Requião: Agenda Brasil é a volta ao fracassado modelo do paleoliberalismo. Não salvará o governo, muito menos o País

Tempo de leitura: 5 min

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AGENDA BRASIL FALIDO

Roberto Requião, no seu blog, encaminhado por sua assessoria

Pedro Nava afirmou que a experiência é um carro com os faróis voltados para trás. Com isso, o grande memorialista queria dizer que o exercício da memória é fútil, pois na vida não se pode voltar no tempo para se consertar erros.

Na política, contudo, a experiência é muito útil, já que pode evitar que erros do passado voltem a ser cometidos. A experiência, parafraseando conhecido economista e filósofo relegado ao ostracismo intelectual, pode evitar que tragédias do passado voltem a acontecer como comédias. A História não precisa se repetir.

Mas há aqueles que, por desconhecimento ou interesse, preferem fazer tabula rasa da experiência para apresentar, como grandes novidades, carcomidos fracassos retirados de um baú de ossos históricos.

É o caso, infelizmente, da Agenda Brasil oferecida generosamente à Nação pelo presidente do Senado.

Trata-se de um somatório de medidas que, em seu conjunto, destina-se a reimplantar, no Brasil, o fracassado modelo do paleoliberalismo, que ruiu em quase toda a América Latina no início deste século e que provocou a pior crise do capitalismo desde 1929.

O que tal agenda oferece como futuro é a volta ao passado. E o que propõe como novo êxito é um velho fracasso.

Comecemos pelo fim. O fim do Mercosul, que é o que efetivamente se propõe quando se fala em “acabar com a união aduaneira”. Querem acabar com esse bloco sob o pretexto esfarrapado de que ele impede o Brasil de se integrar às “cadeias produtivas globais”.  Ora, o Brasil já faz parte, há muito tempo, das cadeias globais de produção, na incômoda condição básica de exportador de produtos primários. Mas não por culpa do Mercosul. Ao contrário, é esse bloco e a integração regional como um todo que vêm salvando a nossa combalida indústria. Entre 2009 e 2014, já em plena crise, a Associação Latino-americana de Importação (ALADI), que inclui o Mercosul, absorveu mais exportações brasileiras de manufaturados que todos os países desenvolvidos somados. Para o Mercosul, nossas exportações estão concentradas em 92% em bens industrializados, e com grande superávit a nosso favor.

O que se quer, na realidade, com essa conversa tola, é ressuscitar o finado projeto da Alca, mediante acordos bilaterais de livre comércio. Acham que essa Alca bilateralizada elevaria o patamar econômico do Brasil. Engano crasso e parvo. Que o diga o México, país plenamente integrado às cadeias produtivas globais, campeão mundial na celebração de acordos de livre comércio, mas que tem, hoje, cerca de 50% de sua população abaixo da linha da pobreza, não tem indústria real significativa além das “maquilas”, e que é totalmente incapaz de produzir inovação tecnológica. É incapaz até de se alimentar sozinho. O México importa atualmente dos EUA até mesmo o milho, base da sua culinária.

O México se incorporou ao “trem da História” no vagão da terceira classe destinado aos provedores de mão de obra barata e legislação ambiental flexível.  Querem o mesmo destino glorioso para o Brasil.

Também desejam, aliás, o mesmo destino glorioso para a Petrobras, alquebrada pelo insustentável “fardo” de 176 bilhões de barris de petróleo, de acordo com última estimativa para o pré-sal do Instituto Nacional de Óleo e Gás da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ). Almejam que tal fardo seja transferido para a Chevron e outras grandes multinacionais, as quais, em louvável ato de altruísmo, o assumiriam com indisfarçável prazer. Retirando da Petrobras a condição de operadora do pré-sal, com o tempo ela se transformaria numa espécie de NNPC, a empresa nigeriana do petróleo que não produz, não controla e não supervisiona. E o Brasil se transformaria, dessa forma, no país que não tem cadeia do petróleo, não tem produção nacional e não tem futuro.

De modo inteiramente previsível, a Agenda Brasil continua com essa pauta de desconstrução do Brasil com as velhas receitas do modelo neoliberal falido.

No campo da Reforma Administrativa e do Estado, propõe-se, além da redução de ministérios, demagogia barata que não tem nenhuma relevância financeira, a redução de estatais, demagogia pela qual o Brasil pagaria um preço muito caro. O que se quer, nas entrelinhas, é a volta das privatizações, da venda entreguista do patrimônio público, na bacia das almas da crise. Poderiam ser vendidos, a convenientes preços de liquidação, o Banco do Brasil, a Caixa, o BNDES, a Petrobras, empresas de energia elétrica e tudo mais que tiver sobrado da voragem privatizante dos tempos do tucanato. Propuseram até mesmo a privatização do SUS, com a precursora medida da cobrança de procedimentos.

Voltou, com grande força, a agenda destrutiva do Estado Mínimo, ensejada pela “necessidade” da contenção de gastos e do “equilíbrio fiscal”.

No que tange à (des)proteção social, pretende-se “regulamentar a terceirização”, inclusive em atividades-fim, forma perversa e sub-reptícia de burlar e corroer a proteção trabalhista herdada dos tempos de Getúlio Vargas. Com isso, o Brasil poderá regredir livremente aos tempos da República Velha, quando a incômoda questão social era simples caso de polícia.

A Agenda também recomenda o aumento da idade mínima para aposentadorias, como forma de se alcançar o nirvana estéril do equilíbrio fiscal. Contudo, faltou incluir na Agenda o sábio conselho do Ministro de Finanças do Japão, Taro Aso, que, em 2013, recomendou aos velhinhos de seu país que morressem mais rápido. Convite prontamente recusado por seus beneficiários.

O mesmo cuidado reservado aos idosos e aos trabalhadores é também estendido às reservas indígenas e ao meio ambiente. Com efeito, a Agenda propõe tanto a revisão das normas relativas à exploração das terras de nossos aborígenes quanto o fast track da expedição de licenças ambientais, com o intuito, é claro, de proteger tanto uns quanto o outro.

Assim, a Agenda contém em si uma série de tragédias trabalhistas, previdenciárias e ambientais, encenadas no palco do ajuste draconiano e recessivo dirigido pelo ministro Levy.

Entretanto, a grande tragédia da Agenda Brasil e tantas outras agendas e pautas que crescem como fungos no Executivo e no Congresso é a total falta de pensamento estratégico sobre o Brasil e seu futuro.  A necessidade tática, de curto prazo, do ajuste fiscal, transmutou-se em estratégia e modelo de longo prazo para o país.

Significativamente, ninguém está falando em câmbio, em taxas de juros, em política industrial, em inovação tecnológica, e muito menos, em política de desenvolvimento e em projeto de nação. Tudo isso, pasmem, numa conjuntura de fim do ciclo das commodities, crise mundial profunda e permanente, e célere debacle da nossa indústria.

É evidente que o término desse ciclo impõe ao país o desafio estratégico de acelerar a transição para uma economia baseada numa indústria nacional competitiva, fundada em educação de qualidade e capacidade de gerar inovação. Ademais, o baixo crescimento do comércio mundial, que vem se perpetuando desde 2011, demanda o aprofundamento do processo de ampliação do mercado de consumo interno.

Como vamos enfrentar esse desafio? Com as maiores taxas de juros do mundo, que esterilizam quaisquer esforços fiscais? Com o câmbio sobrevalorizado que mata a nossa indústria?  Arrochando trabalhadores e aposentados? Voltando a ampliar as desigualdades? Vendendo patrimônio público e setores estratégicos a preço de banana? Entregando o pré-sal?

É essa a discussão que o Brasil deveria fazer. Não o debate de agendas míopes de um fiscalismo colocado a serviço da banca desregulada e de um entreguismo literalmente barato.

O futuro do Brasil não está em seu passado. O êxito do Brasil não está em seus fracassos pretéritos.

A Agenda Brasil e a agenda neoliberal e fiscalista que se tornou hegemônica no Brasil pretendem dirigir o país com faróis voltados para atrás e olhando pelo retrovisor.

Não salvará o governo, muito menos o Brasil. E sequer adiantará rezar com o galo-das-trevas. Com elas, nossa condenação é certa.

Roberto Requião foi deputado estadual, prefeito de Curitiba, governador do Paraná por 3 gestões e atualmente é senador no seu segundo mandato.

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Comentários

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Fabio Meirelles

Infelizmente não temos presidente,há um vacuo de poder e com isso os vermes aparecem e mostram as garras e levam o Brasil aos seculos passados novamente.

Marcos

Excelente artigo.Porém Requião prega para os convertidos.Gostaria que ele convencesse seus colegas de partido a aprovar outra agenda no Congresso.

C.Paoliello

A tal “Agenda Brasil” é uma disfarçada desconstrução da Constituição-Cidadã de 1988. O irônico disso é que o principal condutor da construção daquela Carta Magna foi justamente um peemedebista, Ullysses Guimarães, do qual não resta nenhum seguidor no PMDB, exceto Requião.

Julio Silveira

Gosto muito de tudo que o Requião diz, mas por saber que convive com tão pessimas companhias de partido é que não confio nele.

    Zenio Silva

    Não pecar no céu é fácil, quero ver é não ser pecador nas profundas no inferno!
    Se formos avaliar pelas companhias não escapa um, nenhum mesmo!!!

MAAR

Brilhante artigo do Roberto Requião. Mostra de modo didático e preciso as evidências de que a Agenda Brasil, proposta por Renan Calheiros, representa um convite à volta do neoliberalismo predatório.

A argumentação exposta demonstra com clareza que a referida Agenda visa privilegiar interesses de grupos econômicos hegemônicos, e contém graves ameaças contra a preservação de direitos sociais, contra a proteção do meio ambiente, contra a exploração sustentável de recursos naturais, e contra a ampliação da capacidade industrial e tecnológica do Brasil.

Os setores progressistas da sociedade civil organizada devem mobilizar a conscientização política necessária para expandir a percepção do fato de que é possível e indispensável construir soluções capazes de promover o bem comum.

E as soluções adequadas são exatamente aquelas que conciliam a indução do crescimento econômico com a garantia do desenvolvimento social, através do aprimoramento político das instituições democráticas.

Um futuro melhor para todos depende apenas de coerência e bom senso.

Oliveira

Não consigo entender como Requião continua no PMDB.

Urbano

Nos últimos tempos, um dos maiores sonhos dos bandidos da oposição ao Brasil vem sendo a de incluírem este no bloco da ALCA, no único intuito de no passo seguinte anexá-lo aos isteites. Por não terem conseguido até agora, então passaram a entregar o Brasil aos pedaços e de todas as formas; e o Pré-Sal é um que já se encontra na agulha dessa rapina. Tais fascistas quando não entregam algum bem material do Brasil, entregam informações sigilosas, de valor incalculável; não se enganem.

FrancoAtirador

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Acho isso uma Política Trágica, quase Imperdoável.
Trágica, porque não obteve sucesso; Imperdoável,
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e premiou os Arquitetos da Crise, ou seja,
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pela Crise Financeira, pela Irresponsabilidade Financeira,
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retirados dos Balancetes.
Todas essas práticas financeiras, que são terríveis,
foram premiadas com resgates, fechando-se os olhos
para a Remuneração de Executivos,
com Flexibilização Quantitativa [Ilimitada]…
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E isso só poderia acontecer com a Retirada dos Investimentos Sociais,
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A partir dos 06:45 do Vídeo com a Entrevista em:
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