A cura gay

Tempo de leitura: 2 min
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Por Marco Aurélio Mello

por Marco Aurélio Mello

Um debate ganha forma na internet entre aqueles que estudam as redes sociais e suas dinâmicas.

É a presença de um usuário apelidado de “imitador”, ou “sonâmbulo”.

São pessoas que usam a internet para encontrar diariamente uma opinião para chamar de sua.

Gente que segue determinados formuladores e que se alimenta desta “droga” cotidianamente.

O que antes era papel exclusivo dos meios de comunicação de massa (a midiotização) passou a ser privilégio da internet.

O sujeito entra numa rede, vê algo com o qual se identifica e, ao contrário do modelo anterior, age: curte e compartilha em seu grupo.

Dali a pouco ele se vê numa onda que cresce e cresce até se transformar em “opinião pública”.

Vamos a um exemplo: a cura gay. Duas ondas distintas começaram a se formar ontem, a dos que são a favor e a dos que são contra a lógica de tratar orientação sexual como doença.

Produz-se uma enormidade de fluxo, não de conteúdo, que “transborda”.

Em vez de haver aprofundamento do debate, há divisão, por isso o famoso FlaxFlu.

A ideia será “validada”, conforme alcançar o máximo de “likes” e “trends”.

Mas como toda onda, depois que ela arrebenta, ela morre.

É neste ínterim que formou-se a “opinião pública”.

É nela que se fixarão os operadores virtuais, robôs, espiões, inteligências artificiais, estudiosos de big data e seus algoritmos.

Seu “lado” vai determinar seu futuro na rede, ou seja, em que bolha você se fixará e quais serão as “novas ideias” que vão te alcançar.

Passado um tempo sua experiência será absolutamente positiva; para você.

Não haverá contraditório, nem desgosto, será uma zona de conforto total.

O diabo é que aquela ideia (a cura gay) depois de uma, duas semanas, não terá mais a mínima relevância.

Porque, segundo os mesmos especialistas, passada a comoção, vem a síndrome de abstinência, numa necessidade descontrolada de encontrar uma nova opinião para chamar de sua.

Afinal, vivemos numa sociedade de consumo de alta intensidade e os donos do capital e os políticos sabem direitinho como se aproveitar disso.

Segundo Fábio Malini, coordenador do Labic, um dos caras que estudam e pensam redes, “não há notícias falsas, não há notícias verdadeiras. Só há microfluxos de conversas ocorrendo agora por aí para, amanhã, se transformarem na opinião pública que dará fim ao drama psíquico individual de não ter opinião por um dia.”

Aí eu pergunto: “Existirmos: a que será que se destina?”

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Marco Aurélio Mello

Jornalista, radialista e escritor.


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Comentários

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Edgar Rocha

Resposta: é preciso existir primeiro, pra poder perguntar depois. A sensação de existência gerada pela virtualidade tecnológica é isto mesmo: virtual. Daí a necessidade posterior da catarse: o cara vai pra rua, vai pra qualquer manifestação que lhe mandarem ir, buscando a materialização de seu mundo virtual. A internet é uma usina de energia social. Basta o catalizador certo, um bom conversor e, se a tomada não tem o pino certo é só adaptar.
Esta gente não existe de fato. E sabem disto. Quando você sequer cumprimenta o vizinho, não se preocupa com coisas relevantes para si ou para seu próximo e mesmo assim, se vê cobrado pra sentir-se importante, relevante, notável, cria-se uma equação da vida para a qual te oferecem solução fácil. E você aceita e paga o preço.
Existir de verdade virou sinônimo de ser frugal, pequeno, irrelevante. Não podemos subestimar este paradigma. Nós crescemos nele desde muito antes da internet.
Talvez, a esquerda, se quiser continuar existindo, deva começar a rever isto. Personalismos, hierarquizações, esvaziamento da existência também encontram ecos em estruturas e elaborações.
Um ponto de partida: que tal Mujica?

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