Juca Ferreira: Até fotomontagem foi usada para aprovar edifício em Salvador

Tempo de leitura: 4 min

Captura de Tela 2016-11-20 às 23.01.52

A cultura resiste! Viva o IPHAN!

por Juca Ferreira, no Facebook

Na solidão dos honestos, o IPHAN mostra o que é integridade, coragem, grandeza e respeito à coisa pública e, simplesmente por contraste, revela a podridão e a baixeza das motivações dessa gente que afastou uma presidenta honesta e que finge estar combatendo a corrupção.

Este episódio da demissão de Marcelo Calero do Ministério da Cultura e as graves acusações que ele mesmo fez contra o ainda ministro Geddel Vieira Lima é revelador e instrutivo. Mostra, mais uma vez, a farsa que foi o golpe dado em nome do combate à corrupção e expõe cruamente as entranhas apodrecidas do governo Temer.

Também ensina que, se todas as instituições do Estado brasileiro tivessem o compromisso, a capacidade técnica e a seriedade que o IPHAN, seus dirigentes e seu corpo técnico vêm demonstrando, não teríamos chegado neste estado de barbárie institucional em que estamos.

Há muito tempo o patrimônio histórico é motivo de cobiça e vem, sempre que há oportunidade, sendo achacado pela especulação imobiliária e por uma bandidagem que atua por dentro da política e das instituições.

Depois de décadas de desvalorização constante, os centros históricos e suas terras vivem um momento de valorização, o que tem aumentado em muito a pressão de empresários e políticos desonestos para controlarem esse órgão encarregado da proteção do nosso patrimônio ou para retirar seus poderes constitucionais.

Muita gente tem olho grande no IPHAN devido à importância institucional do órgão.

Na Bahia, esse assédio é ainda mais violento e dramático pela grandeza do patrimônio.

Isso pode ser entendido a partir da história do edifício La Vue Barra, empreendimento que Geddel pretendia aprovar a qualquer custo e motivo da discórdia entre os dois ministros de Temer e alegada razão da demissão de Calero.

Enquanto fui ministro da Cultura em meu segundo mandato, junto com a arquiteta Jurema Machado, então presidente do IPHAN Nacional, tomei todas as providências para impedir o avanço dessa obra irregular e para combater os desmandos na superintendência regional do IPHAN em Salvador.

Meses depois que assumi o MinC, tomei conhecimento da eventuais irregularidades em torno desse empreendimento imobiliário na Barra, e recebi denúncias graves de desmandos por parte do superintendente local do IPHAN, Carlos Amorim.

Determinei a criação de um grupo de trabalho dentro do próprio gabinete do ministro para apurar o caso e realizei uma série de audiências públicas, reuniões e encontros em Salvador para ouvir com atenção as queixas que vinham de todos os lados: moradores da Barra e do Pelourinho, Instituto dos Arquitetos, organizações sociais, universidade, historiadores, jornalistas, ambientalistas e diversos outros setores alarmados com o ataque organizado ao patrimônio histórico de cultural da cidade.

As denúncias revelaram situações absurdas.

Um exemplo: O Escritório Técnico de Licenciamento e Fiscalização – ETELF, encarregado de analisar os projetos imobiliários em áreas de preservação foi extinto, em outubro de 2014, pelo então superintendente do IPHAN-BA, Carlos Amorim, depois de ter dado parecer contrário à construção do La Vue Barra.

Foi ele que na mesma época autorizou a demolição de casarões tombados na área de maior concentração do patrimônio histórico da cidade.

As evidências de desmandos eram tantas que, em outubro, determinei a demissão de Carlos Amorim e o prosseguimento das apurações e dos estudos técnicos, que mais tarde revelariam até falsificações e montagens grotescas.

Carlos Amorim costumava mostrar uma fotomontagem para sustentar a falsa premissa de que as poligonais de tombamento dos bens localizados na vizinhança do prédio não alcançavam a área onde se localizaria o edifício.

A segunda foto que acompanha este post mostra a posição verdadeira do edifício que, em vez de se chamar La Vue, deveria ser batizado de Ma Vue, pois pretendia usurpar o direito à paisagem – que é um bem de todos – e capturá-la para o deleite de uns poucos, entre eles, Geddel Vieira Lima.

Como não poderia deixar de ser, em fevereiro de 2016 o IPHAN Nacional revogou o parecer técnico nº 0627/2014, que autorizava a obra, assinado pelo Engenheiro Bruno Tavares, homem de confiança de Carlos Amorim, e enviou o caso para o Ministério Público.

Pasmem, o Sr. Bruno Tavares viria assumir o IPHAN da Bahia nomeado por Temer, logo depois do golpe que destituiu a presidenta Dilma.

Os ataques não se restringem ao IPHAN da Bahia.

Em junho deste ano, ao recriar o MinC, depois da tentativa frustrada de extingui-lo, inspirado por Geddel e outros golpistas, Temer inventou dentro da estrutura do Ministério uma Secretaria do Patrimônio Histórico numa clara manobra para neutralizar a base técnica e esvaziar um órgão de Estado íntegro, com 80 anos de serviços prestados à memória nacional.

Aqui está o artigo (http://bit.ly/1UiikRW) que publiquei na época denunciando este golpe armado contra o IPHAN, cuja credibilidade e força institucional Calero não ousou enfrentar.

Agora, pela boca de Calero, um fiel auxiliar de Temer e golpista de primeira hora, o ataque ao patrimônio histórico nacional é mais uma vez comprovado.

Temer não poderá alegar que não sabia do crime cometido por Geddel, que usou suas prerrogativas de ministro para obter benefício pessoal. O ministro palaciano tem que ser imediatamente afastado e as denuncias contra ele apuradas com rigor.

É preciso investigar a compra dessa cobertura que Geddel tem no prédio. Houve compra ou seria um pagamento por serviços prestados? O presidente Temer também precisa esclarecer à sociedade porque, ao ser informado por Calero, não tomou providências.

Da mesma forma, o governo deve anular a criação da Secretaria do Patrimônio Histórico, confirmar a decisão do IPHAN e exonerar, a bem do serviço público, o atual superintendente do IPHAN da Bahia que nada mais é do que um estafeta de Carlos Amorim a serviço da especulação imobiliária.

E, finalmente, a cidadania deve se manter alerta. O golpe tem muitas faces e tentará contornar mais esta crise na base da mentira e da manipulação.

Precisamos estar atentos e fortes para enfrentar seus ardis. Estão trocando um golpista de pouca idade por uma raposa velha e felpuda. Ele virá cheio de truques e espertezas.

Os dirigentes e servidores do IPHAN estão merecendo nosso reconhecimento e precisando do nosso apoio.

Leia também:

Em Curitiba, os ataques das milícias de direita às ocupações em escolas; veja as imagens


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Nenhum comentário ainda, seja o primeiro!

Deixe seu comentário

Leia também