Denunciado por criticar Bolsonaro, policial rodoviário federal diz que servidor deve lealdade à instituição, ‘não a políticos’

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Na PRF há oito anos, Fernando Oliveira era o chefe do núcleo de comunicação social da PRF em Curitiba (PR) quando foi denunciado pelo servidor anônimo. Foto: Arquivo PRF

Policiais que criticaram Bolsonaro na internet viraram alvo de apuração

Por Rubens Valente, no UOL

Em 2018, dois policiais rodoviários federais curtiram ou escreveram três publicações em redes sociais com mensagens do #EleNão, hashtag criada nas redes sociais contra o então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, e duas críticas ao ex-juiz federal Sergio Moro.

Sete meses depois, os policiais foram alvo de uma denúncia de “um servidor que solicitou anonimato”, o que levou a PRF (Polícia Rodoviária Federal) a abrir um “procedimento de instrução preliminar”.

Em novembro de 2019, depois de ouvir a defesa dos policiais e fazer diligências para checagem das publicações, a PRF decidiu arquivar o procedimento.

O caso não teve maiores consequências para os policiais, mas ajuda a explicar por que servidores federais em Brasília dizem viver cada vez mais em uma atmosfera de medo, insegurança e paranoia desde a posse de Bolsonaro, com relatos de perseguição ideológica e denúncias anônimas.

O UOL procurou a PRF na última quinta-feira (4) mas não houve, até o fechamento deste texto, resposta às perguntas. A assessoria informou nesta segunda-feira (8) que o assunto já fora repassado aos setores competentes.

Policial diz que servidor deve lealdade à instituição, ‘não a políticos’

A coluna localizou um dos policiais que foi alvo do procedimento.

Na PRF há oito anos, Fernando Oliveira era o chefe do núcleo de comunicação social da PRF em Curitiba (PR) quando foi denunciado pelo servidor anônimo.

Ele disse que o denunciante “fez uma interpretação enviesada da lei 8.112. A lei estabelece que o servidor deve ser leal à instituição onde trabalha, e não a políticos ou ao governo de plantão. No mais, o artigo 5° da Constituição garante a liberdade de expressão e proíbe qualquer tipo de censura”.

O denunciante anexou cinco mensagens de Oliveira.

Numa delas, em setembro de 2018, ele escreveu: “Com a palavra, elas. #EleNão #EleNunca #MulheresContraBolsonaro”.

Em outras duas, ele não mencionou Bolsonaro, apenas curtiu uma mensagem sobre “resistência” e postou uma imagem do show do roqueiro Roger Waters com a palavra “resistir” em inglês.

Outras duas mensagens continham críticas ao ministro Sergio Moro, que ainda não havia tomado posse no cargo.

Ao compartilhar um trabalho da chargista Laerte Coutinho, Oliveira escreveu “O PowerPoint do futuro ministro”.

Para Oliveira, não haveria problema no fato de o denunciante preferir o anonimato, desde que o conteúdo fosse “consistente”.

“Os argumentos do denunciante são tão frágeis que a reclamação deveria ter sido arquivada de imediato ou no menor intervalo de tempo possível, pela simples ausência de elementos mínimos para uma eventual apuração. Provavelmente, trata-se de um servidor bolsonarista com tempo de sobra para ficar bisbilhotando e catalogando postagens ou meras curtidas em redes sociais”, disse o policial, que nunca havia sido alvo de procedimento administrativo na carreira.

Anônimo disse que havia “desapreço” e “falta de lealdade” ao governo

A denúncia foi encaminhada à Ouvidoria e ao gabinete da Corregedoria Geral da PRF no dia 17 de julho de 2019.

O anônimo escreveu que os policiais “manifestam em suas redes sociais o desapreço e a lealdade [sic] ao atual governo, escarnecendo a figura tanto do presidente da República quanto do ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública [Moro]”.

“São casos de pessoas vinculadas ao projeto anterior de poder (PT) notadamente colocada [sic] em pontos chaves e críticos, operacionais e de relacionamento com a imprensa. Devido a [sic] temor de represálias no órgão que atuo [sic] solicito confidencialidade diante dessa denúncia”, diz a mensagem do anônimo.

Oliveira disse à coluna que se filiou ao PT no ano de 2000, mas há anos não participa de atividades partidárias, a filiação não configura ilegalidade e nunca fora questionado sobre isso ao longo de oito anos na PRF.

“O fato de uma pessoa trabalhar como servidor público não retira dela o direito de manifestar sua opinião crítica, inclusive sobre ações de atores políticos. O contrário disso se chama censura. Em uma análise mais ampla, todas essas tentativas de evitar a publicação de críticas estão inseridas em uma estratégia central do governo brasileiro, que já perseguiu e afastou servidores públicos de diferentes órgãos, pelo simples fato de terem divulgado informações de interesse público que contrariavam interesses particulares ou do chefe do Executivo ou de seus auxiliares”, disse Oliveira.

Apuração incluiu ‘pesquisas em fontes abertas e redes sociais’

A denúncia foi levada ao corregedor geral da PRF, que a encaminhou ao chefe da Divisão de Inteligência Correicional e Assuntos Internos do órgão, com um pedido de “análise e providências necessárias”.

O caso foi então enviado à Superintendência da PRF no Paraná, que abriu um “procedimento de instrução preliminar” em outubro de 2019.

Uma “ordem de missão” foi expedida para um servidor da PRF fazer “pesquisas em fontes abertas e redes sociais”, tomar o depoimento dos servidores citados e “produzir uma informação contendo a descrição das diligências realizadas e eventuais indícios de infração funcional”, além de receber “a liberdade para efetuar diligências que não estejam previstas nesta Ordem de Missão”.

Os dois servidores preencheram um questionário por escrito.

A PRF indagou, por exemplo: “Alguma vez no decorrer de sua carreira como PRF, seu lado político-partidário, influenciou nas suas decisões dentro da PRF?” Oliveira respondeu que suas decisões tomadas “no cargo de policial rodoviário federal são influenciadas pela legislação em vigor e pelas normas internas próprias da Polícia Rodoviária Federal”.

As publicações realizadas nos perfis dos servidores no Facebook foram verificados pelo núcleo de assuntos internos.

A conclusão foi que, “mesmo havendo um posicionamento contrário ao atual governo, não há qualquer menção e/ou vinculação com a PRF”.

Em outubro de 2019, o Núcleo de Assuntos Internos da PRF no Paraná opinou pelo arquivamento do procedimento.

Por meio de uma Informação, o núcleo lembrou que a lei 8.112/90, que instituiu o Regime Jurídico dos Servidores Públicos, estabelece que o processo disciplinar “é o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido”.

De acordo com a Informação, “exige-se, portanto, que as irregularidades tenham alguma relação no mínimo indireta com o cargo do servidor ou com suas respectivas atribuições, ou que, de alguma maneira, afetem o órgão no qual o infrator está lotado, situação não identificada no caso em tela”.

“Verificamos que na denúncia consta uma insatisfação de um denunciante, que requereu seu anonimato, quanto ao posicionamento político-partidário dos PRFs […], mas em sua denúncia não se vislumbra qualquer materialidade de que isso tenha interferido no exercício das atividades dos servidores denunciados no decorrer de sua carreira dentro da PRF. Cabe a seara correcional da PRF tão somente apurar condutas irregulares praticadas pelos servidores públicos enquanto investido no seu cargo ou em razão deles. No caso em tela, trata-se de ato da vida particular, situação ocorrida na esfera da vida privada do servidor público”, diz a Informação.

Policial vê tentativa de ‘silenciar críticas’

Em novembro, o superintendente regional da PRF no Paraná, Ismael de Oliveira, acolheu o resultado da apuração e determinou o arquivamento do procedimento, pois “não foram encontrados elementos comprobatórios que configurem cometimento de irregularidade funcional por parte dos policiais rodoviários federais”.

Para o PRF Oliveira, o objetivo de denúncias anônimas do gênero “é silenciar críticas, colocar uma espécie de mordaça nos servidores. Uma tentativa de criminalizar as opiniões divergentes”.

Para Oliveira, “escandalosa mesmo é a tentativa de patrulhamento da opinião, de monitoramento ideológico. No final das contas, uma denúncia irrelevante acabou tramitando por quase cinco meses. Resultou apenas em desperdício de tempo de vários servidores públicos, envolvidos em uma apuração absolutamente desnecessária”.

PS do Viomundo: Uma das “provas” anexadas à denúncia anônima contra o policial Fernando Oliveira é uma charge produzida em novembro de 2018 pela Laerte.

Fernando compartilhou-a em seu perfil Facebook.

A charge era crítica à conduta pregressa do ex-juiz e então futuro ministro da Justiça, Sergio Moro.

Abaixo, o print que o anônimo anexou à denúncia.

A charge em questão é esta:


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Comentários

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abelardo

Penso que uma das razões para justificar a deduragem de um alcaguete e alcoviteiro, que não se assume e portanto se torna também covarde, possivelmente pode exister a inveja. Ela pode existir em função do sucesso maior do acusado sobre o acusador e/ou pela diferença da grandeza moral e/ou pela coragem do acusado exercer o seu direito de opinião, de liberdade e não ser um despeitado escondido de sua própria existência. Neste caso, o acusador é quem deveria experimentar a coragem e Informar se tem alguma das opções acima, em que ele se enquadra.

Zé Maria

O Moro e a Força-Tarefa de Patifes de Curitiba, como toda Organização Criminosa,
montou um Aparato Digital que transborda para a realidade por meio de práticas
ilegais de indivíduos anônimos escalados para executar determinadas tarefas
para suprimir a liberdade de pessoas que são contrárias aos interesses da OLJ.
Essa OrCrim atua da mesma forma que a Milícia Bolsonarista do Gabinete do Ódio,
que, até o dia em que Moro saiu do Ministério, agiam juntas contra a Esquerda.

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