Adriano Benayon: Aprendendo com os erros de Getúlio Vargas

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getulio e dilma

Getúlio Vargas – Aprendendo com os erros

Adriano Benayon, em seu blog no Desenvolvimentistas, sugerido por Gustavo Santos

Agosto de 1954 foi o marco para a destruição do desenvolvimento do País, que o presidente Vargas entendia, corretamente, só ser possível havendo autonomia nacional.

2. Ele conduzia o País na direção do desenvolvimento, o que tornou o alvo a abater pelo império anglo-americano. Documentos históricos provam ter sido Vargas derrubado duas vezes (1945 e 1954), por intervenções das potências anglo-americanas (EUA e Reino Unido).

3. Isso corresponde à lógica imperial: era-lhes intolerável o surgimento de uma potência no Hemisfério Sul e no “Hemisfério Ocidental”. Geopolítica pura.

4. O objetivo foi atingido por intermédio de agentes locais – pagos ou não, conscientes ou não -, como jornalistas, políticos e militares, os quais apareceram mais que aquelas potências diante do público.

5. Pensando nos que contemplam lutar pela sobrevivência do País, discuto, neste artigo, erros de Vargas que contribuíram para o êxito dos inimigos do País.

6. Desfazendo mitos, rejeito a versão rósea e insustentável – embora geralmente aceita – de que o suicídio do presidente e a carta-testamento teriam impedido os golpistas de fazer prevalecer suas políticas. Veja-se o título de um dos livros sobre o presidente: “Vitória na Derrota – A Morte de Getúlio Vargas.”

7. É verdade que a tragédia revelou o profundo amor do povo a Getúlio. Durante, pelo menos, quinze dias, o povo reagiu, até com violência, fazendo se esconderem desafetos e caluniadores de seu líder.

8. Entretanto, o presidente não havia organizado o povo, nem formado seguidores para liderá-lo após sua morte. O único talvez com têmpera para isso, Brizola, ainda era um jovem deputado estadual.

9. Devido a esse vácuo, o furor popular arrefeceu, Eugênio Gudin e Otávio Bulhões, ligados à finança britânica, foram designados para comandar a economia e instituíram a política antinacional destinada a acabar com a autonomia industrial e tecnológica do País.

10. Em janeiro de 1955, foram baixadas as Instruções 113 e seguintes, da SUMOC, e mais medidas para entregar a economia ao controle dos carteis transnacionais, com subsídios incríveis. Desde 1956, essa política foi aplicada intensivamente por JK e nunca mais revertida.

11. É óbvio que a versão conformista interessa aos simpatizantes do império. Mas, paradoxalmente, predomina também entre a maioria dos admiradores e supostos seguidores de Vargas.

12. De resto, as atitudes políticas de muitos desses demonstram terem sido infiéis ao nacionalismo do presidente, fosse por ingenuidade, covardia, falsidade ou até por colaboração interessada com o sistema de poder transnacional.

13. Entre os erros fatais de Getúlio esteve admitir a falsa – ou, no mínimo, irrelevante – pecha de ter sido ditador.

14. Queixavam-se de ele ter ficado 15 anos consecutivos na presidência, de 1930 a 1945, e o acusavam de tencionar voltar a ser ditador, mesmo quando eleito pelo voto direto, em 1950.

15. Na realidade, o espírito de Vargas era conciliador. Não, revolucionário. Assumira a liderança da revolução de 1930, por ser o político mais proeminente do Rio Grande do Sul. Outros foram mais ativos no movimento.

16. À frente de uma revolução, tinha de comandar um governo autoritário e designar interventores nos Estados, a maioria tenentes, que simbolizavam o apoio do Exército ao movimento, além de ideais de mudança política e social.

17. Nos primeiros meses de 1932 Vargas já promulgara a nova lei eleitoral e marcara para 03.05.1933 as eleições para a Assembleia Constituinte. Sem razão, em julho de 1932, foi desencadeada a revolução “constitucionalista”, na verdade, um movimento liderado pela oligarquia paulista vinculada aos interesses britânicos.

18. A Constituição de 1934 estabeleceu eleição indireta para a presidência da República. Eleito Vargas, não cabe qualificá-lo de ditador.

19. Durante o prelúdio da 2ª Guerra Mundial, novembro de 1937, um ano após a tentativa comunista de novembro de 1935, veio, por iniciativa de oficiais do Exército, o golpe criando o “Estado Novo”, com o objetivo de reprimir os comunistas.

20. Portanto, Vargas só poderia, em tese, exercer dois mandatos em condições democráticas. O primeiro, quando presidente constitucional, de 1934 a 1937, interrompido pelos chefes militares.

21. O modelo político-econômico do Estado Novo combinou conceitos que Vargas e o General Góis Monteiro haviam formulado em 1934, sendo a ideia básica o desenvolvimento industrial sob a direção do Estado.

22. No final do Estado Novo e no mandato ganho em 1950 – e abortado pelo golpe de 1954 – Getúlio preocupou-se em desmentir a imagem de ditador. Foi demasiado tolerante – e até complacente – diante das agressões, complôs e conspirações.

23. O problema era que sempre esteve sob fogo do império anglo-americano, inconformado com a permanência de uma liderança no Brasil capaz de conduzi-lo ao desenvolvimento.

24. Embora exalte sempre o presidente Vargas, vejo uma contradição entre sua personalidade conciliadora e a consciência, que tinha, de ser a autonomia nacional indispensável para realizar o desenvolvimento.

25. Sendo essa a via escolhida, não havia campo para facilitar as ações subversivas de seus adversários. Ademais, enfrentava-se um império mundial n vezes mais poderoso que o Brasil: financeira, industrial e militarmente.

26. Em 1952, Vargas ajudou o inimigo ao não prestigiar o Ministro do Exército, Estillac Leal, quando os quintas-colunas Góis Monteiro e João Neves da Fontoura “negociaram” com os EUA o famigerado acordo militar pelas costas de Estillac.

27. Com isso, este se demitiu do ministério e foi perseguido, nas eleições para o Clube Militar, por oficiais golpistas, cujas pressões sobre Leal e partidários deste lhe determinaram a derrota.

28. Novamente, em 1953, o presidente mostrou pulso fraco, não mandando punir os coronéis signatários do manifesto contra o reajuste do salário-mínimo.

29. Daí, a conspiração de agosto de 1954 encontrou-o enfraquecido, quando implicaram a guarda pessoal do presidente no assassinato do Major Vaz, da Aeronáutica, em esquema montado para fazer crer que o alvo do crime fosse o virulento jornalista e deputado Carlos Lacerda.

30. O crime foi articulado sob a direção de Cecil Borer, titular da DOPS – Delegacia de Ordem Política e Social, em que ingressara, em 1932, com o Chefe de Polícia, também pró-nazista, Filinto Muller.

31. Borer continuou com Dutra, simpatizante fascista. Vargas não o substituiu, em 1950, não obstante saber que os nazi-fascistas, então, colaboravam intensamente com os serviços secretos anglo-americanos.

32. Getúlio também foi imprevidente, ao nomear o jovem – e sempre acomodador – deputado Tancredo Neves para o ministério da Justiça, ao qual se subordina a Polícia. Deviam ter impedido as ilegalidades do inquérito policial-militar.

33. A própria instauração do IPM, uma semana após o atentado, significou quebra da autoridade do presidente, concedida por este próprio.

34. Mesmo tendo logrado distorcer os fatos, através da ação combinada do DOPS e da Aeronáutica, e da campanha da mídia, os conspiradores não teriam conseguido derrubar Vargas, se ele não se tolhesse por preconceitos ideológicos de seus adversários.

35. Teria lutado para inteirar-se da verdade e fazê-la conhecer. Se esta já não lhe interessava – por estar cansado e decepcionado – certamente era do interesse do povo. O Brasil precisava dela.

36. Getúlio podia ter feito prevalecer os interesses do País, apoiado pela Vila Militar, no Rio, onde estavam os tanques. Essa era sua obrigação perante o Brasil, como em 1945, quando da anterior deposição por militares manipulados por potências estrangeiras.

37. Então, o pretexto foi a intenção de continuar no poder, falsamente atribuída a Vargas. Tanto não a tinha, que – além de ter convocado eleições e não ser candidato -, Getúlio dissuadiu de subjugar o golpe os chefes militares que tinham poder de fogo e faziam questão fazê-lo, não fosse a ordem contrária do presidente, sob a irrelevante justificativa de não querer o derramamento de sangue.

38. Isso não estava em questão, pois, dada a superioridade de forças dos legalistas, os golpistas se retrairiam. Vide Hélio Silva: “1945 Por Que Depuseram Vargas” – Civilização Brasileira 1976, pp. 253/4, em que reporta o apoio ao presidente do Gen. Odylio Denys, então Comandante da Polícia Militar, e do Marechal Renato Paquet, Comandante da Vila Militar.

39. Consequência da saída de Getúlio, por desapego ao poder, e sem substituto à altura, resultou, de 1945 a 1950, a interrupção do desenvolvimento do País: o Mal. Eurico Dutra, vencedor das eleições, graças a Vargas, traiu os votos, sendo subserviente às potências anglo-americanas.

40. Durante a 2ª GM, Vargas reduzira a quase zero a dívida externa e acumulara reservas cambiais. Dutra as dilapidou com importações supérfluas. Prejudicou a industrialização e dissipou as divisas congeladas pelo Reino Unido, “em troca” de ferrovias obsoletas, do Século XIX.

41. O custo do golpe de 1954 foi muitíssimo mais alto: a entrega subsidiada da indústria ao controle do capital estrangeiro, o que inviabiliza, até hoje, o desenvolvimento. Isso só pode ser revertido através de transformações estruturais profundas.

42. De fato, a dependência do País não cessou de aumentar, desde a legislação dos pró-imperiais instalados com o golpe, a qual foi aplicada e ampliada por JK – outro que traiu os votos getulistas e iniciou a sequência de crises que até hoje persegue o País.

Adriano Benayon é doutor em economia pela Universidade de Hamburgo e autor do livro Globalização versus Desenvolvimento.

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Comentários

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Antonio

A presidente continua aplicando e usando a política do Lulinha Paz e Amor da primeira eleição do presidente Lula.
Acredito que os PSDB, o DEM e os demais partidos da oposição deixaram o Lula se eleger, dando Graças à Deus porque o país estava no chão, literalmente quebrado. Um operário sem instrução, conforme o dono da Folha sem diploma e sem falar inglês. O operário na presidência iria piorar ainda mais a situação e voltariam pelos “braços do povo” na eleição seguinte.
Deu-se o contrário!
Na primeira eleição da Dilma, o jogo já foi pesado e muito mais sujo do que qualquer coisa que já havia ocorrido no país. Nesta última então… sem comentários.
Nestes quatro mandatos, nenhuma medida em direção a uma Lei de Médios, Reformas Política e Fiscal, nada!
A presidente tomou posse do seu segundo mandato e fechou-se no Alvorada apesar da guerra aberta contra ela.
Em nenhum momento buscou apoio ou pediu apoio daqueles que confiaram nela.
Está cercada por energúmenos de primeira, sem ministro da justiça, sem coordenação política, com um ministro das comunicações vendido à Globo, ministros de terceira classe.
Parece que escolheu a dedo pessoas incapazes de contestá-la ou apontar outro rumo.
Aplicou o programa da oposição.
Com quem ela pensa que está lidando? Com políticos republicanos?
Ela ainda não percebeu que está cercada de cães hidrófobos prontos a morder, sabem esperar a hora.
Enquanto isso o projeto do José Serra caminha célere no Senado e em poucos dias vai ser votado e tem muitas chances de ser aprovado.
E ai?
Francamente, espero apenas a rejeição desse projeto para dizer bem alto e com todas as letras.
Presidente Dilma, que você faz no Planalto se não governa?

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