Gilson Caroni Filho: Um recado aos jovens e aos mais antigos

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Um recado aos jovens e aos mais antigos

por Gilson Caroni Filho, via e-mail

É preciso repetir, uma, duas, quantas vezes for necessário.

Não condenemos, nós do campo democrático-popular, as manifestações de junho do ano passado. Não considero os que não concordam com o atual governo como atores necessariamente reacionários.

Numa sociedade como a nossa, totalmente fracionada, a democracia continua sendo meramente formal.

Apesar dos avanços inegáveis, ainda há desigualdades abissais, injustiças profundas, direitos negados a índios e pequenos produtores, ambos perdendo suas terras para o latifúndio.

Obras de impacto ambiental, executadas sem um amplo debate com a sociedade civil, não contribuem em nada para um desenvolvimento sustentável.

Boa parte do que poderia ser investido em saúde e educação é usado no pagamento de juros estratosféricos de uma dívida nunca auditada.

Empresas de comunicação, que funcionam sob regime de concessão pública, atuam como braços políticos dos partidos de direita.

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Por tudo isso, a ida de manifestantes às ruas contribuiu para vocalizar pleitos legítimos que colaboram para o efetivo aprofundamento democrático.

É saudável ver o surgimento de novos protagonistas. É o desdobramento natural da luta do PT,PC do B e de outras forças progressistas nos últimos 20 anos.

Forças que não deveriam ser hostilizadas, mas ouvidas quando buscaram um diálogo.

E qual a causa do insucesso dessa tentativa? A intolerância, alimentada por um discurso raivoso que muitos aplaudiram.

Lembram dos aplausos? Saíram das mesmas mãos que hoje aplaudem as tropas de choque da PM.

E agora, José?

 Mas vocês,ativistas recentes, confundem falta de liderança com ausência de direção. É tudo o que a direita precisa para deslegitimar uma juventude cidadã.

A ambiguidade estudada do PSOL, a inconsequência política do PSTU — além de outras legendas sem base política expressiva– colaboraram, e muito, para o esvaziamento do movimento de vocês.

Delas (da ausência de uma agenda clara e de direções definidas) derivaram a ação nefasta dos Black Blocs a quem muitos, por ingenuidade ou oportunismo, deixaram de condenar em definição clara: fascistas fazendo freelancer de “táticas de defesa libertária”.

Qual o resultado até agora?

Um cinegrafista morto e a mídia corporativa capitalizando o triste episódio para se apresentar como defensora do Estado Democrático de Direito. Logo ela, que durante o regime militar, defendeu os torturadores encapuzados.

Vocês merecem isso, garotada? É claro que não. Nenhum de nós merece.

Os mais antigos, aqueles que forjaram seu perfil na luta contra a ditadura, precisam entender que não são donos de uma fórmula prescritível atemporal, que pode ser aplicada a sujeitos e momentos históricos distintos.

Nada mais antidialético do que pensar e agir desta forma. Nada mais negador da ação política.

Lembremos que, nos anos 1970/1980, os setores mais avançados da classe operária se politizaram nas fábricas e não graças à ação iluminada de consciências exteriores a eles.

E destaquemos a desconfiança que Lula e outra lideranças orgânicas do movimento sindical nutriam em relação aos partidos políticos. A isso nunca chamamos de fascismo. Por que fazê-lo agora?

Será necessário rememorar papel fundamental dos setores ligados à Teologia da Libertação na logística e organização dos movimentos populares, em especial do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra?

Quando, nos anos 1990,o MST fez uma passeata na Avenida Rio Branco, centro financeiro e comercial do Rio de Janeiro, eu estava lá.

E sabem por que foi maravilhoso? Porque as palavras de ordem não repetiam as nossas, os supostos iluminados.

E embora alguns tentassem puxá-las, eles ignoraram solenemente. Hoje, formam o maior movimento social organizado da América Latina.

Acham, com razão, que o governo faz concessões excessivas ao agronegócio, mas sabem que é melhor um governo petista que,mal ou bem, dialoga com eles a um novo ciclo tucano que trata movimentos sociais com repressão e sem concessão alguma.

O massacre de Eldorado de Carajás foi emblemático demais, para pensarmos que aquelas mortes foram um ponto fora da curva.

No mais, é isso: há que se aproximar dos jovens para aprofundar a democracia. Há que se lembrar, mais uma vez, que só se aprende na ação. E alertá-los quanto aos arrivistas que se apresentarão como novidadeiros.

Queiramos ou não, quem muda a história é a juventude. Melhor dialogar com eles a nos tornarmos uma “gerontocracia burocraticamente progressista”

A história corre caudalosa no seu curso. Cabe definir qual margem do rio capturará sua força.

Se a direita que a seca completamente antes de chegar a outro corpo d’água.

Ou se à esquerda que a levará a outro rio, ao mar ou ao Oceano. Nunca o conceito habermasiano de razão dialógica se fez tão urgente.

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