Eugênio Scheleder: Os caminhoneiros têm razão; Petrobras pode cobrar mais barato por óleo diesel

Tempo de leitura: 4 min
Foto Marcelo Pinto, A Plateia, via Fotos Públicas

O Brasil em primeiro lugar

Produzindo petróleo a baixo custo e com um parque de refino moderno e eficiente, a Petrobras pode oferecer combustíveis com preços muito inferiores aos do mercado internacional

Por Eugênio Miguel Mancini Scheleder*

Dirigir um caminhão de carga pelas estradas brasileiras não é uma tarefa fácil.

Exige habilidades específicas, dedicação exclusiva, desprendimento pessoal e muita coragem.

Ser caminhoneiro significa estar disposto a conviver com longos afastamentos da família, a enfrentar o risco de acidentes provocados pela má conservação das vias e a se expor aos assaltos e roubos de carga que ocorrem, diariamente, no País.

É uma vida dura, solitária e sofrida.

Justamente pelas longas jornadas de trabalho, a escolaridade dos caminhoneiros tende a permanecer baixa.

Com base em dados da PNAD-IBGE, a Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) aponta que os níveis de escolaridade e de renda desses profissionais não evoluíram, mesmo após a promulgação da Lei dos Caminhoneiros(Lei nº 13.103, de 02/03/2015), que estabeleceu regras para o exercício da profissão.

Segundo a pesquisa, apenas 60% dos caminhoneiros completaram o ensino fundamental e, destes, somente a metade concluiu, também, o ensino médio completo.

Essa deficiência de formação, no entanto, não impediu que a categoria desse, em maio de 2018, uma exemplar aula de economia, política e gestão às autoridades de Brasília e aos gestores da Petrobras.

Ao exigir e obter a redução do preço do óleo diesel, os caminhoneiros colocaram em cheque, diante de toda a Nação, a política de preços dos combustíveis praticada pela Petrobras.

Após a descoberta do Pré-Sal, a Petrobras investiu pesadamente na produção de óleo e gás natural e na modernização do seu parque de refino.

No ano de2010, foram investidos US$45 bilhões e a empresa aprovou a aplicação de recursos semelhantes nos anos seguintes, até 2014.

Os resultados desse esforço foram recompensados pela altíssima produtividade dos poços do Pré-Sal e, no parque de refino, pela instalação de unidades modernas, atualizadas tecnologicamente, complexas e flexíveis, comparáveis, em seu conjunto, ao que há de melhor em todo o mundo.

Produzindo petróleo a baixo custo e dotada de um parque de refino moderno e eficiente, a Petrobras adquiriu condições para fornecer ao consumidor brasileiro combustíveis a preços muito inferiores aos do mercado internacional.

A partir de 2016, entretanto, o governo obrigou a Petrobras a praticar uma política de alinhamento dos preços internos dos combustíveis com o câmbio e com os preços internacionais.

Essa política de paridade internacional faz com que os consumidores brasileiros paguem muito mais caro pelos combustíveis produzidos no País, em especial a gasolina, o diesel e o gás de cozinha.

Preços internos mais altos favorecem a importação de produtos já refinados, com maior valor agregado, e elevam o nível de exportação do petróleo produzido no Brasil .

O trade-off dessa operação é prejudicial ao País, pois, aumenta o gasto com divisas e afeta, negativamente, o saldo da nossa balança comercial. Prejudica, também, a Petrobras, uma vez que a importação de volumes crescentes de derivados resulta em perda de market-share, ociosidade do parque de refino e redução dos resultados da companhia.

A política de paridade internacional atende unicamente aos interesses do ente abstrato que costumamos chamar de Mercado.

Internacionalizado e apátrida, o Mercado se preocupa unicamente com lucros e prejuízos e não tem qualquer compromisso com o nosso desenvolvimento.

Elevar os preços internos dos combustíveis agrada o Mercado porque viabiliza a importação de derivados por outros agentes, a maioria estrangeiros, reduz a participação da Petrobras no abastecimento nacional, estimula a venda de ativos de refino e de logística da estatal e abre oportunidades para que outras empresas, também estrangeiras, atuem no setor de óleo e gás brasileiro.

Como os principais grupos empresariais nacionais foram impedidos de transacionar com a Petrobras, a partir dos processos movidos pela operação Lava Jato, o resultado final dessa política será a desnacionalização da indústria de petróleo brasileira.

Processo análogo já ocorre no setor elétrico, onde, nos últimos quatro anos, 95% do capital comprador de ativos foi de origem estrangeira.

A mobilização dos caminhoneiros em maio de 2018 paralisou o País.

A principal reivindicação da categoria atingiu o coração da política de preços praticada pela Petrobras, que resultava em preços cada vez mais elevados e imprevisíveis do óleo diesel.

O governo Temer não resistiu à paralisação do sistema de transporte rodoviário nacional e terminou por assinar um acordo com as associações de caminhoneiros, determinando, entre outras providências, que a Petrobras reduzisse o preço do diesel em 10% e o mantivesse congelado por trinta dias.

Esse acordo suspendeu a política de paridade de preços edesarticulou o negócio de importação de combustíveis.

A consequente recuperação do market-share de diesel (15%) e gasolina (6%), em face da redução da importação de derivados por terceiros, aumentou o lucro da Petrobras no 2º trimestre de 2018, demonstrando ser possível obter melhores resultados com preços mais baixos.

Encerrada a greve, no entanto, o governo, em pouco tempo, retomou a política de paridade internacional, abandonando, na prática, as promessas feitas à categoria.

As negociações, desde então, não prosperaram.

Insatisfeitas, as lideranças dos caminhoneiros sinalizaram, recentemente, uma nova paralisação, prevista para o início do próximo mês de fevereiro.

A principal reivindicação continua relacionada à política de preços da Petrobras, pois, as despesas com o diesel significam de 50 a 60% do valor da viagem.

O presidente da Associação Nacional do Transporte Autônomo do Brasil (ANTB), José Roberto Stringasci, afirmou que “a Petrobras não foi criada para gerar riqueza para meia dúzia, a Petrobras é nossa e tem que ajudar o povo brasileiro e o Brasil. Queremos preços nacionais para os combustíveis, com reajuste a cada seis meses ou um ano”.

O patriotismo verdadeiro traz sempre a verdade à tona.

Deflagrada uma nova greve, inércia e má gestão terão um confronto com 2 milhões de caminhoneiros, numa parada que pode significar a busca do “Brasil Primeiro!”

*Eugênio Miguel Mancini Scheleder é engenheiro e trabalhou na Petrobras. Também ocupou cargos de direção nos ministérios de Minas e Energia e do Planejamento, de 1991 a 2005.


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Comentários

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Zé Maria

“Uma greve de caminhoneiros que exige a reversão da venda das refinarias de petróleo
e o fim da paridade do petróleo no Brasil com o dólar americano,
merece apoio de todos os verdadeiros brasileiros”.

Eterno Senador Roberto Requião
https://twitter.com/requiaopmdb/status/1355235824607096838

Biblia do B

se esses pensam que vão fazer a mesma molequecagada que fizeram contra o governo Dilma, tomar bala. Agora o exército está bem nutrido e com disposição de sobra para apertar gatilho .

Biblia do B

Num país em que apenas milionários pode ter carro movido com diesel, é crime que o litro seja inferior a R$ 39,90

Zé Maria

O Crescimento em “V” do Guedes é o dos Preços da Gasolina e do Diesel.

https://br.investing.com/commodities/brent-oil

Zé Maria

Excertos

“No ano de 2010 [Governo Lula], foram investidos US$45 bilhões
e a empresa aprovou a aplicação de recursos semelhantes
nos anos seguintes [Governo Dilma], até 2014.
Os resultados desse esforço foram recompensados pela altíssima
produtividade dos poços do Pré-Sal e, no parque de refino” …

“Produzindo petróleo a baixo custo e dotada de um parque de refino moderno
e eficiente, a Petrobras adquiriu condições para fornecer ao consumidor
brasileiro combustíveis a preços muito inferiores aos do mercado internacional.”

“A partir de 2016 [ano do Golpe de Estado que derrubou a Presidente Dilma],
o governo obrigou a Petrobras a praticar uma política de alinhamento dos preços
internos dos combustíveis com o câmbio e com os preços internacionais”.

“A principal reivindicação [dos Caminhoneiros] continua relacionada
à política de preços da Petrobras”

“As despesas com o diesel significam de 50 a 60% do valor da viagem.”
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Triviais Manchetes da Semana, Pós-Golpe:

“Petrobras eleva gasolina em 5% e diesel em 4,4% nas refinarias”
| Reportagem: Marta Nogueira | Reuters | 26/01/2021 |

“Ameaça de greve de caminhoneiros não é problema da Petrobras”,
diz CEO [Presidente da Petrobras]
| Reportagem: Marta Nogueira e Sabrina Valle | Reuters | 28/01/2021 |
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Cotação do Dólar Comercial = R$ 5,43 [e subindo] (Em 28/01/2021 às 17h)
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