Vestimentas nazistas: A carta de repúdio de alunos da USC e a resposta da universidade
Tempo de leitura: 6 min
Carta de repúdio de alunos do 4º ano de R.I ao estande do curso de História na Feira de Profissões
Nós, alunos do 4º ano de Relações Internacionais da USC, muito nos surpreendemos com o estande do curso de História na Feira de Profissões da Universidade hoje, dia 16 de Setembro.
Ao querer apresentar a alunos do último ano do Ensino Médio fatos sobre a Segunda Guerra Mundial cometeram o grave erro de enaltecer os regimes totalitários responsáveis pelo início do conflito, utilizando as vestimentas e os símbolos representantes de tais grupos, dentre os quais a suástica nazista. Não suficiente, o estande também apresentava discursos do ditador Adolf Hitler.
O Nazismo foi responsável pelo genocídio e perseguições à negros, judeus, homossexuais, e todas as minorias étnicas que não condiziam com a suposta raça ariana. É inadmissível que um curso de História, sendo seus estudantes e coordenação conhecedores de todas as mazelas praticadas por esse regime, possa não ter a sensibilidade de percepção ao contexto atual, onde partidos neonazistas voltaram a participar de eleições na Europa, o que traz reflexos até mesmo nas ruas do Brasil.
Como exemplo, citemos: somente esse ano foram mortos 85 LGBT’s. No ano anterior, 312. Há um mês atrás seis imigrantes haitianos foram baleados em frente a Paróquia Nacional da Paz. Anteontem (14/09) um senegalês foi queimado vivo nas ruas de Santa Maria, RS.
Toda e qualquer menção ou veiculação de símbolos nazista no Brasil é crime previsto no Artigo 20 do Código Penal:
Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. § 1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada para fins de divulgação do Nazismo.
Apesar de haver representação também dos Judeus (um dos grupos que foram perseguidos, torturados e assassinados) a falta de sensibilidade se denota quando temos a certeza de que o cenário ideal seria apenas o de representações dos oprimidos, sem precisar conter as vestimentas nazistas e fascistas, que eram maioria. Este curso de Humanas perdeu uma oportunidade ímpar de mostrar a jovens em formação a única parte que não deve ser esquecida: a morte de mais de dez milhões de pessoas derivada do ódio político, do racismo, da xenofobia e da homofobia.
Apoie o VIOMUNDO
Nós repudiamos veementemente essa exibição do curso de História, e aconselhamos a Universidade do Sagrado Coração a fazer o mesmo, além de exigir um pedido de retratação por parte da coordenação do curso.
Assinam a carta:
Matteo Netto , Alexandre Criscione, Ana Lívia Rodrigues , Thaís Helena Tambara , Natalie Alves , Júlia Lourenção , Débora Ani Marchi , Mariana Marcelino Florenzano , Julia Concuruto Reche, Lilian Lacerda , Isabela Andreatta , Matheus S. Contreira e Gabriel Cara.
*****
Esclarecimento
Tema do curso de História na Feira das Profissões
18 set | Destaques
do site da Universidade do Sagrado Coração
A Universidade do Sagrado Coração optou por apresentar como tema do estande de História, na Feira das Profissões, “O Fim da Segunda Guerra Mundial”, que completa 70 anos em 2015. Um momento que nos faz refletir sobre o fim de ditaduras, de regimes autoritários e totalitários, da repressão e do medo, do início do julgamento dos crimes de guerra e perspectivas de paz.
Para apresentar o tema, montou uma exposição de cartazes que retratavam a ascensão e, principalmente, a queda do 3º Reich e do Eixo. Esta exposição começava com a derrota nazista mostrando a bandeira e a suástica rasgadas e queimadas pelos aliados. Nesses cartazes também encontravam-se imagens sobre a morte do ditador Mussolini, o Holocausto, as sorrateiras propagandas nazistas, o Dia D, a destruição dos símbolos nazistas, a bomba atômica e a vitória dos aliados.
O tema foi enriquecido com a discussão e apresentação de filmes de época como o Triunfo da Vontade, uma fonte histórica muito debatida academicamente para entender a perversa propaganda nazista, bem como a clássica obra-prima de Charles Chaplin O Grande Ditador, que se apresentava como contraponto à obra nazista. Outros filmes e documentários apresentavam críticas aos regimes totalitários como Arquitetura da Destruição e os atuais Olga, A Queda e a Segunda Guerra Mundial.
Foram expostos livros que retratavam o processo histórico relacionado à Segunda Guerra Mundial. Os estudantes do curso de História mostraram como a impiedosa e preconceituosa obra de Hitler, Mein Kampf, seduzia seus seguidores. Discutiram como o mercado editorial utiliza-se de temas como a juventude hitlerista, os generais de Hitler, se o Eixo tivesse vencido, dentre outros temas, e expuseram a vasta publicação que garante os interesses desse mercado. Fizeram críticas à obra impostora e sem sustentação e base histórica publicada no Brasil O Holocausto: judeu ou alemão?. Sugeriram aos visitantes boas e críticas leituras como A Psicologia das Massas no Fascismo, de Wilhelm Reich, A Era dos Extremos, de E. Hobsbawm, o Triunfo da Vontade, de Alcir Lenharo.
Como todos os anos, no estande de História, os alunos se caracterizaram como personagens de época. Representaram soldados brasileiros, assim como soldados soviéticos e militares do Eixo, e fizeram repúdio ao Holocausto, ao preconceito, à agressão e à violência.
O trabalho principal sobre o tema ficou com a personagem vestida como judia de campo de concentração que, com ajuda dos demais alunos, distribuiu símbolos da paz: o marcador de texto com uma pomba branca, a estrela e cartas de filhos que foram e morreram durante a guerra.
Os estudantes transitavam divulgando a paz entre o estande e o Núcleo de Pesquisa e História da USC (NUPHIS), onde também realizaram atividades relacionadas ao tema e suas repercussões no Brasil, como a queda de Getúlio Vargas, que foi apresentada para mostrar o trabalho do historiador a partir das fontes. Na sala de pesquisa aos consulentes e usuários, demonstraram o rico acervo de periódicos: O Correio da Noroeste, o Diário de Bauru e a Revista Inteligência durante e após a Segunda Guerra Mundial. Apresentaram artigos, manchetes e editoriais sobre os acordos de paz, a redemocratização e a convocação em 1946 da Assembleia Constituinte. Ao fundo desta sala, várias cenas e músicas eram projetadas e tocadas, como a famosa Brothers in arms, entre outras, que criticavam toda forma de guerra.
Na recepção do NUPHIS puderam ver a exposição de imagens e fontes sobre vários momentos da História do Brasil. Ainda neste local, os visitantes podiam ver as atividades que se desenvolviam na Sala de Higienização de documentos. Na entrada, lugar privilegiado, estavam expostos dados sobre o NUPHIS e fotos sobre os Campos de Concentração como Awschwitz.
Os alunos ensinaram, conscientizaram, educaram e abriram espaços aos debates. Contribuíram para que os visitiantes refletissem sobre a importância da Democracia, da Justiça, da Igualdade e da Paz nos dias atuais.
Diante da repercussão sobre o tema, salienta-se que a divergência e a diferença de opiniões são sempre salutares, desde que haja respeito entre as partes e que não sejam fundamentadas em interesses pessoais. A informação correta sobre os fatos é absolutamente indispensável para que o debate não fique num mundo de construções tendenciosas, que podem ser injustas, onde cada qual se dá o direito de falar o que quiser a respeito de todo e qualquer assunto e pessoas.
Desta forma, destaca-se que não se pode atribuir conotação racista à atividade educativa e contextualizada em seu todo. Abordar a história assim como ela aconteceu não significa concordar com ela, muito menos fazer apologia, implica sim, viajar no tempo e tentar compreendê-la.
Por sua vez, a distorção destas intenções, descontextualizando-as, para que aos olhos de quem desconhece a situação vivenciada pareça a prática de um crime, provoca danos tanto contra os atores envolvidos no fato como contra a sociedade, e é passível de repreensão nas esferas civil e criminal.
Se a apologia ao nazismo é crime previsto na Lei nº 7.716/1989, imputar ou sugerir que alguém o tenha praticado falsamente é calúnia, crime previsto no art. 138 do Código Penal, sem prejuízo da reparação civil pelo dano à honra das vítimas, nos termos do art. 927, do Código Civil. Podem concorrer aqueles que compartilham em redes sociais, avalizando o posicionamento reprovável.
A temática despertou diferenças de posicionamento entre Cursos, ótima oportunidade para a Universidade cumprir sua missão: formação humana e integral, que ultrapassa a formação de sala de aula e de conteúdo, mas constrói o currículo oculto dos estudantes e futuros profissionais.
Desta forma, a Universidade mais uma vez reafirma seu papel social e seu compromisso com a formação integral, levando em consideração valores e sua identidade. A Universidade tem o direito de tomar suas decisões, de possuir a própria identidade e de continuar sendo um espaço de liberdade intelectual e isto não se confunde de forma alguma com espaço de intolerância – o que infelizmente a sociedade atual confunde com liberdade de expressão.
Agradecemos a preocupação da comunidade com a Universidade do Sagrado Coração, porém, é importante lembrar que, de longa data, dispensamos o cuidado necessário com as nossas ações, sobretudo em relação à formação de nossos estudantes. Os assuntos referentes aos cursos, docentes, coordenadores e estudantes estão sob o nosso olhar. Olhar crítico e competente, porém cuidadoso e amoroso. Cuidado este que vem sendo dispensando há 62 anos e o qual fazemos muito bem, levando em consideração o contexto e o papel que cada um vivencia em cada tempo e lugar.
PS do Viomundo: Você quer fazer uma crítica ao nazismo. Coloca estudantes vestidos de nazistas num ambiente universitário. As imagens vazam para as redes sociais. Por mais interessante que seja o contexto, o poder das imagens atropela o contexto. E alguém controla as redes sociais? Obviamente que não. As imagens vão muito mais longe que o “contexto”. Vivemos o mundo das imagens! Portanto, você NÃO coloca estudantes com vestimentas nazistas num ambiente público, independentemente deles odiarem Hitler até o último fio dos cabelos. Nas redes sociais, eles acabam involuntariamente recebendo comentários elogiosos de neonazistas, como aquele que escreveu: o uso da suástica só deveria ser proibido se também proibissem a foice e o martelo. Em todo o mundo, os neonazistas estão colocando a cabeça para fora. Com eles, o antissemitismo. Existe, portanto, uma responsabilidade política que não pode ser desconhecida, especialmente nos dias de hoje. O mundo real não é uma Disneilândia de selfies.
Leia também:
José Afonso da Silva: O nazismo “naturalizado” em exposição em Bauru





Comentários
Nenhum comentário ainda, seja o primeiro!