Requião: Só canalhas se opõem a projeto que dificulta tribunal midiático; íntegra

Tempo de leitura: 8 min

O projeto que criminaliza o abuso de poder não impede o combate à corrupção. Criminaliza os abusos de agentes públicos que utilizam seus cargos para objetivos pessoais, partidários, que nada tem a ver com a lei e com direito. Desagrada a canalhas e somente aos canalhas. Roberto Requião, ex-senador, no twitter

Da Redação

Relator do projeto que combate o abuso de autoridade (ver íntegra do projeto no pé do post), aprovado na Câmara com 325 votos a favor e 133 contra, o ex-senador Roberto Requião afirmou em vídeo que a ideia nunca foi dificultar o combate a corrupção, mas combater a corrupção de agentes públicos.

Ele citou como exemplo o vazamento de mensagens em que o ex-juiz federal Sérgio Moro “protegeu” o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso de investigação por questões políticas.

O projeto penaliza dois pontos essenciais ao marketing da Lava Jato, que teve como pilar promover o julgamento de suspeitos em jornais e emissoras de televisão:

—  decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado manifestamente descabida ou sem prévia intimação de comparecimento ao juízo.

— com violência, grave ameaça ou redução de sua capacidade de resistência, constranger o preso ou o detento a: exibir-se ou ter seu corpo ou parte dele exibido à curiosidade pública; a se submeter a situação vexatória ou a constrangimento não autorizado em lei; ou a produzir prova contra si mesmo ou contra terceiro.

O presidente Jair Bolsonaro pode vetar o projeto, total ou parcialmente.

Porém, pela forma como foi aprovado, é possível que o veto ou vetos sejam derrubados no Congresso.

O então juiz federal Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça, escreveu artigo analisando a Operação Mãos Limpas, na Itália, no qual destacou a importância de usar a mídia para pré-condenar acusados na opinião pública, o que agora passa a configurar abuso de autoridade no Brasil.

Câmara aprova projeto que define quais situações configuram abuso de autoridade

Como a proposta já foi aprovada pelo Senado, seguirá para sanção de Jair Bolsonaro. Deputados do PSL, partido do presidente, dizem que ele vetará alguns pontos do texto aprovado.

Por Fernanda Vivas, TV Globo — Brasília

A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta quarta-feira (14) o projeto que define em quais as situações será configurado o crime de abuso de autoridade.

Primeiro, os deputados aprovaram um regime de urgência para o projeto e, horas depois, fizeram uma votação simbólica, em que o eleitor não consegue saber como votou cada parlamentar.

O texto considera crime, entre outros pontos, obter provas por meio ilícito, decidir por prisão sem amparo legal, decretar condução coercitiva sem antes intimar a pessoa a comparecer ao juízo, submeter o preso ao uso de algemas quando não há resistência à prisão, invadir imóvel sem determinação judicial e estender a investigação de forma injustificada.

O texto prevê, em alguns casos, pena de prisão para promotores e juízes. Veja detalhes mais abaixo.

Como a proposta já foi aprovada pelo Senado, seguirá para sanção do presidente Jair Bolsonaro.

Segundo o líder do governo, deputado Major Vitor Hugo (PSL-GO), e a deputada Bia Kicis (PSL-DF), ambos do partido de Bolsonaro, o presidente deverá vetar alguns pontos do texto aprovado.

A aprovação provocou reação no Judiciário. Entidades que representam juízes e promotores falam do risco de o projeto inibir investigações.

O que diz a proposta

O que vai configurar crime de abuso de autoridade

Obter prova em procedimento de investigação por meio ilícito (pena de um a quatro anos de detenção);

Pedir a instauração de investigação contra pessoa mesmo sem indícios de prática de crime (pena de seis meses a dois anos de detenção);

Divulgar gravação sem relação com as provas que se pretende produzir em investigação, expondo a intimidade dos investigados (pena de um a quatro anos de detenção);

Estender a investigação de forma injustificada (pena de seis meses a dois anos de detenção);

Negar acesso ao investigado ou a seu advogado a inquérito ou outros procedimentos de investigação penal (pena de seis meses a dois anos);

Decretar medida de privação da liberdade de forma expressamente contrária às situações previstas em lei (pena de um a quatro anos de detenção);

Decretar a condução coercitiva de testemunha ou investigado de forma manifestamente descabida ou sem prévia intimação de comparecimento ao juízo (pena de um a quatro anos de detenção);

Executar a captura, prisão ou busca e apreensão de pessoa que não esteja em situação de flagrante delito ou sem ordem escrita de autoridade judiciária (pena de um a quatro anos de detenção);

Constranger preso com violência, grave ameaça ou redução da capacidade de resistência (pena de um a quatro anos de detenção);

Deixar, sem justificativa, de comunicar a prisão em flagrante à Justiça no prazo legal (pena de seis meses a dois anos de detenção);

Submeter preso ao uso de algemas quando estiver claro que não há resistência à prisão, ameaça de fuga ou risco à integridade física do preso (pena de seis meses a dois anos de detenção);

Manter homens e mulheres presas na mesma cela (pena de um a quatro anos de detenção);

Invadir ou entrar clandestinamente em imóvel sem determinação judicial (pena de um a quatro anos de detenção);

Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia muito maior do que o valor estimado para a quitação da dívida (pena de um a quatro anos de detenção);

Demora “demasiada e injustificada” no exame de processo de que tenha requerido vista em órgão colegiado, com o intuito de atrasar o andamento ou retardar o julgamento (pena de seis meses a 2 anos de detenção);

Antecipar o responsável pelas investigações, por meio de comunicação, inclusive rede social, atribuição de culpa, antes de concluídas as apurações e formalizada a acusação (pena de seis meses a 2 anos de detenção).

Ação penal

Os crimes de abuso de autoridade são de ação penal pública incondicionada, ou seja, o Ministério Público é o responsável por entrar com a ação na Justiça, sem depender da iniciativa da vítima. Se não for proposta a ação pelo MP no prazo legal, a vítima poderá propor uma queixa.

Divergência de interpretação

O texto diz que a divergência na interpretação de lei ou na avaliação de fatos e provas “não configura, por si só, abuso de autoridade”.

Efeitos da condenação

Uma vez condenado, o infrator:

— será obrigado a indenizar a vítima pelo dano causado pelo crime;

— estará sujeito à inabilitação para o exercício do cargo, mandato ou função pública por um a cinco anos;

— estará sujeito à perda do cargo, mandato ou função pública.

Penas restritivas de direitos

O condenado pelo crime de abuso de autoridade também pode ser condenado a penas restritivas de direitos, como:

— prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas;

— suspensão do exercício do cargo, função ou mandato pelo prazo de um a seis meses, com perdas dos vencimentos e das vantagens;

–proibição de exercer funções de natureza policial ou militar no município onde foi praticado o crime e onde mora ou trabalha a vítima, pelo prazo de um a três anos.

Leis para julgamento dos crimes

O Código de Processo Penal e a lei que trata do processo nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais serão usadas para o processo penal dos crimes de abuso de autoridade.

Mudanças na prisão temporária

Determina que o prazo (atualmente em 10 dias) deve constar do mandado de prisão, que também deve conter o dia em que o preso será libertado. E estabelece que, terminado o período, a Justiça deve colocar o preso em liberdade imediatamente, exceto se houver prorrogação da prisão temporária ou decretação da prisão preventiva.

Crime para interceptação telefônica

Torna crime a realização de interceptação telefônica ou de dados, escuta ambiental ou quebra de segredo de Justiça, sem autorização judicial. A pena será de 2 a 4 anos de prisão.

Quem pode ser enquadrado?

De acordo com o texto, os seguintes agentes públicos poderão ser enquadrados no crime de abuso de autoridade:

— servidores públicos e militares;

— integrantes do Poder Legislativo (deputados e senadores, por exemplo, no nível federal);

— integrantes do Poder Executivo (presidente da República; governadores, prefeitos);

— integrantes do Poder Judiciário (juízes de primeira instância, desembargadores de tribunais, ministros de tribunais superiores);

— integrantes do Ministério Público (procuradores e promotores);

–integrantes de tribunais e conselhos de conta (ministros do TCU e integrantes de TCEs).

Argumentos contra e a favor

Para o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi aprovado “o melhor texto”.

“É o texto mais amplo, onde todos os poderes respondem a partir da lei”, afirmou Maia.

Segundo ele, a “grande crítica” a outro texto da Câmara sobre o assunto se dava porque a redação só tratava do Poder Judiciário e do Ministério Público. “Eu acho que é o texto justo [aprovado nesta quarta]. Não fica parecendo que se aprova algo contra um poder. É se organizar para que todos tenham responsabilidade nos seus atos”, acrescentou.

Durante a sessão, deputados se manifestaram a favor e contra a proposta. Arthur Maia (DEM-BA), por exemplo, disse que o objetivo não é impedir o funcionamento de qualquer instituição pública, mas, sim, garantir o “comedimento”.

“Estamos limitando o direito da autoridade através da votação de uma lei que é justa e necessária”, acrescentou.
Com opinião divergente, Carla Zambelli (PSL-SP) disse que o texto “vai acabar com várias investigações” e vai deixar a polícia “numa saia justa tremenda” em várias situações.

Daniel Coelho (Cidadania-PE), por sua vez, disse que não há problemas em o Congresso definir o que é abuso de autoridade, mas ele defendeu que houvesse um debate “melhor” sobre a proposta.

“Acho possível a construção do consenso. Nós não temos opinião radical sobre esse assunto”, acrescentou.

Ao se pronunciar sobre o projeto, Giovani Cherini (PL-RS) disse ser um “absurdo” o fato de o Brasil discutir, segundo ele, o tema há 30 anos e não definir o que é abuso de autoridade.

“É para o agente público, não é para juiz, não é para promotor, é para o agente público. O cidadão fica sabendo quando um político está envolvido. Agora, e quando um cidadão comum é abusado, muitas e muitas vezes?”, indagou Cherini.

Durante a orientação de bancada, Carlos Sampaio (PSDB-SP) disse que o projeto representa avanço, mas acrescentou que iria liberar os deputados tucanos a votar como quisessem. “O projeto de lei efetivamente, ao abordar os Três Poderes, traz um avanço”, afirmou Sampaio.

Ainda na sessão, Marcel Van Hattem (Novo-RS) disse que o projeto não foi debatido, embora o argumento de alguns parlamentares fosse o de que a proposta foi enviada em 2017.

Repercussão no Judiciário

A Associação Nacional dos Procuradores criticou o texto.

“Todos aqueles que atuam para cumprir a lei vão se sentir inibidos ou amedrontados em continuar a sua atuação. Isso pode, sim, atingir casos em curso, casos complexos, operações que envolvem o combate à corrupção, na medida em que conceitos muito abertos, muito subjetivos passam a caracterizar abuso de autoridade”, disse Fábio George Cruz da Nóbrega, presidente da ANPR, à TV Globo.

A Associação Brasileira dos Magistrados disse que “a necessária punição a quem atue com abuso de autoridade não pode servir, sob qualquer pretexto, a intimidar ou de qualquer forma a subtrair a independência do Poder Judiciário e seus juízes, que tanto realizam no combate à corrupção, na garantia dos direitos fundamentais e na consolidação da democracia”.

O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mendes, disse que o texto dá margem a interpretações subjetivas.

“Se o juiz der uma decisão, e essa decisão estiver errada, ela pode ser revista. Isso fazemos todos os dias, faz parte da atividade jurídica. O que não o juiz não pode é ser punido penalmente por decidir de uma maneira que amanhã ou depois venha a ser modificada.”

Tramitação

A proposta chegou à Câmara em 2017 e foi apensada (juntada) a outra semelhante, que já tramitava na Casa. Por isso, em outubro de 2017 foi determinada a criação de uma comissão especial para analisar o projeto.
Apesar de criada, a comissão nunca foi instalada – sempre aguardou a composição dos integrantes do colegiado. Quase dois anos depois, então, foi aprovado o regime de urgência, nesta quarta-feira.

“Eu avisei ontem [terça, 13] que ia votar. Eu avisei dois meses atrás que ia votar abuso de autoridade, quando o Senado estava votando. Não teve nenhuma surpresa nessa matéria”, afirmou o presidente da Câmara.

Durante a sessão, alguns parlamentares defenderam o adiamento da votação, mas a maioria optou por votar nesta quarta. O plenário também derrubou os três destaques apresentados para modificar o texto.

Votação nominal

O Novo apresentou dois requerimentos: um pedindo votação nominal e outro pedindo a retirada do projeto de lei da pauta. Os dois foram rejeitados.

Depois de negar a votação nominal, Rodrigo Maia afirmou que seguiu o regimento. “O que quero dizer é que o requerimento que a deputada do Novo apresentou é um segundo requerimento, este em cima de um primeiro requerimento que o Novo já tinha apresentado. E, por isso, fizemos a votação de dois requerimentos de obstrução — de forma pausada, com calma —, e ninguém pediu verificação.”

De acordo com o regimento, a votação nominal ocorre quando há exigência de um quorum especial de votação, por deliberação do plenário, por requerimento de qualquer deputado ou quando houver pedido de verificação de votação. Este pedido deve ser feito por um décimo dos deputados ou por líderes que representem esse número.

Segundo Maia, o partido usou seus requerimentos de forma democrática, e ele não poderia aceitar outro com assinaturas, porque não teria como comprovar que os deputados estavam no plenário.


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Comentários

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Kiko

O Roberto Requião é brilhante e faz parte da safra política que ainda representa as pessoas de boa fé desse nosso país ????

lulipe

Só falta agora proibir os policiais de usarem arma de fogo!!

Zé Maria

Já que a Globo não publica opinião de Parlamentares de Esquerda nas reportagens,
aliás, sequer cita o nome de um Deputado do PT, a não ser quando é alguma Armação do Moro e do Dallagnol contra o Parlamentar
ou contra o Partido, transcrevo trecho da publicação do sítio de Notícias da Câmara, sobre a Aprovação do Projeto de Lei 7596/17:

O líder do PT, deputado Paulo Pimenta (PT-RS),
ressaltou que o bom profissional não tem
o que temer:
“Esses argumentos ‘do medo’ não são
para proteger os bons profissionais,
são para proteger milicianos, são para
proteger bandidos que, às vezes,
estão dentro do serviço público,
pessoas que se utilizam dos seus cargos
para perseguir pessoas inocentes”,
disse o parlamentar.

A Líder da Minoria, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ)
destacou que impedir o abuso é um
instrumento da democracia.
“E há consequências graves de abuso,
e aqui eu quero lembrar de uma consequência:
o suicídio do reitor da Universidade Federal
de Santa Catarina”, declarou, em referência
a Luiz Carlos Cancellier, que se suicidou
após ser preso e afastado da universidade
no escopo da Operação Ouvidos Moucos.

https://www.camara.leg.br/noticias/571081-camara-aprova-projeto-que-define-crimes-de-abuso-de-autoridade/
https://www.camara.leg.br/noticias/571062-policiais-vao-pedir-veto-de-pontos-do-projeto-sobre-abuso-de-autoridade/

Zé Maria

“O então juiz federal Sérgio Moro, hoje ministro da Justiça, escreveu artigo … no qual destacou a importância de usar a Mídia [ – e de fato usou a Globo – ] para pré-condenar acusados na opinião pública,
o que agora passa a configurar abuso de autoridade no Brasil.”

Obrigado, Senador Requião!

Larápios da Estirpe do Bandido-Mor{o}
têm de ir, mesmo, pra Cadeia!

    Zé Maria

    É uma pena que essa atualização
    da Lei de Abuso de Autoridade de 1965
    tenha vindo tão tarde.
    Pois, se tivéssemos o PL 7596/2017 (PLS 85/17)
    aprovado há mais tempo, teríamos poupado
    muitos inocentes de serem investigados
    e condenados por Patifes, sobretudo
    os da FTLJ de Curitiba e o Bandido-Mor{o}.

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