticas e econômicas da paz. Para melhor coordenar nossas disparatadas operações civis e militares, vou pedir ao Congresso para dar sequência ao Ato Goldwater-Nichols de 1986, que forneceu as bases para operações conjuntas de nossas forças militares. O novo ato poderia criar as bases para forças civis e militares trabalharem e treinarem juntas para facilitar a cooperação nas tarefas de reconstrução pós-conflito.

Também precisamos revitalizar nossa diplomacia pública. Em 1998, o governo Clinton e o Congresso erroneamente concordaram em abolir a Agência de Informação dos Estados Unidos e transferir suas funções diplomáticas para o Departamento de Estado. Isso equivale ao desarmamento unilateral na guerra de ideias. Vou trabalhar com o Congresso para criar um nova agência independente com o único propósito de levar a mensagem dos Estados Unidos ao mundo — um elemento crítico para combater o extremismo islâmico e restaurar nossa imagem positiva no estrangeiro.

UNITING THE WORLD’S DEMOCRACIES

Nossas organizações e parcerias precisam ser tão internacionais quanto os desafios que confrontamos. Hoje, soldados dos Estados Unidos servem no Afeganistão com britânicos, canadenses, holandeses, alemães, italianos, lituanos, poloneses, espanhóis e turcos da OTAN. Eles também servem ao lado de forças da Austrália, Japão, Nova Zelândia, Filipinas e Coreia do Sul — todos aliados democráticos ou parceiros próximos dos Estados Unidos. Mas estas tropas não são parte de uma estrutura comum. Elas não trabalham juntas sistematicamente ou se encontram regularmente para desenvolver estratégias diplomáticas e econômicas e enfrentar desafios comuns.

A OTAN começou a preencher este espaço pela promoção de parcerias entre a aliança e as grandes democracias da Ásia e de outras regiões. Nós deveríamos ir além ao juntar as nações democráticas em uma organização comum: uma Liga de Democracias mundial. Não seria como o plano fracassado de Woodrow Wilson, de uma Liga das Nações de alcance universal. Em vez disso, seria similar ao que foi previsto por Theodore Roosevelt: nações com princípios comuns trabalhando juntas por paz e liberdade. A organização agiria quando as Nações Unidas fracassarem — para reduzir o sofrimento humano em lugares como Darfur, combater HIV/Aids na África subsaaariana, desenvolver melhores políticas para enfrentar crises ambientais, dar acesso desimpedido àqueles que buscam liberdade econômica e política ou tomar outras medidas não-alcançáveis por sistemas existentes, regionais ou universais.

Esta Liga de Democracias não suplantaria as Nações Unidas nem outras organizações internacionais, mas as complementaria aproveitando as vantagens morais e políticas oferecidas pela ação democrática unitária. Ao dar passos para colocar pressão conjunta em tiranos da Birmânia (rebatizada de Myanmar pelo governo militar em 1989) ou Zimbábue, se unindo para impor sanções ao Irã, dando apoio a democracias-em-risco na Sérvia ou Ucrânia, a Liga de Democracias serviria como mão a serviço da liberdade. Se eu for eleito presidente, durante meu primeiro ano de governo vou promover uma cúpula das democracias do mundo para ouvir a visão de meus colegas e explorar os passos necessários para dar corpo a esta visão — da mesma forma que os Estados Unidos lideraram a criação da OTAN seis décadas atrás.

REVITALIZING THE TRANSATLANTIC PARTNERSHIP

Os Estados Unidos não ganharam a Guerra Fria sozinhos: a aliança transatlântica venceu, juntamente com parceiros de todo o mundo. As ligações que temos com a Europa em termos históricos, de valores e interesses, são únicas. Infelizmente, elas se esgarçaram. Como presidente, uma de minhas prioridades em política externa será revitalizar nossa parceria transatlântica.

Os americanos deveriam dar boas vindas à ascensão de uma União Europeia forte e confiante. O futuro da aliança transatlântica se baseia em enfrentar os desafios mundiais do século 21: desenvolver uma política energética comum, criar um mercado comum transatlântico para reunir nossas economias ainda mais, institucionalizar nossa cooperação em questões como mudanças climáticas, ajuda externa e promoção da democracia.

Uma década e meia atrás, o povo russo jogou fora a tirania do comunismo e parecia determinado a construir uma democracia e um mercado livres para se juntar ao Ocidente. Hoje, vemos na Rússia a diminuição das liberdades políticas, uma liderança política dominada por uma claque de espiões, tentativas de ameaçar vizinhos democráticos, como a Georgia, e tentativas de manipular a dependência da Europa do petróleo e gás da Rússia. Precisamos de uma nova postura ocidental para enfrentar essa Rússia revanchista.

Precisamos começar por garantir que o G-8, o grupo de estados altamente industrializados, se torne novamente um clube das democracias de mercado: deveria incluir o Brasil e a Índia, mas excluir a Rússia. Em vez de tolerar a chantagem nuclear ou os ciberataques da Rússia, as nações ocidentais deveriam deixar claro que a solidariedade da OTAN, dos estados bálticos ao Mar Negro, é indivisível e que as portas da organização permanecem abertas para todas as democracias comprometidas com a defesa da liberdade. Precisamos aumentar nossos programas para apoiar a liberdade e a lei na Rússia e enfatizar que uma parceria genuína permanece aberta se Moscou desejar, mas que tal parceria envolve compromisso em ser um ator responsável, em termos domésticos e internacionais.

Mais amplamente, os Estados Unidos precisam fazer renascer a solidariedade democrática que uniu o Ocidente durante a Guerra Fria. Não podemos construir a paz duradoura baseada em liberdade por nossa própria conta. Precisamos estar dispostos a ouvir os aliados democráticos. Ser um grande poder não significa que faremos o que quisermos quando quisermos, nem devemos pretender que temos toda a sabedoria, o conhecimento e os recursos necessários para ser bem sucedidos. Quando acreditamos que ação internacional — seja militar, econômica e diplomática — é necessária, precisamos trabalhar para persuadir nossos amigos e aliados de que estamos certos. E precisamos também estar dispostos a ser persuadidos por eles. Para ser um bom líder, os Estados Unidos precisam ser um bom aliado.

SHAPING THE ASIA-PACIFIC CENTURY

O poder no mundo de hoje está se movendo para o Oriente; a região da Ásia-Pacífico está em ascensão. Se agarrarmos as oportunidades presentes em um mundo que se revela, este século pode se tornar seguro e tanto os Estados Unidos como a Ásia podem ser prósperos e livres.

A Ásia deu enormes passos em décadas recentes. Suas conquistas econômicas são bem conhecidas; menos conhecido é o fato de que mais pessoas vivem sob regimes democráticos na Ásia que em qualquer outra região do mundo. O ex-primeiro ministro do Japão falou de um “arco de liberdade e prosperidade” atravessando a Ásia. O primeiro-ministro da Índia chamou a democracia liberal de “ordem natural de organização social e política do mundo de hoje”. Os países asiáticos estão se aproximando, fazendo acordos de comércio e de segurança uns com os outros e com estados de outras regiões.

O regime totalitário da Coreia do Norte vai contra essa tendência. É incerto hoje se a Coreia do Norte está realmente comprometida com a desnuclearização verificável e com a prestação de contas de todos os seus materiais e instalações nucleares, dois passos que são necessários antes que um acordo diplomático duradouro seja fechado. Negociações futuras precisam levar em conta os programas de mísseis balísticos da Coreia do Norte, o sequestro de cidadãos japoneses e o apoio norte-coreano ao terrorismo e à proliferação.

A chave para enfrentar este e outros desafios numa Ásia em mudança é a cooperação com nossos aliados. O central para o futuro da região é o contínuo engajamento dos Estados Unidos. Dou boas vindas à liderança internacional e ao poder emergente do Japão, encorajo sua admirável “diplomacia baseada em valores” e apoio seu desejo de um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Como presidente, cuidarei de nossa aliança cada vez mais forte com a Austrália, cujas tropas estão lutando ombro a ombro com as nossas no Afeganistão e no Iraque. Vou tentar reconstruir nossa enfraquecida parceria com a Coreia do Sul, enfatizando cooperação econômica e de segurança e vou cimentar nossa crescente parceria com a Índia.

No Sudeste Asiático, vou buscar uma parceria elevada com a Indonésia e continuar a expandir nossa cooperação de defesa com a Malásia, as Filipinas, Cingapura e o Vietnã, trabalhando com parceiros regionais para promover a democracia; derrotar as ameaças do terrorismo, do crime e do tráfico de drogas; pôr fim aos deploráveis abusos de direitos humanos na Birmânia. Os Estados Unidos deveriam participar mais ativamente das organizações regionais da Ásia, inclusive daquelas lideradas por membros da Associação das Nações do Sudeste da Ásia. Como presidente, vou tentar institucionalizar uma nova parceria quadrilateral de segurança entre as maiores democracias da Ásia-Pacífico: Austrália, Índia, Japão e Estados Unidos.

Negociar com uma China em ascensão será um desafio central para o próximo presidente dos Estados Unidos. A recente prosperidade da China tirou mais gente da pobreza que qualquer outra época da história humana. O novo poder da China implica em responsabilidades. Cria expectativas legítimas de que a China vai se comportar como um parceiro econômico responsável, ao desenvolver um código transparente de conduta para suas corporações, garantir a segurança de suas exportações, adotar regras de mercado para sua moeda, e perseguir políticas ambientais sustentáveis, além de abandonar sua política de garantir sozinha seu suprimento de energia mundial.

A China também poderia aumentar a crença em sua “ascensão pacífica” se tornando mais transparente quanto a seu significativo aumento de poderio militar. Quando a China constrói novos submarinos, acrescenta centenas de novos caças, moderniza seu arsenal de mísseis balísticos e testa armas antisatélites, os Estados Unidos devem de forma legítima questionar as intenções de tais atos provocativos. Quando a China ameaça Taiwan democrática com um arsenal maciço de mísseis e retórica de guerra, os Estados Unidos devem anotar. Quando a China mantém relações econômicas e diplomáticas próximas com estados-pária como a Birmânia, o Sudão e o Zimbáue, tensão resultará. Quando a China propõe fóruns regionais e acordos econômicos desenhados para excluir os Estados Unidos da Ásia, os Estados Unidos vão reagir.

A China e os Estados Unidos não estão destinados a ser adversários. Temos numerosos interesses comuns. As relações Estados Unidos-China podem beneficiar os dois países e, assim, a região Ásia-Pacífico e o mundo. Mas até que a China caminhe para a liberalização política, nosso relacionamento será baseado em interesses comuns conjunturais, não em valores fundamentais.

Os Estados Unidos deveriam determinar o padrão de liberalização comercial na Ásia. Completar acordos de livre comércio com a Malásia e a Tailândia, explorar o potencial completo de nosso novo tratado com a Coreia do Sul e institucionalizar parcerias econômicas com a Índia e a Indonésia para que elas complementem acordos existentes com a Austrália e Cingapura deveriam servir de base para uma ambiciosa tentativa de liberalizar o comércio no Pacífico. Tal liberalização seria benéfica para americanos e asiáticos.

BUILDING A HEMISPHERE OF PEACE AND PROSPERITY

John F. Kennedy descreveu o povo da América Latina como nossos “amigos firmes e antigos, unidos pela história e pela experiência e por nossa determinação de fazer avançar os valores da civilização americana”. Os países da América Latina são nossos parceiros naturais, mas a desatenção dos Estados Unidos tem prejudicado nossos relacionamentos. Precisamos melhorar nossas relações com o México para controlar a imigração ilegal e derrotar os cartéis de drogas, e com o Brasil, um parceiro cuja liderança das forças de paz no Haiti é um modelo para fazer avançar a segurança regional. Meu governo daria a estas e outras grandes nações democráticas da América Latina uma forte voz na Liga de Democracias — uma voz negada a elas no Conselho de Segurança das Nações Unidas.

Precisamos trabalhar juntos para enfrentar a propaganda de demagogos que ameaçam a segurança e a prosperidade das Américas. Hugo Chávez presidiu o desmantelamento da democracia da Venezuela ao enfraquecer o Parlamento, o judiciário e a imprensa, os sindicatos livres e a iniciativa privada. Seu regime está adquirindo equipamento militar avançado. E está tentando construir um eixo antiamericano global. Meu governo vai trabalhar para marginalizar tais influências nefastas.  Também vai preparar imediatamente uma transição de Cuba para a democracia, desenvolvendo um plano regional e com parceiros europeus para uma Cuba pós-Castro, um plano pronto para detonar mudança rápida naquele país de sofrimento, quando chegar a hora. Precisamos construir sobre o Tratado de Livre Comércio da América Central, aprovando os acordos com a Colômbia, o Panamá e o Peru, movendo adiante o processo de completar a Área de Livre Comércio das Américas.

(…)

Quase dois séculos atrás, James Madison delcarou que “a grande luta da Época” era “entre liberdade e despotismo”. Muitos pensaram que aquela luta terminou com a Guerra Fria, mas não. Ela assumiu novos disfarces, com os terroristas islâmicos que usam nossos avanços tecnológicos para seus desejos assassinos e autocratas ressurgentes que nos lembram o século 19. Terroristas internacionais capazes de infligir destruição em massa são um novo fenômeno. Mas o que eles buscam e o que representam são tão velhos quanto o tempo. Eles são parte de uma luta política, econômica e filosófica entre o futuro e o passado, entre o progresso e a reação, entre a liberdade e o despotismo. Nossa segurança, nossa prosperidade e nossa forma de vida democrática dependem do resultado de tal luta.

Thomas Jefferson argumentou que os Estados Unidos eram “uma república solitária do mundo, o único monumento para direitos humanos, o depositário do fogo sagrado da liberdade e do auto-governo, a partir do qual o fogo deve ser aceso em outras regiões do mundo, se outras regiões da terra se tornarem suscetíveis à sua influência benigna”. Desde aquela época, dois séculos atrás, quando os Estados Unidos eram “uma república solitária no mundo”, mais gente do que nunca está sob a “influência benigna” da liberdade. A proteção e a promoção do ideal democrático, em casa e fora, serão a forma mais certa de segurança e paz para o século que está diante de nós. O próximo presidente dos Estados Unidos precisa estar pronto para liderar, pronto para mostrar aos Estados Unidos e ao mundo que os melhores dias deste país ainda estão adiante, e pronto para estabelecer a paz duradoura baseada na liberdade, o que pode garantir a segurança americana pelo resto do século 21. Eu estou pronto.


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Comentários

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abarbosafilho

É incrível o que o dinheiro da indústria armamentista e a vocação "missionária" , juntos, podem fazer! O McCain é um fanático, um mercenário em busca de uma guerra, qualquer guerra, na qual se alistar. Claro que, com essa idade, ele não se alistaria fisicamente, mas alistaria os jovens americanos para morrerem e (pior ainda) matarem, em nome de nobres falsas causas.
Aliás, quando Bushinho invadiu o Iraque, só um filho de general das três Forças foi convocado (e para funções burocráticas) e nenhum filho de congressista. Os caras são loucos, mas nem tanto, né?

Wendel

Qta humanidade! Qta "defesa" da democracia, e direitos humanos! Chega a ser angelical! E pensar que eu antes acreditava! Como é bom pesquisar, estudar, comparar e finalmente ver que, o que pregam nada mais é que o clássico "faça o que eu digo mas não faça o que eu faço"! . É hilário! e o pior, tem gente que acredita! Pobres mortais, que ainda estão décadas/séculos distantes de descobrirem que a verdade que eles divulgam, só os favorecem, e o rsto que se danem!
E a imprensa? Esta lacaia? Os que te gostam, que te comprem!

valdeci elias

Hitler queria mil anos de paz, McCaim é mais humilde , só quer um seculo de paz.

Filipe Rodrigues

McCain e pricipalmente Obama, não perceberam que assim como o comunismo autoritário, o livre-mercado sem regulação morreu.
O cenário nos países desenvolvidos para os próximos anos é de lutas internas, a população aos poucos como nos países árabes vai saindo as ruas para protestar contra os atuais governos que privilegiam banqueiros e cortam gastos sociais.
Obama aposta no comércio internacional para os EUA saírem da crise (coitado), um dos motivos que levaram Dilma e Mantega a pisarem um pouco no acelerador no crescimento brasileiro é para evitar futuras bolhas especulativas, Dilma aposta que a economia mundial vai entrar numa nova crise em 2012 igual a de 2008, se isso ocorrer Obama já era e para o Brasil se sair ainda melhor que em 2008/09 precisa reduzir os juros e ajustar o dólar.
Sarkozy é outro que está com a corda no pescoço, precisa de algo que possa aumentar sua popularidade, por isso que ataca a Líbia, algumas pesquisas eleitorais colocam Sarkozy em 3º lugar na disputa presidencial francesa, atrás da extrema-direita e dos socialistas.
Na América Latina, o cenário por incrível que pareça é de calmaria, a instabilidade é sempre causada por aliados de Washington, o candidato de esquerda (Ollanta Humala) vem crescendo nas eleições peruanas, Daniel Ortega deve ser reeleito, Cristina Kirchner também.

Julião

Nos nossos dias a agenda americana, descrita pelo candidato republicano a presidencia dos USA, é independente do presidente ou congresso eleito.

As "agencias", conglomerados econômicos, funcionários dos governos e outros, aplicam o acima descrito pelo MaCain independente de qualquer coisa. Estes conceitos de "defesa nacional, livre comercio, liberdades, etc" são cortinas de fumaça para a grande estratégia americana de dominação mundial pela submissão dos povos e governos.

Se existir um anti Cristo, esse seria atualmente os USA.

C. Bertoldo Arruda

Em "Banhos de sangue" , Chomsky relata que em um avião de combate podia-se ler "Nosso negócio é a morte. E nosso negócio vai indo bem". Parece que esse sr. McCain aprendeu pouca coisa no Vietnã, exceto que a indústria bélica não pode parar.

beattrice

"Há muito que fazer", se isso não é uma intimidação coletiva, não sei o que é.
Mas lá para os lados da Coréia do Norte eles não se atrevem a esticar os olhinhos não é não?
A Guerra da Coréia eles narram de outro jeito.

ZePovinho

Cabe reprisar aquele artigo do Nicholas Spykman,Azenha.

Marinho

Só gente boa ele citou, como por exemplo, Theodore Roosevelt do "big stick" e Harry Truman, de Hiroshima e Nagasaki.

glapido

Excelente iniciativa de traduzir e publicar esta peça.
Ainda mais porque, conforme você apontou, mais do que propostas, já são fatos.
Olha outro aí:
"Precisamos melhorar nossas relações com o México para controlar a imigração ilegal e derrotar os cartéis de drogas"
E olha no que está dando,
aqui

SILOÉ

Esse plano da liga das democracias não se parece um pouco com a liga das escolas de sambas do Rio?
Pelo menos no caráter dos membros, e nos meios utilizados…

Abestado colonizado

Azenha,
Respeito o senador John McCain por ser um heroi de guerra; creio que ele acredita em tudo o que disse.
Mas, convenhamos. Que povo mais paranoico e' o americano; alem de hipocrita. Quantas bases militares americanas estao espalhadas neste mundo, pergunto. E a explosao de Alcantara ficou ate' hoje sem resposta convincente. Inclusive, nossas autoridades fingem que foi no Afeganistao.

Gustavo Pamplona

Então quero que o Brasil seja muito bem-vindo a Liga das Democracias!

Ronaldo Irion

Aí está a doutrina do IV Reich. Espero que fracasse fragorosamente, e que leve junto o Império do mal naziamericano.

@sventura_sp

Os americanos usam exaustivamente os termos liberdade, democracia e direitos individuais, todos são conceitos absolutamente desejaveis em um mundo marcado por intolerância, repreesão e guerras de todos os tipos, entretanto esses conceitos por si só são vazios, se não explicitarmos que liberdade deve ocorrer perante o Estado, mas também perante as grandes forças econômicas que esmagam os direitos individuais, e democracia somente ocorre quando iguais podem ter a mesma voz e acesso ao poder, deixando de fazer sentido quando se trata apenas de jogar palavrório na imprensa, na internet ou nas ruas, assim sendo somente temos democracia com mais justiça social e mais desconcentração de renda, o que iguala as pessoas, e tal não soa, ao menos explicitamente, nos discursos americanos.

Nelson

Azenha. Esqueci de agregar mais estas palavras no comentário anterior:
Depois de iniciar o artigo apresentando seu país como o campeão do altruísmo, McCain não se contém e, já no 5º parágrafo, confessa a verdadeira razão pela qual se move o governo dos EUA:
“Não podemos recuperar os anos perdidos e agora a única ação responsável para um candidato presidencial é olhar para a frente e ADOTAR UMA POSTURA ESTRATÉGICA NO IRAQUE QUE SEJA A MELHOR PARA OS INTERESSES NACIONAIS DOS ESTADOS UNIDOS.”

luiz claudio

Nossa ,que emocionante,quase entro em extase,meus DEUS,como eles são hipócritas e arrogantes,esses yanques se acham,tudo é nós,somos nós;eu quero a paz,luto pela paz,mas isto tem que ser um desejo de todos,baseado no livre-arbítrio,o mundo dispensa os salvadores,aliás,só aceitamos um,JESUS CRISTO,o resto é conversa fiada.Quando será que os USA entenderam que eles não são a terra ,apenas uma das nações deste mundo.Viva o planeta terra,viva a humanidade igualitária e una,fora imperialistas.

FrancoAtirador

.
.
Pelo visto, quem quer que esteja no poder nos EUA

está pronto para manter a hegemonia norte-americana

a qualquer preço, a qualquer guerra e a qualquer golpe.
.
.

Nelson

Bem, Azenha, não cheguei a ler todo o artigo, pois não tive “saco” para tanto.
O que se vê, já no início, mesmo avizinhando-se o fim da primeira década do século 21 (o artigo é de 2007), é a persistência da crença de que existe um “povo escolhido” pela entidade superior; o povo estadunidense, é lógico.
Quando escreve que “os americanos entenderam seu dever de servir a uma causa maior que seu interesse pessoal”, McCain ressalta outra crença, a de que os EUA agem por um profundo sentimento altruísta. Nada mais ilógico em se tratando de capitalistas ferrenhos.
E ainda querem me convencer de que os árabes é que são os fundamentalistas.

    Morvan

    Boa noite.
    Nelson, esta lavagem cerebral de "povo escolhido" está presente também no imaginário dos israelenses. Seria só coincidência? Gêmeos siameses?

    Morvan, Usuário Linux #433640

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