Lobista do caso Alstom atuou em Furnas
Papéis da Suíça indicam que suspeito de pagar propina a agentes públicos de SP também teria subornado funcionários da estatal federal
12 de março de 2014 | 2h 06
Ampliado às 9h05 – Fernando Gallo, de O Estado de S.Paulo
Um lobista acusado de ser intermediário de propinas da Alstom a agentes públicos de estatais de energia de São Paulo é suspeito de ter repetido o mesmo esquema em Furnas, empresa do governo federal.
Romeu Pinto Jr. é um dos 11 réus no processo criminal aberto pela Justiça Federal em São Paulo em janeiro. Ele é acusado de lavar dinheiro da Alstom que serviria para pagar ex-diretores de uma extinta estatal de energia paulista entre 1998 e 2002.
Em troca da propina, segundo procuradores, a Alstom conseguiu obter um aditivo de contrato no valor atualizado de R$ 181,3 milhões com a Empresa Paulista de Transmissão de Energia (EPTE).
Documentos suíços enviados ao Brasil agora também mostram que a MCA Uruguay, offshore pertencente a Pinto Jr., assinou em 5 de maio de 1998 um contrato com a Cegelec, subsidiária da Alstom, para consultoria em um projeto que envolvia o fornecimento de um sistema de telecomunicações para Furnas. O contrato da Cegelec com Furnas era de cerca de US$ 13,4 milhões, em valores da época.
Durante o governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), o setor elétrico foi controlado pelo PFL, hoje Democratas.
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Na documentação enviada às autoridades brasileiras que investigam a Alstom, há recibos de Pinto Jr. à Cegelec em que o lobista solicita o depósito de valores em uma conta de Nova York. Ao todo, são cinco recibos emitidos num total de US$ 1,2 milhão.
Junto com os recibos os procuradores suíços enviaram as correspondentes ordens de transferência bancária emitidas pela Cegelec a dois bancos franceses, o Societé Generale e o Crédit Agricole. Nelas, a empresa solicita que as instituições financeiras transfiram para a conta do lobista em Nova York, no banco Audi, os valores apontados por Pinto Jr. nos recibos.
Como os contratos da consultoria de Pinto Jr. com a subsidiária que prestava serviço em Furnas e com a multinacional que prestava serviço em São Paulo são da mesma época, não há como separar o dinheiro que circulou nas contas do lobista.
A tentativa de descobrir o caminho do dinheiro revelou, porém, que Pinto Jr. transferiu US$ 222 mil para uma outra conta, esta ligada a Sabino Indelicato, que também é réu no processo envolvendo a Alstom em São Paulo. Indelicato foi intermediário do dinheiro que chegou à conta na Suíça do ex-chefe da Casa Civil do governador Mário Covas (PSDB) e hoje conselheiro do Tribunal de Contas paulista, Robson Marinho.
Em depoimento de 2009 ao Ministério Público, Pinto Jr. admitiu que não prestou os serviços pelos quais emitiu recibos à Alstom no âmbito do contrato em São Paulo, e disse que repassou o dinheiro a motoboys indicados por doleiros. Pinto Jr. também afirmou que a offshore foi criada por um ex-diretor financeiro da Alstom na França que controlava contas da empresa no exterior.
O lobista prestou ainda um outro depoimento, a pedido das autoridades suíças, no qual negou ter tido envolvimento “em qualquer projeto de telecomunicações envolvendo a Cegelec/Alstom e a companhia Furnas”.
O advogado de Pinto Jr., contudo, contradisse ontem seu cliente e afirmou que os serviços foram, sim, prestados à Cegelec.
A prática de contratação de consultorias fictícias para o pagamento de propina levou a Alstom a ser condenada judicialmente fora do Brasil. Em dezembro, a multinacional anunciou que decidiu abolir a contratação de consultorias para atividades comerciais.
Sem serviço. Em 2006, em depoimento na Polícia Federal, um ex-superintendente da Toshiba, José Antonio Talavera, afirmou que a Alstom integrava um “clube da propina” que subornava políticos e dirigentes de empresas estatais do setor elétrico para obter contratos, inclusive em Furnas.
Defesa. “Não sei sobre esse contrato, mas se ele existe certamente foi honrado”, declarou o advogado Henrique Fagundes, que defende Romeu Pinto Jr.. “Todos os serviços de consultoria de Romeu foram efetivamente prestados, de forma correta.” Fagundes disse que a defesa “vai comprovar que a MCA recebeu por serviços prestados não da Alstom, mas da Alcatel (empresa de telecomunicação)”.
Furnas esclareceu que a atual gestão não tem conhecimento de nenhum dos fatos. A empresa afirmou que, como se trata de contrato antigo, hoje poderá providenciar informações. A Alstom disse que tem implementado “regras estritas de conformidade e ética que devem ser aderidas por todos os funcionários”.
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QUARTA-FEIRA, 12 DE MARÇO DE 2014, 18:41 HS
O caso Furnas e a cegueira seletiva da justiça mineira
Por Rogério Correia, em seu blog*
A notícia veiculada pelo Estadão nesta quarta-feira, 12 de março, de que o lobista da Alstom é o mesmo do esquema de Furnas acrescenta mais uma prova à existência de lavagem de dinheiro através da estatal. Enquanto isso, o jornalista Marco Aurélio Carone, principal divulgador de informações sobre o esquema de corrupção conhecido como Lista de Furnas, permanece preso sob o silêncio da mídia e da justiça mineira.
Já são muitos os fatos que remontam à existência do esquema em Furnas: o relatório da Polícia Federal comprovando a autenticidade da Lista de Furnas, a denúncia do Ministério Público do Rio de Janeiro detalhando o esquema, a denúncia de Roberto Jefferson, o recibo apresentado pelo deputado Antônio Júlio e agora a ligação entre Furnas e o caso Alstom. Contudo, parece que nada disso é suficiente para enquadrar o alto escalão do tucanato e reverter a situação do preso político Marco Aurélio Carone.
O silêncio sobre a prisão de Carone evidencia a estratégia de “dois pesos, duas medidas” adotada pelo judiciário em Minas Gerais: enquanto o jornalista, juntamente com o lobista Nilton Monteiro, segue preso mesmo sem condenação; os condenados de Felisburgo agora gozam dos privilégios de um habeas corpus. Tudo ao sabor dos governantes do estado.
Leia também:
A cobertura marota da Folha sobre o mensalão tucano e a lista de Furnas




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