Marcelo Zero: Aderir à nova Guerra Fria é o que há de mais atrasado; é aprovar a violência, a intolerância, o unilateralismo e o belicismo

Tempo de leitura: 2 min
Os presidentes Biden (EUA) e Zelensky (Ucrânia), no Salão Oval da Casa Branca, em 21 de dezembro de 2022. E Boric (Chile), após reunir-se com chefes de países da América do Sul, no Palácio do Itamaraty, em Brasília (DF), em 30 de maio de 2023. Fotos: Domínio público, via Wikimedia Commons e Rafa Neddermeyer/ Agência Brasil

Quem Adere à Nova Guerra Fria é Atrasado

Por Marcelo Zero*

Lula resiste à pressão dos EUA e de aliados europeus de abandonar a neutralidade em relação à guerra na Ucrânia e de aderir à nova Guerra Fria.

Por isso, é criticado. Nossa mídia, completamente ignorante em geopolítica ou que finge desconhecer as origens do conflito, diz que ele é “atrasado”. Que está em outras décadas. Comparam-no a Boric, que seria “moderno”.

Total inversão de valores.

A nova Guerra Fria guia-se pela mesma lógica arcaica, binária, maniqueísta e excludente da antiga.

Divide o mundo entre os “bons” (EUA e aliados) e os “maus” (Rússia, China e todos aqueles que não se alinham com o chamado Ocidente).

Com a desculpa hipócrita e esfarrapada de defender a democracia e os direitos humanos, os “bons” fazem intervenções militares e impõem draconianas sanções a todos aqueles que eles julgam merecer alguma punição.

Estudo da Brown University estima que as “intervenções” feitas por EUA e aliados após o 11 de setembro (Afeganistão, Síria, Iraque, Somália, Líbia etc.) mataram cerca de 4,5 milhões de pessoas, a grande maioria civis. Além disso, deslocaram 38 milhões de pessoas de suas terras. Tudo muito moderno e democrático.

Agora, esse pulcro segmento dos “bons” quer impor ao resto do mundo uma cruzada insana e irracional contra Rússia, China etc.

No caso da Rússia, alega-se que esse país faz uma guerra de “agressão imperialista” na Ucrânia.

Tem de ser um completo ignorante ou alguém de profunda má-fé para fazer uma afirmação desse tipo.

Claro está que a intervenção russa na Ucrânia é violação da Carta das Nações Unidas e merece condenação. Lula e o Brasil condenaram.

Mas dizer que é uma “agressão imperialista” é algo francamente parvo. E a falta de inteligência nunca será algo “moderno”.

Qualquer pessoa que tenha um mínimo de informação histórica sabe muito bem que a intervenção russa é geoestrategicamente defensiva. Não precisa ler Dugin e assemelhados.

Basta ler norte-americanos racionais (uma espécie minoritária, reconheço), como Kissinger, MacNamara, George Kennan, John Matlock, Jeffrey Sachs etc. etc.

No caso da China, alega-se, entre outras coisas, que esse país quer “invadir Taiwan”. Ora, tanto as Nações Unidas quanto os próprios EUA reconhecem que Taiwan é parte da China.

Em todo o mundo, só uma meia dúzia de nações, como o Paraguai, reconhecem Taiwan como país. Quem sabe o moderno Chile queira fazer parte desse seleto grupo.

Ironias à parte, o fato é que aderir a essa nova Guerra Fria é o que há de mais atrasado no mundo.

É aderir à violência, ao unilateralismo, ao belicismo. É querer fazer parte de um arcaico e inviável mundo unipolar. É não aceitar as profundas mudanças geopolíticas e geoeconômicas que ocorreram no planeta e querer voltar para a década de 1990.

Para usar a passagem da moda do grande poema sânscrito, é aderir à Morte, a destruidora de mundos. O terrível dharma do Ocidente.

Aderir à nova Guerra Fria é também algo profundamente antidemocrático. É propugnar por um mundo intolerante, mascarado na democracia como valor absoluto.

Quem se desvia do padrão imposto, tem de ser rigorosamente punido com intervenções e sanções. E que se dane a população inocente. Que se dane a paz.

Felizmente, a maior parte dos países do planeta é “atrasada” como o Brasil.

Não querem guerra, fria ou quente. Querem prosperar e viver em paz.

E não há nada mais clássico e mais moderno do que isso.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.

Leia também:

Eve Ottenberg: Soldados dos EUA estão na Ucrânia, além dos mercenários americanos

Marcelo Zero: Fragmentando a paz


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Comentários

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Zé Maria

+ Impressões sobre a China

Acompanhe a Seqüência:

https://twitter.com/IsisMaia/status/1683769621000646656

Zé Maria

Na realidade, a Guerra ‘Quente’,
historicamente, Nunca ‘Esfriou’.

Zé Maria

https://pbs.twimg.com/media/Ff0vp4qXEAIhnxT?format=jpg

Dado Estatístico Concreto
No Início da Presente Década, a Expectativa Média de Vida da China
superou a dos Estados Unidos da América (EUA) que vem caindo.
.
.
“China supera os EUA em Expectativa de Vida”.

“Deveria ser a manchete em todos os jornais estadunidenses e ocidentais,
mas não foi.
Embora os dados sejam provisórios, é importante entender o que isso
sinaliza.

A previsão anterior era que a expectativa de vida na China viesse a
ultrapassar a dos EUA por volta de 2027.
O processo foi acelerado pela gestão trágica estadunidense da pandemia,
cujo resultado foi queda de cerca de 2,26 anos na expectativa de vida
e mais de 1 milhão de mortos

De um lado, a expectativa de vida dos EUA volta a taxas próximas a meados
da década de 1990.
Além da pandemia, há um esgarçamento do tecido social evidentes que vai
repercutir nos indicadores sociais.

De outro, a China, além do controle muito eficaz da pandemia – mesmo que
sacrificando o desempenho econômico – promove a maior mobilidade social
da história.
Ora, o resultado se vê na notável progressão do IDH e pode se tornar mais
perceptível em comparação com os EUA.”

Professor Pesquisador DIEGO PAUTASSO
Doutor em Ciência Política pela UFRGS.
Autor de “Imperialismo”; “China e Rússia
no Pós Guerra Fria”; e co-autor de
“Teoria das Relações Internacionais”,
com Ana Prestes.
https://twitter.com/DgPautasso/status/1584475042888372231

Leia também:

“A Irracionalidade e a Presunção
é Típica dos Impérios em Declínio.”

https://twitter.com/DgPautasso/status/1683098778054565889

Zé Maria

“Acabei de retornar da China.
Estive em Xangai, Shenzen e Guangzou.
O país oriental está em constante transformação
e muitas coisas que li antes de viajar
não são compatíveis com o que vi.
Este fio reúne minhas impressões sobre o país.”

Professora Pesquisadora Isis Paris Maia
Historiadora
Mestre e Doutoranda em Políticas Públicas pela UFRGS.
https://twitter.com/IsisMaia/status/1682677180164128768

Everton Silva

Na Arábia Saudita tem muitos direitos humanos.
Simplesmente não dá para confiar nos EUA.
Certamente o Biden vai apoiar o Boric na próxima eleição no Chile. rsrsrs !
rsrsrs !

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