Isaías Dalle: Sindicalismo acomodado facilitou era neoliberal, agora arrocho

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Da esquerda para a direita: Anselmo, Eliseo, o mediador Dari Krein e João Felício

por Isaías Dalle, no site da CUT

A acomodação do movimento sindical ajudou a consolidar a era neoliberal, que no Hemisfério Norte despontou no final dos anos 1970, e também tem papel determinante na escalada de cortes de direitos e arrocho salarial que assola a Europa neste momento.

Esse é um ponto comum nas três breves análises feitas durante seminário que marcou a abertura oficial do terceiro curso “Políticas e Sindicalismo Internacionais”, parceria da CUT e do Cesit/Unicamp, na última segunda-feira, no Instituto Cajamar (SP).

O professor Anselmo Luis dos Santos, da Unicamp, lembrou que ao final dos anos 1970 as lideranças sindicais – e políticas, em geral – não haviam vivenciado a profunda crise que eclodira nos anos 30 nem a Segunda Guerra Mundial, episódios que precederam a dura tarefa de reconstrução que deu origem ao chamado Estado de Bem-Estar Social.

Na opinião do professor, isso dificultou a compreensão de que as críticas à proteção social e às políticas públicas, que tomaram corpo ao final da década de 70 com maciça ajuda da mídia e de universidades, poriam fim a um período de forte regulação dos mercados, graças ao qual o capitalismo viveu sua época “menos instável”. A resistência aos ataques coordenados teria sido, por causa dessa espécie de relaxamento, fraca.

Anda e para

“O mundo de hoje se parece muito mais com aquele do final do século 19 e início do 20. Vivemos sob a lógica do ‘stop and go’, em breves ciclos de baixo crescimento seguidos por estagnação e desemprego, quando o capital, para se proteger, vai buscar seu lucro em outras regiões do planeta onde a regulação dos mercados é ainda mais frágil que nos países centrais”, afirmou Anselmo. “Isso porque a brutal desregulamentação neoliberal deu predominância a um capital fictício, especulativo”.

A mesma acomodação fez o movimento sindical se deixar apanhar de surpresa na eclosão da crise em 2008, na opinião do professor Elísio Guerreiro do Estanque, da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, Portugal.

“A geração que chegou ao mercado europeu nos anos 90 nem conhecia o padrão de direitos que existia anteriormente, e por isso não considerou, de uma forma geral, a necessidade de se organizar em sindicatos. Uma das consequências foi se deixar levar pelo discurso fácil do individualismo como motor do desenvolvimento”, disse. Tal era o “espírito do tempo” quando a manifestação mais grave da crise bateu na segunda metade dos anos 2000.

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Em parte por causa disso, as principais mobilizações de rua na Europa têm sido puxadas, segundo testemunho do professor, por “movimentos ditos espontâneos, sem lideranças nítidas. Foram esses movimentos que fizeram os protestos que mais estremeceram as instituições. O campo sindical teve dificuldades de se posicionar”, disse.

Emboscada

João Felício, secretário de Relações Internacionais da CUT, disse acreditar que “o Estado de Bem-Estar Social e as boas condições de vida que gerou escamotearam as contradições entre capital e trabalho e parte do movimento sindical europeu foi apanhado de emboscada”.

No Brasil, o neoliberalismo chegou mais tarde, muito em função da luta popular pela redemocratização do País, que nos anos 1980 colocara na agenda política nacional a conquista de mais direitos como prioridade. Uma das obras dessa luta foi a Constituição de 1988, que apesar de todas as dificuldades impostas a partir da década seguinte, serviu de anteparo ao desmonte total pretendido pelos governos Collor e FHC. E, como em parte da América Latina, governos progressistas atualmente resistem à crise com a ajuda de políticas sociais adotadas antes de 2008.

“Por tudo isso que vemos no mundo, mais as mobilizações de junho aqui no Brasil, sabemos que o movimento sindical não pode descuidar da mobilização e de uma postura de pressão constante para não apenas evitar retrocessos, mas produzir avanços”, disse o secretário.

Ao discorrer sobre o cenário sindical internacional, Felício afirmou que uma grande dificuldade é produzir uma síntese, uma espécie de “marca registrada” que dê unidade de ação com clareza ideológica às diversas centrais existentes no mundo. “Nosso desafio é como colocar todas as filiadas à CSI em movimento por uma única causa”, analisou. A CUT é filiada à CSI (Central Sindical Internacional).

Antes, o professor Anselmo havia sugerido uma bandeira que, na opinião dele, pode unificar o movimento sindical internacional e dialogar com as sociedades. “Há certas pautas que, por mais justas, são difíceis de defender em determinados países. Como propor, por exemplo, a redução da jornada em países africanos carentes de industrialização e de empregos? Mas eu acredito que uma campanha pela redução dos juros internacionais pode unificar a todos. O combate à especulação estimularia o capital produtivo”.

Eliseo, por sua vez, lembrou que o que une os movimentos hoje na Europa é a bandeira da renegociação das dívidas públicas.

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