Eliara Santana: JN passa pano para Bolsonaro; comemora 80 vagas de emprego e alimenta ideia do “despejo criminoso”

Tempo de leitura: 4 min
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Por Eliara Santana

por Eliara Santana*

As edições do JN de 7 e 8 de outubro deixaram bem claro que as Organizações Globo vão continuar a “passar pano” para Bolsonaro.

No dia 7, o Jornal Nacional ignorou solenemente a denúncia do jornal Folha de São Paulo mostrando que o WhatsApp reconhece que houve disparo ilegal de mensagens (por empresas) na campanha para a presidência em 2018. Nem uma nota. Nada. Assunto silenciado.

Também não houve qualquer menção à fala de Jair Bolsonaro desqualificando a Folha, num marcado enfrentamento com a imprensa.

Silenciamento como política editorial e edições cada vez mais leves e “divertidas”, estilo alto astral – nada de incômodo, são os tons a definir as edições do JN, por ora.

Alguns movimentos, que se consolidam como blocos de sentidos (que vão compor uma narrativa), são importantes para pensarmos sobre um posicionamento estratégico:

1. NÃO ENFRENTAMENTO A BOLSONARO

Há matérias que destacam ações específicas do governo, como a veiculada no dia 7 sobre campanha de vacinação contra sarampo, mostrando protagonismo do Ministério da Saúde

– Bolsonaro volta a aparecer no noticiário apenas em declarações suaves, comentando problemas e questões específicas (como o vazamento de óleo no Nordeste

– Há uma nota brevíssima para falar sobre a denúncia de caixa 2 envolvendo o ministro do Turismo (e a matéria não o liga a Bolsonaro). No dia 8, mostram nova denúncia de filiada ao PSL sobre propina

– Matéria mostra que Bolsonaro amplia lei Maria da Penha

– Vídeo reproduzido mostra Bolsonaro novamente falando, calmo, dizendo que não há censura

Nesse item, o segundo tópico do item 2, que está assim (completei):

2. PROBLEMAS DE POLÍTICA E ECONOMIA DESAPARECEM DO NOTICIÁRIO

– O que se veicula em termos de política nacional é basicamente a votação da reforma da Previdência e discussões na Câmara e no Senado. Nada das confusões no PSL, por exemplo.

– Em relação à economia, matérias mostram a necessidade de reformas e de enxugamento da máquina estatal (como na matéria em que, pasmem, o governo “descobre” que tem mais estatais do que imaginava. Então, mostram-se essas estatais e sua ineficiência) e abordagens sobre os altos salários e a ineficiência do funcionalismo público – prenunciando as bases da reforma administrativa, que começa a ser discutida.

Sobretudo, o tom da economia é positivo, “pequenos sinais de recuperação”, como Bonner sinaliza na abertura da matéria.

No JN, 80 (OITENTA) vagas de emprego em São Paulo já justificam matéria para mostrar a “reação do mercado de trabalho”.

Vozes externas de cidadãos, não apenas a de Bonner, são trazidas para reforçar a ideia de que a economia melhora: “Já sinto que as coisas estão melhorando”, diz prontamente uma entrevistada. Portanto, o desemprego é colocado num quadro positivo de aumento de vagas e busca com final feliz. O índice não é alardeado, a ideia é “está melhorando”.

3. IDEIA DO “DESPEJO CRIMINOSO” GANHA ESPAÇO

– No dia 8, a primeira matéria da edição dá amplo destaque para relatório da Petrobras que afirma que o que chega ao litoral do Nordeste é uma “mistura de óleos venezuelanos”.

Na matéria, Bolsonaro aparece falando em “óleo criminoso”.

Prato cheio para criar um clima bélico, alimentar os seguidores e desviar de assuntos que realmente importam. Nada como uma guerrinha simbólica para distrair a turba.

Como no ano passado, com matéria que alimentou a ideia de que a mala de dinheiro do ditador africano era para Haddad e, mais recentemente, a história do Hacker que grampeou fones de autoridades.

4. TEMAS GENERALISTAS GANHAM ESPAÇO

Grandes reportagens com temas generalistas que não se ligam a questões problemáticas (desemprego, economia, confusão no PSL, denúncias envolvendo caixa 2). O importante é falar em inteligência artificial e levar o espectador a uma realidade almejada

5. MEIO AMBIENTE CONTINUA A TER ESPAÇO

A questão da Amazônia tem merecido uma boa cobertura do JN, apesar de as críticas ao governo terem arrefecido.

6. INTERNACIONAL NÃO TRAZ CRISE NA ARGENTINA

7. NEM COMO CIDADÃO HONORÁRIO DE PARIS LULA APARECE NO JN

A partir desses blocos, podemos tirar algumas conclusões:

1. Como já discutimos aqui algumas vezes, o JN não vai partir para um grande enfrentamento com Bolsonaro, pelo menos por ora.

Enfrentá-lo e colocá-lo em maus lençóis – coisa que o jornal tem plenas condições de fazê-lo – significa também colocar em maus lençóis o governo como um todo, revelando claramente que a mídia colocou aventureiros irresponsáveis no Planalto apenas para derrotar a esquerda.

Além disso, é preciso tempo para construir um candidato viável (Huck, por exemplo).

2. Moro e Paulo Guedes continuarão a ser blindados enquanto for possível. Por isso, nada de falar mal da economia (para não colocar em risco a aprovação das reformas e das privatizações pretendidas) e dos problemas da Lava Jato (portanto, Vaza Jato não existe para o JN).

Economia segue no modo “recuperação” (então, os termos “empreendedorismo” “emprego informal”, “recuperação lenta” estarão em voga.

3. Na cobertura internacional, a crise argentina está silenciada porque é muito fácil ligar o projeto liberal de Macri – que foi reverenciado pela mídia brasileira, lembrando Miriam Leitão, que o comparou a Aécio Neves – ao projeto liberal de Guedes, potencializando o medo do efeito Orloff.

4. Meio ambiente é uma pauta que interessa à Globo – sobretudo em tempos de Greta Thunberg.

É preciso mostrar alinhamento às tendências modernas (que não mexem, em suma, nas estruturas nefastas do país) e que o agronegócio não se vincula a modos arcaicos de produção – o que acontece na Amazônia é ação de alguns grupos completamente anacrônicos (agro é pop).

5. A ideia a costurar as edições é de que o país caminha e o governo é normal.

P.S: Em matéria do Tijolaço, Fernando Brito mostra as inconsistências da ideia da “viagem” do óleo da Venezuela até a costa do Nordeste. Ele tenta ensinar aos jornalistas brasileiros um pouco de geografia. Infelizmente, acho que eles não querem aprender essa matéria. Nem história.

*Eliara Santana é jornalista e doutoranda em Estudos Linguísticos pela PUC Minas/Capes.

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Eliara Santana

Eliara Santana é jornalista e doutora em Linguística e Língua Portuguesa e pesquisadora associada do Centro de Lógica, Epistemologia e Historia da Ciência (CLE) da Unicamp, desenvolvendo pesquisa sobre ecossistema de desinformação e letramento midiático.


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Comentários

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Eduardo Farias

Tivemos oportunidades politicas de reduzir o dano causado pelo monopólio midiático no pais e não houve coragem de enfrentar a questão. Hoje pagamos o preço. Espero que tenhamos apreendido, mas aparentemente não. A esquerda continua na letargia, perdida em que caminho a seguir, sendo pautada pela turma no poder e seus aliados da mídia e esperando um “milagre” na deteriorização do cenário econômico.

Zé Maria

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Painel em Porto Alegre-RS
“A defesa da Justiça do Trabalho
e os ataques da reforma trabalhista”

Painelista: Juíza do Trabalho Valdete Souto Severo,
Presidente da Associação Juízes para a Democracia

Dia 15 de Outubro às 19h30min

Salão Multicultural Alê Junqueira
Rua Marcílio Dias, 660. Menino Deus.
.
É Melhor se Antenar:

Deputado apresenta PEC para acabar com a Justiça do Trabalho

Proposta de Emenda à Constituição (PEC) formulada
pelo deputado Bolsonarista Paulo Eduardo Martins (PSC)
propõe a Extinção da Justiça do Trabalho e também do
Ministério Público do Trabalho (MPT).

Pela PEC, seriam Extintos o Tribunal Superior do Trabalho (TST),
os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs), as Varas Trabalhistas e o Ministério Público do Trabalho (MPT), e os servidores
redistribuidos “conforme a necessidade do serviço”.

Aos desembargadores dos TRTs seria concedida
aposentadoria integral, com benefícios, enquanto
os Juízes da JT e os Procuradores do MPT seriam
incorporados às carreiras da Justiça Federal
e do MPF, respectivamente.

O texto da PEC é tão Simplório e Grotesco, que não traz
qualquer explicação sobre o que justificaria a tal “necessidade do serviço” nem prevê o que aconteceria aos servidores
na hipótese de não existir essa “necessidade”.

Para o Deputado do PSC – mesmo Partido de Carlos Bolsonaro, o filho 02 de Jair – protocolar a PEC são necessárias as assinaturas de um terço da Composição da Câmara ou 171 assinaturas.

https://www.conjur.com.br/2019-out-09/deputado-apresenta-pec-acabar-justica-trabalho

Luis Leite

A Globo agora rasteja e bajula Bolsonaro prá ver se consegue dinheiro publico para se manter viva jâ que vem acumulando deficits, como dizia o saudoso Paulo Henrique Amorim a Globo está morrrendo gorda.

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