
por Luiz Carlos Azenha, publicado originalmente em 2005
Permanece um ponto de interrogação em minha carreira. A história de uma mulher supostamente grávida.
Faz tanto tempo que exame de ultrassonografia nem existia em Bauru, no interior de São Paulo.
Eu trabalhava na TV Bauru, em início de carreira.
Fui chamado pelo chefe de reportagem, Luiz Antônio Malavolta.
Existia a denúncia de que um bebê havia sido sequestrado de uma maternidade.
Um caso inédito na cidade. Fomos encontrar a mãe que fazia a denúncia, em um bairro pobre de Bauru.
Ela já tinha outros filhos, se não me engano três ou quatro. A mulher era quarentona.
Contou uma história coerente e mostrou documentos.
Apoie o VIOMUNDO
Receitas médicas normalmente associadas ao acompanhamento de uma gravidez.
O tratamento dado aos pacientes do INPS (que precedeu o SUS) era sofrível.
As filas eram enormes nos postos de atendimento.
Não era incomum a consulta durar de cinco a dez minutos.
A mãe que fez a denúncia nos contou que parou de menstruar, que os seios aumentaram de tamanho, que sentia as náuseas típicas da gravidez e que chegou a produzir leite.
No dia marcado para o parto, apresentou-se na maternidade.
Saiu de lá sem o bebê.
Estava certa de que a criança havia sido seqüestrada.
Fomos ao hospital investigar a denúncia.
Enfermeiras e médicos ficaram nervosos com a presença da equipe de reportagem.
No arquivo do hospital, havia o registro da presença da paciente no dia marcado para o parto.
Mas, na hora agá, os médicos nada encontraram na barriga da mulher.
Fizeram apenas uma curetagem.
O diretor do hospital apresentou uma explicação: tinha sido um caso de pseudociese, uma falsa gravidez, um episódio psíquico.
Ansiosa para ter mais um filho, porque estava próxima da menopausa, ou talvez para atrair a atenção de um marido distante, a mulher tinha produzido todos os sinais de uma gravidez inexistente.
Fiquei surpreso com a explicação, mas apurando com especialistas confirmamos a possibilidade.
São casos raros, registrados na literatura médica.
Provam o poder da mente humana.
Fui conferir a definição de pseudociese em uma enciclopédia médica:
“Gravidez imaginária em mulheres em geral resultam de um forte desejo ou necessidade de reprodução. A menstruação deixa de acontecer ainda que não haja concepção. O abdômen e os seios incham, podendo produzir leite. O útero pode mostrar sinais de gravidez e os exames de urina podem dar falsos positivos. A mulher pode ter a sensação de movimentos do feto. (…) Há indícios de que a depressão pode provocar alterações na glândula pituitária, provocando mudanças hormonais similares às que ocorrem na gravidez real”.
Foi um alerta para o repórter em início de carreira: em Jornalismo, nem tudo é o que parece.
Leia também:




Comentários
Nenhum comentário ainda, seja o primeiro!