Ricardo Melo: Assim caminha a impunidade

Tempo de leitura: 3 min

Assim caminha a impunidade

27/01/2014  03h00

Ricardo Melo, na Folha, sugestão do Julio Cesar Macedo Amorim

Meio na surdina, como convém a processos do alto tucanato, a Justiça livrou mais um envolvido no chamado mensalão mineiro. O ex-ministro e ex-vice-governador Walfrido dos Mares Guia safou-se da acusação de peculato e formação de quadrilha, graças ao artifício de prescrição de crimes quando o réu completa 70 anos.

Já se dá como praticamente certa a absolvição, em breve, de outro réu no escândalo. Trata-se de Cláudio Mourão, ex-tesoureiro da campanha do PSDB ao governo mineiro em 1998. Ao fazer 70 anos em abril, Mourão terá direito ao mesmo benefício invocado por Mares Guia.

Vários pesos, várias medidas. Enquanto o chamado mensalão petista foi julgado com celeridade (considerado o padrão nacional) e na mesma, e única, instância suprema, o processo dos tucanos recebe tratamento bastante diferente. Doze anos (isso mesmo, doze!) separam a ocorrência do desvio de dinheiro para o caixa da campanha de Eduardo Azeredo (1998) da aceitação da denúncia (2010).

Com o processo desmembrado em várias instâncias, os réus vêm sendo bafejados pelo turbilhão de recursos judiciais.

Daí para novas prescrições de penas ou protelações intermináveis, é questão de tempo. Isso sem falar de situações curiosas.

O publicitário Marcos Valério, considerado o operador da maracutaia em Minas, já foi condenado pelo mensalão petista.

Permanece, contudo, apenas como réu no processo de Azeredo, embora os fatos que embasaram as denúncias contra o PSDB mineiro tenham acontecido muito antes.

Se na Justiça mineira o processo caminha a passo de cágado, no Supremo a situação não é muito animadora.

A ação contra Azeredo chegou ao STF em 2003. Está parada até agora. Diz-se que o novo relator, o ministro Barroso, pretende acelerar os trabalhos para que o plenário examine o assunto ainda este ano. Algo a conferir.

Certo mesmo é o contraste gritante no tratamento destinado a casos similares. Em todos os sentidos. Tome-se o barulho em torno de um suposto telefonema do ex-ministro José Dirceu de dentro da cadeia. Poucos condenam o abuso de manter encarcerado um preso com direito a regime semiaberto.

Isso parece não interessar. Importa sim reabrir uma investigação sobre uso de celular, que aliás já havia sido arquivada. Resultado: com a nova decisão, por pelo menos mais um mês Dirceu perde o direito de trabalhar fora da Papuda.

Por mais que se queira, é muito difícil falar de imparcialidade diante de tais fatos, que não são os únicos.

As denúncias relativas à roubalheira envolvendo trens, metrô e correlatos, perpetrada em sucessivos governos do PSDB, continuam a salvo de uma investigação séria. Isso apesar da farta documentação colocada à disposição do público nas últimas semanas.

Vê-se apenas o jogo de empurra e muita, muita encenação. Alguém sabe, por exemplo, que fim levou a comissão criada pelo governo de São Paulo para supostamente investigar os crimes? Silêncio ensurdecedor.

Mesmo assim, cabe manter alguma esperança na Justiça — desde que seja a da Suíça.

*

Depois da operação estapafúrdia na cracolândia e dos acontecimentos nas manifestações de sábado, ou o governador Geraldo Alckmin toma alguma providência para disciplinar suas polícias, ou em breve ele terá aquilo que todo governante sempre deveria temer: um cadáver transformado em mártir.

Ricardo Melo, 58, é jornalista. Na Folha, foi editor de ‘Opinião’, editor da ‘Primeira Página’, editor-adjunto de ‘Mundo’, secretário-assistente de Redação e produtor-executivo do ‘TV Folha’, entre outras funções. Atualmente é chefe de Redação do SBT (Sistema Brasileiro de Televisão). Também foi editor-chefe do ‘Diário de S. Paulo’, do ‘Jornal da Band’ e do ‘Jornal da Globo’. Na juventude, foi um dos principais dirigentes do movimento estudantil ‘Liberdade e Luta’ (‘Libelu’), de orientação trotskista.

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Comentários

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ricardo silveira

A propósito, quando na Folha esse jornalista tinha coragem de dizer a verdade ou se acovardava e comia na mão da canalha dona do Jornal que emprestava seus carros aos torturadores da Ditadura.

Marat

O STF parece um pavódromo… É muito pavão fazendo showzinho para a burguesada!

Marat

Ainda há um fio de esperança… vida inteligente e crítica na Folha… Arre!
Sobre o judiciário, a caixa de Pandora precisa ser arrombada! Vejo muito bréqui bróqui daqui, de lá, rolezinho pra shópi centis, mas creio que seja necessário pressão no judiciário corrupto e parcial. Precisamos de um Judiciário!
Chega de juízes que esquecem provas em gavetas, chega de ministros do STF com pesos e medidas de acordo com o réu!
Aproveito o ensejo e peço que lutemos contra a corrupção, seja ela no Metrô, no Trem, no PSDB, no PT ou na PQP! Tô de saco cheio!
Chega de delegado aceitando suborno! Chega de prevaricação!
Chega de dono de cartório falsificar documentos para seus amiguinhos!!!
Se é para quebrar, queimar, lutar etc. Que se insiram estes personagens na batalha!

Luís Carlos

Impunidade. Hoje completou um ano do “massacre” de 242 jovens na boate Kiss. Com está o processo? Alguém condenado? Quanto tempo ainda durará o processo para julgar culpados pela morte de 242 pessoas??? Mesmo após tantas mortes há impunidade e demora absurda, condenando famílias a maior sofrimento ainda pela própria impunidade. Temos que perguntar: se prefeito fosse do PT teria caído no esquecimento? Teria tanta demora e silêncio? Não, e nem deveria, como também não deveria ter agora, em respeito às vítimas e às famīlias.

flavio botelho junior

E ai companheiro esqueceu teu passado, até quando vai manter aquela nazifascista fazendo comentários no SBT, Sistema bozo de Televisão.

Alberto

Muito bom este artigo do jornalista Ricardo Melo. Ele só esqueceu de mencionar que, justamente, a Folha de São Paulo, é um dos mais aguerridos defensores da roubalheira dos Tucanos paulista, capiteneados por FHC, José Serra, Alckimin. Outro blindado pela Folha é o Aécio Neves, que transformou Minas Gerais em um Estado fascista e policialesco, isso sem falarmos na corrupção, que anda no mesmo nível de São Paulo.

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