Urariano Motta e o livro que ensina a falar errado

Tempo de leitura: 3 min

por Urariano Mota, em Direto da Redação

Recife (PE) – Nesta semana, o “Bom dia Brasil”, nome do telejornal que desconhece o vocativo,  abriu espaço para uma aula magna de Alexandre Garcia. Em breve editorial, Alexandre fulminou o livro “Por uma vida melhor”. Entre outras sábias reflexões, assim falou Garcia:

– Pois, ironicamente, esse livro se chama ‘Por uma vida melhor’. Se fosse apenas uma polêmica linguística, tudo bem, mas faz parte do currículo de quase meio milhão de alunos. E é abonado pelo Ministério da Educação. Na moda do politicamente correto, defende o endosso ao falar errado para evitar o preconceito linguístico.  Aboliu-se o mérito e agora se aprova a frase errada para não constranger.

A isso o professor Sérgio Nogueira apareceu como convidado. Mas antes, de modo espontâneo, o apresentador lhe levantou a bola:

– Isso (esse livro) é o início do fim da gramática?

Ao que pontificou o mestre:

– O fim da gramática já vem sendo feito há um bom tempo por essa nova linha do ensino, na chamada linguística moderna, em que o certo e o errado é abandonado… vocês pagariam pra uma escola em que seu filho vai continuar falando a língua que ele não precisa, que pode aprender sozinho?

Ao que aterrorizou melhor o apresentador:

– A língua é um traço de união nacional. Ela estaria ameaçada?

No que concordou o brilhante professor:

– Neste caso, sim, porque é diferente você respeitar as variantes regionais, as variantes sociais,e não conhecer uma língua geral, uma língua padrão. Por sinal, é nosso trabalho constante na Rede Globo, que é conseguir essa linguagem, como no caso do Bom Dia, que atinge o Sul e o Norte, Leste e Oeste. Hoje o gaúcho da fronteira se comunica com o sertanejo.

“Graças ao ótimo trabalho de lingüística da Rede Globo”, nem precisou o mestre completar. Que coisa… As letras de um artigo não enrubescem de vergonha. Nem cabe, na medida deste espaço, mostrar o serviço danoso que as telenovelas da Globo têm feito contra a riqueza da fala nacional. Mas cabem 2 ou 3 coisas sobre o livro condenado.

Ele, o maldito que rompe a unidade e pureza da língua, não prestigia o “falar errado”, nem ensina a fala errada.  Em um capítulo, em apenas um, o malvado chama a atenção para formas à margem da norma culta. Mas  alerta que as falas têm o seu lugar, adequação diferente, em momentos solenes, na escrita ou dentro de casa. Escândalo.

O que deveria ser saudado em um livro que não humilha os falantes mais pobres, porque não os desqualifica, mas antes, como uma ressalva, lembra que “a sua fala não é errada, ela possui um valor. Apenas tomem cuidado, porque em determinadas ocasiões essa variante faz da pessoa alguém menor”, virou uma prova da mais alta incompetência do MEC. É como se não houvesse estudos científicos da língua nas universidades, é como se os frutos dessa pesquisa não pudessem voltar a quem de direito.

Em toda a mídia, falaram entre naftalinas ou com o mais simples cheiro de mofo. Contra o livro se levantou uma guerra, um embate político e ideológico que faz a gente lembrar a difamação sofrida por Darwin, com um rabo até hoje porque teria dito que o homem descende do macaco. Ou como lhe perguntou um conservador no século XIX: “o senhor vem de um símio por parte de pai ou de mãe?”. Ou como afirmam os conservadores destes dias: “Aboliu-se o mérito e agora aprova-se a frase errada. Livro aprovado pelo MEC é uma inversão de valores”. Pois o governo agora ensina que nós vai tá bão.

No entanto, a palmatória que se levanta nem precisava ir tão longe: na própria imprensa se cometem todos os dias autênticas aberrações na ortografia, na sintaxe e no sentido das palavras. Há um novo léxico de novo-rico. Os apresentadores de telejornais falam récorde, em lugar de recorde, e nessa pronúncia nem são ingleses nem brasileiros. Os nomes franceses procuram ser pronunciados à francesa, e a comédia resultante disso é constrangedora. Não faz muito, criou-se um deus nos acuda porque Dilma virou presidentA.  Não, ensinaram os doutos que não leem dicionários, ela é presidentE. (Muito contra a nossa vontade, queriam dizer.)

Por que nunca levantaram a voz contra Manuel Bandeira?

“A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros

Vinha da boca do povo na língua errada do povo

Língua certa do povo

Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil”

Por que não impediram jamais a divulgação de versos tão sacrílegos? Ah, Manuel Bandeira dominava a língua culta. Quem domina, pode. Quem não domina, se pode, para não falar rima menos pura.


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Comentários

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Pedro

Certa vez, eu também li um livro interessante intitulado "Casa-Grande e Senzala". A polêmica do livro distribuído pelo MEC está sendo gerado por sua proposta: tentar livrar a nossa população mais pobre e menos favorecida do preconceito linguístico imposto pela classe rica e culta. Mas, este material será utilizado também em escolas particulares? Acredito que não, e por um simples fato: os pais não financiarão a educação de seus filhos para que eles aprendam a escrever e falar diferente da forma incorreta. Acredito que o real preconceito seja o de privar a população de um ensino público com qualidade, ou alguém neste espaço ousaria em dizer que o nosso ensino é de qualidade. No Brasil, a lei do menor esforço que rege a política da educação tem produzido alunos analfabetos cursando o ensino médio. Adicionalmente, como a posse de um diploma de nível superior não mais diferenciam ricos de pobres, está sendo necessário se criar um novo instrumento de diferenciação. Sendo assim, acho pouco provável que qualquer um dos defensores desta nova forma de ensino da língua portuguesa tenham matriculado seus filhos em escolas públicas.

| Portal Bahia na Rede

[…] Vi o mundo 7 de julho de 2011 in Sem categoria Administrador do siteJosias PiresRedação Bahia na Rede […]

Graça Lago

“[…] Vosmecê agora me faça a boa obra de querer me ensinar o que é mesmo que é: fasmisgerado… faz- megerado… falmisgeraldo… familhas-gerado…?
Disse, de golpe, trazia entre dentes aquela frase. Soara com riso seco. Mas, o gesto, que se seguiu, imperava-se de toda a rudez primitiva, de sua presença dilatada. Detinha minha resposta, não queria que eu a desse de imediato. E já aí outro susto vertiginoso suspendia-me: alguém podia ter feito intriga, invencionice de atribuir-me a palavra de ofensa àquele homem; que muito, pois, que aqui ele se famanasse, vindo para exigir-me, rosto a rosto, o fatal, a vexatória satisfação?
– “Saiba vosmecê que saí ind’hoje da Serra, que vim, sem parar, essas seis léguas, expresso direto pra mor de lhe preguntar a pregunta, pelo claro…”
Se sério, se era. Transiu-se-me.
(Guimarães Rosa – Primeiras Estórias)

Graça Lago

“Dá-me um beijo”, ela pediu,
e eu nunca mais voltei lá,
quem fala “dá-me” não ama,
quem ama fala “me dá”.

“Dá-me um beijo” é que é correto,
é linguagem de doutor,
mas “me dá” tem mais afeto
Beijo me dado é melhor.

Mário Lago

Helena Pahl

Realmente o que o PIG quer, é atingir o LULA. Desde quando eles se preocupam com os "diferenciados". O bom é que eles agoram precisam engolir a blogosfera, ou seja, são desmascarados todos os dias.

Maxwell B. Medeiros

Eu ia criticar a idéia do livro, mas quer saber? Prefiro ler esse livro e analisar se o que ele prega é isso mesmo. E uma pessoa não precisa de um livro como esse para saber que pode falar sua língua da maneira que achar melhor. Mas independente de a crítica do pessoal da Globo estar certa ou errada, eu defendo que se ensine a falar e escrever corretamente. Toda pessoa que frequenta a escola tem esse direito e tem o dever de aprender.

Antonia Gay

Alguém tem que dizer pra Globo que Camões escreveu "O povo vão".
Camões era analfabeto? Ignorante?

Ignorância é não reconhecer que a Língua é um organismo vivo; que A LÍNGUA BRASILEIRA existe e é uma delícia. Meu apoio à professora Heloisa Ramos, ao MEC e ao povo brasileiro, que fala gostoso e bonito.

Pronominais

"Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do porfessor e do aluno
E do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro"

Oswald de Andrade in Pau-brasil (1925)

FrancoAtirador

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A EDITORA ABRIL E A LINGUAGEM POPULAR

Esqueçam tudo o que foi publicado pela revista Nova Escola da Editora Abril,
a mesma que publica a revista Veja.

Vídeo sobre a Exposição "Menas – O certo do errado e o errado do certo", que aconteceu no Museu da Língua Portuguesa (que pertence ao Governo de São Paulo), em 2010.

Que diferença de opinião… e ainda nem fez um ano…
http://www.advivo.com.br/blog/luisnassif/a-abril-

[youtube PZcppSdG8cg&feature=player_embedded http://www.youtube.com/watch?v=PZcppSdG8cg&feature=player_embedded youtube]

waleria

Essa relativização da lingua, como dos direitos, das obrigações, e principalmente da Justiça, está distruindo o Brasil – não percebem?

Um menino de 15 anos, briga e mata a menina com quem ficou, de 13. E mata a amiga dela, como queima de arquivo.

Pego pela policia, sai sorrindo diante das cameras de TV.

E por ter 15 anos – é uma criancinha – que sabe fazer filho, matar, com crueldade – mas para nossa sociedade não pode pagar por seus crimes. Estamos criando monstros que nos encontrarão na proxima esquina – não percebem?

Isso não é questão de direita ou esquerda – isso é questão de QI. Queremos nos destruir?

Será que não percebem?

Assim, um economista estuda na USP, vai para o estacionamento, já tinha carro blindado, e é assassinado. E assim vai nossa sociedade.

Aqui, nesta nossa relativização excessiva, onde não mais existem regras, onde aluno mata professor e agride o aluno diferente só por ser diferente – onde se quer uma liberdade SEM RESPEITO PELO LIMITE DA LIBERDADE DO OUTRO – assim não haverão mais regras.

Que outra sociedade sobreviveu assim?

Nem no Haiti é assim.

Nossos Danieis Dantas, Gilmares Mendes, et caterva tem toda razão de ser – nõs estamos fazendo isso do Brasil – um lugar sem respeito, onde é a lei do mais esperto que vale, onde o jeitinho é o mais importante.

Em que outro lugar do mundo é assim?
Nem no Haiti, nem em Cuba, nem na China, nem nos US ou Dinamarca.

Nós estamos nos esforçando por – des-civilizar o Brasil – não percebem?

    Gabriel Vaz

    É verdade Waleria, temos que prender essa rapaziada que sai dando tiro na futura ex-namorada, antes deles cometerem o crime! Manda todo mundo para a FEBEM.
    Ironia tá!
    Pense que colocar mais regras e punições não impediu e nunca vai impedir que adolescentes cometam crimes passionais.
    A dica é: leia o livro que está sendo publicamente criticado por fazer algo que ele não faz! E a outra é, entenda como pensam as crianças, adolescentes, e em geral pessoas diferentes de você mesma. Além do mais, se você lê revistas ou jornais, o MEC não tem a menor intenção de recolher esse livro.

    Bia

    Waléria, permita-me uma correção: "Não haverÁ mais regras". Cuidado com o preconceito liguístico!
    Ferimos, todos, as regras da norma culta diariamente em situações informais. Afinal, você diz: "Liga-me" ou "Me liga"? Note que a nossa língua tem várias redundâncias: "os livros" (será que são necessários dois plurais?). No inglês, o artigo vem sempre no singular, os verbos não são conjugados. Seriam eles menos civilizados?
    O papel da escola é ensinar a norma culta, não há dúvida. O livro é dedicado à educação de adultos, que passaram a vida inteira alienados da educação formal e, portanto, com uma linguagem coloquial bastante enraizada. O capítulo que chama a atenção para o uso da linguagem coloquial busca exatamente diminuir a resistência desses alunos a aprender a norma culta, aumentando sua auto-estima.
    Por fim. O que os ´erros` de português têm a ver com o RESPEITO PELA LIBERDADE DO LIMITE DO OUTRO?

tauba

moderador,moderador… Que tal deixar passar pelo menos um comentário que não reze pela cartilha do seu website? Afinal, diversidade de opinião só é bonita no papel, mesmo, não é?

tauba

Eu queria ver a reação honesta dos defensores dos comissários do Ministério da Educação se seus filhos utilizassem a ´lingua gostosa do povo` na rua, na chuva, na fazenda…

Jair

ôBA

Agora nois pody falá o qui quizé, cuma quizé qui tá certu.

Fôi o Ministériu da Ducação qui falou e inté tá distribuinu cartia qui cônsta qui a frasi "Nós pega o peixe" tá serta.

Intão num pricizamu mais preucupá in aprendê, purque falá desse geito nóis gá sabi

Jair

Tem que ser muito esquerdista pra defender a tese de que o certo é errado e o errado é o certo…

    Lucas

    A questão não é certo ou errado, é o adequado ou inadequado. A linguagem que eu uso escrevendo aqui é diferente da linguagem com que apresento seminários, que é diferente da linguagem com que falo com amigos no bar. Você honestamente nunca ouviu falar de variantes linguísticas? Não é uma coisa tão nova assim.

    Jair

    A questão não é de "variantes linguisticas".

    Acho que até um primata sabe que existem diversas formas de se falar. Ocorre que o problema central é um livro pago com R$ público que "ensina" que falar errado também é certo.

    A questão é: qual o papel da escola?

    Ensinar o que todos já sabem e aprenderam em botecos, em casa, na rua, no fundo do quintal ou ENSINAR AQUILO QUE SÓ APRENDEMOS COM ELA, a norma culta?

    Qual a utilidade de um livro didático que "ensina" o que todo mundo já sabe por "instinto"?

    "Você pode estar se perguntando: 'Mas eu posso falar "os livro"?'. Claro que pode."

    NÃO, NÃO PODE, É ERRADO!

    A escola, os livros, os professores, EXISTEM PARA ENSINAR A FORMA CORRETA, NÃO A ERRADA, POIS ESSA JÁ SABEMOS DE CÓ E SALTEADO NA IGNORÂNCIA DO DIA-A-DIA!

    A diferença entre as trevas e a luz, quem faz é a norma culta, nao o balacobaco da esquina!

    Será que é tão complicado, difícil, hercúleo, entender o cerne dessa discussão?

    Mas que "novo mundo" é esse Meu Deus?

    waleria

    Não tem que ser esquerdista Jair.

    Tem que ser cego.

Jornalixta celestiar num sabe o que dis. Para eli, Manuel Bandeira é uma besta! » O Recôncavo

[…] Do Vi o mundo […]

Ingrid Carvalho

Trago para ilustrar esse belo texto palavras de Irandé Antunes.

"Efetivamente, a língua, sob a forma de uma entidade concreta, não existe. O que existe são falantes; são grupos de falantes. A língua, tomada em si mesma, não passa de uma abstração, de uma possibilidade, de uma hipótese. O que existe de concreto, de observável são os falantes, que sempre, numa situação social particular, usam (e criam!) os recursos linguísticos para interagirem uns com os outros e fazerem circular a gama de valores culturais que marcam cada lugar, cada situação e cada tempo. "

"A língua é, assim, um grande ponto de encontro; de cada um de nós, com os nossos antepassados, com aqueles que, de qualquer forma, fizeram e fazem a nossa história. Nossa língua está embutida na trajetória de nossa memória coletiva. Daí, o apego que sentimos à nossa língua, ao jeito de falar de nosso grupo. Esse apego é uma forma de selarmos nossa adesão a esse grupo."

"Pela língua, enfim, recobramos uma identidade."

Por isso, eu, como educadora não posso negar e taxar como errado qualquer que seja a identidade do meu aluno em sala de aula.

Como dizer a uma criança que "desmoderno" é errado?! Gente, isso é neologismo. Isso é a forma mais clara dela demonstrar que aprendeu a regra. Afinal, quando queremos negar uma palavra colocamos o prefixo "des".

A quem interessar procurem livros como: Língua, texto e ensino; Por que (não) ensinar gramática na escola
entre outros.

Adilson

Azenha,

Pois é, o mais rídiculo dessa questão, é a Rede dos Bobos querer ser mais real do que o Rei.

@azeitona

E assim temos que nos adaptar a regras, como se não fossem as regras feitas para nós. Usem como exemplo a linguagem que subculturas como grupos de adolescentes em grandes cidades literalmente criam para que tenham algo em comum. A língua faz parte de nossa identidade, e se somos obrigados a nos adaptar a ela simplesmente a abandonamos.

Qr dizer q papo de interwebs é errado? Ficou – compreensível?

ruizaltino

como bem disse marcos bagno, o preconceito linguístico é o único que vai da extrema esquerda à extrema direita. o bom disso tudo é que a lingua não dá pelota para isto ou aquilo. tanto a elite pode atrasar os avanços com suas tentativas conservadoras, como a plebe pode adiantá-los, com sua dinâmica. no fim, a lingua sempre vai seguir seu caminho com base em seus próprios regulamentos, nós falantes somos ao mesmo tempo mantenedores e mantidos neste complexo e maravilhoso domínio. nem o imperador romano nem os revolucionários franceses conseguiram, por meio de decretos, determinar como o povo deve falar. isto quem faz são os falantes, mas sempre com base em regras do sistema da lingua e, pelo jeito, no caso do chamado plural redundante os mano vencerão. o incrível é ver gente tipo clovis rossi, alexandre garcia e augusto nunes espumando para falar tanta besteira. zeus é pai e o circo é muito divertido. por esta semana nem precisa de pão.

    Coralina

    "zeus é pai e o circo é muito divertido." Muito bom, ruizaltino!!
    Como tudo – gênero, sexualidade, classe, etnia, geração, etc – a linguagem também classifica. Os senhores que vc cita, também "espumam" para reafirmar socialmente, através de sua linguagem ("correta/culta"), o status que querem e acreditam ter .

    altamir

    brilhante!

Carmem Leporace

Urano Mota… escuta aqui mano véio, a diferença é que Manuel Bandeira não escrevia livros com normas gramaticais cultas da língua, Manuel Bandeira escrevia romances…

Tchau rapaz.

    waleria

    Exatamente Carmem.

    Manuel Bandeira, Guimarães Rosa, não faziam LIVROS DIDATICOS, nem GRAMATICAS, mas escreviam – genialmente, seus romances.

    Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.

    Né não?

    Uai!

    Bia

    "Né não" pode?

    Raul

    Ôpa!!! Me cita UM romance de Manoel Bandeira???

    waleria

    Raul

    Falá errado pode, nóis pode porque nóis qué.

    Mas misturá romance com kronika e cum conto dos vigário num póde?
    E poesia a gente num póode misturá cum otras coisa?

    Fazê gramatika esquisita nóis póde, mas nóis tem qui sabê quem iscreveu o ke?
    Sinão tá erradu mermu?

    Cláudia Vasconcelos

    Rapaz, Manuel Bandeira escrevia poemas, se não me engano ;) Agora não estou lembrada de um romance dele, tem algum?

    Carmem Leporace

    Tem sim… ""Vamu tomá todas"""… Um romance publicado quando ele frequentava os bares do ABC.

    Tchau tocador de tuba… fffoooooooommmmmmmm……

    José Feitosa

    Tu continua com teu preconceito que eu te processo ?

    Carmem Leporace

    Processa de que véio??? vai procurar o que fazer rapaz…

    Ta pensando que é o que véio???

paulooliva

Correto o MEC. Em linguagem como em vestimenta não existe certo ou errado. Existe o adequado: posso ir ao campo de futebol de bermudas, com a camisa chamativa do meu time, mas não é adequado vestir-se assim ao comparecer à celebração de um casamento…Duvido que o mais douto ou douta dos 4% chiques deste país diz a todo instante "por serdes vós quem sois…" e nunca diz "pra mim fazer", a menos que seja um pernóstico. Informar o aluno sobre isso, incluisve alertando-o de que deve arcar com as consequências caso não saiba a linguagem adequada para cada situação, por isso o dever dele de aprender a norma culta, é educação de alta qualidade. Que o MEC propõe. E vamos nos divertir com com lirismo (Nóis fumo e não incontremo ninguém) de "Saudosa Maloca" ou com o humor caipira de "Joaquim Bentinho" do saudoso escritor Cornélio Pires.

NELSON NISENBAUM

Urariano no seu melhor. Fantástico.

Mariana Martins

Parabéns, Urariano!

GilTeixeira

Para os klaus e leporaces da vida!

Amigo Doroteu, prezado amigo,
Abre os olhos, boceja, estende os braços
E limpa das pestanas carregadas
O pegajoso humor, que o sono ajunta.
5 — Critilo, o teu Critilo é quem te chama;
Ergue a cabeça da engomada fronha,
Acorda, se ouvir queres coisas raras.
"Que coisas ( tu dirás ), que coisas podes
Contar que valham tanto, quanto vale
10 — Dormir a noite fria em mole cama,
Quando salta a saraiva nos telhados
E quando o sudoeste e outros ventos
Movem dos troncos os frondosos ramos?"
É doce este descanso, não to nego.
15 — Também, prezado amigo, também gosto
De estar amadornado, mal ouvindo
Das águas despenhadas brando estrondo,
E vendo, ao mesmo tempo, as vãs quimeras,
Que então me pintam os ligeiros sonhos.
20 — Mas, Doroteu, não sintas que te acorde;
Não falta tempo em que do sono gozes:
Então verás leões com pés de pato,
Verás voarem tigres e camelos,
Verás parirem homens e nadarem
25 — Os roliços penedos sobre as ondas.
Porém que têm que ver estes delírios
Co'os sucessos reais, que vou contar-te?
Acorda, Doroteu, acorda, acorda;
Critilo, o teu Critilo é quem te chama:
30 — Levanta o corpo das macias penas;
Ouvirás, Doroteu, sucessos novos,
Estranhos casos, que jamais pintaram
Na idéia do doente, ou de quem dorme,
Agudas febres, desvairados sonhos.

Gerson Carneiro

Meu sobrinho se recusava a andar no meu carro porque segundo ele meu carro era "desmoderno".

E tudo que a mim restava era a rendição diante da beleza dessa construção.
Quem sou eu para "corrigí-lo"? Eu só aprendi. E aprendo.

    João Ferreira Bastos

    Gerson,

    quando minha filha tinha 2/3 anos, para adjetivar algo que não gostava, dizia:

    horrorivel

    Tambem aprendi e aprendo

    Gerson Carneiro

    E eu nessa idade chorava e dizia "liga a tanhanhão".

    Televisão :)

    Bia

    Que maravilha ouvir comentários bem humorados sobre a língua viva, de gente viva. Viva!

    Gerson e João me renderam deliciosas gargalhadas. :)

FrancoAtirador

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Alfabetização de adultos precisa levar em conta “norma popular”, defendem especialistas

Brasília – Um livro de língua portuguesa distribuído a turmas de educação de jovens e adultos (EJA) pelo Ministério da Educação (MEC) causou polêmica ao incluir frases com erro de concordância como “os livro ilustrado” ou “nós pega o peixe” em uma lição que apresentava a diferença da norma culta e a falada. No texto, a autora da obra Por uma Vida Melhor defende que os alunos podem falar do “jeito errado”, mas devem atentar para o uso da norma culta, cujas regras precisam ser dominadas. Apresenta exemplos incorretos e, em seguida, mostra como eles deveriam ser escritos de acordo com as normas gramaticais.

A Academia Brasileira de Letras (ABL) condenou a posição da autora e criticou o MEC por defender a obra. O ministro Fernando Haddad já disse que os 484 mil livros comprados e distribuídos às escolas não serão recolhidos. De acordo com a ABL, “a posição teórica dos autores do livro didático que vem merecendo a justa crítica de professores e de todos os interessados no cultivo da língua padrão segue caminho diferente do que se aprende nos bons cursos de teoria da linguagem”.

Mas linguistas e especialistas em educação de adultos defendem que a aceitação da variedade popular é parte importante do trabalho com o público que não frequentou a escola na idade correta. “O aluno chega à escola com uma linguagem já constituída muito longe do que é a norma culta. Se acha burro por falar errado. Então o educador tem que mostrar que a linguagem dele não é primitiva, mas uma língua que tem uma lógica e por meio da qual ele consegue se comunicar. Se você reconhece a sua própria fala, você consegue adquirir a norma culta”, aponta Vera Masagão, presidente da organização não governamental (ONG) Ação Educativa e especialista em EJA.

Segundo Vera, para o adulto que retorna à escola depois de muito tempo sem estudar, aprender a norma culta é quase como “aprender uma língua estrangeira”. “Ele vai fazer um esforço muito grande para colocar o 's' no final das palavras porque para ele não é natural conjugar o plural. Ele já é falante totalmente maduro, ao contrário de uma criança”, compara. Ela avalia que a mesma abordagem não poderia fazer parte de um livro para as séries regulares do ensino fundamental, por exemplo, já que, nessa fase, o aluno está formando a sua linguagem.

Marcos Bagno, professor da Universidade de Brasília (UnB) e autor do livro Preconceito Linguístico, considera que faltaram informações à sociedade e aos meios de comunicação para abordar o assunto. “Isso é uma falsa polêmica porque qualquer livro didático que você procure no mercado brasileiro traz um comentário, uma lição sobre a variação linguística. A linguística moderna se dedica ao estudo de qualquer manifestação da língua e não só aquela que um grupo de pessoas considera certa”, afirma.

19/05/2011 – 8h46
Educação
Reportagem: Amanda Cieglinski
Edição: Lílian Beraldo
Agência Brasil

antonio

Azenha,

Um caso de bulying linguístico:

PAra mim, a questão essencial deste imbróglio é a preocupação por parte do MEC com a discriminação rotineira contra `aqueles que falam de forma "errada".
Normalmente, essa discriminação ocorre a partir da própria família, quando pais que não tiveram oportunidades de frequentar a escola, sofrem reprimendas ou mesmo segregação por falarem "errado", como se isso fosse uma doença contagiosa, o que causaria vergonha e saia justa para os filhos.
Muitas vezes essas pessoas 'diferenciadas' introjetam esse preconceito e por isso manifestam receio em falar quando estão em ambiente público.
Para concluir, é importante conscientar as pessoas que o falar 'errado' não pode ser motivo de desvalorização das pessoas.
Para mim, a discriminação linguistica e um tipo de bullying, bulying linguistico.

FrancoAtirador

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Confira trechos do livro Por uma Vida Melhor que tratam da chamada “norma popular”

Brasília – O livro Por uma Vida Melhor foi distribuído pelo Ministério da Educação (MEC) para turmas de educação de jovens e adultos (EJA) em todo o Brasil. A publicação causou polêmica ao incluir frases com erro de concordância em uma lição que apresentava a diferença da norma culta e a falada.

Confira abaixo trechos do livro sobre o assunto:

“É importante saber o seguinte: as duas variantes [norma culta e popular] são eficientes como meios de comunicação. A classe dominante utiliza a norma culta principalmente por ter maior acesso à escolaridade e por seu uso ser um sinal de prestígio. Nesse sentido, é comum que se atribua um preconceito social em relação à variante popular, usada pela maioria dos brasileiros”

“'Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado'. Você pode estar se perguntando: ‘Mas eu posso falar ‘os livro?’.’ Claro que pode. Mas fique atento porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas. O falante, portanto, tem de ser capaz de usar a variante adequada da língua para cada ocasião”

“Na variedade popular, contudo, é comum a concordância funcionar de outra forma. Há ocorrências como:

Nós pega o peixe.

nós – 1ª pessoa, plural

pega – 3ª pessoa, singular

Os menino pega o peixe.
menino – 3ª pessoa, ideia de plural (por causa do “os”)
pega – 3ª pessoa, singular

Nos dois exemplos, apesar de o verbo estar no singular, quem ouve a frase sabe que há mais de uma pessoa envolvida na ação de pegar o peixe. Mais uma vez, é importante que o falante de português domine as duas variedades e escolha a que julgar adequada à sua situação de fala.”

“É comum que se atribua um preconceito social em relação à variante popular, usada pela maioria dos brasileiros. Esse preconceito não é de razão linguística, mas social. Por isso, um falante deve dominar as diversas variantes porque cada uma tem seu lugar na comunicação cotidiana.”

“A norma culta existe tanto na linguagem escrita como na linguagem oral, ou seja, quando escrevemos um bilhete a um amigo, podemos ser informais, porém, quando escrevemos um requerimento, por exemplo, devemos ser formais, utilizando a norma culta. Algo semelhante ocorre quando falamos: conversar com uma autoridade exige uma fala formal, enquanto é natural conversarmos com as pessoas de nossa família de maneira espontânea, informal.”

19/05/2011 – 8h49
Educação
Reportagem: Amanda Cieglinski
Edição: Lílian Beraldo
Agência Brasil

    Edmundo Adôrno

    Olá Sr Pistoleiro a esmo!
    "… Nós pega o peixe…" A fala das pessoas ensejam uma lógica que sustenta suas idéias. Se, não, vejamos:
    "… Nos peg …" Claro: nós pelo simples fato de ser mais de uma pessoa na tentativa.
    "… pega o peixe…" Apesar de mais de uma pessoa na tentativa de pegar O peixe, é sabido que apenas UM deles pegará o dito cujo. E qual é a lógica que sustenta a idéia que a fala encerra: um peixe só é pegado por apenas UM deles. Em pescaria um peixe não é fisgado por mais de um anzol. Exceto em caçadas maritimas ou fluviais um peixe é pegado por mais de um CAÇADOR.
    Abraço.

    FrancoAtirador

    .
    .
    ARRIÉGUA !!!

    QUI TRÓUZINHO BEM MIXURUCA !!!
    .
    .

    Pedro

    Agora, por favor, faça a tradução para que todos possam entender.

Gerson Carneiro

Beija Eu
Arnaldo Antunes
Composição : Arnaldo Antunes / Arto Lindsay / Marisa Monte

Beija eu,
Beija eu,
Deixa que eu seja eu.
E aceita
o que seja seu.
Então deita e aceita eu.

Molha eu,
Seca eu,
Deixa que eu seja o céu.
E receba
o que seja seu.
Anoiteça e amanheça eu.

Beija eu,
Beija eu,
Beija eu, me beija.
Deixa
O que seja ser.
Então beba e receba
Meu corpo no seu corpo,
Eu no meu corpo
Deixa,
Eu me deixo.
Anoiteça e amanheça.

    Wildner Arcanjo

    E na voz de Marisa Monte… Eita mulher da voz bunita sô!

Gerson Carneiro

Canção inspirada a partir da frase "errada" de uma criança: Beija eu – Arnaldo Antunes.

[youtube 5vwJg594gYc http://www.youtube.com/watch?v=5vwJg594gYc youtube]

Jose Emílio Guedes

E o Vinícios errou feio quado escreveu o lindo verso: " eu sei que vou te amar". A gramática elitista não admite um pronome entre doi verbos. Então seus pulhas globais façam a correção para : "eu sei que te vou amar" ou "eu sei que vou amar te". Aproveitem e fiquem por lá viu seu Alexandre Garcia

FrancoAtirador

Foi há muito tempo…
A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
.
.
EVOCAÇÃO DO RECIFE
(Manuel Bandeira)

Recife
Não a Veneza americana
Não a Maurisstad dos armadores das Índias Ocidentais
Não o Recife dos Mascates
Nem mesmo o Recife que aprendi a amar depois –
Recife das revoluções libertárias
Mas o Recife sem história nem literatura
Recife sem mais nada
Recife da minha infância
A rua da União onde eu brincava de
chicote-queimado e partia as vidraças
da casa de dona Aninha Viegas
Totônio Rodrigues era muito velho
e botava o pincenê na ponta do nariz
Depois do jantar as famílias
tomavam a calçada com cadeiras,
mexericos, namoros, risadas
A gente brincava no meio da rua
Os meninos gritavam:
Coelho sai!
Não sai!
À distância as vozes macias das meninas politonavam:
Roseira dá-me uma rosa
Craveiro dá-me um botão
(Dessas rosas muita rosa
Terá morrido em botão…)
De repente nos longes da noite
um sino
Uma pessoa grande dizia:
Fogo em Santo Antônio!
Outra contrariava: São José!
Totônio Rodrigues achava sempre que era São José.
Os homens punham o chapéu saíam fumando
E eu tinha raiva de ser menino
porque não podia ir ver o fogo
Rua da União…
Como eram lindos os nomes
das ruas da minha infância
Rua do Sol
(Tenho medo que hoje se chama do Dr. Fulano de Tal)
Atrás de casa ficava a rua da Saudade…
…onde se ia fumar escondido
Do lado de lá era o cais da rua Aurora…
…onde se ia pescar escondido
Capiberibe
– Capibaribe
Lá longe o sertãozinho de Caxangá
Banheiros de palha
Um dia eu vi uma moça nuinha no banho
Fiquei parado o coração batendo
Ela se riu
Foi o meu primeiro alumbramento
Cheia! As cheias! Barro boi morto
árvores destroços redomoinho sumiu
E nos pegões da ponte do trem de ferro
os caboclos destemidos em jangadas de bananeiras
Novenas Cavalhadas
Eu me deitei no colo da menina e ela
começou a passar a mão nos meus cabelos
Capiberibe
– Capibaribe
Rua da União onde todas as tardes
passava a preta das bananas
Com o xale vistoso de pano da Costa
E o vendedor de roletes de cana
O de amendoim que se chamava midubim
e não era torrado era cozido
Me lembro de todos os pregões:
Ovos frescos e baratos
Dez ovos por uma pataca
Foi há muito tempo…

A vida não me chegava pelos jornais nem pelos livros
Vinha da boca do povo na língua errada do povo
Língua certa do povo
Porque ele é que fala gostoso o português do Brasil
Ao passo que nós
O que fazemos
É macaquear
A sintaxe lusíada (!!!)

A vida com uma porção de coisas
que eu não entendia bem
Terras que não sabia onde ficavam
Recife…
Rua da União…
A casa de meu avô…
Nunca pensei que ela acabasse!
Tudo lá parecia impregnado de eternidade
Recife…
Meu avô morto.
Recife morto, Recife bom,
Recife brasileiro como a casa de meu avô.
.
.

Cleverton Silva

Interessante que tais críticas raivosas venham de uma emissora onde, bem notado, os(as) âncoras resistem em dizer recorde e dizem "récorde" e onde se exibe uma novela chamada Morde e Assopra. NÂO EXISTE ASSOPRAR! Só no mundo da Rede Goebbels e da extrema direita.

Luis

A questão não é falar errado. Ou o poder falar errado. É o respeito que falta. É por isso que gosto do via mundo. Mostrando os vários assuntos. A língua é viva. Ela evolui com o povo, e temos que observar essa evolução. O que acontece é que não há o respeito ao diferente. Já os cultos mal educados, desprezam os incultos que não tiveram uma boa educação pública e falam regionês. Não li esse livro, mas sei do problema que temos em nossa língua portuguesa. O que entendo é que mesmo falando ou escrevendo errado temos que passar a mensagem! Valorizar a linguagem culta, e respeitar as idéias de que não teve a oportunidade de ter uma boa educação. Assim como eu! mal educado na língua.

Tiago Lira Vieira

Parabéns pelo artigo. Infelizmente, nem todo mundo vai ler este texto.

FrancoAtirador

Sugiro a leitura destes 2 artigos, especialmente aos paulistas e aos mineiros:

LINGUAGEM E IDENTIDADE CULTURAL CAIPIRA NO MUNICÍPIO DE MOSSÂMEDES:
POR UMA NOVA CONCEPÇÃO ACERCA DA LINGUAGEM CAIPIRA
Por Andrey Aparecido Caetano Linhares

RESUMO: Há muito tempo que a educação oficial – em outros termos, regulamentada pelos órgãos do Estado – privilegia a cultura erudita, em detrimento da cultura popular. Tal postura contribui, de certa forma, para que muitos costumes, tradições e saberes consuetudinários sejam, invariavelmente, ignorados como formas autênticas e válidas de manifestações culturais. Este artigo trata da linguagem caipira – que é uma dessas manifestações culturais preteridas pelas instituições oficiais de ensino – e visa contrapor-se à concepção errônea e preconceituosa acerca dessa linguagem, bem como ressaltar a importância da mesma como um elemento marcante da identidade cultural caipira e, por extensão, como um valioso patrimônio da nossa cultura regional.

O DIALETO CAIPIRA: EXPRESSÃO NÃO REGULAMENTADA E RESISTÊNCIA
Por Walter Praxedes

As inúmeras formas de preconceito e discriminação existentes em relação ao dialeto caipira no Brasil são uma expressão viva da cumplicidade mantida com as línguas e culturas dominantes. Quando utilizamos como critérios de correção e elegância apenas as formas linguísticas orais e escritas de origem européia e faladas pelos estratos dominantes da sociedade brasileira, estamos sendo cúmplices com as instituições dominantes e legitimando a sua dominação.
Este artigo foi escrito com a intenção de contribuir para a “[…] criação de um contexto favorável aos marginalizados e oprimidos, para a recuperação da sua história, da sua voz, e para a abertura das discussões acadêmicas para todos” (Bonnici, 2000, p. 10).

No Brasil, desde o final do período colonial até o presente, o acesso privilegiado e a assimilação da língua dominante através do sistema escolar de ensino por parte das populações urbanas, historicamente se transformou em um mecanismo simbólico de distinção utilizado por aqueles que tiveram acesso à educação escolar, para se diferenciarem e distanciarem daqueles aos quais o mesmo acesso foi negado. Garantiu-se, assim, um melhor posicionamento dos primeiros na competição pelos melhores postos disponíveis no mercado de trabalho urbano e até rural, reservando para os falantes das formas de sobrevivência do dialeto caipira as ocupações de menor prestígio e remuneração, como as de agricultores, ajudantes, serventes, faxineiros, pedreiros, carregadores, ensacadores, domésticos, vigilantes, garis etc.

O predomínio político e a concentração da riqueza entre as classes e camadas sociais dominantes urbanas dos grandes centros, produziu o desprezo e a rejeição dos moradores urbanos falantes da língua dominante, principalmente por parte das camadas sociais formadas por trabalhadores intelectuais, em relação aos trabalhadores braçais rurais e suas formas de expressão, como atesta o tratamento depreciativo à linguagem caipira que sobrevive entre os moradores do campo de algumas regiões do Brasil e seus descendentes urbanos.

A violência simbólica legítima realiza, assim, uma brutal imposição de uma forma específica de comunicação, a linguagem dominante, tida como “culta”, contra os falares considerados deselegantes, incorretos, inadequados, vulgares, existentes no Brasil. Os trabalhadores intelectuais como professores, jornalistas, escritores, advogados etc., se consideram guardiões dos códigos linguísticos dominantes, escondendo que a sua autoridade é legitimada pela arbitrariedade com que as formas de falar e escrever “corretamente” são impostas sobre inúmeras outras formas de expressão. Nem é necessária a dissimulação da violência com a qual os praticantes de formas de expressão linguísticas desautorizadas são humilhados e excluídos socialmente. O que a quase totalidade dos trabalhadores intelectuais fazem questão de ignorar é que a redução de todas as formas de se comunicar, orais ou escritas, a uma forma única, tida como correta e elegante, leva a um empobrecimento da capacidade de comunicação humana e de expressão de significados, negando reconhecimento a algumas formas de expressão identitária. As expressões linguísticas são ilimitadas, infinitas e mutáveis e a princípio não haveria razão para aceitarmos que só uma forma de expressão deva ser privilegiada.

Ocorre, no entanto, uma relação de forças entre as formas de expressão linguísticas dominantes e autorizadas, e os falares marginalizados pela dominação cultural representada pela imposição de uma forma única e legítima de uso padronizado da língua portuguesa, que chega ao ponto de emudecer os não praticantes desta forma de comunicação padronizada, e assim perdem a voz, ou renunciam à própria fala alegando para si mesmos que “não sabem falar”.

http://www.espacoacademico.com.br/073/73praxedes…. http://www.proec.ufg.br/revista_ufg/agro/T34_ling

Wildner Arcanjo

Então tá.

– Quer dizer que o nordestino fala errado por falar vice e não viste, pia e não espia?
– Quer dizer que o gaúcho fala errado por falar ba-tche (se não for assim, os gaúchos que me perdoem)?
– Que o carioca fala errado por falar mermão e não meu irmão?
– Que o paulista fala errado por falar mano (e não irmão)?

Quem é que disse que existe o falar errado? Existe o escrever errado não seguindo as normas gramaticais, mas quem disse que existe uma forma padrão de se expressar de forma coloquial (esqueceram a forma coloquial?)?

A língua portuguesa é mutável exatamente por essa flexibilização de o popular, quando amplamente aceito, virar a forma culta.

Se não fosse assim estaríamos falando vossa mercê até hoje e não você.

No final, essa polêmica toda, não passa de preconceito de classe travestido de "defesa da língua portuguesa".

Ps. Desculpem o português, mas, como todo bom Brasileiro, ainda não domino inteiramente as normas cultas e gramaticais.

Jeca Tatu

Bem, vamos pedir para alguém reescrever as músicas de Adoniran e de Luiz Gonzaga. Mas é claro deverá ser com um português anteior a Camões.

    Antonia Gay

    E os anacolutos de Guimarães Rosa e Clarice Lispector devem ser banidos. Seus livros devem ser censurados; um crime contra a norma culta do Português! Aliás, que história é essa de ficar escrevendo sobre o Sertão? Um absurdo tal situação no Brasil, país em que todos somos elite, estudamos a vida inteira, comemos brioches e não há exclusão social.

Klaus

Porque em nenhum momento o poeta ensinou às crianças nas escolas que elas podem falar errado. Veja que, apesar de achar que a língua do povo é gostosa, o autor faz o uso correto da língua. Todos podem admirar a fala gostosa do povo, com seus sotaques diversos, sua musicalidade, mas na hora de ensinar, há o certo e o errado. Dizendo o que é o certo já está ruim o ensino do português no Brasil, imagina quando o conceito de certo e errado for flexibilizado.

    Zhungarian Alatau

    Você acha mesmo que o tal livro "ensina" errado? Pelo visto, quem aprendeu errado foi você. Pêsames.

    Nagual Jr

    O livro não ensina a falar errado, mas defende que o uso de falas dialetais, de acordo com a ocasião, é também adequado. Além disso, não é direcionado às crianças. É para o EJA(Educação de Jovens e Adultos).

    Nora Cúneo

    O seu problema parece ser, não o uso da língua correta ou a do povo, e sim de interpretação de texto.

christian peixoto

Li uma vez um excelente livro sobre o tema na faculdade "Preconceito Linguístico".

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