por MC*
Ao assistir aos primeiros programas eleitorais de Eduardo Campos, Aécio Neves, e Dilma Rousseff me pareceu que o que se vendia eram o Anjo, o Estadista e a Mãezona. Acostumada a trabalhar a construção da narrativa, vi a propaganda eleitoral como que às avessas, tentando fazer a radiografia do que foi ao ar e dos símbolos que as peças carregavam.

Com o olhar contaminado por esse vício de tentar ler a ideia por trás das imagens, imagino que o roteiro do programa de Eduardo Campos pode ter nascido mais ou menos assim:
Abre com ele em quadro. Close.
Trecho de discurso positivo e esperançoso. Cobre com imagens dele mesmo.
Nada de drama, enterro, tristeza. Alegria nordestina.
Entra trilha instrumental.
Cenas desta e de outras campanhas revelam os valores de um político jovem, sonhador, competente e de família.
Sobe trilha. Alceu Valença sopra na memória afetiva de várias gerações que “a voz do anjo sussurou no meu ouvido, eu não duvido já escuto os teus sinais”.
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Takes do candidato mostram que ele chegava perto, conversava, abraçava, beijava, transformava e empolgava.
Sobe som dele com eleitores revela como ficava à vontade com o povo.
“Tu vens, tu vens. Eu já escuto teus sinais…”
Curto, emotivo e sem grande custo financeiro.
Singelo, emociona. Eficiente, valoriza a marca.

O briefing do programa do PSDB parece ter sido algo como:
Estúdio, fundo neutro, de terno e gravata, Aécio Neves fala à Nação.
É quase um pronunciamento. Solene.
Att diretor, postura de estadista. Att cenografia, verde e amarelo bem suave na tapadeira.
Trilha épica.
Discurso do candidato é o texto-base da narrativa.
Imagem e ideias dele se espalham pelo país.
Brasileiros com perfis variados e catalogados no IBGE com renda abaixo de 10 salários mínimos vêem e ouvem o que tem a dizer o novo líder.
O povo não fala, só ouve.
O rosto dele está sempre em evidência. Precisa marcar. O candidato se apresenta como um chefe novo que começa no cargo. E dá as boas vindas aos funcionários da firma. Bem-vindos.

O programa que João Santana fez para Dilma é uma superprodução e superdecupado às avessas seria assim:
Clipe com avanços em várias areas. Ideia de que mudanças muitas vezes são silenciosas.
Locutor sereno. Trilha discreta.
Grandes obras, país grande e renovado.
Dilma fala relaxada e segura, no jardim
Sorri, trabalha, estuda, pica tomate e faz um macarrãozinho.
Estádios, aeroportos, hidrelétricas.
Dedicada, mamãe fez tudo isso e promete mais.
Historias reais dão credibilidade e emoção à peça.
Pessimismo, não.
Segundo mandato, sim.
Amada pelo povo é coroada numa chuva de selfies enlouquecida.
Quando parece que acabou, entra o maior cabo eleitoral do país.
Lula, de branco, em casa, fundo claro, mínimos detalhes em vermelho.
Pede o cheque em branco no fio da barba e bigode grisalhos.
Clip alegre da mulher valente contamina o país.
Muito Norte e Nordeste.
A mãe assume que é guerrilheira. E já enfrentou coisa pior.
Volta Lula. Pede licença e homenageia o amigo Eduardo.
Duas linhas, serenas e o bordão do afilhado.
Em termos de comunicação, o programa de João Santana supera de longe os concorrentes. Humilhação pior só a dos 7 a 1 para a Alemanha.
*Telejornalista com premiada trajetória na edição de reportagens e documentários
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