Marcos Coimbra: Aborto e união civil homossexual nas eleições

Tempo de leitura: 3 min

8 de Dezembro de 2010 – 12h57

Marcos Coimbra: uma nova pesquisa sobre temas morais nas eleições

por Marcos Coimbra, no Correio Braziliense, via Vermelho

Uma novidade importante nas eleições presidenciais deste ano foi a proeminência que ganharam certos temas que poderíamos chamar morais. São questões importantes para todos na sociedade e, para algumas pessoas, fundamentais. Nunca, no entanto, haviam estado na pauta dos candidatos (pelo menos dos partidos maiores) e nem suscitado discussões relevantes na tomada de decisões de voto.

Este ano, temas como o aborto, a união civil entre pessoas do mesmo sexo e o consumo de drogas assumiram posição central, especialmente no período entre o final do primeiro turno e o início do segundo. Ao longo dessas semanas, parecia que a eleição tratava fundamentalmente deles e que todos os demais eram secundários.

O pano de fundo para o destaque que esses temas receberam talvez tenha sido o quase consenso que existia na opinião pública sobre a continuidade das políticas do governo Lula. Na medida em que a vasta maioria dos eleitores a desejavam, nem Serra, nem Marina (orientados por seus marqueteiros e pesquisadores) quiseram discuti-la, preferindo apresentar-se como opções a Dilma apenas no plano pessoal.

Era como se dissessem que a escolha deveria basear-se em critérios extra-políticos: a biografia de cada um, sua subjetividade e as diferenças entre eles em questões morais. Não estavam em contraste visões de Brasil e modos de tratar seus problemas, mas individualidades e assuntos da vida privada.

Bem que a campanha Dilma tentou manter a comparação entre os candidatos no plano político, insistindo na contraposição entre os governos FHC e Lula, e trazendo de volta a discussão sobre as privatizações. Mas a tarefa não era fácil, pois Serra não media esforços para se associar a Lula (chegando a se apresentar como o Zé para continuar o trabalho do Silva) e Marina até se parecia ao presidente no simbolismo. Ou seja, era difícil evitar que uma pauta não-política vicejasse.

É claro que isso não passou despercebido pelos estrategistas tucanos. Conscientes de que a eleição se encaminhava para a vitória de Dilma no dia 3 de outubro, moveram todos seus recursos para fazer com que essa pauta se impusesse, pelo menos junto a um segmento suficiente do eleitorado para levar a eleição para o segundo turno. Com sucesso, como vimos.

O resultado é que passamos cerca de três semanas dominadas pelas discussões sobre aborto e casamento homossexual, sem esquecer a liberação do consumo de drogas. Nelas, Dilma e Serra frequentaram todas as missas, cultos e serviços religiosos que sua agenda permitia (sem esquecer a inacreditável procissão de Mónica Serra ao Chile), assumiram compromissos e deram declarações contrárias a qualquer avanço na legislação relativa a esses assuntos. Um para ganhar, ela para não perder o voto do eleitor preocupado com eles.

A mais recente pesquisa nacional da Vox Populi ajuda a compreender o modo como a opinião pública reage a tais temas e revela um aspecto pouco óbvio de seu impacto eleitoral. Ela foi feita entre os dias 19 e 23 de novembro.

A primeira coisa que chama a atenção são as proporções que apóiam as restrições existentes: 82% dos entrevistados são de opinião que o aborto não deve deixar de ser considerado crime; 72% acham que o governo não deve propor mudanças na legislação que o descriminalizem; 60% entendem que a união civil de pessoas do mesmo sexo não deve ser permitida; 72% acham que o governo não deve propor leis que descriminalizem o consumo de drogas.

As variações socioeconômicas e regionais nas respostas são pouco relevantes, embora aconteçam nas direções esperadas. Pessoas de escolaridade mais alta, com maior renda, mais jovens, moradores de áreas urbanas e de estados mais desenvolvidos, tendem a ser menos hostis a mudanças, mas nunca em proporções elevadas (a aceitação de que o aborto não seja considerado crime é de 10% entre pessoas de baixa ou nenhuma escolaridade, mas vai a apenas 20% nas de alta escolaridade). Ou seja, se quisermos falar em conservadorismo, trata-se de um fenômeno majoritário na sociedade inteira.

Outro resultado interessante é que não há diferenças nos padrões de resposta dos eleitores de Dilma e Serra. Contrariando uma expectativa que se difundiu quando a campanha do PSDB pisou no acelerador dessa temática, a “taxa de conservadorismo” do voto Serra foi idêntica à de Dilma: 82% dos eleitores da petista e 82% do tucano, por exemplo, são favoráveis a que o aborto continue a ser considerado crime.

O mesmo acontece no tocante à união civil homossexual (60% dos eleitores de Dilma e 62% de Serra acham que não deve ser permitida) e à revisão da legislação que proíbe o consumo de drogas (apenas 11% de Dilma e 12% de Serra acham que deve mudar).

Olhando esses números, vemos que há eleitores do PT conservadores e progressistas nessas questões, assim como do PSDB. Não é com base nelas que se explica a vitória de Dilma ou a derrota de Serra.

Marcos Coimbra é sociólogo e presidente do Instituto Vox Populi


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Comentários

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Fabio_Passos

(Resposta ao Giovani)

Imagine.
Não é mesmo simples arbitrar sobre quando um embrião torna-se um ser humano.
Creio que 12 semanas é um padrão aceito para escolha exclusiva da mulher.

No limite daquela história de "ser humano potencial" cada ejaculada nossa é um genocídio.

Mas você sugere prender todas as "assassinas" que fazem aborto?

Urbano

Para o zé contra-rampa, o mitômano, que não possuía (nem possui ele nem 99,9% da sua turma; e estou sendo bondoso) um projeto decente para o Brasil, qualquer assunto polêmico estava de bom tamanho para enganar os idiotas.

Vinícius

Enquanto isso, aqueles que tem medo da democracia querem que o casamento gay, a legalização da maconha e o aborto sejam decididos dentro do parlamento, sem plebiscito.

Estou mentindo? Não é medo do povo isso?

Muito movimento social quer enfiar suas reformas goela abaixo. É duro dizer isso, mas é verdade. Como não conseguem se amigar do povo, se esforçam pra se amigar do rei… no caso, dos senadores.

Daí, o BUCHA do Ricardo Barros aqui no Paraná, com 5% das intenções de voto, do dia para a noite chega a 20% dos votos pra senador porque disse que era contra casamento gay. Por quê? Porque certos movimentos sociais desistiram de crescer junto ao povo. O povo não conhece esses movimentos, não está nem aí pra eles, às vezes até vê a postura deles como uma postura agressiva.

A gente não faz nada sozinho… tomara que os movimentos feminista, gay e pela legalização da maconha aprendam isso.

    @BorbaGabriel

    Vinícius, sua concepção de democracia está limitada. O que o Congresso Nacional decide também é democrático no caso atual do Brasil, uma vez que os que estão lá decidindo são eleitos pela vontade popular. Por essa razão devemos votar e fiscalizar a atuação daqueles que acreditamos que representam em uma Câmara a nossas vontades.

Beth

A pesquisa demonstra o que já sabíamos: majoritariamente somos um país conservador. São dados da maior importãncia para quem luta por uma transformação na cultura política do nosso país

Ronaldo Luiz

Para estes casos de cunho socio-moral, deveriamos copiar o sistema plebicitário em uso nos Estados Unidos. Lá na mesma oportunidade em que o eleitor vai votar nos seus parlamentares ou dirigentes executivos, tem a oportunidade de votar temas ultra polêmicos. Nada melhor do que a manifestação do povo para estes casos. Incluiria tambem um referendo a todas as alterações constitucionais promovidas pelo congresso no inter-regno das eleições.

    Lucas Cardoso

    Não. Isso é horrível. Devem ser impostas regras para que a maioria não imponha suas vontades às minorias. Por exemplo, a maior parte da população não é gay. Apesar de haver muitos não-gays como nós que apoiam os direitos dos homossexuais, os gays quase sempre saem perdendo em plebiscitos assim. De que importa minha opinião se os gays podem casar ou não? De que me importa se eles querem se casar ou adotar filhos? Não há motivo nenhum para que eu decida se eles vão ou não ter esses direitos.

    Roberto Locatelli

    Realmente, Lucas, chega a ser ridículo. Mais ou menos assim: eu proíbo você de tomar suco de uva, pois EU não gosto de suco de uva.

edson

17:11
08/12/2010
Jobim diz que aceitou convite para continuar no Ministério da Defesa

Daniella Jinkings
Repórter da Agência Brasil

Brasília – O ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse há pouco que foi convidado pela presidenta eleita Dilma Rousseff para continuar no cargo no próximo governo. Jobim afirmou que aceitou o convite durante reunião com a presidenta eleita no início desta semana.

“Tive uma conversa relativamente longa com ela [Dilma] e já tinha notícia de que ela faria o convite. Tem certas coisas que você não pode deixar de aceitar”, afirmou Jobim.

No encontro, o ministro entregou a Dilma o plano diretor preliminar dos projetos do Ministério da Defesa. “O plano significa continuidade. Disse a ela que tínhamos iniciado, na segunda parte da minha gestão, a consolidação, que é a aplicação ao longo de 20 anos do plano de adequação das Forças Armadas.”

Segundo ele, durante a reunião foram discutidos assuntos referentes à administração geral do ministério e projetos que envolvem as Três Forças. “Temos que resolver problemas de comando. Disse a ela que é necessária a conservação total ou a renovação [dos comandos]. Isso será conversado nos próximos dias, ainda antes do dia 20.”

Jobim informou que a decisão sobre a compra de aviões de combate para a Força Aérea Brasileira (FAB) será da presidenta eleita. “Entreguei a ela o material e ela disse que vai analisar. Depois vai me chamar, eu darei explicações adicionais e, então, ela vai decidir.”

Outro ponto discutido na reunião foi a transferência do setor de aviação civil. “Há necessidade de que a aviação civil saia do Ministério da Defesa. Tive algumas dificuldades em reuniões internacionais, pois havia ministros dos transportes, secretários especiais e não tinha representantes militares. Ela [Dilma] disse que vai analisar e ver se cria uma secretaria especial, mas ainda não está decidido.”

Matéria ampliada – Edição: João Carlos Rodrigues
http://agenciabrasil.ebc.com.br/home;jsessionid=B

Fabio_Passos

Olhando esses números não se explica a vitória de Dilma ou a derrota de Serra. Mas seguramente é uma das razões da derrota acachapante do Plinio de Arruda Sampaio, que defendeu abertamente os avanços de costumes.

Olhando estes números se explica porque somos uma nação tremendamente atrasada.

O Brasil precisa fazer um enorme esforço civilizatório.
O risco de aceitar uma situação tão vergonhosa é a perpetuação do nosso subdesenvolvimento.

É evidente que a mídia burguesa tem culpa destes números assustadores.
Temos uma ferramenta fabulosa para educar e bem informar a população… mas ela está entregue a oligarcas atrasados e reacionários.

Daniel Rodrigues

É um retrato da nossa sociedade em novembro de 2010. O perfil é conservador demonstrando que nossa sociedade é assim. São dados sobre os quais os movimentos sociais devem se debruçar para ajudar ao trabalho que fazem visando mudanças.

Fabio_Passos

Que vergonha estes números.
Legalização do aborto, drogas e casamento gay são conquistas civilizatórias elementares.

É preciso mudar a cabecinha diminuta da maior parte da população.
Esclarecer. Educar. Informar.

Estamos mergulhados no atraso!
É dever de todo cidadão trabalhar para superar a idiotia social.

    Giovani

    Casamento gay tudo bem!!! As pessoas tem o direito de se unirem com quem quiser e o Estado não tem direito de interferir nisso!

    Mas porque o aborto é uma conquista civilizatória? Para mim aborto é assassinato!!!

    Fabio_Passos

    Imagine.
    Não é mesmo simples arbitrar sobre quando um embrião torna-se um ser humano.
    Creio que 12 semanas é um padrão aceito para escolha exclusiva da mulher.

    No limite daquela história de "ser humano potencial" cada ejaculada nossa é um genocídio.

    Mas você sugere prender todas as "assassinas" que fazem aborto?

    Giovani

    Cada ejaculada é um genocídio? kkkk Não existem óvulos fecundados no esperma!!! Mas é claro que vc sabe disso!!!

    A vida não começa no parto, antes disso, o embrião tem vida sim!!! Até que ponto podemos decidir sobre a vida de alguém? Não é melhor tomar anticoncepcional, que é um método muito mais seguro que o aborto? Evitar uma gravidez creio que seja uma atitude muito mais civilizada do que interrompe-la.

    É claro que para uma família pobre com muitos filhos, a vinda de mais um pode piorar a situação. Mas a distribuição de anticoncepcionais não seria mais eficiente? Menos doloroso para a família? Menos prejudicial ao corpo da mulher? A prevenção não é melhor? Ou estou errado nisso também?

    A minha opinião pessoal é de que seja crime sim, não dá para resolver um problema com uma solução ainda pior.

    Fabio_Passos

    Acho que você não entendeu.
    12 semanas é muito antes do parto.
    É um prazo arbitrado porque não se considera humano o embrião sem sistema nervoso central constituído.

    Você acredita que um espermatozóide não tem vida por que não fecundou um óvulo?
    Curioso.

    Lógico que impedir a fecundação usando anticoncepcionais é o ideal.
    Agora… você reafirma sua posição e foge de uma resposta necessária: você sugere prender todas as "assassinas" que fazem aborto?

    Elton

    Em nossos vizinhos da América do Sul, países tão ou mais "católicos" que o nosso (mais praticantes) a legislação a respeito de alguns desses temas é BEM MAIS progressista.

    Fabio_Passos

    Portugal dizem que é carola-papa-hóstia até o limite legalizou o aborto em 2007.

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