Luciano Martins Costa: A imprensa se faz de vítima

Tempo de leitura: 3 min

REGULAÇÃO EM DEBATE

A imprensa se faz de vítima

Por Luciano Martins Costa em 9/11/2010

Comentário para o programa radiofônico do OI, 9/11/2010, via Paulo Dantas

Mal ou bem, o noticiário sobre eventos para discutir a liberdade de imprensa começa a oferecer algo mais do que os repetitivos e mal fundamentados alertas sobre o risco de volta da censura no Brasil.

Tanto as reportagens a respeito do encerramento da 66ª Assembléia Geral da Sociedade Interamericana de Imprensa, que se realizou na cidade de Mérida, no México, quanto o seminário sobre o futuro das mídias, que se inicia na terça-feira (9/11) por iniciativa do governo, em Brasília, estão trazendo um pouco mais de informação sobre um tema que a imprensa brasileira tradicional tem mantido, propositadamente, na obscuridade.

Vejamos, primeiro, o que nos trazem os jornais sobre a assembléia da SIP. A entidade, que congrega mais de 1.300 empresas privadas de comunicação nas Américas, tem conflitos permanentes com o governo em alguns países – cuja natureza varia conforme o país – mas trata a todos esses governos como inimigos das liberdades civis.

Ao mesclar propositalmente as situações da Venezuela e do Brasil, por exemplo, e acusar genericamente outros países de promover a “bolivarização” das comunicações, a imprensa desinforma, confunde e atenta contra os interesses da sociedade cujos direitos diz defender.

Noticiário manipulado

Conforme observa o Estado de S.Paulo, ainda antes de encerrar-se o encontro no México representantes de governos criticados pelas empresas de comunicação faziam reparos aos documentos apresentados durante o congresso. O porta-voz do governo da Bolívia, por exemplo, comentou que “os membros da SIP, que no passado atuaram apoiando até mesmo ditaduras, estão equivocados”.

O chanceler do Equador também se manifestou, recomendando que a imprensa de seu país faça a lição básica do jornalismo, de tentar se colocar do outro lado, para sentir a pressão e a manipulação enviesada da informação cometida pela imprensa contra o governo.

A choradeira da mídia, que no Brasil não tem qualquer justificativa, acaba por abrir espaço para algum esclarecimento no noticiário que, embora ainda manipulado, permite ao público tomar conhecimento de que, aqui como em outros países do continente, a imprensa não é simplesmente vítima de ditadores, mas protagonista ativa do jogo político.

Novas alternativas

Para uma abordagem jornalística do problema das relações da imprensa latino-americana com o poder público, é preciso recuar alguns anos e recordar que, no país onde esse conflito chegou ao grau máximo, a Venezuela, tudo começou com uma tentativa de golpe de Estado liderada por donos de empresas de comunicação.

Em alguns outros países, como a Bolívia, houve uma reação preconceituosa de empresários de origem hispânica à eleição de um governante de origem indígena, e parte da imprensa andou estimulando até mesmo aventuras separatistas.

No Brasil, a adesão da imprensa mais poderosa a um grupo político específico é oficial e contamina o jornalismo.

Na maior parte desses casos, ficou clara a dificuldade da mídia tradicional de lidar com contrariedades na escolha democrática dos eleitores e na execução de políticas diversas daquelas que historicamente eram produzidas por governantes aliados ou controlados pelas empresas de comunicação.

A partir do estabelecimento desse viés a priori, pode-se afirmar que quase tudo que se publica vem contaminado por esse desvio no caráter da imprensa.

Ao lado desse fenômeno deve-se observar que o rápido desenvolvimento das novas tecnologias de comunicação e informação oferece ao público alternativas mais abertas, retirando do círculo de influência da mídia até então predominante vastas porções da sociedade.

Só o jornalismo salva a imprensa

Quando se fala do público que consome informações através do jornalismo, já não se pode restringi-lo ao conceito de leitor de jornais ou revistas. De posse de uma informação, o cidadão pode rapidamente se transformar em protagonista do processo comunicacional, reproduzindo uma notícia por meio de seu aparelho eletrônico, acrescentando seu próprio comentário – que eventualmente corrige, completa, contradiz ou desmente a notícia original.

Portanto, o poder de influência da imprensa tradicional sobre a sociedade reduz-se gradualmente e tende a se concentrar sobre as instituições.

Nessa circunstância, não é partindo para o confronto e fazendo denúncias sobre ameaças que não existem que as empresas de comunicação vão recuperar alguma reputação. O que pode ajudar a imprensa não é a ação política direta ou diversionista – é apenas o jornalismo de qualidade.


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Comentários

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Bonifa

Não sabia que existia esse tal de SIP. Barbaridade. Uma congregação internacional de Institutos Millenium! Era só o que faltava à América Latina! Mas é como diz o lúcido Luciano Martins Costa: Só o jornalismo poderá salvara imprensa. É preciso multiplicar as associações multilaterais de verdadeiro jornalismo na América Latina, para fazer um contraponto forte a esta organização política poderosa que pretende perpetuar a dominação de partidos de direita e extrema direita através do controle da informação pública no continente.

van

Os blogs mudaram tudo. E, não é porque estou no seu blog, Azenha, mas foi aqui que pela primeira vez vi, um elogio, uma constatação de como é importante essa resposta imediata dos comentaristas que aqui, representa o povo.
É uma parcela da população que gosta de política e não desistiu coo muitos, por compreender que só através da participação e do interesse político, pode-se chegar, pelo menos ao senso comum.
Excelente texto.

Rogerio Godoy

Ouvi falar que o sertão nordestino (do Sergipe ao Ceará) está todo esburacado. O povo está procurando os canos que o zé pinóquio disse que instalou naquela região pra “dar água de beber àquele povo de meu Deus”.
Quem será punido pela fraude das imagens no caso "bolinha de papel"?

Marat

O x da questão é a imprensa ter relações promíscuas com certos partidos e com empresas. Como ela será isenta se tem o rabo preso? Esse papo de que regulação é o mesmo que manipulação não passa de um tosco sofisma que a não engana mais ninguém. Eles querem liberdade? Que tenham responsabilidade!

Jorge

Censura! Sou a favor, eu mesmo já estabeleci "censura prévia" aqui em casa, senão vejamos:
– Já se vão 5 anos que cancelei Veja (e qualquer publicação Abril),
– No mesmo período, deixei de comprar FSP na banca. Assim procedia pois nem sempre tinha tempo para leitura diária e convinha a compra deste modo a mim e ao amigo jornaleiro. Infelizmente, perdeu ele um pouco de renda mas continuo ainda marcando presença e atualizando o papo quando vou pegar minha Isto É e umas de palavras cruzadas,
– Girei minha parabólica do satélite StarOne C2 para o Brasilsat B4; tive que comprar 2 receptores digitais para substituir os analógicos mas, em contrapartida, fiquei com opção de mais canais e livre da Globo (ela não está no B4 e espero que não venha). No começo deu chiadeira, hoje o ar da casa está arejado – Globo, quem quiser, apenas com auxílio de bom bril.

Polengo

Ontem, a rádio que "troca" notícia estava passando a cada 5 minutos uma declaração de 10 minutos de um cara aí, expert em sei lá o quê (tanto quanto o expert da globo em bolinha) falando que a censura vai voltar….
Eles estão se debatendo, esperneando.

Pra mim, censura é impedir que todo mundo fale o que pense, e não deixar apenas algumas famílias controlando tudo o que pode ser dito.

Censura é o que está acontecendo agora, e desde há muito.

Pedro A. Martins

A Carcomia Mídia tem que entender de um modo ou de outro que o mundo mudou e em velocidade supersónicas. O Povo está mais esclarecido e não adianta tentar manipulá-lo. OCidadão hoje tem muito mai smeio de informações. Tem milhões que tem Internet e estamos ligados na Blogosfera.

SérgioFerraz

Bye-Bye máfia-midiática!
As classes D e E vêm aí, com banda larga, ENEM e PROUNI.

Luciano Prado

A velha e carcomida imprensa brasileira vai instigar, provocar, esticar a corda no intuito de que se cometa algum deslize para que ela venha mais uma vez com seu discurso enfadonho e mentiroso sobre censura.

Alessandro Lino

Se houver de fato a implantação da banda larga em larga escala,não precisaremos sequer de "Ley de Medios".Sou exemplo disso,tenho banda larga de transmissão de 2mb de velocidade,e desde então nunca mais li jornalzão nem canais do Pig.Me emancipei.Imaginem a classe C e D com acesso a essa tecnologia???Adeus Pig. Dilma sepultará a velha mídia.

easonnascimento

"Regular a mídia é ampliar a liberdade de expressão, a liberdade da imprensa, a pluralidade e a diversidade. Regular a mídia é garantir mais e não menos – democracia. É caminhar no sentido do plenp reconhecimento do direito á comunicação como um direito fundamental da cidadania." Com estas palavras o professor Venício de A. Lima diz tudo.
http://easonfn.wordpress.com

Baixada Carioca

A gritaria da mídia brasileira começou quando o governo começou a distribuir melhor a verba de publicidade. Enquanto estava com a maior fatia, a velha mídia ficava na dela, mas agora quer usar sua máquina de manipulações para fazer pressão por verbas publicitárias.

O caminho para minar essa resistência e oposição é uma banda larga que chegue ao povo realmente. Se isso vier acontecer, vamos ter uma massa significativa se informando via internet e abandonando essa mídia partidarizada e ideologizada.

Jose Irassu Angeli

Fala-se muito em liberdade de expressão, porém na eleição perdida pelos derrotados insatisfeitos e, por grandes grupos de comunicações do País, muitos, não foi um só, foram mais, jornalistas que escreveram ou perguntaram "coisas" indesejáveis, foram demitidos. Que liberdade querem? Só a deles que prevalece? Está na hora de corrigir esse comportamento, punindo esses irresponsáveis de alguma foram.

Luana

Você tem que ler, Azenha, as distorções do Pasquin global, aguarde que já, já virão os colonistas e os editorais de sempre.

Lafitte

Gostaria de saber se existe subsídio para o papel imprensa. Caso ainda exista entendo que é por aí.

    Baixada Carioca

    O subsídio aparece em forma de publicidade do governo e das Estatais. Essa publicidade tem que inverter as prioridades e deixar essa velha mídia com suas elites. Quero ver se se sustentam.

    Exilado

    Sim, existe. A Constituição da República assim o garante.
    Veja esse texto: "O papel é um produto que não paga imposto, em algumas circunstâncias, de acordo com a lei. Trata-se do chamado papel imune, que fica restrito a algumas situações, tais como livros e jornais, periódicos de editoras regularmente constituídas e registradas, encartes, que podem ser exclusivamente publicitários, a serem distribuídos juntamente com o jornal ou periódico e publicações que contenham material informativo e publicitário, vedada a publicação exclusivamente publicitária. Na verdade, a não-tributação ou imunidade do papel de imprensa constitui a essência da liberdade de Imprensa, que não poderia ser obstruída por uma taxação elevada do papel destinado a jornais, livros e periódicos. Essa é uma conquista da liberdade de comunicação escrita. Em conseqüência, os livros, jornais, periódicos e o papel destinado às respectivas impressões são imunes à tributação (art. 150, VI, "d" da CF/99) da União, Estados e Municípios;"
    Eu entendo que, se há lucro no jornal ou revista, então o papel deveria ser tributado!

Alexandre

Me considero um laboratório do inconformismo do cidadão comum com o que se transformou nossa grande mídia. Desde a tentativa de golpe midiático, levado à cabo pelos jornalões, com a ocorrência de um segundo turno na reeleição de Lula, passei a me interessar por blogs alternativos. Naquela ocasião eu ficava lendo o que se publicava no Observatório da Imprensa e no site da revista Carta Capital. Alí descobrí que existia vida pujante fora do contaminado ambiente das redações dos grandes veículos de comunicação. Lembro-me que o onipresente Ali Kamel chegou a responder à saraivada de críticas que a Rede Bobo recebeu na ocasião. O golpe fora acusado! Um mandato depois a tantativa de golpe se repete. Novamente sem sucesso. Como diria minha avó: "Bendito seja Deus"! Desta vez, pude acompanhar o desdobrar dos fatos lendo: viomundo, tijolaço, conversaafiada, cartamaior, cartacapital, observatoriodaimprensa, escrevinhador, entre outros. A conclusão que chego é que a turma está aumentando. Consequência da inclusão digital, social, cidadâ, etc… Espero sinseramente que seja as inclusões que ainda faltam, sejam concluídas!

RODRIGO SÉRVULO

O PIG ESPERNEIA
http://midiacaricata.blogspot.com/2010/11/o-pig-e

SAUDAÇÕES DEMOCRÁTICAS

adhemar

o velho ditado esta sendo atualizado,se correr o bicho pega,se ficar parado o bicho come,a volocidade de transformação em que esta o mundo,a velha midia não consegue acompanhar os novos,visto nesta eleições,qdo a escolha do candidato da oposição coube a ela,fez a festa emplacou o serra,mas qdo a escolha chegou ao povo,a velha imprensa conhecida como pig foi triturada,basta ver que no ultimo debate a toalha ja estava jogada,vão continuar insistindo claro,mas sentiram que do outro lado tambem estão jogando de chuteira

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