Economistas propõem um Fundo Verde de Investimentos para o Brasil

Tempo de leitura: 5 min

Um Fundo Verde de Investimentos no Brasil

Por Alessandra Cavalcante de Oliveira, Cândido Ferreira da Silva Filho, Eduardo Marques, Izaias Borges e José Alex R. Soares, especial para o Viomundo

O debate em torno da economia verde, em especial sobre como se desenhar a transição de uma economia tradicional para economia verde, é intenso.

Muito tem se discutido em torno das novas matrizes energéticas, tecnologias mais eficientes e limpas e agricultura sustentável, mas pouco se consumou em relação à dinâmica dos investimentos, ou melhor, das condições de financiamento dos projetos desta nova matriz econômica.

O quadro que se delineia sobre as fontes de recursos é extremamente complexo, principalmente se pensarmos em termos de fontes tradicionais de financiamento.

Analisando em particular o Orçamento da União, podemos observar que a margem para investimentos é bastante restrita. Mesmo quando analisamos os fundos sobre a tutela de instituições constituídas já há algum tempo, como bancos de fomento e instituições financeiras tradicionais, observamos certa parcimônia no financiamento da transição ecológica.

O Orçamento da União se encontra sequestrado pelo Congresso, mas além disso, o volume de recursos disponibilizado para investimentos (despesas discricionárias) é extremamente baixo frente às demandas para enfrentamento dos problemas tradicionais do país.

Acreditamos que as novas demandas e as tradicionais não devem concorrer em termos orçamentário.

Mesmo as instituições clássicas de fomento, como BNDES, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, já possuem suas estratégias desenhadas com uma agenda própria de investimentos para superação dos gargalos apresentados no interior da nossa economia.

Desta forma, precisamos pensar uma alternativa eficiente para viabilizar investimentos estratégicos na transição ecológica.

A resposta que apresentamos aos obstáculos para financiamento dessa pauta da economia verde é a constituição de um Fundo Público Verde de Investimentos no Brasil (Funding).

Esse Fundo possuiria uma estratégia específica tanto na captação de recursos como no financiamento, sem concorrer com os recursos e as estratégias próprias do Orçamento Fiscal da União e tampouco se vinculando às instituições financeiras de fomento já assentadas e focalizadas em suas estratégias.

Do lado da fonte de recursos (captação), a inovação estaria nas diretrizes para a alavancagem dos recursos que vão alimentar o Fundo Verde de Investimentos.

Os recursos seriam alavancados por um conjunto de medidas tributárias (que poderiam estar inseridas em uma eventual reforma tributária), não concorrendo com os recursos orçamentários já existentes ou aportados diretamente pelo Tesouro.

A proposta inicial é irrigar o Fundo com um Imposto sobre as Commodities minerais, entendendo que essa taxa deve ser cobrada não apenas sobre as exportações, mas também sobre os dividendos gerados por esse setor.

O setor em particular é responsável por um passivo ambiental importante, além de descapitalizar as gerações futuras em detrimento das gerações presentes.

O aumento da tributação deste setor se justifica também uma vez que produz grandes externalidades negativas para o território brasileiro, sendo que o produto gerado pelo processo alimenta o desenvolvimento no exterior.

Gerando um enorme passivo ambiental interno e uma pequena capacidade de alavancar o emprego e a renda nacional, a tributação deste setor significa fonte importante para os investimentos do país em direção à transição ecológica.

Cumpre destacar que as Commodities Minerais são relativamente inelásticas em relação ao preço da demanda das exportações, mantendo uma margem significativa para cobrança desse imposto.

Já de início, um maior rigor na fiscalização sobre o setor poderia trazer resultados significativos no aumento de arrecadação.

Conforme estudo do Instituto de Justiça Fiscal (IJF), organização formada por economistas e auditores da Receita Federal, e coordenado pelo Observatório da Mineração, as mineradoras deixaram de pagar ao país cerca de US$ 5 bilhões (ou R$ 25 bilhões) em quatro anos (de 2017 a 2020), isso considerando apenas suas operações de exportação.

A outra fonte de recursos seria a propositura de um Imposto sobre o Carbono (carbon tax) mais amplo, sobre os setores que apresentam tradicionalmente passivos ambientais. Os índices percentuais de cada imposto e o volume total arrecadado dependerá do arranjo político e da envergadura da reforma tributária.

Ainda assim, estudo de Bráulio Borges, em artigo recente no blog do IBRE/FGV (com base em dados do FMI), estabelece que um Imposto sobre Carbono no Brasil seria capaz de gerar algo próximo de R$ 600 bilhões em dez anos.

O Fundo Verde de Investimentos poderia, futuramente, centralizar as diversas fontes nacionais e internacionais de investimentos nesta área (como Fundo de Desenvolvimento da Amazônia, coordenado pelo BNDES), exercendo um efeito gravitacional de atração de recursos financeiros para projetos de desenvolvimento da economia verde, tornando-se uma instituição estratégica na construção de uma alternativa de desenvolvimento sustentável.

A destinação dos recursos deste Fundo Verde de Investimentos também deve se constituir em outro aspecto inovador.

Com o foco voltado para projetos destinados à Geração de Energia Limpa, Mobilidade Urbana, Agricultura Familiar Orgânica, Infraestrutura Verde e Pesquisa das Universidades em Inovação Tecnológica para uma Economia Verde, os investimentos a serem priorizados devem buscar alavancar iniciativas estratégicas com grande potencial de geração futura de emprego e renda nacional, dentro de um novo modelo de desenvolvimento econômico e social sustentável.

Projetos que permitam o aprofundamento de “cadeias verdes industriais” no Brasil, gerando uma nova gama de empregos e produzindo valores adicionados a partir de uma matriz econômica mais sustentável, por exemplo, devem ser privilegiados.

Podem ser listados como exemplos o financiamento de projetos na área de energia limpa (fotovoltaica, eólica, etc.) ou ainda o desenvolvimento de motores elétricos mais potentes e com maior autonomia, alterando a indústria automobilística nacional de veículos leves, ônibus e caminhões.

O Fundo financiaria projetos de investimentos a partir das prioridades elencadas nos setores, liberando os recursos conforme as estratégias definidas dentro da análise da economia verde para cada setor.

A intenção seria priorizar os efeitos multiplicadores a partir das condições mínimas capazes de apresentar respostas a essas pautas, assim como irrigar o financiamento de pesquisas nessas áreas (Universidades, Institutos de Pesquisas e startups).

Em última instância, teríamos um Fundo Verde de Investimentos único para o Brasil, uma instituição nova sem precedentes para o desenvolvimento do país.

O Fundo Verde de Investimentos ficaria sob a gestão do Ministério do Planejamento, sendo peça fundamental no restabelecimento da importância estratégica deste órgão para o desenvolvimento do país. Sua missão será direcionar e conduzir (reger) a economia brasileira nessa transição para economia verde.

Os projetos seriam enviados para uma equipe de técnicos que teria a função de analisar e aprovar aqueles que melhor respondessem à estratégia definida de transição para a economia verde.

Para tanto, o Ministério do Planejamento deve ser restruturado e passar por uma ampliação de seus quadros técnicos, visando permitir a operacionalização, acompanhamento e viabilização dos projetos financiados pelo Fundo.
Instituições Públicas Financeiras poderão ser responsáveis pela intermediação financeira entre os recursos do Fundo e os projetos de investimento financiados.

Referências

BORGES, B. “IPCA bem abaixo do piso abre janela única para implementar carbon tax no Brasil e ajudar a saldar o custo fiscal da crise atual”. Maio 2020. Acesso em: 18 jun. 2022: https://blogdoibre.fgv.br/posts/ipca-bem-abaixo-do-piso-abre-janela-unica-para-implementar-carbon-tax-no-brasil-e-ajudar

SOARES, J.A.R.; FILHO, C.F.; MARQUES, E.C.V.; BORGES, I. “Oportunidade de um fundo verde para o financiamento da transição ecológica”. Teoria e Debate, Edição 223, 03/08/2022. https://teoriaedebate.org.br/2022/08/03/oportunidade-de-um-fundo-verde-para-o-financiamento-da-transicao-ecologica/

*Alessandra Cavalcante de Oliveira, doutora em Ciências pelo PROLAM-USP.

Cândido Ferreira da Silva Filho, economista e professor do Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade da PUC-Campinas.

Eduardo Marques, economista e professor de Economia na UniAnchieta.

Izaias Borges,  economista e professor da Faculdade de Economia na PUC-Campinas.

José Alex R. Soares, economista e professor de Economia da PUC-Campinas.


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Zé Maria

https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/bancoImagemSco/bancoImagemSco_AP_459081.jpg

Há 8 anos, está em trâmite no Supremo Tribunal Federal a Ação Cível Originária
(ACO) 2512 AM, em que se discute o reconhecimento do “Encontro das Águas” dos Rios Negro e Solimões como espaço especialmente protegido.

O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou a ação contra a União Federal,
o Estado do Amazonas, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
(ICMBio) e o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan),
entre outros órgãos e empresas, para que o Poder Judiciário reconheça o “valor
histórico, cultural arqueológico, paleontológico, geológico, estético e paisagístico”
do monumento natural e o declare espaço especialmente protegido, nos termos
de dispositivos constitucionais que tratam da proteção ao meio ambiente.

Inicialmente, a ação havia sido ajuizada no juízo da Sétima Vara Federal da
Seção Judiciária do Amazonas/AM, que admitiu o Estado do Amazonas como
litisconsorte do Instituto de Proteção Ambiental do Estado do Amazonas – IPAAM.

Posteriormente a ACO foi remetida ao Supremo Tribunal Federal (STF),
em 23.9.2014, em razão de decisão proferida pela Primeira Turma, que,
na Reclamação n. 12.957/AM, assentou a competência do STF para conhecer
da ação, pelo potencial conflito federativo e deferiu medida cautelar para
“obstar-se o início ou o prosseguimento de obras na região denominada
‘Encontro das Águas dos Rios Negro e Solimões’.”

Atualmente, a ACO 2512 encontra-se aguardando decisão da Ministra Relatora
Cármen Lúcia.

https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4640177

https://1.bp.blogspot.com/-NMKKe1WhQGI/YCCB_GHUJcI/AAAAAAAAMnY/8cdUYuJZp5Il186EqwPY62mVB8Qa6xHZACLcBGAsYHQ/w400-h281/WhatsApp-Image-2020-09-14-at-11.09.38.jpeg

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