Emir Sader: Reforma política democrática, só com Constituinte

Tempo de leitura: 2 min

Durante a campanha eleitoral Lula e Dilma falaram de convocar Assembleia Constituinte exclusiva para a reforma política. Os argumentos a favor são claros: um Congresso eleito pelos benefícios das leis atuais, não iria dar tiro no pé e reformar essas leis.

Terminadas as eleições, não se falou mais no tema. Mesmo com Lula definindo a reforma política como uma das prioridades da sua atuação, não se voltou a mencionar mais a Constituinte. Lula mergulhou nas difíceis e trabalhosas negociações da reforma diretamente com os líderes do Congresso atual.

Logo o PMDB e o PSDB apresentaram suas próprias propostas, que têm em distintas versões do voto distrital seu eixo – retrocessos enormes em relação às precárias formas atuais de representação política. Tudo indica que o fazem sem esperança de que sejam aprovadas, mas para se contrapor o primeiro, e negociar o segundo, com o PT, com algo em mão em torno do qual fazer concessões, em troca de outras tantas por parte do PT e de Lula. Para que finalmente nada mude – condição para que o PMDB continue a ter o peso que tem tido até aqui.

Lula, o governo, o PT, a esquerda – entraram no jogo. Se deixaram levar pela solução mais fácil: negociar com o Congresso e com os partidos como eles existem hoje. Resultado: nem sequer o financiamento público de campanha deve ser aprovado. A reforma política está no limite de ser mais uma vez uma frustração e de termos de conviver com o financiamento privado das campanhas e todo o poder do dinheiro sobre elas; com as candidaturas avulsas em cara partido, em que tantos deles se tornam partidos de aluguel; sem fidelidade partidária, para que o mercado dos mandatos possa seguir correndo solto; para que a deformação da representação atual na Câmara siga favorecendo estados menores, que elegem deputados com dez e quinze menos votos que em outros estados.

Em suma, abandonando a ideia da Assembleia Constituinte autônoma, estamos caminhando para uma grande derrota. Não estaremos aproveitando a grande derrota que impusemos à direita nas eleições de 2010, para eleger uma Assembleia Constituinte com uma composição muito melhor, perdendo a possibilidade de promover uma nova geração de políticos jovens, que representem as camadas emergentes e a juventude.

Se não reconsiderarmos o caminho aparentemente sem saída que trilhamos, faremos de uma vitória, uma derrota, estaremos perpetuando um sistema eleitoral deformado, socialmente injusto, economicamente determinado.

Ainda é tempo. Basta Lula e Dilma se recordarem das posições que defenderam durante a campanha e recolocarem a proposta de convocação de uma Assembleia Constituinte Autonoma. Certamente o PT e os outros partidos de esquerda seguirão por esse caminho e o Brasil poderá renovar, de forma mais acelerada e transparente, seu sistema politica e sua democracia.

Emir Sader, sociólogo e cientista, mestre em filosofia política e doutor em ciência política pela USP – Universidade de São Paulo.


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Comentários

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Matheus

Querem saber a real solução para essa desgraça coletiva que chamamos de "Brasil"? Fuzilemos todos os filhotes da ditadura civil-militar, após julgamento público, mas ágil, em praça pública. Depois de limpar esse país, eliminando os Sarneys, Marinhos, ACMs, Malufs, Abilios Dinizs, Edir Macedos, Brilhantes Ustras, Barbalhos, Calheiros, Collors, Bornhausens, etc., etc., etc., aí sim valerá à pena pensar em uma nova constituinte, que não fique, como a de 1988, apenas na promessa de cidadania.

Operante Livre

Este é o momento.
Fico feliz de saber que outros veem na nova constituinte uma possibilidade real de mudança.

Izac Menezes Alves

O primewiro passo é acabar com as coligações partidárias para o Legislativo, que é a maior vergonha nacional e depois e implnatar o financiamento público, melhoraria muito.

luiz pinheiro

Seria ótimo termos essa Constituinte. O problema é que a convocação dela depende do Congresso Nacional, que, como bem observa o Emir, não é lá dado a praticar tiro ao alvo contra o próprio pé.

Pedro Luiz Paredes

Se eles quisessem financiamento público de campanha teriam isolado essa proposta de uma eventual reforma política.

El Gordo

Constituinte hoje – com o Brasil ainda sob forte influência da Imprensa Corporativa, com crise econômica no exterior e uma série de interesses distintos no país – é abrir espaço pra transformar a Constituinte no neocolonialismo do século XXI: o institucional.

FrancoAtirador

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Concordo, desde que o candidato a constituinte:

1) Não seja detentor de mandato eletivo;

2) Fique impedido de concorrer a qualquer cargo
nas duas eleições imediatamente subsequentes.
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David Rodrigues

Constituinte JÁ! Valeu Professor!

    Rodrigo Santos

    Não há mecanismos jurídicos que possam limitar uma assembléia constituinte.
    Uma vez convocada a assembléia, ela passa a ter poder constituinte originário. O que quer dizer que ela não estaria limitada a tratar apenas dos temas relativos à "reforma política", mas poderia disciplinar constitucionalmente qualquer outro tema.
    Não existe assembléia constituinte para "reformar" a constituição. Assembléia constituinte é, como já disse, ilimitada juridicamente.
    Agora, imagine que fossem escolhidos um bando de "Paulos Malufs" e "Jair Bolsonaros" para essa "constituinte". Alguém ai acha que eles se limitariam a fazer uma "reforma política" ou aproveitariam a oportunidade de ausência de limite para acabar com todas as conquistas sociais que já estão na Constituição Federal de 1988?

Luiz Fortaleza

"Pensar a política no estreito horizonte político burguês, é fazer a política da burguesia"; "A democracia liberal burguesa é a sua verdadeira ditadura de classe" Karl Marx.

Roberto Locatelli

Realmente, corretíssima a avaliação: o atual Congresso, eleito pelas normas atuais, não deseja mudar. Por exemplo, anos atrás o Senador Suplicy apresentou projeto de lei para que os mandados dos senadores fossem de 4 anos, e não mais de 8, que ele achava longo demais. Quase foi linchado…

É a população que deseja uma estrutura política melhor, não os políticos que aí estão. Constituinte já!

blogdofajardo

Com que leis se elegeriam os cogressistas constituintes?

ricardo silveira

Pela experiência que temos no Brasil, está para nascer um Congresso que faça uma reforma política pensando no aperfeiçoamento da democracia brasileira. Sem Constituinte exclusiva é melhor nem fazer, deixa como está, porque se mexer na legislação que temos, a chance de piorar é muito maior do que de melhorar.

Fabio SP

Bom, finalmente eu sei a diferença entre o voto distrital e o não distrital… Se for distrital, o PT perde cadeiras no Congresso e o PMDB e PSDB ganham. Se não for distrital ganha o PT e perdem o PMDB e o PSDB.

Assim sendo, tudo o mais que se falar, depende de quem estiver falando…

    Pedro Soto

    Uma diferença fundamental entre os dois sistemas que você não conhece é que o voto distrital é um VOTO DE CABRESTO. É a volta do curral eleitoral. Ou seja, representa aquilo que a direita mais deseja numa campanha eleitoral: a desideologização do voto. Sem falar na participação decisiva do poder econômico, ainda mais considerando o financiamento exclusivamente privado das campanhas, que a direita também defende.
    É a própria sopa no mel. DESSE TIPO DE MOLEZA EU TAMBÉM GOSTO!

    Beto

    Tu tá sabendo muito pouco, cara pálida!
    Só isso que tu sabes!
    O quê que o financiamento público de campanhas tem a ver com voto distrital? Por exemplo?
    "Assim sendo, tudo o mais que se falar, depende de quem estiver falando…"
    Cumé que tu falas uma asneira dessas? cara pálida!
    Cruz credo!!

Klaus

Como o Congresso atual não vota a reforma política como Emir Sader quer, eleja-se uma Assembléia Constituinte autônoma para fazer uma reforma política como ele acha é seja certo. Caso o Congresso atual fizesse a reforma política que ele quer, uma Assembléia Constiutinte autônoma não seria necessária. Perdi alguma coisa?

    Operante Livre

    Você perdeu a capacidade de perceber que ele pode querer e defender a reforma que lhe pareça conveniente e que você pode defender outros critérios. Aqui é espaço de colocações de percepções e preferências. Em vez de criticar o cara diz qual é a tua posição, se é que tem alguma.

    fernandoeudonatelo

    Não tiro sua razão, mas tbm não vejo por aí.

    Porque para indivíduos de posições progressistas mais à esquerda, essa atual Reforma Política é despolitizadora, ou seja, a proposta de voto distrital e manutenção do financiamento privado e não-declarado de campanha, esvaziam o caráter ideológico das instituições partidárias (que já é vazio) e transferem o centro do debate para o Provincianismo (que já existe), ou currais de influência.

    E aí se diferencia dos que são ideologicamente antagônicos, mais à direita do espectro político seja conservador ou liberal, que não tem interesse na mudança estrutural de uma Constituinte tendo em vista o maior peso favorável ao seu projeto.

    Nesse caso não tiro sua razão, porque de fato, o que PMDB, talvez PSD e outros querem é uma votação na pessoa e não na legenda, não na ideologia pois essas estruturas são fragmentadas nesses partidos, sem militância orgânica na base.

    Mas peço que olho pelo prisma desses blocos progressistas.

    Pedro Soto

    Acho que você não entendeu nada.
    O tempo todo o Emir Sader está defendendo a realização da reforma política através de uma Assembléia Constituinte.

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