A vida dupla de Friedrich Engels, o homem sem o qual ninguém teria ouvido falar em Karl Marx

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Fotomontagem: Boitempo

A vida dupla de Friedrich Engels, o homem sem o qual ninguém teria ouvido falar em Karl Marx

Marx e Engels: duas personalidades extremamente talentosas, unidas por um afeto mútuo e pela paixão por uma causa comum que mudou o curso da história

Por Dalia Ventura, BBC News

Um amante de champanhe que gostava de caçar raposas, um crítico literário e um distinto cavalheiro vitoriano… não soa como uma descrição do defensor da revolução proletária ou do coautor do Manifesto Comunista.

Mesmo assim, Friedrich Engels era tudo isso e muito mais.

Ficou deliberadamente à sombra de seu camarada de armas, Karl Marx. Mas, sem ele, um dos pensadores mais influentes de nosso tempo e a inspiração para movimentos socialistas e comunistas em todo o mundo poderia ter sido nada mais do que apenas um obscuro intelectual alemão.

E o século 20 poderia ter dado uma guinada muito diferente.

Foi Engels quem possibilitou que Marx escrevesse suas principais obras. Na verdade, ele próprio escreveu alguns clássicos e constantemente dava a Marx insights cruciais, análises e informações detalhadas, além de dinheiro.

Engels vivia uma vida dupla, transitando sem problemas entre capitalistas ricos e trabalhadores; lutando por uma mudança revolucionária enquanto ganhava uma fortuna no mercado de ações.

Independentemente do fascínio ou repulsa à ideologia pregada pela dupla, este parceiro de Marx é um homem que vale a pena conhecer melhor.

Um menino rebelde

Engels viveu durante a maior parte do século 19 — de 1820 a 1895 —, o que significa que ele foi uma testemunha, e um participante, das enormes mudanças sociais e políticas que varreram a Europa naquela época.

Ele nasceu há 200 anos na cidade prussiana de Barmen, em uma família muito próspera e devota, duas características que determinaram o curso de sua vida.

Ele se rebelou contra as duas coisas usando uma caneta, que dominava desde muito jovem, escrevendo desde poemas denunciando injustiças até um libreto para uma ópera infantil sobre a derrubada de uma oligarquia corrupta na Roma medieval.

Aos 18 anos, seu pai, cansado de lidar com o filho rebelde, mandou-o para Bremen para trabalhar em uma empresa de exportação.

A terrível miséria

Foi em Bremen que Engels começou a desenvolver a capacidade de viver aquela vida dupla que garantiria que ele e Marx pudessem deixar seu legado.

Em público, ele era um diligente aprendiz de negócios, saía para beber, cantava em um coral, nadava perfeitamente, treinava esgrima e cavalgava.

Em sua vida particular, lia textos liberais e revolucionários e escrevia artigos de jornal sob o pseudônimo de Friedrich Oswald, talvez para evitar o sofrimento de sua mãe.

Com apenas 19 anos, ele escreveu sobre a situação dos operários cujo trabalho estava “destinado a privá-los de toda a força e entusiasmo pela vida”.

Ele denunciou a “terrível miséria das classes mais baixas”, em particular o destino das crianças em idade escolar que, diz ele, “são privadas de educação e crescem nas fábricas, apenas para que o dono da fábrica não tenha que dar a um adulto, cujo lugar ocupam, o dobro do salário de uma criança”.

“Os ricos proprietários de fábricas, entretanto, têm uma consciência flexível, e causar mais ou menos a morte de uma criança não condena uma alma piedosa ao inferno, especialmente se ela vai à igreja duas vezes todos os domingos.”

Essas duras críticas à religião estavam de acordo com as de um grupo de filósofos esquerdistas conhecidos como Jovens Hegelianos (Junghegelianer), seguidores da obra de Georg Hegel, com quem ele mais tarde se familiarizou. Isso aconteceu quando Engels esteve em Berlim, onde prestou serviço militar no exército da Prússia.

“Hegel já tinha morrido, mas ainda era como um rock star filosófico”, diz o cientista político alemão Christian Krell, da Fundação Friedrich Ebert, à BBC.

“Engels não só aprendeu deste grupo o laicismo, mas também a ideia de que a história se dirige a um determinado fim, que existe uma força motriz que é o espírito, a razão, etc.”

Mas então um evento importante mudou sua perspectiva sobre esse último elemento: seu encontro com um dos primeiros comunistas alemães, Moses Hess.

Há quem descreva Friedrich Engels como o Che Guevara de seu tempo, pois ele veio de uma família privilegiada, mas a rejeitou para lutar pela libertação dos trabalhadores, pela justiça e pelo socialismo

“Engels chegou à conclusão, depois de conversar com Hess, que não era o idealismo, mas o materialismo que moldava os acontecimentos da história: o que importa é a forma como a riqueza é distribuída na sociedade, não as ideias ou um certo espírito”, diz Krell.

No coração da Revolução Industrial

Engels conversou com Hess a caminho da cidade de Manchester, no Reino Unido, onde ia para continuar seu treinamento de negócios na Ermer & Engels, uma fábrica de propriedade conjunta de sua família.

Se seu pai nutria esperanças de que o afastamento pudesse ajudar a apagar suas ideias revolucionárias nascidas na Alemanha, ele não poderia tê-lo enviado a um lugar menos apropriado.

Em Manchester, em 1842, o mais glorioso e o mais terrível início da era industrial foram combinados.

Apesar de conviver no seu trabalho com executivos da empresa têxtil, de viver em uma casa digna de solteiro burguês e de, como de costume, deleitar-se com os gostos de um cavalheiro rico, o lado mais sombrio dessa realidade era onipresente.

E Engels logo teve um guia ideal para explorá-lo: Mary Burns, uma inglesa de ascendência irlandesa, nativa daquele mundo desconhecido que o jovem alemão estava ansioso para descobrir.

Manchester em 1870, ano em que Engels deixou a cidade em que morou por 28 anos. Era a maior cidade industrial da Inglaterra e um notável centro do lucrativo comércio de algodão. A vida no centro da Revolução Industrial foi extremamente difícil para muitos

Quando voltou à Alemanha em 1844, Engels tinha tudo de que precisava para escrever o que se tornaria um de seus livros mais conhecidos: A situação da classe trabalhadora na Inglaterra.

“A única diferença em relação à antiga escravidão aberta é que o trabalhador de hoje parece livre porque não é vendido de uma vez por todas, mas aos poucos, por dia, semana, ano, e como nenhum dono o vende para outro, em vez disso, ele é forçado a se vender. ”

Embora houvesse outros denunciando as injustiças do capitalismo inicial, seu livro foi “único por ter sido um dos primeiros exemplos de pesquisa empírica”, enfatiza o cientista político Krell.

“Ele foi até os trabalhadores, morou e conversou com eles. Ele fazia o que chamamos de trabalho de campo hoje, então suas conclusões vêm da vida real, não de uma mesa, e isso era novo.”

“Além disso, ele combinou essa análise empírica com uma mensagem política de que os trabalhadores podem se unir, lutar por seus próprios interesses e mudar a história.”

“O interessante é que a ideia de que os trabalhadores poderiam se tornar uma classe social e que essa classe poderia liderar a revolução foi dada por Engels a Marx.”

Amigos da alma

O livro foi publicado em alemão em 1845 e, curiosamente, foi traduzido para o inglês apenas 40 anos depois.

Naquele mesmo ano, Engels terminou outro texto que só foi publicado 80 anos depois.

Foi A Ideologia Alemã, a primeira obra que escreveu com outro jornalista alemão filho de uma família rica, editor do jornal Rheinische Zeitung para o qual Karl Marx havia escrito.

Engels e Marx se conheceram três anos antes, mas não gostavam um do outro. O primeiro encontro entre os dois foi curto e cruel.

Mas dois anos depois eles se encontraram novamente em Paris e passaram dez dias juntos, durante os quais estabeleceram uma amizade íntima.

Engels tinha então 24 anos. Marx, 26. Eles imediatamente começaram a trabalhar juntos.

Até então, Marx havia se concentrado principalmente no estudo da filosofia, história, direito e matemática, e foi Engels quem sugeriu que ele prestasse atenção à economia política, um conselho que se provou fundamental.

Afinal livre das cadeias de trabalho que odiava, Engels poderia ser, entre 1845 e 1850, o que ele almejava: um ativista político subsidiado por sua família.

No continente europeu o espírito revolucionário ganhava impulso alimentado pelo descontentamento não só do proletariado, mas também da classe média. Com Marx em Bruxelas, em 1848, Engels e ele escreveram O Manifesto Comunista, que viria a influenciar a história mundial…

… mas não a que se avizinhava.

1848

Em todo o continente, de Paris a Palermo, os liberais se levantaram contra os governos conservadores.

Os primeiros sinais de revolta ocorreram em janeiro, na Sicília; em fevereiro, a monarquia francesa caiu; em poucos meses, Alemanha, Áustria, Hungria e Itália viveram o fervor revolucionário.

Apenas alguns países, notadamente o Reino Unido e a Rússia, foram esquecidos.

Os rebeldes lutaram pelo nacionalismo, justiça social e direitos civis e estavam dispostos a lutar nas ruas até serem vitoriosos ou mortos.

Engels não se limitou a produzir material escrito com Marx; também pegou em armas.

Dezenas de milhares de pessoas perderam suas vidas; mas pouco de valor duradouro foi alcançado e, no final do ano, as revoluções liberais haviam sido duramente derrotadas.

E O Manifesto Comunista?

Suas últimas palavras pareciam um prelúdio para o que aconteceu:

“Podem as classes dominantes tremer ante uma revolução comunista! Nela os proletários nada têm a perder a não ser as suas cadeias. Têm, em vez disso, um mundo inteiro a ganhar. Proletários de todos os países, uni-vos!”

No entanto, ele quase não teve influência nas revoluções europeias daquele ano, nem em várias dos anos seguintes.

“Há um grande contraste entre a popularidade do Manifesto agora e então. Hoje ele é — além da literatura religiosa — um dos textos mais populares já escritos no mundo. Ele inspirou milhões, mudou a história. Mas quando foi publicado quase ninguém percebeu e foi esquecido por quase duas décadas”, diz Krell.

“Na década de 1870, quando o socialismo se popularizou, outro livro de Engels, Anti-Dühring, foi publicado no qual ele expôs os princípios do socialismo científico em uma linguagem mais acessível e clara, o que gerou interesse naquele texto original — que hoje é tido como a bíblia dos revolucionários.”

Muito do texto foi baseado em um trabalho anterior de Engels chamado Princípios do Comunismo, particularmente o primeiro e o segundo, que são os mais comoventes e emocionantes, e os mais lidos.

As algemas outra vez

Em 1850, Engels não teve escolha senão desistir.

Não apenas a revolução europeia fracassou, mas sua família perdeu a paciência e suspendeu a ajuda financeira.

Foi isso que permitiu não só a ele, mas também a seu grande amigo Marx, se dedicar à luta pela justiça. Agora, ambos dependiam dos benefícios que apenas sua participação ativa dentro do sistema capitalista poderia lhes dar.

Engels voltou para Manchester, para Ermer & Engels e para sua vida dupla.

“Seis dias por semana, das dez às quatro, ele era comerciante, fiscalizava a correspondência de sua empresa em vários idiomas, e ia à Bolsa de Valores”, diz Paul Lafargue no livro Memórias Pessoais de Engels. Lafargue era autor de O direito à preguiça e genro de Marx.

“À noite, livre da escravidão comercial, voltava para sua casinha, onde voltaria a ser um homem livre.”

Essa “casinha” era uma de suas duas casas, na qual vivia com sua amante da classe trabalhadora Mary Burns e sua irmã, e sua futura esposa, Lizzie.

Ele era “respeitável” e mantinha uma imagem como um empresário que “não só participava da vida industrial de Manchester, mas também de seus prazeres”, diz Lafargue, acrescentando que talvez aqueles com quem participava de banquetes e praticava esportes desconheciam sobre sua outra vida.

“Os ingleses são extraordinariamente discretos e não se envolvem em coisas que não lhes dizem respeito (…) O homem que Marx considerava o homem mais culto da Europa só era considerado um companheiro alegre que gostava de suas bebidas.”

Família em Londres

Com sua renda, Engels sustentou Marx e sua família em Londres por 19 anos, permitindo que Marx prosseguisse em sua grande tarefa, a escrita de Das Kapital (O Capital).

Embora separados, os amigos “viveram juntos no pensamento”. “Quase todos os dias, durante 17 anos, eles se corresponderam, e assim se mantiveram informados sobre o andamento dos estudos, e comunicaram suas reflexões sobre questões políticas”, conta Lafargue.

O primeiro volume de O Capital foi publicado em 1867.

No entanto, as ideias de Marx só se tornaram amplamente conhecidas graças à publicação de Anti-Dühring, “que fornece uma versão simples e abreviada das ideias de Marx… ou, na verdade, a versão de Engels das teorias de Marx”, Jonathan Sperber, professor emérito da Universidade de Missouri e autor de Karl Marx: A Nineteenth-Century Life, disse à BBC.

Nesta alternativa intimidante para O Capital, “Marx aparece como o Charles Darwin do mundo social, já que Engels apresentou sua teoria como equivalente à de Darwin sobre a evolução das espécies”.

“Assim, os primeiros seguidores de Marx o descobriram graças a Engels.”

Quando, em 1869, depois de garantir dinheiro mais do que suficiente para sustentar a si mesmo e a Marx pelo resto de sua vida, Engels finalmente conseguiu deixar o emprego e retornar às atividades políticas e aos estudos, ele se sentiu renascido.

O gênio

Marx morreu em 1883.

Engels não só continuou a sustentar sua família, mas também deixou de lado os estudos da filosofia universal do conhecimento, à qual se dedicou uma década, para terminar O Capital, que ficara inacabado.

O que ambos criaram, que poderia muito bem ser chamado de “engelismo”, é conhecido como marxismo, algo que Engels defendeu enfaticamente.

Após sua morte, 125 anos atrás, as filhas de Marx herdaram sua então considerável fortuna, pois entre a miríade de conhecimentos que este ícone da esquerda adquiriu em seus quase 75 anos de vida estava a habilidade de investir astutamente no mercado de ações.


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Zé Maria

Os Manuscritos Econômico-Filosóficos de Karl Marx datam de 1844.*

Neles Marx já discorria sobre a Alienação do Trabalho, descrevendo-a:

“(XXII) …”
[…]
“Partiremos de um fato econômico contemporâneo.
O trabalhador fica mais pobre à medida que produz mais riqueza
e sua produção cresce em força e extensão.
O trabalhador torna-se uma mercadoria ainda mais barata à medida
que cria mais bens.
A desvalorização do mundo humano aumenta na razão direta
do aumento de valor do mundo dos objetos.
O trabalho não cria apenas objetos; ele também se produz a si mesmo
e ao trabalhador como uma mercadoria, e, deveras, na mesma
proporção em que produz bens.

Esse fato simplesmente subentende que o objeto produzido pelo
trabalho, o seu produto, agora se lhe opõe como um ser estranho,
como uma força independente do produtor.
O produto do trabalho humano é trabalho incorporado em um objeto
e convertido em coisa física; esse produto é uma objetificação do
trabalho.
A execução do trabalho é simultaneamente sua objetificação.
A execução do trabalho aparece na esfera da Economia Política como
uma perversão do trabalhador, a objetificação como uma perda e uma
servidão ante o objeto, e a apropriação como alienação.

A execução do trabalho aparece tanto como uma perversão que o
trabalhador se perverte até o ponto de passar fome.
A objetificação aparece tanto como uma perda do objeto que o
trabalhador é despojado das coisas mais essenciais não só da vida,
mas também do trabalho.

O próprio trabalho transforma-se em um objeto que ele só pode
adquirir com tremendo esforço e com interrupções imprevisíveis.

A apropriação do objeto aparece como alienação a tal ponto que
quanto mais objetos o trabalhador produz tanto menos pode possuir
e tanto mais fica dominado pelo seu produto, o Capital. [!!!]

Todas essas conseqüências decorrem do fato de o trabalhador ser
relacionado com o produto de seu trabalho como com um objeto
estranho. Pois está claro que, baseado nesta premissa, quanto mais
o trabalhador se desgasta no trabalho tanto mais poderoso se torna
o mundo de objetos por ele criado em face dele mesmo, tanto mais
pobre se torna a sua vida interior, e tanto menos ele se pertence a si
próprio.
Quanto mais de si mesmo o homem atribui a Deus, tanto menos lhe
resta.

O trabalhador põe a sua vida no objeto, e sua vida, então, não mais lhe
pertence, porém, ao objeto.
Quanto maior for sua atividade, portanto, tanto menos ele possuirá.
O que está incorporado ao produto de seu trabalho não mais é dele
mesmo.
Quanto maior for o produto de seu trabalho, por conseguinte, tanto
mais ele minguará.
A alienação do trabalhador em seu produto não significa apenas
que o trabalho dele se converte em objeto, assumindo uma existência
externa, mas ainda que existe independentemente, fora dele mesmo,
e a ele estranho, e que com ele se defronta como uma força autônoma.

A vida que ele deu ao objeto volta-se contra ele como uma força
estranha e hostil.

(XXIII) Examinemos agora, mais de perto, o fenômeno da objetificação,
a produção do trabalhador e a alienação e perda do objeto por ele
produzido, nisso implícitas.
O trabalhador nada pode criar sem a natureza, sem o mundo exterior
sensorial.
Este último é o material em que se concretiza o trabalho, em que este
atua, com o qual e por meio do qual ele produz coisas.

Todavia, assim como a natureza proporciona os meios de existência
do trabalho, na acepção de este não poder viver sem objetos aos quais
possa aplicar-se, igualmente proporciona os meios de existência em
sentido mais restrito, ou sejam os meios de subsistência física para o
próprio trabalhador.
Assim, quanto mais o trabalhador apropria o mundo externo da
natureza sensorial por seu trabalho, tanto mais se despoja de meios
de existência, sob dois aspectos:
primeiro, o mundo exterior sensorial se torna cada vez menos um
objeto pertencente ao trabalho dele ou um meio de existência de seu
trabalho;
segundo, ele se torna cada vez menos um meio de existência na
acepção direta, um meio para a subsistência física do trabalhador.

Sob os dois aspectos, portanto, o trabalhador se converte em escravo
do objeto:
primeiro, por receber um objeto de trabalho, isto é, receber trabalho,
e em segundo lugar por receber meios de subsistência.
Assim, o objeto o habilita a existir, primeiro como trabalhador e depois
como sujeito físico.

O apogeu dessa escravização é ele só poder se manter como sujeito
físico na medida em que é um trabalhador, e de ele só como sujeito
físico poder ser um trabalhador.

(A alienação do trabalhador em seu objeto é expressa da maneira
seguinte, nas leis da Economia Política:
quanto mais o trabalhador produz, tanto menos tem para consumir;
quanto mais valor ele cria, tanto menos valioso se torna;
quanto mais aperfeiçoado o seu produto, tanto mais grosseiro
e informe o trabalhador;
quanto mais civilizado o produto, tão mais bárbaro o trabalhador;
quanto mais poderoso o trabalho, tão mais frágil o trabalhador;
quanto mais inteligência revela o trabalho, tanto mais o trabalhador
decai em inteligência e se torna um escravo da natureza.)

A economia Política oculta a alienação na natureza do trabalho por
não examinar a relação direta entre o trabalhador (trabalho) e a
produção.
Por certo, o trabalho humano produz maravilhas para os ricos,
mas produz privação para o trabalhador.
Ele produz palácios, porém choupanas é o que toca ao trabalhador.
Ele produz beleza, porém para o trabalhador só fealdade.
Ele substitui o trabalho humano por máquinas, mas atira alguns
dos trabalhadores a um gênero bárbaro de trabalho e converte
outros em máquinas.
Ele produz inteligência, porém também estupidez e cretinice para
os trabalhadores.

A relação direta do trabalho com seus produtos é a entre o trabalhador
e os objetos de sua produção.
A relação dos possuidores de propriedade com os objetos da produção
e com a própria produção é meramente uma conseqüência da
primeira relação e a confirma.
Apreciaremos adiante este segundo aspecto.

Portanto, quando perguntamos qual é a relação importante do
trabalho, estamos interessados na relação do trabalhador com a
produção.

Até aqui consideramos a alienação do trabalhador somente sob um
aspecto, qual seja o de sua relação com os produtos de seu trabalho.

Não obstante, a alienação aparece não só como resultado, mas
também como processo de produção, dentro da própria atividade
produtiva.
Como poderia o trabalhador ficar numa relação alienada com o
produto de sua atividade se não se alienasse a si mesmo no próprio
ato da produção?
O produto é, de fato, apenas a síntese da atividade, da produção.
Conseqüentemente, se o produto do trabalho é alienação, a própria
produção deve ser alienação ativa – a alienação da atividade e a
atividade da alienação.

A alienação do objeto do trabalho simplesmente resume a alienação
da própria atividade do trabalho.

O que constitui a alienação do trabalho?
Primeiramente, ser o trabalho externo ao trabalhador, não fazer parte
de sua natureza, e por conseguinte, ele não se realizar em seu trabalho
mas negar a si mesmo, ter um sentimento de sofrimento em vez de
bem-estar, não desenvolver livremente suas energias mentais e físicas
mas ficar fisicamente exausto e mentalmente deprimido.
O trabalhador, portanto, só se sente à vontade em seu tempo de folga,
enquanto no trabalho se sente contrafeito.
Seu trabalho não é voluntário, porém imposto, é trabalho forçado.
Ele não é a satisfação de uma necessidade, mas apenas um meio
para satisfazer outras necessidades.
Seu caráter alienado é claramente atestado pelo fato, de logo que
não haja compulsão física ou outra qualquer, ser evitado como
uma praga.
O trabalho exteriorizado, trabalho em que o homem se aliena
a si mesmo, é um trabalho de sacrifício próprio, de mortificação.
Por fim, o caráter exteriorizado do trabalho para o trabalhador é
demonstrado por não ser o trabalho dele mesmo mas trabalho
para outrem, por no trabalho ele não se pertencer a si mesmo
mas sim a outra pessoa.” [!!!]

*Íntegra:
https://www.marxists.org/portugues/marx/1844/manuscritos/index.htm

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